Dimensões da violência do aluno contra o professor

Dimensions of student violence against the teacher

Angela Gilda Alves Flaviane Cristina Rocha Cesar Maria Alves Barbosa Lizete Malagoni de Almeida Cavalcante Oliveira Edinamar Aparecida Santos da Silva Dolors Rodríguez-Martín Sobre os autores

Resumo

A violência contra o professor é uma preocupação global e traz impacto negativo para o desenvolvimento da sociedade. Nesse contexto, o estudo objetivou revisar definições de violência contra o professor para desenvolver consenso integrado e modelo conceitual. Foi realizada uma revisão de escopo de literatura para incluir artigos que pudessem responder à pergunta norteadora da pesquisa: “Quais são as definições e as dimensões da violência do aluno contra o professor no ensino?” Nos estudos incluídos na revisão, identificou-se que a violência contra o professor pode ser definida como o conjunto de ações e situações provocadas por estudantes de forma insidiosa ou crônica no local de trabalho e/ou meio digital, mediadas por percepção de violência, mecanismo de enfrentamento do professor e gestão organizacional da violência. O modelo integrado de violência contra o professor compreende antecedentes conceituais, como a experiência anterior com violência contra o docente, definição cultural de violência e percepção de vitimização. A violência propriamente dita contra o professor é um construto multidimensional que resulta da interação com o estudante nos contextos organizacional e social. As consequências da violência contra o professor incluem danos psicológicos, emocionais, biológicos, profissionais e sociais.

Key words:
Violence; Teaching; Workplace violence; Education; Faculty

Abstract

Violence against teachers is a global concern and has a negative impact on the development of society. In this context, this study aimed to review definitions of violence against teachers to develop an integrated consensus and conceptual model. A scoping review of the literature was carried out to include articles that could answer the guiding question of the study: “What are the definitions and dimensions of student violence against teachers in teaching?” The studies included in the review, it was identified that violence against the teacher can be defined as a set of actions and situations caused by students in an insidious or chronic way in the workplace and/or through digital medium, mediated by the perception of violence, the copping mechanism of the teacher and the organizational management of the violence. The integrated model of violence against teachers comprises conceptual antecedents, such as previous experience with violence against the teacher, the cultural definition of violence and the perception of victimization. Violence against teachers is a multidimensional construct that results from the interaction with the student in the organizational and social context. The consequences of violence against the teacher include psychological, emotional, biological, professional and social harm.

Key words:
Violence; Teaching; Workplace violence; Education; Faculty

Introdução

O conceito de violência não apresenta uma única face, tampouco um único significado, e deve ser historicamente situado e compreendido11 Wieviorka M. O novo paradigma da violência. Tempo Soc 1997; 9(1):5-41.. Originalmente, o termo em latim, violentia, significa a ação de violar a si mesmo ou outra pessoa, como ato aparentemente não natural, sendo ligado à prática de força impetuosa e deliberada capaz de produzir danos físicos e psíquicos, contrários à liberdade e à vontade de alguém.

A definição da Organização Mundial da Saúde (OMS)22 World Health Organization (WHO). Violence: a public health priority. Geneva: WHO; 1996. perpassa pelo uso de força física ou poder, expressa em ameaça ou prática, contra si, outra pessoa ou um grupo ou comunidade que imponha algum grau de dor e sofrimento evitáveis.

Minayo e Souza33 Minayo MCS, Souza ER. Violência e saúde como um campo interdisciplinar e de ação coletiva. Hist Cienc Saude-Manguinhos 1997; 4(3):513-531. destacam a compreensão da violência como um problema de saúde pública, definida como “qualquer ação intencional, perpetrada por indivíduo, grupo, instituição, classes ou nações dirigida a outrem, que cause prejuízos, danos físicos, sociais, psicológicos e (ou) espirituais”.

Schraiber e D’Oliveira44 Schraiber LB, D’Oliveira AF. Violência contra mulheres: interfaces com a saúde. Interface (Botucatu) 1999; 3(5):11-26. afirmaram a inexistência de conceito próprio para violência, no discurso da ciência e das práticas sociais, pela ausência de designação que a nomeie e permita lidar com seus determinantes, antecedentes e consequências, tanto no âmbito da vida quanto da saúde da população.

Por esses vários, ou ausentes, conceitos de violência, pode-se verificar que nem sempre ela se apresenta como um ato, uma relação ou um fato que possua estrutura facilmente identificável.

Para Pierre Bourdieu55 Bourdieu P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2007., a violência compreende o efeito indireto de um conjunto complexo de ações que se engendram na estrutura do campo por meio do qual se exerce a dominação frente aos demais, sendo a violência simbólica uma situação em que o dominado não pode deixar de conceder ao dominante. A dominação, nesse caso, é consentida, pela aceitação das regras e crenças partilhadas como se fossem “naturais” e da incapacidade crítica de reconhecer o caráter arbitrário de tais regras impostas pelas autoridades dominantes de um campo66 Salvini L, Souza J, Marchi JW. A violência simbólica e a dominação masculina no campo esportivo: algumas notas e digressões teóricas. Rev Bras Educ Fís Esporte 2012; 26(3):401-410.,77 Tiradentes AR. Violência simbólica no contexto escolar: discriminação, inclusão e o direito à educação. Revista Eletrônica do Curso de Direito - PUC Minas Serro 2015; 12:33-48..

A violência simbólica é um fenômeno que pode ser verificado em várias instituições da sociedade. Trata-se de um mecanismo utilizado de forma sutil pela classe dominante, a fim de legitimar certas crenças, comportamentos ou tradições88 Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2001..

Pierre Bourdieu, enquanto sociólogo, situa-se na contemporaneidade como pós-estruturalista crítico ao procurar definir os conflitos micro e macrossocial, e o termo violência simbólica, utilizado para esclarecer a sucessiva reprodução de crenças dominantes no processo de socialização88 Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2001., explica a adesão dos dominados, os quais são forçados a aderir a um conjunto de disposições coerentes com a lógica de cada campo. Eles herdam capitais culturais variados e participam de relações que os forçam a seguir brutalmente determinado caminho (pessoal, afetivo e profissional)99 José VTS. A violência simbólia: o Estado e as práticas sociais. Revista Crítica de Ciências Sociais 2015; 108:183-190..

Esta seria a sociologia do capital, do campo e do habitus, e estão conectadas. A teoria do capital se refere aos recursos que um indivíduo possui para ter vantagens e privilégios, o campo é uma rede de relações sociais que são organizadas em posições de dominância, e está ligado ao capital, pois é nesse onde ocorrem as disputas de poder. O habitus, na concepção bourdieusiana, é o que liga o individual e o social, entendido como um sistema de esquemas individuais, construído socialmente e que produz ações e reproduz práticas construídas historicamente1010 Dendasck CV, Lopes GF. Conceito de habitus em Pierre Bourdieu e Norbert Elias. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento 2016; 3(5):1-10., pois trata-se de “um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações [...]”1111 Bourdieu P. Esboço de uma teoria da prática. In: Ortiz R, organizador. Conceito de Habitus em Pierre Bourdieu e Norbert Elias. São Paulo: Ática; 1983. p. 46-81..

As teorias científicas sobre o fenômeno violência são inúmeras, necessárias para descrevê-la, analisá-la e interpretá-la nos campos das teorias sociológicas, psicológicas, psicanalíticas, biológicas, jurídicas e feministas. A violência é fruto da sociedade. Surge do tecido sócio-econômico-político e se estrutura no indivíduo e nas instituições, que não são naturais.

Nesse contexto, estudiosos destacam maior amplitude e ambiguidade do conceito de violência que não só ligado à dor e à agressão cometida por uma pessoa contra outra, considerando haver também complexidade no conceito de dor, igualmente de difícil definição, além da variação conceitual no tempo e no espaço, segundo padrões culturais dos grupos ou época1212 Modena MR. Conceitos e formas de violência. Caxias do Sul: EDUCS; 2016..

Essas teorias trazem como um dos grupos de vitimização os professores, destacando que mais da metade deles já experienciou algum tipo de violência1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766.,1414 Wilson CM, Douglas KS, Lyon DR. Violence against teachers: prevalence and consequences. J Interpers Violence 2011; 26(12): 2353-2371. e um a cada dez já vivenciou violência física ou assédio sexual1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.. Os professores podem ser, inclusive, vítimas do que Benson1616 Benson KA. Comment on Crocker’s “An analysis of university definitions of sexual Harassment”. Signs 1984; 9(3):516-519. denominou de “assédio contrapoder”, que se refere ao ambiente ou à situação em que uma pessoa aparentemente com menos autoridade ou poder, como alunos, assedia outra pessoa com maior autoridade, como poderiam ser os professores.

Apesar das altas taxas de vitimização, a violência contra o professor é uma temática pouco discutida1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766.,1717 Melanda FN, Salvagioni DAJ, Mesas AE, Gonzalez AD, Andrade SM. Recurrence of violence against teachers: two-year follow-up study. J Interpers Violence 2019; 36(17-18):NP9757-NP9776.,1818 Moon B, Morash M, Jang JO, Jeong S. Violence against teacher in South Korea: negative consequences and factors leading to emotional distress. Violence Vict 2015; 30(2):279-292.. A literatura que aborda violência escolar tende a focar nos estudantes, não nos professores1919 Ruff JM, Gerding G, Hong O. Workplace violence against K-12 teachers: implementation of preventive programs. AAOHN J 2004; 52(5):204-209..

A violência contra o professor é universal e tem consequências negativas em sua vida1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16., sendo necessárias mais informações sobre vitimização e o que essas viviências podem causar na vida do professor1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.,2020 Reddy LA, Espelage D, McMahon SD, Anderman EM, Lane KL, Brown VE, Reynolds CR, Jones A, Kanrich J. Violence against Teachers: case studies from the APA Task Force. International Journal of School & Educational Psychology 2013; 1(4):231-245..

A sociedade não tem sido indiferente à tematica, sobretudo à violência no cenário escolar, onde se encontram docentes e discentes. Decerto, não se pode deixar de considerá-la, ainda que os limites entre o que é e o que não é violência de aluno contra professor acabem por ficar muito difusos. Assim, exploramos no presente estudo a violência direta/indireta, institucional e social.

Visando contribuir para a ampliação do conhecimento sobre a violência do aluno contra o professor e suas características, o objetivo deste estudo foi revisar definições e características de violência contra o professor para desenvolver consenso e modelo conceitual.

Método

Trata-se de revisão de escopo com a finalidade de sintetizar e disseminar os resultados de estudos a respeito das definições e características da violência contra o professor. Operacionalizada em outubro de 2019, em seis etapas consecutivas: 1) identificação da pergunta de pesquisa; 2) identificação de estudos relevantes; 3) seleção dos estudos; 4) extração de dados dos artigos selecionados; 5) agrupamento; e 6) resultado e relato dos resultados2121 Armstrong R, Hall BJ, Doyle J, Waters E. Cochrane update. ‘Scoping the scope’ of a cochrane review. J Public Health (Oxf) 2011; 33(1):147-150.,2222 Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Baldini Soares C, Khalil H, Parker D. Chapter 11: Scoping reviews. In: Aromataris E, Munn Z, editors. Joanna Briggs Institute Reviewer’s Manual. Adelaide: The Joanna Briggs Institute; 2017..

A pergunta norteadora da pesquisa foi: “Quais são as definições e as dimensões da violência do aluno contra o professor no ensino?” Para identificação de estudos relevantes, foram consultadas as bases de dados Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), American Psychological Association (PsyInfo) e Education Resources Information Center (ERIC), por serem abrangentes e com ampla cobertura das publicações na temática. Para ampliar o número de publicações, não foi delimitado período de publicação e uma busca adicional foi realizada no Google Acadêmico.

Utilizando descritores padronizados e termos booleanos, realizou-se a seguinte estratégia de busca: “Violence” AND “Education Graduate”; “Faculty” AND “Workplace Violence”; “Faculty” AND “Violence”; “Workplace Violence” AND Teaching; e “Violence against teacher”. Os termos padronizados foram identificados no Medical Subject Heading Section (MeSH) e nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS).

Os critérios de inclusão foram: apresentar-se nos idiomas português, espanhol ou inglês, conforme periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). O critério de exclusão estabelecido foi ser um estudo secundário.

A extração de dados dos artigos selecionados incluiu: autor, ano de publicação, tipo de violência, característica da violência contra o professor e nível de ensino. Preliminarmente, foram analisadas as palavras contidas nos títulos, resumos e descritores. Os estudos capturados que responderam à questão norteadora foram lidos na íntegra, e suas referências analisadas em busca de estudos adicionais. Quando o resumo não deixava clara a relevância de um estudo, o artigo completo era recuperado para verificar se abordava adequadamente a questão de pesquisa.

O processo de busca e seleção dos estudos desta revisão de escopo está representado em um fluxograma (Figura 1) elaborado conforme recomendações do Joanna Briggs Institute (JBI), segundo checklist adaptado do PRISMA Extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR)2323 Moher D, Liberati A, Tetzlaff J, Altman DG, PRISMA Group. Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses: the PRISMA statement. PLoS Med 2009; 6(7):e1000097.

24 Peters MDJ, Godfrey CM, Mcinerney P, Soares CB, Khalil H, Paker D. The Joanna Brigs Institute Reviewers’ Manual 2015: methodology for JBI scoping reviews. Adelaide: The Joanna Briggs Institute; 2015.
-2525 Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O’Brien KK, Colquhoun H, Levac D, Moher D, Peters MDJ, Horsley T, Weeks L, Hempel S, Akl EA, Chang C, McGowan J, Stewart L, Hartling L, Aldcroft A, Wilson MG, Garritty C, Lewin S, Godfrey CM, Macdonald MT, Langlois EV, Soares-Weiser K, Moriarty J, Clifford T, Tunçalp Ö, Straus SE. PRISMA extension for scoping reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med 2018; 169(7):467-471..

Figura 1
Fluxograma do processo de seleção dos estudos sobre violência contra o professor, adaptado do PRISMA-ScR.

Os dados dos artigos selecionados foram agrupados em tipo de violência e suas características. Os tipos de violência foram categorizados com base nos referenciais teóricos de Bourdieu (Figura 2), sendo construído um modelo teórico conceitual sobre a violência contra o professor.

Figura 2
Categorização dos tipos de violência segundo Bourdieu.

Resultados

Compreender a natureza simbólica que subjaz a natureza física da agressão é uma tarefa bem complexa. Entre os 517 artigos encontrados na busca, 285 (55,1%) o foram no ERIC, na PsyInfo foram 110 (21,2%), na Medline 119 (23%) e no Google Acadêmico 3 (0,5%). Dentro dos pré-selecionados, apenas dez contemplaram os critérios de inclusão e tiveram os dados incluídos para síntese e categorização.

A leitura dos artigos selecionados permitiu agrupá-los em tipos de violência experienciada pelo professor segundo as categorias de Bourdieu e na quantidade de trabalhos abordando a temática, o que constituiu o Quadro 1. Assim, foram geradores das categorias: violência no trabalho (2), violência por meio de tecnologias da informação e comunicação - TIC (2), violência relacionada à identidade de gênero e à orientação sexual (1), coerção social (1), danos a propriedades (4), desprezo individual ou coletivo (2), violência verbal (5), violência física (6), interrupção na sala de aula (1), gestos ou falas obscenas (3), assédio sexual (1), agressão sem contato (1).

Quadro 1
Tipos de violência experienciadas pelo professor segundo as categorias de Bordieu.

Em grande parte dos textos, não foi possível identificar a formação dos autores, e a maioria dos artigos foi encontrada em revistas de psicologia.

A violência contra o professor apareceu em todos os níveis escolares, indo do ensino primário ao superior, e também em todas as localidades, sendo presenciada em áreas urbanas, suburbanas e rurais. A maioria dos estudos teve como prevalência professores brancos do sexo feminino. A violência física foi a mais relatada, seguida pela advertência verbal.

Violência verbal, violência física, danos a propriedades, coerção social e isolamento da vítima, são as definições de violência contra o professor descritas por Dzuka e Dalbert2626 Dzuka J, Dalbert C. Student violence against teachers: teachers’ well-being and the belief in a just world. European Psychologist 2007; 12(4):253-260..

O estudo de Álvarez-Garcia et al.2727 Álvarez-García D, Mercedes JM, Rodríguez FJ, Núñez JC. Adaptación y validación del cuestionario CUVE³ - EP para la evaluación de la violencia escolar en centros de enseñanza básica de la República Dominicana. Anales de Psicología 2015; 31(3):859-868. foi o único a avaliar a frequência de violência entre aluno-professor. Moon e McCluskey1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16. exploraram as consequências negativas da violência contra o professor, e identificaram que a violência verbal e as agressões sem contato fisico são mais comuns e que os professores que são menos amigáveis com os alunos tem uma chance maior de sofrer violência.

A violência sem contato físico, como insultos pessoais e xingamentos, foi identiticada também no estudo de Wilson, Douglas e Lyon1414 Wilson CM, Douglas KS, Lyon DR. Violence against teachers: prevalence and consequences. J Interpers Violence 2011; 26(12): 2353-2371. como sendo o tipo mais prevalente (75,2%).

No estudo de Bounds e Jenkins2828 Bounds C, Jenkins LN. Teacher-directed violence and stress: the role of school setting. Contemporary School Psychology 2018; 22(4):435-442., o tipo de violência mais relatado pelos professores foi o de comentários obscenos (34,26%), seguido por danos a propriedades pessoais (22%), intimidações (18,52%), furto de pertences (18,52%), violência física (14%) e agressão por meio de tecnologias da informação e comunicação (6%).

Já Al-Omari, Johari e Choo2929 Al-Omari MA, Johari H, Suan Choo L. Workplace violence: a case in Malaysian higher education institute. Business Strategy Series 2012; 13(6):274-283. e Ruff, Gerding e Hong1919 Ruff JM, Gerding G, Hong O. Workplace violence against K-12 teachers: implementation of preventive programs. AAOHN J 2004; 52(5):204-209. associaram a violência contra o professor ao ambiente de trabalho, sendo que o primeiro estudo ressaltou que o ambiente de trabalho influencia diretamente na violência. O clima escolar, para Lucas-Molina et al.3030 Lucas-Molina B, Williamson AA, Pulido R, Pérez-Albéniz AJPitS. Effects of teacher-student relationships on peer harassment: a multilevel study. Psychology in the Schools 2015; 52(3):298-315. também foi considerado como fator de vitimização do professor, e Reddy e colaboradores2020 Reddy LA, Espelage D, McMahon SD, Anderman EM, Lane KL, Brown VE, Reynolds CR, Jones A, Kanrich J. Violence against Teachers: case studies from the APA Task Force. International Journal of School & Educational Psychology 2013; 1(4):231-245. identificaram que as violências sofridas pelo professor influenciam diretamente em seu desempenho no ambiente profissional, bem como leva a complicações emocionais.

McMahon et al.1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766. pesquisaram 2.998 professores do ensino fundamental e médio para identificar a prevalência de violência sofrida pelo professor e os fatores demográficos associados. Identificaram que 80% dos professores sofreram violência, cerca de – deles relataram assédio, mais da metade teve destruição de propriedades e 44% sofreram violência física. Além disso, identificaram que o professor sofre violência de outros, além dos alunos, como pais e colegas.

Discussão

As concepções bourdieusianas podem ser aplicadas a todas as áreas do conhecimento ao se considerar que as práticas sociais (ações, encaminhamentos e modo de ser e viver) que conduzem a vida são estruturadas e expõem características próprias da posição social de quem as produz. Em seus conceitos, na elaboração da sociologia da educação crítica, o sociólogo elenca a escola como dispositivo disponível para legitimação e manutenção de privilégios sociais3131 Bourdieu P. A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In: Nogueira MA, Catani A, organizadores. Escritos e educação. Petrópolis: Vozes; 2002. p. 39-64..

A partir dessa compreensão, no presente estudo foram formatadas três categorias centrais de violência contra o professor provocadas por alunos e 12 subcategorias que permitiram caracterizar diferentes dimensões desse fenômeno. Além disso, foram identificadas três dimensões de danos aos professores expostos a violência.

A categoria bourdieusiana habitus

Habitus, elemento gerador de práticas, é a subjetividade socializada, pois é um conjunto de comportamentos, valores, condutas, gostos e estilos de classe que vão construir tendências de comportamento3232 Bourdieu P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva; 2007.. Ou seja, o contexto social influencia e faz com que o comportamento siga padrões sociais, ainda que não se perceba, seria o “sentido prático”. Assim, vemos que o habitus é mediado entre a estrutura objetiva, ou seja, o “campo social” em que o sujeito/agente está inserido, e o subjetivo, isto é, a percepção do sujeito dentro daquele campo.

Portanto, o habitus seria como um modo de ação e de pensamento atribuído à posição que um agente ocupa dentro de um campo. O sujeito aprende as regras do jogo em campo e as internaliza em sua subjetividade. O sentido prático será a ação do agente que internalizou as regras do jogo de um determinado campo e age irrefletidamente, com as estratégias que vem incorporando e que lhe foram úteis anteriormente, o que torna seu jogo eficaz.

A violência é o lado sombrio da razão humana, que significa a instrumentalização do mundo da vida. Ela nasce com a inversão de valores, quando a dignidade humana é desrespeitada e o cidadão passa a ser tratado como meio, e não como fim em si mesmo, que ao final se naturaliza, questão de habitus88 Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2001..

O habitus do indivíduo está no tipo de educação que recebeu, influenciada pela classe social que a família ocupa, pelos habitos alimentares e culturais, bem como pelas escolhas da família para aquele individuo na infância, para a sua formação. Portanto, é um processo histórico de socialização em que há uma trajetória que a pessoa gradualmente naturaliza, assimila as estruturas sociais, os hábitos e os valores impostos pela sociedade em que vive, tornando-se uma grade de leitura onde o agente lê o mundo.

Podemos dizer de maneira mais clara que habitus é aquilo que comumente se faz de forma automática, sem precisar pensar para fazer. Simplesmente se faz daquela maneira porque é a capacidade dos sentimentos, dos pensamentos e das ações dos indivíduos de incorporar determinada estrutura social3333 Guimarães AA, Oliveira Junior CR. Pierre Bourdieu e “A economia das trocas simbólicas”. Faculdades Integradas de Itararé - FAFIT-FACIC Itararé 2014; 5(2):31-38..

Nesse contexto, foram identificados nos textos alguns tipos de violência do aluno contra o professor, que, pelas características de reprodução, compõem a categoria habitus e inclui agressões por meio de contato direto ou indireto, ofensas verbais e gestuais que representam risco de danos psicoemocionais e biológicos.

Os estudos identificaram agressão por contato indireto, coerção social2727 Álvarez-García D, Mercedes JM, Rodríguez FJ, Núñez JC. Adaptación y validación del cuestionario CUVE³ - EP para la evaluación de la violencia escolar en centros de enseñanza básica de la República Dominicana. Anales de Psicología 2015; 31(3):859-868. e agressão sem contato1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.. A agressão por contato direto incluiu violência verbal1414 Wilson CM, Douglas KS, Lyon DR. Violence against teachers: prevalence and consequences. J Interpers Violence 2011; 26(12): 2353-2371.,1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.,1717 Melanda FN, Salvagioni DAJ, Mesas AE, Gonzalez AD, Andrade SM. Recurrence of violence against teachers: two-year follow-up study. J Interpers Violence 2019; 36(17-18):NP9757-NP9776.,2626 Dzuka J, Dalbert C. Student violence against teachers: teachers’ well-being and the belief in a just world. European Psychologist 2007; 12(4):253-260.,2828 Bounds C, Jenkins LN. Teacher-directed violence and stress: the role of school setting. Contemporary School Psychology 2018; 22(4):435-442., violência física1414 Wilson CM, Douglas KS, Lyon DR. Violence against teachers: prevalence and consequences. J Interpers Violence 2011; 26(12): 2353-2371.,1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.,1717 Melanda FN, Salvagioni DAJ, Mesas AE, Gonzalez AD, Andrade SM. Recurrence of violence against teachers: two-year follow-up study. J Interpers Violence 2019; 36(17-18):NP9757-NP9776.,2626 Dzuka J, Dalbert C. Student violence against teachers: teachers’ well-being and the belief in a just world. European Psychologist 2007; 12(4):253-260.,2828 Bounds C, Jenkins LN. Teacher-directed violence and stress: the role of school setting. Contemporary School Psychology 2018; 22(4):435-442., interrupção na sala de aula2828 Bounds C, Jenkins LN. Teacher-directed violence and stress: the role of school setting. Contemporary School Psychology 2018; 22(4):435-442., agressão sem contato1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16., violência relacionada a identidade de gênero e orientação sexual2020 Reddy LA, Espelage D, McMahon SD, Anderman EM, Lane KL, Brown VE, Reynolds CR, Jones A, Kanrich J. Violence against Teachers: case studies from the APA Task Force. International Journal of School & Educational Psychology 2013; 1(4):231-245., gestos ou falas obscenas e assédio sexual1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766.,1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.,2020 Reddy LA, Espelage D, McMahon SD, Anderman EM, Lane KL, Brown VE, Reynolds CR, Jones A, Kanrich J. Violence against Teachers: case studies from the APA Task Force. International Journal of School & Educational Psychology 2013; 1(4):231-245..

A violência contra professoras foi identificada na maioria dos artigos analisados. Mostra-se aqui uma ação de não reconhecimento da “figura de autoridade” na professora, e também na “mulher” professora, como se poderia dizer, não há o peso da imagem da autoridade “masculina”. Esse fato pode estimular os alunos (meninos e meninas) a não reconhecerem essa autoridade, por serem mulheres em uma estrutura social patriarcal. Esses achados também são reafirmados por outros estudos que analisaram especificamente o “assédio por contrapoder” no ambiente acadêmico universitário3434 McKinney K. Sexual harassment of university faculty by colleagues and students. A Journal of Research 1990; 23(7):421-438.

35 Lampman C, Phelps A, Bancroft S, Beneke M. Contrapower harassment in academia: a survey of faculty experience with student incivility, bullying, and sexual attention. Sex Roles 2009; 60(5):331-346.
-3636 Taylor EA, Smith AB, Rode CR, Hardin R. Women don’t know anything about sports: contrapower harassment in the sport management classroom. Sport Management Education Journal 2017; 11(2):61-71.. A título de exemplo, na pesquisa realizada por Taylor et al66 Salvini L, Souza J, Marchi JW. A violência simbólica e a dominação masculina no campo esportivo: algumas notas e digressões teóricas. Rev Bras Educ Fís Esporte 2012; 26(3):401-410., em que foi aplicado um questionário para examinar a prevalência de “assédio por contrapoder”, respondido por 179 professoras da área de gestão esportiva (área altamente masculinizada). Os resultados mostraram que mais da metade das entrevistadas indicou que mais de 50% dos alunos as tratavam de forma diferente pelo fato de serem mulheres e que 80% delas já haviam enfrentado incidentes de falta de urbanidade e cortesia dos alunos.

Além disso, o tipo de violência que pode ser exercida contra os professores, como o assédio sexual, tem a ver com a visão da mulher como um “objeto sexual” passivo, como bem mencionado por Grauerholz3737 Grauerholz E. Sexual harassment of women professors by students: exploring the dynamics of power, authority, and gender in a university setting. Sex Roles 1989; 21(11):789-801., que pesquisou 208 professores universitários, revelando uma grande variedade de comportamentos sexistas, principalmente de estudantes do sexo masculino, que iam desde comentários a agressões sexuais.

As apreciações de Bourdieu3838 Bourdieu P. Outline of a theory of practice. Cambridge: Cambridge University Press; 1977. no que diz respeito à sociedade e ao sistema escolar e a função deste na reprodução do sistema de organização da sociedade, avançam na interdependência dos conceitos de violência simbólica, de capital cultural, social e econômico, e de habitus1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766.,3232 Bourdieu P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva; 2007..

O habitus é um sistema autorregulador de princípios implícitos e explícitos da ação, em que há incorporação das regras do jogo dentro de um determinado campo3939 Bourdieu P, Passeron JC. Reproduction in education, society and culture. Londres: Sage; 1977.. Os agentes (alunos), ao entrarem no campo, irão incorporar as competências para a atuação dentro dele de forma bem-sucedida, garantindo assim a reprodução social. Reprodução social que tem como guarda-chuva ideológico o patriarcado e que - embora no campo do ensino algumas escolas/universidades postulem a igualdade entre homens e mulheres - será também educativa na socialização primária e secundária (que ocorrerá nessas instituições), com viés de gênero. Portanto, em alunos com certo habitus, sua atuação no campo pode ser marcada pela não lembrança da “figura de autoridade pedagógica” em uma mulher.

A categoria bourdieusiana capital

O conceito de capital é um dos que mais influencia a dinâmica social. Não há apenas um capital, mas muitos que se relacionam entre si (financeiro, cultural, social etc.) O capital cultural e o capital social, ambos podem se tornar capital simbólico, de prestígio e reconhecimento.

Embora Pierre Bourdieu, ao conceituar capital, aproxime-se das concepções marxistas, no contrapeso dos fatores econômicos e culturais diverge bastante, pois no campo educacional se balizam os três capitais (econômico, social e cultural) como propriedades que determinam grande parte das diferenças entre os indivíduos13,37,40,41.

Um capital, para Bourdieu, é um objeto real ou simbólico valioso, cobiçado e apreciado, socialmente procurado. E, portanto, em torno dele será gerado uma espécie de mercado, certas instituições que o administram, e um campo em disputa (o campo onde é disputado).

Os artigos mostram que o capital simbólico em disputa no campo do ensino pode ser determinado pelos diferentes habitus dos agentes que exercem essa violência contra os professores. Por um lado, haveria a violência dos que buscam a melhoria de notas e que, portanto, buscam prestígio acadêmico. Além do prejuízo que esse fato exerce sobre o professor, o prestígio ainda pode advir, por exemplo, de mostrar superioridade em relação a outros colegas que também cometem esses delitos, e pode-se aludir a um aspecto de luta entre esses alunos. Também haveria danos a objetos pessoais que podem intimidar os professores com o intuito de obter prestígio ou reconhecimento entre os seus pares quanto ao poder que pode ser exercido em relação a um professor.

Os danos às propriedades estão relacionados a roubar dinheiro dos professores, danificar roupas2727 Álvarez-García D, Mercedes JM, Rodríguez FJ, Núñez JC. Adaptación y validación del cuestionario CUVE³ - EP para la evaluación de la violencia escolar en centros de enseñanza básica de la República Dominicana. Anales de Psicología 2015; 31(3):859-868., roubos e danos de propriedades e de bens pessoais1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766.,2727 Álvarez-García D, Mercedes JM, Rodríguez FJ, Núñez JC. Adaptación y validación del cuestionario CUVE³ - EP para la evaluación de la violencia escolar en centros de enseñanza básica de la República Dominicana. Anales de Psicología 2015; 31(3):859-868.. McMagon et al.1313 McMahon SD, Martinez A, Espelage D, Rose C, Reddy LA, Lane K, Anderman EM, Reynolds CR, Jones A, Brown V. Violence directed against teachers: results from a national survey. Psychology in the Schools 2014; 51(7):753-766. identificaram que os furtos de propriedade dos docentes têm uma prevalência de 44%, e de 42% quanto aos bens pessoais, diferentemente de Bounds e Jenkins2828 Bounds C, Jenkins LN. Teacher-directed violence and stress: the role of school setting. Contemporary School Psychology 2018; 22(4):435-442., que encontraram 22% e 18,52%, respectivamente.

A coerção social está relacionada a situações como pressionar o professor para obter melhores notas2626 Dzuka J, Dalbert C. Student violence against teachers: teachers’ well-being and the belief in a just world. European Psychologist 2007; 12(4):253-260.. Já o desprezo individual ou coletivo é representado por isolar socialmente o docente1414 Wilson CM, Douglas KS, Lyon DR. Violence against teachers: prevalence and consequences. J Interpers Violence 2011; 26(12): 2353-2371.,1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16.,1717 Melanda FN, Salvagioni DAJ, Mesas AE, Gonzalez AD, Andrade SM. Recurrence of violence against teachers: two-year follow-up study. J Interpers Violence 2019; 36(17-18):NP9757-NP9776.,2828 Bounds C, Jenkins LN. Teacher-directed violence and stress: the role of school setting. Contemporary School Psychology 2018; 22(4):435-442..

Daí surge a tarefa de resgatar a política pública, solidária e racional para dentro do espaço escolar. Todavia, isso só será possível com uma educação voltada para a cidadania e os direitos humanos, com o incremento crítico da cultura, tendo o ser humano como meta principal.

A categoria bourdieusiana campo

O campo é uma abstração que deriva de uma série de estudos bourdieusianos que se conceitua pelo conjunto de organizações de estruturas estruturantes ligadas pelos seus habitus. Podemos defini-los como espaços (culturais, religiosos, economicos, educacionais, científicos, jornalísticos etc.) dentro dos quais os agentes, tanto pessoas quanto organizações, ocupam posições que estatisticamente determinam a posição social dos agentes em relação ao campo e onde se revelam, por exemplo, as figuras de autoridade, detentoras de maior volume de capital4242 Pereira EAT. O conceito de campo de Pierre Bourdieu: possibilidade de análise para pesquisas em história da educação brasileira. Revista Linhas Florianópolis 2015; 16(32):337-356..

Dessa forma, segundo conceitos bourdieusianos3232 Bourdieu P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva; 2007., todo campo tem um habitus, mas que o indivíduo seguirá ou não de forma própria, personalíssima, pois o habitus é um processo que constitui um sistema de disposições socialmente constituidas que, enquanto estruturas estruturantes (estruturas sociais que te cercam - a sociedade, repensadas e absorvidas individualmente - habitus, feito de maneira inconsciente, sem a necessidade de um agente coordenando essas condições), constituem o princípio gerador e unificador do conjunto das práticas e ideologias características de determinado grupo de agentes (campo).

O lugar que os agentes ocupam na estrutura é que indica suas tomadas de posição. Por esse prisma, formatamos a categoria campo ao identificar nos estudos analisados que existe alta prevalência de violência contra o professor no seu ambiente de trabalho1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16., o que não deveria acontecer, já que a violência no local de trabalho não deve ser aceita2929 Al-Omari MA, Johari H, Suan Choo L. Workplace violence: a case in Malaysian higher education institute. Business Strategy Series 2012; 13(6):274-283.. É preciso que os professores sejam protegidos por seus gestores2727 Álvarez-García D, Mercedes JM, Rodríguez FJ, Núñez JC. Adaptación y validación del cuestionario CUVE³ - EP para la evaluación de la violencia escolar en centros de enseñanza básica de la República Dominicana. Anales de Psicología 2015; 31(3):859-868., até mesmo porque a violência interfere negativamente no desempenho desses profissionais, principalmente quando essa é a violência física1515 Moon B, McCluskey J. An exploratory study of violence and aggression against teachers in middle and high schools: prevalence, predictors, and negative consequences. Journal of School Violence 2018; 19(2):1-16..

Temos os seguintes agentes: alunos/professores/famílias. E à medida que se movem, lutam no campo educacional. Sendo assim, é claro que o ambiente de ensino exerce violência simbólica pelo mero fato da ação pedagógica, mas a outra violência que ocorre nesse campo, e que visa o professor, é dada por outras estruturas que evidenciam sua luta também no campo de ensino88 Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2001..

A violência no local de trabalho pode aparecer de várias maneiras4343 Nowrouzi-Kia B, Chai E, Usuba K, Nowrouzi-Kia B, Casole J. Prevalence of type ii and type iii workplace violence against physicians: a systematic review and meta-analysis. Int J Occup Environ Med 2019; 10(3):99-110. e é um fenômeno social, com 36,4% dos trabalhadores se sentindo vulneráveis4444 Ansoleaga E, Ahumada M, González-Santa CA. Association of workplace bullying and workplace vulnerability in the psychological distress of Chilean workers. Int J Environ Res Public Health 2019; 16(20):4039.. A vulnerabilidade no ambiente de trabalho acontece de forma aleatória, mas afeta grupos específicos, como aqueles com menor poder social e do gênero feminino4444 Ansoleaga E, Ahumada M, González-Santa CA. Association of workplace bullying and workplace vulnerability in the psychological distress of Chilean workers. Int J Environ Res Public Health 2019; 16(20):4039.. Os trabalhadores que se sentem vulneráveis estão mais propensos a sofrer violência física e psicológica, sendo assim, têm maiores chances de ter sofrimento psicológico4444 Ansoleaga E, Ahumada M, González-Santa CA. Association of workplace bullying and workplace vulnerability in the psychological distress of Chilean workers. Int J Environ Res Public Health 2019; 16(20):4039..

A reprodução de relações desiguais entre as classes, que contribuem com as vulnerabilidades e exacerbam violências, é algo muito presente no sistema de ensino, por ainda valorizar e socializar fatores culturais minoritários em contraponto à cultura das classes mais numerosas, segundo reflexões bourdieusianas3131 Bourdieu P. A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In: Nogueira MA, Catani A, organizadores. Escritos e educação. Petrópolis: Vozes; 2002. p. 39-64..

Os artigos evidenciaram como professores com orientação sexual e identidade de gênero específicas sofreram violência. Nesse sentido, essa violência no ensino como campo se dá pelas lutas que ocorrem tanto entre os agentes que representam os professores quanto por parte dos alunos. Aqui fica claro que o habitus dos agentes, no campo do ensino, é marcado pela estrutura social heteropatriarcal normativa, que fará com que seus agentes pautem suas ações a partir da subjetividade que se cria a partir dessas estruturas e também se transmite4545 Catalan MM. Docentes abriendo las puertas del clóset: narrativas de resistencias y apropiaciones a la heteronormatividad en profesores homosexuales/lesbianas en escuelas públicas y privadas de Santiago de Chile. Revista Latinoamericana de Educación Inclusiva 2018; 12(1):57-78..

Há violência simbólica no campo do ensino, visto que o objetivo da ação pedagógica é impor uma abordagem cultural arbitrária a partir da cultura e da classe dominantes daquela sociedade, que no caso da maioria dos artigos são as dos Estados Unidos. As imposições de fato ocorrem e são continuamente reproduzidas. Entretanto, muitas vezes ocorrem de forma velada e apoiadas em crenças e preconceitos coletivamente construídos e difundidos.

E é por esse contexto basal da violência simbólica de Bourdieu88 Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2001. que se entende que aconteça a influência e imposição cultural sobre os menos privilegiados, induzindo-os a conferir valores, pessoal e coletivo, a partir de um juízo (a)crítico próprio do discurso dominante.

Embora a família seja forte influenciadora do conjunto de crenças, práticas e comportamento assumidos e absorvidos pela socialização do indivíduo, por ele percorrer vários espaços de socialização ao longo da vida, adquire novos habitos, pensamentos e formas de agir pela convivência com outras pessoas e novos ambientes, modificando o seu habitus. Ou seja, habitus e campos de vivência andam juntos, como se fossem uma dupla. Não há como falar do habitus de uma pessoa sem falar do seu campo de atuação.

Gostaríamos de reconhecer algumas limitações do nosso estudo por não conter dados globais. Contudo, os resultados são relevantes e de interesse internacional, evidenciando a importância de reformular políticas para impedir a vitimização dos professores.

Conclusão

A violência contra o professor pode ser definida como um conjunto de ações e situações provocadas por estudantes de forma insidiosa ou crônica no local de trabalho e/ou meio digital, mediada por percepção de violência, mecanismo de enfrentamento do professor e gestão organizacional da violência. É caracterizada por ameaça, tentativa ou agressão real, incluindo fala, escrita, gestos, contato físico, coerção social, desprezo individual ou coletivo, danos a propriedades, múltiplos fatores no ambiente de trabalho, interrupção na sala de aula, conteúdos inapropriados em mídia eletrônica, violência de gênero e orientação sexual e presenciar cenas de violência.

O modelo integrado de violência contra o professor compreende antecedentes conceituais, como a experiência anterior com violência contra o docente, definição cultural de violência e percepção de vitimização. A violência propriamente dita contra o professor é um construto multidimensional que resulta da interação com o estudante no contexto organizacional e social. As consequências da violência contra o professor incluem danos psicológicos, emocionais, biológicos, profissionais e sociais.

Os resultados citados devem levar a refletir sobre a necessidade de mudança global na sociedade, que tenda à igualdade efetiva, em que homens e mulheres sejam respeitados igualmente, independentemente de origem ou procedência, orientação sexual ou identidade de gênero, já que o campo do ensino é um motor de mudança social para sociedades mais igualitárias e inclusivas.

Apesar das limitações, o estudo serve de base para pesquisas futuras, pois o fenômeno violência é fruto da sociedade. Surge do tecido sócio-econômico-político e se estrutura no indivíduo e nas instituições (escola, família, igreja, Estado etc.). A quebra emancipadora da estrutura política gera a patologia individual, a neurose. Essa situação de estrangulamento social não é espontânea, ela se ratifica no cotidiano, em forma de violência. As cidades estão, a cada instante, sendo surpreendidas por essa barbárie. Têm aumentado os casos de abuso sexual seguidos de morte, principalmente contra as mulheres.

O conjunto teórico bourdieusiano, habitus, campo e capital (social, cultural, econômico), e o poder simbólico estão implicados diretamente nos modelos de gestão e desvelam o papel que as organizações estabelecem sobre seus agentes, inclusive os governamentais, responsáveis por formulações de políticas que provocarão processos organizacionais de divisões de tarefas, de hierarquia nas relações de trabalho pelo poder e subordinação, além de exigência de padrões de desempenho.

Por esse motivo, urge pensar políticas públicas urbanas e cidadãs. As autoridades competentes com a responsabilidade de gestão pública e social têm que sair a campo para evitar que os conflitos se transformem em violência. Viver em cidade é uma questão de política pública, com definições claras por parte dos gestores da cidade. A estrutura fragilizada dos serviços de segurança põe em risco o direito fundamental do ser humano, o direito à vida. É o momento de reparar e enfrentar com urgência essa problemática do medo urbano e essa sensação de insegurança de viver na cidade.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    31 Ago 2020
  • Aceito
    15 Abr 2021
  • Publicado
    17 Abr 2021
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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