Proporção e fatores associados a Apgar menor que 7 no 5º minuto de vida: de 1999 a 2019, o que mudou?

Alessandra Lourenço Caputo Magalhães Denise Leite Maia Monteiro Alexandre José Baptista Trajano Flavio Monteiro de Souza Sobre os autores

Resumo

Apesar da variação entre observadores na avaliação do escore de Apgar, ele permanece um indicador útil das condições gerais do recém-nascido. O presente trabalho é um estudo de corte transversal baseado na população de nascidos vivos no Brasil no ano de 1999 e no biênio 2018-2019. Foram avaliadas todas as declarações de nascidos vivos (DNV) obtidas a partir do banco de dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos. As frequências foram comparadas entre os grupos por meio do teste qui-quadrado de Pearson e foi realizada análise de regressão logística multivariada. Adotou-se nível de significância estatística de 0,05. Foram analisadas 9.050.521 DNVs em nossa pesquisa. Constatamos que 2,1% dos recém-nascidos tiveram Apgar de 5º minuto < 7 em 1999, em comparação com 0,9% em 2018-2019. A análise multivariada indicou que gemelidade e gravidez na adolescência deixaram de ser fatores de risco para Apgar de 5º minuto < 7. Entre os fatores de risco, nota-se aumento da prematuridade, baixo peso ao nascer e anomalias congênitas. Observou-se melhoria de marcadores maternos, em especial o aumento do número de consultas pré-natais e escolaridade. Tais achados mostram a importância de acesso e seguimento pré-natal adequado e investimento em melhores condições socioeconômicas como estratégia eficaz para redução de morbimortalidade neonatal.

Palavras-chave:
Asfixia neonatal; Índice de Apgar; Atenção à saúde

Introdução

O Brasil ainda convive com elevadas taxas de mortalidade e morbidade perinatais. Em 2019, 35.293 crianças morreram no país antes de completar o primeiro ano de vida, sendo 69% destes óbitos no primeiro mês de vida e 52% dentro da primeira semana, correspondendo à taxa de mortalidade neonatal de 8,6 a cada 1.000 nascidos vivos11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Tabnet - demográficas e socioeconômicas. (acessado 2022 maio 10). Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sim/cnv/inf10uf.def
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
. Apesar da marcante redução de mais de 2/3 na mortalidade neonatal nos últimos 25 anos, sua monitorização continua sendo prioridade nacional.

Ao contrário de países desenvolvidos, como Estados Unidos e Reino Unido, onde a principal causa isolada de morte no período neonatal é a malformação congênita22 Lehtonen L, Gimeno A, Parra-Llorca A, Vento M. Early neonatal death: a challenge worldwide. Semin Fetal Neonatal Med 2017; 22(3):153-160., no Brasil a maioria dos óbitos perinatais é determinada pelas condições da gestante e pelas características da assistência ao parto e ao recém-nascido33 Almeida MFB, Kawakami MD, Moreira LMO, Santos RMV, Anchieta LM, Guinsburg R. Early neonatal deaths associated with perinatal asphyxia in infants = 2,500g in Brazil. J Pediatr 2017;93(6):576-584..

O escore de Apgar é um método rápido de avaliação das condições clínicas do recém-nascido. O sistema propõe uma pontuação que varia de 0 a 10 e corresponde ao somatório dos pontos obtidos pela avaliação de cinco critérios: frequência cardíaca, respiração, tônus muscular, irritabilidade reflexa e cor44 Apgar V. A proposal for a new method of evaluation of the newborn infant. Curr Res Anesth Analg 1953; 32(4):260-267.. A facilidade de aplicação desse índice fez com que fosse usado em grande quantidade de estudos de resultados perinatais55 Garcia LP, Fernandes CM, Traebert J. Risk factors for neonatal death in the capital city with the lowest infant mortality rate in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2019; 95(2):194-200.

6 Li F, Wu T, Lei X, Zhang H, Mao M, Zhang J. The Apgar score and infant mortality. PLoS One 2013; 8(7):e69072.

7 Lie KK, Groholt EK, Eskild A. Association of cerebral palsy with Apgar score in low and normal birthweight infants: population-based cohort study. BMJ 2010; 341(6):c4990.

8 Herrera CA, Silver RM. Perinatal asphyxia from the obstetric standpoint: diagnosis and interventions. Clin Perinatol 2016; 43(3):423-438.

9 Li C, Miao JK, Xu Y, Hua YY, Ma Q, Zhou LL, Liu HJ, Chen QX. Prenatal, perinatal and neonatal risk factors for perinatal arterial ischaemic stroke: a systematic review and meta-analysis. Eur J Neurol 2017; 24(8):1006-1015.

10 Casey BM, McIntire DD, Leveno KJ. The continuing value of the Apgar score for the assessment of newborn infants. N Engl J Med 2001; 344(7):467-471.
-1111 Park JH, Chang YS, Ahn SY, Sung SI, Park WS. Predicting mortality in extremely low birth weight infants: comparison between gestational age, birth weight, Apgar score, CRIB II score, initial and lowest sérum albumin levels. PLoS One 2018; 13(2):e0192232.. Sabe-se que o índice de Apgar inferior a 7 no 5° minuto de vida (Ap5 < 7) é empregado para avaliar o estado do recém-nascido e indica a maior possibilidade de uso de recursos especializados. Estudos recentes têm reforçado seu valor como ferramenta prognóstica na identificação de crianças em risco1212 Moster D, Lie RT, Irgens LM, Bjerkedal T, Markestad T. The association of Apgar score with subsequent death and cerebral palsy: a population based study in term infants. J Pediatr 2001; 138(6):798-803.,1313 Thorngren-Jerneck K, Herbst A. Low 5-minute Apgar score: a population based register study of 1 million term births. Obstet Gynecol 2001; 98(1):65-70., e em pesquisas de base populacional, a avaliação do índice de Apgar no 5° minuto é o mais próximo que podemos chegar da investigação sobre as condições de nascimento1313 Thorngren-Jerneck K, Herbst A. Low 5-minute Apgar score: a population based register study of 1 million term births. Obstet Gynecol 2001; 98(1):65-70.,1414 Woday A, Muluneh A, St Denis C. Birth asphyxia and its associated factors among newborns in public hospital, northeast Amhara, Ethiopia. PLoS One 2019; 14(12):e0226891..

Desde a implantação do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) pelo Ministério da Saúde em 1994, vários trabalhos descreveram as características dos recém-nascidos55 Garcia LP, Fernandes CM, Traebert J. Risk factors for neonatal death in the capital city with the lowest infant mortality rate in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2019; 95(2):194-200.,1515 Mello Jorge MHP, Gotlieb SLD. O sistema de informação de atenção básica como fonte de dados para os sistemas de informações sobre mortalidade e sobre nascidos vivos. Info Epidemiol SUS 2001; 10(1):7-18.,1616 Rodrigues CS, Magalhães Junior HM, Evangelista PA, Ladeira RM, Laudares S. Perfil dos nascidos vivos no município de Belo Horizonte, 1992-1994. Cad Saude Publica 2002; 13(1):53-57.. Essas pesquisas vêm contribuindo para o entendimento a respeito da mortalidade perinatal, infantil e sobre o perfil dos nascidos vivos nos locais onde são produzidos. Este trabalho avalia os fatores predisponentes do Ap5 < 7 no Brasil como marcadores de prognóstico neonatal e a mudança em seus índices nos últimos 20 anos. O presente estudo, por analisar a evolução ao longo do tempo, pode auxiliar na proposta de estratégias que visem melhorar a saúde perinatal.

Método

Trata-se de um estudo de corte transversal baseado na população de nascidos vivos do Brasil no ano de 1999 e no biênio de 2018-2019. Foram avaliadas todas as declarações de nascidos vivos (DNV) que foram obtidas a partir do banco de dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC, 2017), por meio do servidor do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) do Ministério da Saúde do Brasil.

Escolheu-se o biênio 2018-2019 em comparação com o ano de 1999, visando obter uma imagem das mudanças ocorridas em 20 anos, sendo o ano de 2019 o último disponível no SINASC durante a pesquisa.

Estão disponíveis no SINASC 27 bancos de dados, correspondentes a cada uma das unidades da federação, que foram por nós agrupados em um único arquivo contendo os registros de todo o país.

Critérios de inclusão e exclusão

Foram consideradas todas as DNVs referentes ao período de estudo e excluídas aquelas com as seguintes características: índice de Apgar no 5° minuto não preenchido, índice de Apgar igual a 0 no 5° minuto de vida quando associado a índice de Apgar igual a 0 no 1° minuto; idade gestacional inferior a 22 semanas, peso fetal inferior a 500g ou peso fetal não preenchido.

Além dessas exclusões gerais, no estudo de variáveis específicas foi excluída da análise dessa variável a DNV em que o preenchimento não ocorreu ou estivesse registrado como ignorado.

Análise dos dados

Para a análise estatística, empregou-se o software Statistical Package for Social Science (SPSS para Mac, versão 27). Considerou-se o nível de significância estatística de 0,05. Inicialmente, foram calculadas as frequências dos fatores estudados, as razões de chance (RC) e os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%), avaliando a associação entre as variáveis por meio de análise bivariada. As frequências foram comparadas entre os grupos por meio do teste qui-quadrado de Pearson.

Na investigação da relação entre o desfecho desfavorável (Ap5 < 7) e as demais variáveis, realizou-se análise multivariada de regressão logística. Permaneceram no modelo final os fatores com nível de significância superior a 95%.

Questões éticas relacionadas ao projeto

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Pedro Ernesto, sob o registro CAAE 07660818.6.0000.5259.

Resultados

Em 1999, foram registrados 3.256.443 DNVs, e no biênio 2018-2019, 5.794.078, totalizando 9.050.521 DNVs. Depois de aplicados os critérios de exclusão para o ano de 1999, houve redução de 13,8%, totalizando 2.808.341 registros. Nos anos de 2018 e 2019, a redução do número de casos foi de 2,0%, passando para 5.680.092.

Verificamos que 58.961 recém-nascidos apresentaram Ap5 < 7 (2,1%) em 1999. No biênio 2018-2019, tal prevalência caiu para 0,9%, correspondendo a 52.731 casos.

A comparação entre os dois períodos estudados demonstra aumento da chance de nascimento prematuro, de baixo peso ao nascer, de raça negra e com anomalias congênitas no biênio 2018-2019. Inversamente, houve menor probabilidade de nascimento após 42 semanas e com peso maior que 4.000g no biênio 2018-2019. Os dados encontram-se na Tabela 1.

Tabela 1
Análise bivariada da distribuição dos nascidos vivos segundo as variáveis referentes aos recém-nascidos depois de aplicados os critérios de exclusão.

Em relação às variáveis maternas, no biênio 2018-2019 observou-se aumento da idade materna na comparação com 1999, com menor probabilidade de nascimentos entre as adolescentes e maior probabilidade após os 34 anos de idade. Há também melhora na cobertura pré-natal, com menos mulheres sem nenhuma consulta e mais gestantes com sete ou mais consultas pré-natais. O número de mulheres com oito ou mais anos de estudo aumentou e reduziu-se o número de mulheres sem estudo na comparação entre os períodos. Observa-se também maior número de mulheres que não viviam maritalmente, que não tiveram filhos vivos anteriormente, assim como maior número de perdas fetais ou abortamentos prévios em 2018-2019. Os dados referentes às variáveis maternas estão apresentados na Tabela 2.

Tabela 2
Análise bivariada da distribuição dos nascidos vivos segundo as variáveis referentes às mães depois de aplicados os critérios de exclusão.

Com relação às variáveis referentes à gravidez e ao parto, observa-se maior chance de gestação gemelar e aumento de quase 70% na frequência de cesariana no biênio 2018-2019. Foi também mais frequente o parto domiciliar neste biênio e, inversamente, menos frequente o número de partos em estabelecimentos de saúde não hospitalares. Na distribuição dos partos de acordo com as regiões do país, observa-se aumento nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e diminuição na região Sul. A Tabela 3 lista os dados encontrados.

Tabela 3
Análise bivariada da distribuição dos nascidos vivos segundo as variáveis referentes à gravidez e ao parto depois de aplicados os critérios de exclusão.

A análise multivariada evidenciou que os fatores de risco para asfixia perinatal foram praticamente os mesmos nos dois períodos. Prematuridade, baixo peso ao nascimento e presença de anomalias congênitas continuaram sendo os fatores de risco com maior impacto sobre o Ap5 < 7. Embora com menor impacto, idade gestacional igual ou superior a 42 semanas, macrossomia, raça negra e recém-nascido do sexo masculino são variáveis que também apresentaram risco aumentado para Ap5 < 7.

Entre as variáveis maternas, a análise multivariada indicou maior risco de Ap5 < 7 nas gestantes com 35 anos ou mais, nas que nunca estudaram ou que têm menos de oito anos de estudo, nas solteiras, nas com menos de seis consultas pré-natais e nas que já tiveram uma ou mais perdas gestacionais prévias. O nascimento anterior de um ou mais filhos vivos permaneceu como fator de proteção para Ap5 < 7. A adolescência se apresentava como fator de risco em 1999, entretanto, no biênio 2018-2019, o fato de a mãe ser adolescente não configura risco para Ap5 < 7.

Ainda na análise multivariada, com relação às variáveis da gestação e do parto, observa-se mudança do cenário ao longo do período estudado. A gemelidade, mostra menor associação com Ap5 < 7 no biênio 2018-2019. O parto vaginal, que conferia proteção em 1999, passou a se configurar como fator de risco no mesmo biênio. O parto domiciliar deixa de configurar fator de risco no biênio estudado, permanecendo como risco apenas o nascimento em estabelecimentos de saúde não hospitalares. O nascimento na região Norte deixa de se apresentar como fator de risco e, inversamente, na região Sul passa de fator de proteção para fator de risco. A Tabela 4 mostra os dados encontrados.

Tabela 4
Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 no Brasil - análise multivariada.

Discussão

Parto e nascimento são eventos transformadores e, na maioria das vezes, não apresentam riscos elevados. Entretanto, em uma parcela dos casos, observa-se desfechos neonatais desfavoráveis, com impacto na mortalidade e na morbidade neonatal. Estudo realizado no estado de São Paulo identificou que metade dos óbitos infantis ocorre no período neonatal precoce (até o sexto dia de vida), sendo a asfixia responsável por 17,4% desses óbitos1717 Areco KCN, Konstantyner T, Taddei JAAC. Tendência secular da mortalidade infantil, componentes etários e evitabilidade no Estado de São Paulo - 1996 a 2012. Rev Paul Pediatr 2016; 34(3):263-270.. Além do aumento da mortalidade, a asfixia perinatal também se associa ao aumento da morbidade neonatal, tendo sido o fator de risco mais consistentemente associado à paralisia cerebral1818 Mcintyre S, Taitz D, Keogh J, Goldsmith S, Badawi N, Blair E. A systematic review of risk factors for cerebral palsy in children born at term in developed countries. Dev Med Child Neurol 2013; 55(6):499-508..

O escore de Apgar é um sistema mundialmente reconhecido e permanece até os dias atuais como ferramenta de avaliação prognóstica neonatal importante, e apesar de isoladamente não predizer desfechos a longo prazo, seu valor abaixo de 7 no 5º minuto de vida está fortemente relacionado a aumento da mortalidade na primeira semana de vida do recém-nascido devido a asfixia perinatal e a aumento do risco de paralisia cerebral1010 Casey BM, McIntire DD, Leveno KJ. The continuing value of the Apgar score for the assessment of newborn infants. N Engl J Med 2001; 344(7):467-471.,1212 Moster D, Lie RT, Irgens LM, Bjerkedal T, Markestad T. The association of Apgar score with subsequent death and cerebral palsy: a population based study in term infants. J Pediatr 2001; 138(6):798-803.,1919 Varela AR, Schneider BC, Bubach S, Silveira MF, Bertoldi AD, Duarte LSM, Menezes AMB, Domingues MR, Bassani DG. Fetal, neonatal, and post-neonatal mortality in the 2015 Pelotas (Brazil) birth cohort and associated factors. Cad Saude Publica 2019; 35(7):e00072918.

20 Iliodromiti S, Mackay DF, Smith GCS, Pell JP, Nelson SM. Apgar score and the risk of cause-specific infant mortality: a population-based cohort study. Lancet 2014: 385(9956):1749-55.

21 Persson M, Razaz N, Tedroff K, Joseph KS, Cnattingius S. Five and 10 minute Apgar scores and risks of cerebral palsy and epilepsy: a population based cohort study in Sweden. BMJ 2018; 360:k207.
-2222 Razaz N, Cnattingius S, Joseph KS. Association between Apgar scores of 7 to 9 and neonatal mortality and morbidity: population based cohort study of term infants in Sweden. BMJ 2019; 365:l1656..

Os dados do nosso trabalho demonstram queda progressiva ao longo de 20 anos no Ap5 < 7, com redução de 57,2% entre 1999 e 2019. A partir dessa informação, buscou-se estudar quais mudanças ocorreram nos fatores de risco para Ap5 < 7 que possam ter impactado em tão significativa redução. Observou-se não ter havido queda significativa em diversos fatores de risco conhecidamente relacionados. Alguns, ao contrário, mostraram aumento significativo na probabilidade de ocorrência, tais como gemelidade, prematuridade, baixo peso ao nascer e anomalias congênitas.

Como ponto positivo, a análise também mostra que o número de casos excluídos caiu de 13,8% para 2%, indicando melhor qualidade dos dados apresentados nas DNVs.

A observação das variáveis relacionadas ao feto mostra aumento da ocorrência de baixo peso ao nascer, prematuridade e presença de anomalias congênitas, assim como diminuição no risco de partos após 42 semanas e de fetos macrossômicos. A adoção de novos protocolos, a maior disponibilidade de métodos diagnósticos de avaliação de bem-estar fetal e o aumento da disponibilidade e de recursos nas unidades neonatais têm permitido maior número de diagnósticos e intervenções mais oportunas nessas gestações. Como exemplo, podemos citar a antecipação do parto na restrição intrauterina de crescimento e a proposta de intervenção eletiva após 41 semanas de gravidez, sendo a primeira responsável por aumento dos nascimentos prematuros e com baixo peso e a segunda pela diminuição dos nascimentos após 42 semanas e com peso acima de 4.000g. Além disso, o aumento da idade materna também pode ter impactado, visto que quanto maior a faixa etária maior a possibilidade de ocorrência de complicações clínicas e obstétricas, que por sua vez aumentam o risco de ocorrência de baixo peso no nascimento e prematuridade. O aumento da ocorrência de anomalias congênitas pode estar relacionado a esse aumento da idade materna, bem como ao maior número de diagnóstico delas.

Avaliando-se as variáveis relacionadas às mulheres, observa-se aumento da idade materna no biênio 2018-2019, com maior número de gestantes acima de 34 anos e menor número de adolescentes. Neste aspecto, é importante notar que a adolescência deixa de se configurar como fator de risco nesse biênio, mantendo-se a idade materna maior que 34 anos como de risco aumentado para o desfecho. O aumento de risco ocasionado pela maior idade materna está relacionado à maior probabilidade de intercorrências clínicas e obstétricas maternas, assim como de complicações fetais como aneuploidia e restrição de crescimento2323 Abdo RA, Halil HM, Kebede BA, Anshebo AA, Gejo NG. Prevalence and contributing factors of birth asphyxia among the neonates delivered at Nigist Eleni Mohammed memorial teaching hospital, Southern Ethiopia: a cross-sectional study. BMC Preg Childbirth 2019; 19(1):536.

24 Laopaiboon M, Lumbiganon P, Intarut N, Mori R, Ganchimeg T, Vogel JP, Souza JP, Gülmezoglu AM, WHO Multicountry Survey on Maternal Newborn Health Research Network. Advanced maternal age and pregnancy outcomes: a multicountry assessment. BJOG 2014; 121(Suppl. 1):49-56.
-2525 Almeida NK, Almeida RM, Pedreira CE. Adverse perinatal outcomes for advanced maternal age: a cross-sectional study of Brazilian births. J Pediatr 2015; 91(5):493-498.. Adolescentes na grande maioria das vezes são saudáveis e ativas, sendo questão central na gravidez nessa faixa etária a adesão ao pré-natal e a conciliação com os estudos e as atividades diárias. A maior disponibilidade de informação, orientação adequada e acesso ao sistema de saúde proporciona melhor acompanhamento pré-natal dessas jovens, o que impacta positivamente na melhoria dos desfechos2626 Monteiro DLM, Miranda FRD, Lacerda IMS, Taquette SR, Ramos JAS, Souza FM et al. Increase in fertility rate before the age of 14 in Brazil from 1996 to 2018. Rev Assoc Med Bras 2021; 67(11):1712-1718..

Com relação às variáveis referentes à gravidez e ao parto, houve queda no número de partos vaginais, passando de 60,8% em 1999 para 43,3% no biênio 2018-2019, com consequente aumento do número de cesarianas. Observou-se também que a quase totalidade de partos (98,3% em 1999 e 99,1% em 2018-2019) foi realizada em ambiente hospitalar, a despeito do aumento da probabilidade de partos domiciliares nesse biênio. Há relatos na literatura que indicam que o parto domiciliar está associado ao aumento de 11 vezes no risco de Apgar < 6 no 5º minuto, assim como a menor taxa de recuperação do escore de Apgar baixo do 1º ao 5º minuto, indicando maior risco nesses recém nascidos2727 Bessa JF, Bonatto N. Apagar scoring system in Brazil's live birth records: diferences between home and hospital births. Rev Bras Ginecol Obstet 2019; 41(2):76-83., o que não foi verificado no presente estudo. Uma possível explicação para essa observação é a maior seleção dos casos, com o parto domiciliar ocorrendo em casos selecionados de baixo risco, o que possivelmente não ocorria há 20 anos, quando o parto em domicílio era um evento emergencial e acidental.

O parto vaginal, por sua vez, que era fator de proteção na análise multivariada de 1999, configura-se como fator de risco nos anos de 2018 e 2019, fato que se relaciona possivelmente com a qualidade da assistência, já que, com a “cultura da cesariana”, observamos negligência na assistência adequada ao trabalho de parto. Zaiden et al. (2020) mostram que, em regiões fora das capitais, em hospitais mistos, de menor complexidade e com menos de 1.500 partos ao ano, a probabilidade de uma gestante ser submetida a cesariana eletiva é maior2828 Zaiden L, Nakamura-Pereira M, Gomes MAM, Esteves-Pereira AP, Leal MC. Influence of hospital characteristics on the performance of elective cesareans in Southeast Brazil. Cad Saude Publica 2020; 36(1):e00218218.. Essa informação reforça a percepção de que o treinamento para a assistência adequada ao parto vem sendo negligenciado; em outras palavras, “desaprendemos” a arte de partejar. O aumento nas taxas de cesariana reúne elementos de ordem social e cultural importantes, como a percepção por parte de muitas mulheres de ser um procedimento praticamente livre de riscos2929 Mylonas I, Friese K. Indications for and risks of elective cesarean section. Dtsch Arztebl Int 2015; 112(29-30):489-495.,3030 Domingues RMSM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Torres JA, d'Orsi E, Pereira APE, Schilithz AOC, Leal MC. Processo f decision making regarding the mode of birth in Brazil: from the initial preference of women to the final mode of birth. Cad Saude Publica 2014; 30(Suppl. 1):S101-S116.. O estímulo ao parto vaginal deve ser meta de mudança a ser implementada, visto ser essa via de parto comprovadamente de menor risco materno e fetal2121 Persson M, Razaz N, Tedroff K, Joseph KS, Cnattingius S. Five and 10 minute Apgar scores and risks of cerebral palsy and epilepsy: a population based cohort study in Sweden. BMJ 2018; 360:k207.,2222 Razaz N, Cnattingius S, Joseph KS. Association between Apgar scores of 7 to 9 and neonatal mortality and morbidity: population based cohort study of term infants in Sweden. BMJ 2019; 365:l1656.. Entretanto, observa-se com frequência o acompanhamento inadequado do trabalho de parto, seja por negligência ou imperícia, o que impacta diretamente no cuidado e no resultado neonatal.

A mudança de perfil de risco entre as regiões do país, com o nascimento na região Sul do país passando a se configurar como fator de risco e o nascimento na região Norte deixando de se mostrar dessa forma, associada a uma maior taxa de nascimentos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, também foi observada. Tal fato pode ser secundário em relação à migração interna vivenciada no país e à melhora da assistência nas regiões Norte e Nordeste ao longo desses 20 anos.

A gemelidade, reconhecido fator de risco, configurou-se como fator de proteção no biênio 2018-2019, o que pode ser resultado da melhoria dos cuidados para esses casos, com referenciamento adequado para centros especializados.

A avaliação de variáveis relacionadas à gestante, em especial aquelas que dizem respeito a condições socioeconômicas, demonstra melhora. Notou-se aumento na escolaridade das mulheres, subindo de 33,7% para 83,4% o percentual de mães com oito anos ou mais de escolaridade, assim como uma queda de 4,9% para 0,3% de mães que nunca estudaram. O grau de escolaridade materno é fortemente associado a maiores taxas de Ap5 < 73131 Anggondowati T, El-Mohandes AA, Qomariyah SN, Kiely M, Ryon JJ, Gipson RF, Zinner B, Achadi A, Wright LL. Maternal characteristics and obstetrical complications impact neonatal outcomes in Indonesia: a prospective study. BMC Preg Childbirth 2017; 17(1):100.

32 Tasew H, Zemicheal M, Teklay G, Mariye T, Ayele E. Risk factors of birth asphyxia among newborns in public hospitals of central zone, Tigray, Ethiopia 2018. BMC Res Notes 2018; 11(1):496.
-3333 Opitasari C, Andayasari L. Maternal education, prematurity and the risk of birth asphyxia in selected hospitals in Jakarta. Health Sci J Indones 2015; 6(2):111-115.. A avaliação do impacto dessa mudança de perfil é extremamente importante, visto que tanto escolaridade como número de consultas pré-natais se configuram como fatores de proteção segundo nosso trabalho.

Diversos aspectos de melhora citados têm em comum a relação com a assistência pré-natal. O adequado referenciamento para centros especializados, possibilitaria a adoção de protocolos de assistência bem estabelecidos, assim como o encaminhamento para maternidades de referência favorece o cuidado mais atento ao longo da gravidez, podendo reduzir os riscos de desfechos neonatais adversos3131 Anggondowati T, El-Mohandes AA, Qomariyah SN, Kiely M, Ryon JJ, Gipson RF, Zinner B, Achadi A, Wright LL. Maternal characteristics and obstetrical complications impact neonatal outcomes in Indonesia: a prospective study. BMC Preg Childbirth 2017; 17(1):100.. Houve, de fato, melhora da cobertura pré-natal, com aumento no número de gestantes com sete ou mais consultas e apenas 1,5% de mulheres sem esse tipo de atendimento.

A melhor qualidade das consultas de pré-natal e do atendimento à gestante no parto e ao recém-nascido interferem diretamente na mortalidade neonatal3434 Lansky S, Friche AA, Silva AA, Campos D, Bittencourt SD, Carvalho ML, Frias PG, Cavalcante RS, Cunha AJLA. Pesquisa nascer no Brasil: perfil da mortalidade neonatal e avaliação da assistência à gestante e ao recém-nascido. Cad Saude Publica 2014; 30(Suppl. 1):S192-S207.

35 Hofmeyr GJ, Hodnett ED. Antenatal care packages with reduced visits and perinatal mortality: a secondary analysis of the WHO antenatal care trial. Reprod Health 2013; 10:20.
-3636 Wondemagegn AT, Alebel A, Tesema C, Abie W. The effect of antenatal care follow-up on neonatal health outcomes: a systematic review and meta-analysis. Public Health Rev 2018; 39:33.. Óbitos de recém-nascidos a termo por asfixia intraparto apontam para a qualidade inadequada da atenção pré-natal e hospitalar, uma vez que esses óbitos seriam evitáveis pela melhoria dessa mesma atenção. A redução da taxa de mortalidade infantil observada no estado de São Paulo no período de 1996 a 2012 ocorreu principalmente no período neonatal precoce e, em especial, no grupo de causas evitáveis1717 Areco KCN, Konstantyner T, Taddei JAAC. Tendência secular da mortalidade infantil, componentes etários e evitabilidade no Estado de São Paulo - 1996 a 2012. Rev Paul Pediatr 2016; 34(3):263-270.. Da mesma forma, estudo no Rio Grande do Sul enfatiza a importância de acesso adequado e de qualidade ao pré-natal como responsável para melhoria dos desfechos neonatais1919 Varela AR, Schneider BC, Bubach S, Silveira MF, Bertoldi AD, Duarte LSM, Menezes AMB, Domingues MR, Bassani DG. Fetal, neonatal, and post-neonatal mortality in the 2015 Pelotas (Brazil) birth cohort and associated factors. Cad Saude Publica 2019; 35(7):e00072918..

Desfechos favoráveis na assistência ao parto dependem de rede hospitalar adequada, com recursos humanos e estrutura apropriada para o cuidado. Estudo de Bittencourt et al. avaliou que apenas 34% dos hospitais foram considerados adequados, com estrutura de suporte e profissionais apropriados para atendimento ao perfil proposto3737 Bittencourt SDA, Domingues RMSM, Reis LGC, Ramos MM, Leal MC. Adequacy of public maternal care services in Brazil. Reprod Health 2016; 13(Suppl. 1):120.. Tal disparidade é ainda mais acentuada nas regiões Norte e Nordeste e em locais distantes das capitais, onde mais da metade das gestantes consideradas de alto risco foi atendida em hospitais onde não havia disponibilidade de cuidados especializados e UTI3737 Bittencourt SDA, Domingues RMSM, Reis LGC, Ramos MM, Leal MC. Adequacy of public maternal care services in Brazil. Reprod Health 2016; 13(Suppl. 1):120..

A pesquisa “Nascer no Brasil: pesquisa nacional sobre parto e nascimento” evidenciou que apenas 59% das mulheres foram devidamente orientadas sobre a maternidade de referência e que quase um quinto delas procurou mais de um serviço para admissão durante o trabalho de parto, sendo tal peregrinação associada a aumento do risco de óbito e outras complicações neonatais3131 Anggondowati T, El-Mohandes AA, Qomariyah SN, Kiely M, Ryon JJ, Gipson RF, Zinner B, Achadi A, Wright LL. Maternal characteristics and obstetrical complications impact neonatal outcomes in Indonesia: a prospective study. BMC Preg Childbirth 2017; 17(1):100.,3838 Carmo Leal M, da Silva AA, Dias MA, da Gama SG, Rattner D, Moreira ME, Filha MM, Domingues RM, Pereira AP, Torres JA, Bittencourt SD, D'orsi E, Cunha AJ, Leite AJ, Cavalcante RS, Lansky S, Diniz CS, Szwarcwald CL. Birth in Brazil: national survey into labor and birth. Reprod Health 2012; 9:15.. Problemas de adequação da assistência pré-natal têm sido relatados por diversos estudos de âmbito local e nacional3939 Leal MC, Gama SGN, Pereira APE, Pacheco VE, Carmo CN, Santos RV. A cor da dor: iniquidades raciais na atenção pré-natal e ao parto no Brasil. Cad Saude Publica 2017; 33(Suppl. 1):e00078816.,4040 Martinelli KG, Santos Neto ET, Gama SGN, Oliveira AE. Access to prenatal care: inequalities in a region with high maternal mortality in southeastern Brazil. Cien Saude Colet 2016; 21(5):1647-1657.. Domingues et al. identificaram um gradiente crescente de adequação do pré-natal com o aumento dos anos de estudo e da classe econômica, sendo duas vezes superior naquelas pertencentes às classes econômicas A ou B e naquelas com 12 anos ou mais de escolaridade4141 Domingues RMSM, Viellas EF, Dias MAB, Torres JA, Theme-Filha MM, Gama SGN, Leal MC. Adequação da assistência pré-natal segundo as características maternas no Brasil. Rev Panam Salud Publica. 2015; 37(3):140-147.. Esses problemas podem estar reduzindo a efetividade do cuidado pré-natal para a prevenção de desfechos perinatais negativos.

O pré-natal é uma oportunidade ímpar para várias intervenções preventivas na saúde materno-fetal. Além do rastreio e tratamento de intercorrências clínico e obstétricas, é ótimo momento para abordagem de variados temas e orientações, tais como alimentação e comportamentos saudáveis, preparação e estímulo para o parto e aleitamento e orientação de sinais de alerta. Uma gestante mais bem orientada e esclarecida indubitavelmente terá mais ferramentas para buscar auxílio em situações desfavoráveis, repercutindo de maneira direta em melhores resultados maternos e fetais3131 Anggondowati T, El-Mohandes AA, Qomariyah SN, Kiely M, Ryon JJ, Gipson RF, Zinner B, Achadi A, Wright LL. Maternal characteristics and obstetrical complications impact neonatal outcomes in Indonesia: a prospective study. BMC Preg Childbirth 2017; 17(1):100.,4242 World Health Organization (WHO). WHO recommendations on antenatal care for a positive pregnancy experience. Geneva: WHO; 2016.,4343 Ministério da Saúde (MS). Programa de humanização do parto: humanização no pré-natal e nascimento. Brasília: MS; 2002.. Assim, a melhora dos índices de escolaridade e o aumento do número de consultas de pré-natal (marcador indireto da qualidade do pré-natal) podem favorecer a redução do Ap5 < 7.

Leal et al. mostraram haver gradiente de melhora de cuidados na atenção pré-natal e ao parto entre pretas, pardas e brancas que permaneceu após controle de variáveis socioeconômicas, resultando em benefícios e oportunidades diferenciadas segundo a raça, com prejuízo para as de cor mais escura1919 Varela AR, Schneider BC, Bubach S, Silveira MF, Bertoldi AD, Duarte LSM, Menezes AMB, Domingues MR, Bassani DG. Fetal, neonatal, and post-neonatal mortality in the 2015 Pelotas (Brazil) birth cohort and associated factors. Cad Saude Publica 2019; 35(7):e00072918.,3939 Leal MC, Gama SGN, Pereira APE, Pacheco VE, Carmo CN, Santos RV. A cor da dor: iniquidades raciais na atenção pré-natal e ao parto no Brasil. Cad Saude Publica 2017; 33(Suppl. 1):e00078816.. Nosso trabalho corrobora estas observações, demonstrando maior risco de Ap5 < 7 entre negras. Neste grupo de mulheres, que engloba as pretas e pardas, evidencia-se que, mesmo após controle de outras variáveis, a cor da pele permanece como fator de risco em comparação com as mulheres brancas. Além disso, demonstra um aumento de risco entre populações amarelas e indígenas, enfatizando esse gradiente de cuidados com populações menos favorecidas. A DNV é preenchida por meio da autodeclaração de cor, e nota-se expressivo aumento de declaração de raças não brancas no período, o que nos sinaliza para uma mudança cultural importante, reconhecendo nossas raízes miscigenadas. Apesar disso, as disparidades raciais no processo de atenção à gestante a ao parto permanecem contribuindo para as disparidades nos indicadores finais de saúde, sendo este apenas mais um exemplo da importância da análise de marcadores individuais das gestantes e do impacto que ainda hoje tem a cor da pele sobre a saúde materna e perinatal.

Entre as limitações do presente estudo, citamos a baixa sensibilidade do índice de Apgar como marcador de prognóstico neonatal; entretanto, a despeito das críticas, ele continua sendo utilizado na prática clínica e, em um estudo de base populacional com mais de 9 milhões de casos, configura-se como o marcador mais próximo que podemos chegar da investigação de prognóstico neonatal1313 Thorngren-Jerneck K, Herbst A. Low 5-minute Apgar score: a population based register study of 1 million term births. Obstet Gynecol 2001; 98(1):65-70.,2222 Razaz N, Cnattingius S, Joseph KS. Association between Apgar scores of 7 to 9 and neonatal mortality and morbidity: population based cohort study of term infants in Sweden. BMJ 2019; 365:l1656.,4444 Siddiqui A, Cuttini M, Wood R, Velebil P, Delnord M, Zile I, Barros H, Gissler M, Hindori-Mohangoo AD, Blondel B, Zeitlin J, Euro-Peristat Scientific Committee. Can the Apgar score be used for international comparisons of newborn health? Paediatr Perinat Epidemiol 2017; 31(4):338-345.,4545 Bovbjerg ML, Dissanayake MV, Cheyney M, Brown J, Snowden JM. Utility of the 5-minute Apgar score as a research endpoint. Am J Epidemiol 2019; 188(9):1695-1704.. Além disso, faltam informações sobre as causas de prematuridade, muitas das quais associadas a gestações após os 35 anos e a nascimento por parto cesariano, prejudicando a análise sobre a influência da via de parto no Ap5 < 7.

Como ponto forte, ressaltamos o tamanho da base de dados com o levantamento e a análise primária de 9.050.521 declarações de nascidos vivos, tendo sido incluídos todos os nascimentos elegíveis no Brasil nos períodos estudados, evitando viés de seleção. Mais ainda, por meio da análise multivariada, foi possível o ajuste de diversos fatores de confundimento. A avaliação de número tão expressivo de casos permite observar as mudanças que ocorreram nos fatores de risco e no perfil epidemiológico das pacientes, sinalizando assim para áreas onde maior investimento e atenção aprimorariam ainda mais os resultados.

Conclusão

Este estudo mostrou diminuição na incidência de Ap5 < 7. A análise multivariada indicou que gemelidade e gravidez na adolescência deixaram de constituir fatores de risco para Ap5 < 7.

Entre os fatores de risco para esse marcador de avaliação neonatal, observamos aumento de prematuridade, baixo peso ao nascer e anomalias congênitas. Observou-se expressiva melhoria de marcadores maternos, em especial o aumento do número de consultas pré-natais e da escolaridade. Tais achados demonstram a importância de intervenções durante a gestação, tais como acesso e seguimento pré-natal adequado e investimento na melhoria das condições socioeconômicas da população como estratégia eficaz para redução de morbimortalidade neonatal.

Referências

  • 1
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Tabnet - demográficas e socioeconômicas. (acessado 2022 maio 10). Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sim/cnv/inf10uf.def
    » http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sim/cnv/inf10uf.def
  • 2
    Lehtonen L, Gimeno A, Parra-Llorca A, Vento M. Early neonatal death: a challenge worldwide. Semin Fetal Neonatal Med 2017; 22(3):153-160.
  • 3
    Almeida MFB, Kawakami MD, Moreira LMO, Santos RMV, Anchieta LM, Guinsburg R. Early neonatal deaths associated with perinatal asphyxia in infants = 2,500g in Brazil. J Pediatr 2017;93(6):576-584.
  • 4
    Apgar V. A proposal for a new method of evaluation of the newborn infant. Curr Res Anesth Analg 1953; 32(4):260-267.
  • 5
    Garcia LP, Fernandes CM, Traebert J. Risk factors for neonatal death in the capital city with the lowest infant mortality rate in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2019; 95(2):194-200.
  • 6
    Li F, Wu T, Lei X, Zhang H, Mao M, Zhang J. The Apgar score and infant mortality. PLoS One 2013; 8(7):e69072.
  • 7
    Lie KK, Groholt EK, Eskild A. Association of cerebral palsy with Apgar score in low and normal birthweight infants: population-based cohort study. BMJ 2010; 341(6):c4990.
  • 8
    Herrera CA, Silver RM. Perinatal asphyxia from the obstetric standpoint: diagnosis and interventions. Clin Perinatol 2016; 43(3):423-438.
  • 9
    Li C, Miao JK, Xu Y, Hua YY, Ma Q, Zhou LL, Liu HJ, Chen QX. Prenatal, perinatal and neonatal risk factors for perinatal arterial ischaemic stroke: a systematic review and meta-analysis. Eur J Neurol 2017; 24(8):1006-1015.
  • 10
    Casey BM, McIntire DD, Leveno KJ. The continuing value of the Apgar score for the assessment of newborn infants. N Engl J Med 2001; 344(7):467-471.
  • 11
    Park JH, Chang YS, Ahn SY, Sung SI, Park WS. Predicting mortality in extremely low birth weight infants: comparison between gestational age, birth weight, Apgar score, CRIB II score, initial and lowest sérum albumin levels. PLoS One 2018; 13(2):e0192232.
  • 12
    Moster D, Lie RT, Irgens LM, Bjerkedal T, Markestad T. The association of Apgar score with subsequent death and cerebral palsy: a population based study in term infants. J Pediatr 2001; 138(6):798-803.
  • 13
    Thorngren-Jerneck K, Herbst A. Low 5-minute Apgar score: a population based register study of 1 million term births. Obstet Gynecol 2001; 98(1):65-70.
  • 14
    Woday A, Muluneh A, St Denis C. Birth asphyxia and its associated factors among newborns in public hospital, northeast Amhara, Ethiopia. PLoS One 2019; 14(12):e0226891.
  • 15
    Mello Jorge MHP, Gotlieb SLD. O sistema de informação de atenção básica como fonte de dados para os sistemas de informações sobre mortalidade e sobre nascidos vivos. Info Epidemiol SUS 2001; 10(1):7-18.
  • 16
    Rodrigues CS, Magalhães Junior HM, Evangelista PA, Ladeira RM, Laudares S. Perfil dos nascidos vivos no município de Belo Horizonte, 1992-1994. Cad Saude Publica 2002; 13(1):53-57.
  • 17
    Areco KCN, Konstantyner T, Taddei JAAC. Tendência secular da mortalidade infantil, componentes etários e evitabilidade no Estado de São Paulo - 1996 a 2012. Rev Paul Pediatr 2016; 34(3):263-270.
  • 18
    Mcintyre S, Taitz D, Keogh J, Goldsmith S, Badawi N, Blair E. A systematic review of risk factors for cerebral palsy in children born at term in developed countries. Dev Med Child Neurol 2013; 55(6):499-508.
  • 19
    Varela AR, Schneider BC, Bubach S, Silveira MF, Bertoldi AD, Duarte LSM, Menezes AMB, Domingues MR, Bassani DG. Fetal, neonatal, and post-neonatal mortality in the 2015 Pelotas (Brazil) birth cohort and associated factors. Cad Saude Publica 2019; 35(7):e00072918.
  • 20
    Iliodromiti S, Mackay DF, Smith GCS, Pell JP, Nelson SM. Apgar score and the risk of cause-specific infant mortality: a population-based cohort study. Lancet 2014: 385(9956):1749-55.
  • 21
    Persson M, Razaz N, Tedroff K, Joseph KS, Cnattingius S. Five and 10 minute Apgar scores and risks of cerebral palsy and epilepsy: a population based cohort study in Sweden. BMJ 2018; 360:k207.
  • 22
    Razaz N, Cnattingius S, Joseph KS. Association between Apgar scores of 7 to 9 and neonatal mortality and morbidity: population based cohort study of term infants in Sweden. BMJ 2019; 365:l1656.
  • 23
    Abdo RA, Halil HM, Kebede BA, Anshebo AA, Gejo NG. Prevalence and contributing factors of birth asphyxia among the neonates delivered at Nigist Eleni Mohammed memorial teaching hospital, Southern Ethiopia: a cross-sectional study. BMC Preg Childbirth 2019; 19(1):536.
  • 24
    Laopaiboon M, Lumbiganon P, Intarut N, Mori R, Ganchimeg T, Vogel JP, Souza JP, Gülmezoglu AM, WHO Multicountry Survey on Maternal Newborn Health Research Network. Advanced maternal age and pregnancy outcomes: a multicountry assessment. BJOG 2014; 121(Suppl. 1):49-56.
  • 25
    Almeida NK, Almeida RM, Pedreira CE. Adverse perinatal outcomes for advanced maternal age: a cross-sectional study of Brazilian births. J Pediatr 2015; 91(5):493-498.
  • 26
    Monteiro DLM, Miranda FRD, Lacerda IMS, Taquette SR, Ramos JAS, Souza FM et al. Increase in fertility rate before the age of 14 in Brazil from 1996 to 2018. Rev Assoc Med Bras 2021; 67(11):1712-1718.
  • 27
    Bessa JF, Bonatto N. Apagar scoring system in Brazil's live birth records: diferences between home and hospital births. Rev Bras Ginecol Obstet 2019; 41(2):76-83.
  • 28
    Zaiden L, Nakamura-Pereira M, Gomes MAM, Esteves-Pereira AP, Leal MC. Influence of hospital characteristics on the performance of elective cesareans in Southeast Brazil. Cad Saude Publica 2020; 36(1):e00218218.
  • 29
    Mylonas I, Friese K. Indications for and risks of elective cesarean section. Dtsch Arztebl Int 2015; 112(29-30):489-495.
  • 30
    Domingues RMSM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Torres JA, d'Orsi E, Pereira APE, Schilithz AOC, Leal MC. Processo f decision making regarding the mode of birth in Brazil: from the initial preference of women to the final mode of birth. Cad Saude Publica 2014; 30(Suppl. 1):S101-S116.
  • 31
    Anggondowati T, El-Mohandes AA, Qomariyah SN, Kiely M, Ryon JJ, Gipson RF, Zinner B, Achadi A, Wright LL. Maternal characteristics and obstetrical complications impact neonatal outcomes in Indonesia: a prospective study. BMC Preg Childbirth 2017; 17(1):100.
  • 32
    Tasew H, Zemicheal M, Teklay G, Mariye T, Ayele E. Risk factors of birth asphyxia among newborns in public hospitals of central zone, Tigray, Ethiopia 2018. BMC Res Notes 2018; 11(1):496.
  • 33
    Opitasari C, Andayasari L. Maternal education, prematurity and the risk of birth asphyxia in selected hospitals in Jakarta. Health Sci J Indones 2015; 6(2):111-115.
  • 34
    Lansky S, Friche AA, Silva AA, Campos D, Bittencourt SD, Carvalho ML, Frias PG, Cavalcante RS, Cunha AJLA. Pesquisa nascer no Brasil: perfil da mortalidade neonatal e avaliação da assistência à gestante e ao recém-nascido. Cad Saude Publica 2014; 30(Suppl. 1):S192-S207.
  • 35
    Hofmeyr GJ, Hodnett ED. Antenatal care packages with reduced visits and perinatal mortality: a secondary analysis of the WHO antenatal care trial. Reprod Health 2013; 10:20.
  • 36
    Wondemagegn AT, Alebel A, Tesema C, Abie W. The effect of antenatal care follow-up on neonatal health outcomes: a systematic review and meta-analysis. Public Health Rev 2018; 39:33.
  • 37
    Bittencourt SDA, Domingues RMSM, Reis LGC, Ramos MM, Leal MC. Adequacy of public maternal care services in Brazil. Reprod Health 2016; 13(Suppl. 1):120.
  • 38
    Carmo Leal M, da Silva AA, Dias MA, da Gama SG, Rattner D, Moreira ME, Filha MM, Domingues RM, Pereira AP, Torres JA, Bittencourt SD, D'orsi E, Cunha AJ, Leite AJ, Cavalcante RS, Lansky S, Diniz CS, Szwarcwald CL. Birth in Brazil: national survey into labor and birth. Reprod Health 2012; 9:15.
  • 39
    Leal MC, Gama SGN, Pereira APE, Pacheco VE, Carmo CN, Santos RV. A cor da dor: iniquidades raciais na atenção pré-natal e ao parto no Brasil. Cad Saude Publica 2017; 33(Suppl. 1):e00078816.
  • 40
    Martinelli KG, Santos Neto ET, Gama SGN, Oliveira AE. Access to prenatal care: inequalities in a region with high maternal mortality in southeastern Brazil. Cien Saude Colet 2016; 21(5):1647-1657.
  • 41
    Domingues RMSM, Viellas EF, Dias MAB, Torres JA, Theme-Filha MM, Gama SGN, Leal MC. Adequação da assistência pré-natal segundo as características maternas no Brasil. Rev Panam Salud Publica. 2015; 37(3):140-147.
  • 42
    World Health Organization (WHO). WHO recommendations on antenatal care for a positive pregnancy experience. Geneva: WHO; 2016.
  • 43
    Ministério da Saúde (MS). Programa de humanização do parto: humanização no pré-natal e nascimento. Brasília: MS; 2002.
  • 44
    Siddiqui A, Cuttini M, Wood R, Velebil P, Delnord M, Zile I, Barros H, Gissler M, Hindori-Mohangoo AD, Blondel B, Zeitlin J, Euro-Peristat Scientific Committee. Can the Apgar score be used for international comparisons of newborn health? Paediatr Perinat Epidemiol 2017; 31(4):338-345.
  • 45
    Bovbjerg ML, Dissanayake MV, Cheyney M, Brown J, Snowden JM. Utility of the 5-minute Apgar score as a research endpoint. Am J Epidemiol 2019; 188(9):1695-1704.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    Fev 2023

Histórico

  • Recebido
    27 Mar 2022
  • Aceito
    26 Jul 2022
  • Publicado
    28 Jul 2022
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br