O Brasil, após 36 anos do surgimento do Sistema Único de Saúde (SUS), ainda é fortemente marcado pelas iniquidades em saúde. Nesta edição, 3 artigos tratam de diversos aspectos associados às iniquidades em saúde: Os injustos diferenciais econômicos e raciais relacionados à mortalidade pelos cânceres mais prevalentes; O acesso das pessoas em situação de rua (PSR) aos diversos serviços de saúde em Belo Horizonte; O estado da arte quanto ao acesso das pessoas em situação de rua aos serviços de saúde mental. Esses artigos serão seguidos em edições futuras por outros que tratam das distribuições desiguais de riscos e de perfis epidemiológicos, e das estratégias organizadas de enfrentamento dessas desigualdades.
Como indicado no artigo que trata da distribuição das neoplasias mais prevalentes, o risco de morte por neoplasia de colo do útero foi 8,5% maior para negras do que para brancas. Para todas as causas ocorreu aumento da mortalidade com o aumento da idade.
O artigo sobre o acesso das pessoas em situação de rua ao SUS apresentou resultados que recomendam a estruturação de uma Rede de Atenção à Saúde poliárquica, multiprofissional e intersetorial, orientada pela territorialização e longitudinalidade do cuidado, adotando a abordagem de a clínica ampliada. O modelo de atenção que emerge nesse estudo é consistente com o observado na literatura científica pelo estudo seguinte que trata das barreiras e facilitadores vivenciados pela PSR no acesso aos serviços de saúde mental. Para além dos fatores relacionados ao uso de álcool e outras drogas, a maioria dos fatores estão vinculados às condições e modos da vida dessa população, e às formas como os serviços a aborda. Discriminação, disciplinamento excessivo e ausência de integração intra e intersetorial operam como barreiras significativas para o acesso aos serviços. Já os Consultórios na Rua e a abordagem centrada na redução de danos e no matriciamento de ações emergiram como facilitadores do acesso para a PSR.
Os artigos desta edição iniciam o traçado de um panorama em que os determinantes sociais e econômicos estruturalmente reproduzidos são reiterados pelo acesso desigual aos bens e serviços de saúde, tanto em termos quantitativos, como qualitativos. Também, indicam que abordagens articuladas e integradas podem mitigar os efeitos mais deletérios das iniquidades em saúde e aumentar o bem-estar das populações mais vulnerabilizadas.
Uma abordagem efetiva no enfrentamento dessas iniquidades compreende um conjunto articulado e integrado de intervenções para enfrentar diferentes fatores associados a esse fenômeno que vão além do campo estrito de atuação da saúde. Investimentos em educação, habitação, políticas ativas de geração de trabalho e renda, proteção social, promoção de igualdade gênero, combate ao racismo, estão associadas à promoção da equidade em saúde11 Paes-Sousa R. Buss PM, Barreto ML. Reducing health inequalities in developing countries. In: Detels R, Karim QA, Baum F, Li L, Leyland AH, editors. Oxford Textbook of Global Public Health. 7ª ed. Oxford: Oxford University Press; 2021..
A análise das políticas municipais é importante já que o ciclo de apropriação das políticas de alcance nacional parte muitas vezes de experiências locais bem-sucedidas. Essas podem ganhar escala e se tornar a abordagem do ou para o SUS e outras políticas sociais22 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Memórias da saúde da família no Brasil. Brasília: MS; 2010..
Referências
- 1Paes-Sousa R. Buss PM, Barreto ML. Reducing health inequalities in developing countries. In: Detels R, Karim QA, Baum F, Li L, Leyland AH, editors. Oxford Textbook of Global Public Health. 7ª ed. Oxford: Oxford University Press; 2021.
- 2Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Memórias da saúde da família no Brasil. Brasília: MS; 2010.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
27 Jan 2025 - Data do Fascículo
Jan 2025
Histórico
- Recebido
15 Out 2024 - Aceito
17 Out 2024