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Meninos e meninas de rua do Brasil

 

 


 

 

De 23 a 25 de maio último, o Cebrid — Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Rua Napoleão de Barros, 899 — 04024 — São Paulo/ SP — tel. 572.5470) — e o Departamento de Psicobiologia da Escola Paulista de Medicina promoveram um "Encontro sobre Abuso de Drogas entre Meninos de Rua do Brasil".

Contando com quatro conferencistas (inclusive do exterior) e com relatores do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua do Brasil e entidades afins de oito estados brasileiros (CE, DF, ES, MG, PE, PI, RJ e RS), o Encontro reuniu informações tanto científicas como a partir da prática dos educadores de rua, e promoveu discussões sobre questões importantes e urgentes da criança de rua.

Ainda, fez expedir telex para a Comissão Especial para Apreciação do Estatuto do Menor, da Câmara dos Deputados (Brasília), informando como conclusão prioritária do Evento a urgência da aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, por considerá-lo instrumento imprescindível para garantir os direitos constitucionais daquele segmento da população brasileira.

As recomendações que se seguem foram aprovadas por unanimidade, após consulta por carta a todos os participantes.

 

RECOMENDAÇÕES DO ENCONTRO SOBRE ABUSO DE DROGAS ENTRE MENINOS E MENINAS DE RUA DO BRASIL

01. Há dúvidas quanto ao real número de crianças de rua existentes no Brasil, assim como o próprio termo carece de melhor definição. O dado oficial de sete milhões parece ser grosseiramente exagerado. Recomenda-se a execução prioritária de projetos de pesquisa, visando obter a real dimensão do problema.

02. De maneira geral, há isolamento e falta de comunicação entre os grupos que trabalham com crianças de rua, em que pese o esforço de inúmeras pessoas interessadas. Recomenda-se a urgente organização e publicação de um catálogo, contendo as informações sobre todas as instituições, públicas ou privadas, envolvidas com a problemática dessa população.

03. Há consenso de que os educadores de rua não têm acesso a informações suficientes para o melhor desempenho das suas funções. Recomenda-se que seja estimado o intercâmbio entre a Universidade e as Instituições que atendem as crianças de rua. As formas que este intercâmbio poderia tomar seriam: boletins periódicos, cursos de formação, reuniões, entre outras.

04. É necessário que o educador de rua tenha formação específica e adequada para desempenhar sua importante tarefa. Neste sentido, recomenda-se que seja promovido apoio e incentivo aos cursos já existentes, bem como estímulo a que novos cursos sejam criados. Como conteúdo, ressalta-se, entre os inúmeros outros pontos a serem definidos localmente, esclarecimento sobre a ação de drogas psicotrópicas no corpo humano. Outrossim, recomenda-se que o educador de rua seja visto como um profissional que merece respeito e apoio da sociedade e que não deve ser objeto de desprezo e preconceito, como muitas vezes acontece no seu cotidiano.

05. É reconhecida a falta de recursos necessários para tratar adequadamente a problemática dos meninos e meninas de rua. Recomenda-se que o Estado repasse verbas públicas suficientes aos vários programas de assistência a esses menores, propiciando-lhes condições para um adequado desenvolvimento dos seus trabalhos. É fundamental, no entanto, que tais recursos, destinados tanto à prevenção ao abuso de drogas como a outras atividades, sejam rapassados sem burocratismo. Em se tratando de verbas públicas, recomenda-se, também, uma avaliação periódica dos resultados obtidos, realizada por instituição independente.

06. O uso de drogas psicotrópicas lícitas e ilícitas entre as crianças de rua de todas as capitais brasileiras atinge proporções dramáticas, não só em percentagem, mas, também, em termos de intensidade de uso, sem paralelo em outros segmentos da nossa população. Por esta razão, recomenda-se que todo e qualquer programa de prevenção/tratamento de abuso de drogas no País tenha como primeira prioridade atingir, inicialmente, aquele segmento.

07. Os programas não deverão ter ênfase na repressão, não deverão abordar de forma exclusiva ou prioritária as drogas em si, mas, sim, fornecer às crianças de rua alternativas válidas de lazer e atividades estruturadas. Não se considera adequada a importação de pacotes de programas desenvolvidos no exterior.

08. Fica, também, reconhecido que o problema da criança de rua tem suas raízes no sistema econômico-social, injusto na sua essência. Rocomenda-se, portanto, que a abordagem desta questão seja feita sem que jamais se perca de vista este referencial mais amplo.

09. Muitas vezes os serviços policiais têm profissionais sem o preparo adequado para lidar com o problema das crianças de rua. Conseqüentemente, abusos e violências ocorrem com freqüência e a instituição policial, como um todo, passa a ter imagem negativa. Recomenda-se, enfaticamente que sejam organizados sistemas de seleção e melhor preparo desses profissionais, a fim de que a Instituição passe a somar esforços positivos na resolução do problema, juntamente com outros segmentos da sociedade.

10. Recomenda-se a aprovação, com urgência, do Estatuto da Criança e do Adolescente, por considerá-lo como instrumento imprescindível para garantir os direitos constitucionais desse segmento da população brasileira.

11. Os trabalhos com crianças de rua não deverão servir de motivo de autopromoção ou de propaganda política para pessoas, grupos ou setores do próprio Governo.

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br