RESENHA/RESENHA

 

 

Ellen Hardy; Ivanise Rebello

Faculdade de Ciências Médicas; Universidade de Campinas

 

 

O Limite da Exclusão Social - Meninos e Meninas de Rua no Brasil. Maria Cecília de S. Minayo (Org.). São Paulo: Hucitec/Rio de Janeiro: Abrasco, 1992.

Minayo e outros pesquisadores do Centro Latino-Americano de Estudos sobre Violência e Saúde (Claves) tentam revelar a face oculta da problemática dos meninos de rua, a situação de miséria e os conflitos vividos por suas famílias. Mostram que o fenômeno "meninos de rua" gerou, no último decênio, uma ampla produção bibliográfica, que reflete a grande inquietude dos intelectuais e dos movimentos sociais em relação ao processo de deterioração das instituições, das relações e das condições de vida no Brasil. Mas isto também indica que chegou o momento de agir, de estratégias operacionais.

Os autores apresentam os resultados de uma pesquisa qualitativa, realizada em cinco capitais e algumas áreas complementares, associados a indicadores de pobreza construídos com base nas PNADs/IBGE da década de 80, e a literatura existente sobre o tema. Aprofundam-se em dois temas: propõem que, a partir do campo da Saúde Pública, defenda-se a rede familiar como espaço de investimento para a assistência e a seguridade social, dotando-a do mínimo necessário para a reprodução física, social, cultural e moral das crianças. E consideram a família a única instituição capaz de oferecer à criança um espaço de realização de suas potencialidades. Os autores não aceitam a rua enquanto espaço competente para abrigar meninos e meninas de rua, negando a premissa de que estes teriam "escolhido" viver aí, sendo que, na verdade, é a necessidade que os impele a tentar sobreviver neste espaço de violência, decadência moral e aviltamento dos seres humanos.

Em todo o estudo entende-se "meninos e meninas de rua como o conjunto de crianças que utilizam a rua como espaço de trabalho e sustento, retornando assiduamente a suas casas; as que vivem com suas famílias na rua; e aquelas em processo de rompimento ou que já romperam os laços familiares, fazendo da rua seu espaço de vida". Estes três grupos foram estudados sempre diferenciadamente.

Existem alguns pressupostos fundamentais nos quais os autores se baseiam durante a pesquisa. O primeiro é que o problema de "meninos e meninas de rua" possui raízes sócio-históricas na formação de rendas, desigual, onde impera o desenvolvimento econômico, deixando à margem o social. O segundo pressuposto é que este fenômeno cresceu de forma preocupante na última década, onde os problemas econômicos do país se acentuaram, penalizando ainda mais a população abaixo da linha de pobreza, e as políticas sociais são escassas e ineficientes. O terceiro pressuposto é que o fenômeno dos meninos e meninas de rua só pode ser entendido articulando-se macrossocialmente os problemas do campo e das cidades e o direcionamento das políticas agrícolas e industriais que fizeram com que o Brasil, nas últimas décadas, produzisse fenômenos de tal ordem. O quarto pressuposto, de ordem metodológica, é que as crianças que estão nas ruas constituem-se um problema social muito complexo, diferenciado e de várias causas, o que faz com que ele necessite de uma análise teórico-prática, buscando-se as distinções fundamentais. E, por fim, o último pressuposto é que o problema das crianças na rua é de suas famílias, que, de alguma forma, não conseguiram retê-las no lar.

O livro consta de seis capítulos, sendo que, inicialmente, os leitores são apresentados ao tema meninos de rua. No primeiro capítulo são expostos os objetivos gerais do estudo e alguns conceitos fundamentais, delineando-se o método de trabalho. No capítulo dois foi feito um estudo minucioso baseado nas informações das PNADs dos anos 80, sobre a distribuição de renda e dos indicadores de pobreza. Priemiro faz-se um levantamento dos dados globais do Brasil e, deois, uma análise das principais regiões metropolitanas do país. Foi constatado que a década de 80 constituiu-se um verdadeiro período de retrocesso, com um considerável aumento nos níveis de pobreza do país e uma piora na distribuição de renda associada à crise econômica.

No capítulo três, os autores enfatizam que, para o entendimento do fenômeno de crianças de rua, as suas famílias devem ser analisadas enquanto não-cumpridoras de suas obrigações essenciais, sendo incapazes de garantir a segurança material e afetiva que dão condições ao pleno desenvolvimento de seus filhos. São apresentados os dados de uma pesquisa que objetivava traçar o perfil dessas famílias através de suas histórias. O texto mostra as características e a constituição destas famílias, suas condições de vida e saúde, e seus principais conflitos.

No quarto capítulo, os autores retratam "as crianças que vivem na rua" e a realidade de vida delas neste espaço onde moram e trabalham. Caracterizam cada um dos grupos nos quais os meninos foram divididos, segundo escolaridade e o tipo de vida na rua, o processo de saída de suas casas, as atividades exercidas, as amizades e o uso de drogas, por exemplo.

No último capítulo são feitas algumas considerações sobre o grave problema do enorme contingente de crianças que fazem da rua um espaço de lazer, trabalho e moradia, e de suas famílias. São apontadas as características dos três grupos estudados e formuladas algumas proposta de ação, partindo-se sempre do princípio de que deve-se dar condições à família nuclear ou adotiva dessas crianças para que esta assuma sua responsabilidade de paternagem.

Sem dúvida, este livro será uma valiosa colaboração aos cientistas que necessitam de informações sobre o assunto, tais como cientistas sociais e políticos.

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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