Atividade física, tempo de tela e utilização de medicamentos em adolescentes: coorte de nascimentos de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, 1993

Physical activity, screen time, and use of medicines among adolescents: the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study

Actividad física, tiempo de visualización de pantallas y consumo de medicamentos en adolescentes: estudio de cohorte de nacimientos de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, 1993

Gabriel Gustavo Bergmann Andréa Dâmaso Bertoldi Grégore Iven Mielke Aline Lins Camargo Alicia Matijasevich Pedro Curi Hallal Sobre os autores

Resumo:

O objetivo do estudo foi avaliar associações transversais e longitudinais entre atividade física, tempo de tela e uso de medicamentos em adolescentes da coorte de nascidos em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, em 1993, acompanhados aos 11 anos (N = 4.452), 15 anos (N = 4.325) e 18 anos (N = 4.106). Foram mensurados o uso de medicamentos nos últimos 15 dias, o uso contínuo de algum medicamento, o nível de atividade física (questionário e por acelerometria) e o tempo de tela (TV, computador e videogame). Um terço dos adolescentes usou, pelo menos, um medicamento nos últimos 15 dias, e, aproximadamente, 10% fizeram uso de algum medicamento de uso contínuo. Na análise ajustada, os resultados indicaram que níveis mais altos de atividade física aos 18 anos e menor tempo de tela aos 15 anos, entre os meninos, estiveram associados a frequências inferiores de uso global de medicamentos (p < 0,05). Também, para os meninos, a atividade física aos 11 e 18 anos associou-se inversamente ao uso contínuo de medicamentos (p < 0,05). Meninos mais ativos e com menor tempo de tela na adolescência apresentam menor uso de medicamentos aos 18 anos.

Palavras-chave:
Atividade Motora; Adolescente; Uso de Medicamentos

Abstract:

This study aimed to evaluate cross-sectional and longitudinal associations between physical activity, screen time, and use of medicines among adolescents from the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study, followed at 11 (N = 4,452), 15 (N = 4,325), and 18 years of age (N = 4,106). The study recorded the use of medicines in the previous 15 days, continuous use of some medication, level of physical activity (by questionnaire and accelerometry), and screen time (TV, computer, and videogame). One-third of adolescents had used at least one medicine in the previous 15 days and approximately 10% were on some continuous medication. In the adjusted analysis, the results showed that higher levels of physical activity at 18 years and less screen time at 15 years in boys were associated with lower overall use of medicines (p < 0.05). For boys, physical activity at 11 and 18 years were inversely related to continuous medication (p < 0.05). More physically active boys and those with less screen time in adolescence showed lower use of medicines at 18 years of age.

Keywords:
Motor Activity; Adolescent; Drug Utilization

Resumen:

El objetivo del estudio fue evaluar asociaciones transversales y longitudinales entre actividad física, tiempo de visualización de pantallas y consumo de medicamentos en adolescentes de la cohorte de nacidos en Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, en 1993, cuyo seguimiento se realizó a los 11 (N = 4.452), 15 (N = 4.325) y 18 años (N = 4.106). Se midió el consumo de medicamentos durante los últimos 15 días, el uso continuo de algún medicamento, el nivel de actividad física (cuestionario y por acelerometría) y el tiempo de visualización de pantallas (TV, computadora y videojuegos). Un tercio de los adolescentes consumió por lo menos un medicamento en los últimos 15 días, y aproximadamente 10% hizo uso de algún medicamento de uso continuo. En el análisis ajustado, los resultados indicaron que niveles más altos de actividad física a los 18 años y menor tiempo de visualización de pantallas a los 15 años, entre los niños, estuvieron asociados a frecuencias inferiores de uso global de medicamentos (p < 0,05). También para los niños, la actividad física a los 11 y 18 años se asoció inversamente al uso continuo de medicamentos (p < 0,05). Los niños más activos y con un menor tiempo de visualización de pantallas en la adolescencia presentan un menor consumo de medicamentos a los 18 años.

Palabras:
Actividad Motora; Adolescente; Utilización de Medicamentos

Introdução

Ao longo da história, os medicamentos têm se constituído como importantes recursos terapêuticos, possibilitando melhores condições de saúde à população. Os avanços científicos e tecnológicos proporcionaram a introdução, no mercado, de novos medicamentos e que o seu acesso fosse ampliado. Embora os benefícios desse avanço sejam inquestionáveis, riscos também existem. O uso sem indicação e controle pode causar alterações comportamentais, dependência, intoxicações e outros efeitos colaterais indesejáveis 11. Dal Pizzol TS, Branco MMN, Carvalho RMA, Pasqualotti A, Maciel EN, Migott AMB. Uso não-médico de medicamentos psicoativos entre escolares do ensino fundamental e médio no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22:109-15.,22. Hawton K, James L. Suicide and deliberate self harm in young people. BMJ 2005; 330:891-4.,33. Rogers PD, Copley L. The nonmedical use of prescription drugs by adolescents. Adolesc Med State Art Rev 2009; 20:1-8.,44. Andersen A, Holsten BE, Hansen EH. Is medicine use in adolescence risk behaviour? Cross-sectional survey of school-aged children from 11 to 15. J Adolesc Health 2006; 39:362-6..

As razões para o uso de medicamentos são variadas, não sendo esse influenciado apenas por questões de saúde. Características socioculturais, individuais e de mercado 55. Arrais PSD, Brito LL, Barreto ML, Coelho HLL. Prevalência e fatores determinantes do consumo de medicamentos no Município de Fortaleza, Ceará, Brasil. Cad Saúde Pública 2005; 21:1737-46.,66. Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saúde Pública 2004; 38:228-38.,77. Barros JAC. Propaganda de medicamentos: atentado à saúde? São Paulo: Editora Hucitec; 1995.,88. Lefèvre F. A oferta e a procura de saúde imediata através do medicamento: proposta de um campo de investigação. Rev Saúde Pública 1987; 21:64-7. parecem exercer influência nesse comportamento. Em adolescentes, alguns estudos 99. Bertoldi AD, Silveira MPT, Menezes ANB, Assunção MCF, Gonçalves H, Hallal PC. Tracking of medicine use and self-medication from infancy to adolescence: 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. J Adolesc Health 2012; 51(6 Suppl):S11-S5.,1010. de Moraes ACF, Delaporte TRM, Molena-Fernandes CA, Falcão MC. Factors associated with medicine use and self medication are different in adolescents. Clinics 2011; 66:1149-55.,1111. Gobina I, Välimaa R, Tynjälä J, Villberg J, Villerusa A, Iannotti RJ, et al. The medicine use and corresponding subjective health complaints among adolescents, a cross-national survey. Pharmacoepidemiol Drug Saf 2011; 20:424-31.,1212. Piccinini M, Vieno A, Santinello M. Use of medicines and lifestyles among Italian adolescents. Epidemiol Prev 2011; 35:222-8. têm indicado prevalências entre 30% e 55% de uso de medicamentos utilizando-se um período recordatório de 15 dias. Desse total, cerca de um terço é utilizado por automedicação 1313. Du Y, Knopf H. Self-medication among children and adolescents in Germany: results of the National Health Survey for Children and Adolescents (KiGGS). Br J Clin Pharmacol 2009; 68:599-608..

Se por um lado o uso de medicamentos é uma das principais alternativas para o tratamento e controle de problemas de saúde, por outro, a prática regular de atividade física e um menor tempo de tela se configuram como importantes meios de prevenção contra uma série de doenças 1414. Lee IM, Shiroma EJ, Lobelo F, Puska P, Blair SN, Katzmarzyk PT. Effect of physical inactivity on major non-communicable diseases worldwide: in analysis of burden of disease and life expectancy. Lancet 2012; 380:219-29.,1515. Ekelund U, Brage S, Froberg K, Harro M, Anderssen SA, Sardinha LB, et al. TV viewing and physical activity are independently associated with metabolic risk in children: the European Youth Heart Study. PLoS Med 2006; 3:e488.,1616. World Health Organization. Global strategy on diet, physical activity and health. Geneva: World Health Organization; 2004..

A prevalência de uso de medicamentos em adolescentes é elevada e com evidências de aumento ao longo da última década 1717. Holstein BE, Hansen EH, Due P, Almarsdóttir AB. Self-reported medicine use among 11- to 15-year-old girls and boys in Denmark 1988-1998. Scand J Public Health 2003; 31:334-41.. Já a prevalência de prática de atividade física nessa população é baixa 1818. Hallal PC, Andersen LB, Bull FC, Regina G, Haskell W, Ekelund U, et al. Global physical activity levels: surveillance progress, pitfalls, and prospects. Lancet 2012; 380:247-57. e parece estar diminuindo ao longo dos últimos anos 1919. Coll Cv, Knuth AG, Bastos JP, Hallal PC, Bertoldi AD. Time trends of physical activity among Brazilian adolescents over a 7-years period. J Adolesc Health 2014; 54:209-13.. O tempo de tela parece estar aumentando durante a adolescência, principalmente devido ao drástico aumento no uso de computadores e outros equipamentos eletrônicos para o acesso à Internet 2020. Bucksch J, Inchley J, Hamrik Z, Finne E, Kolip P; HBSC Study Group Germany. Trends in television time, non-gaming PC use and moderate-to-vigorous physical activity among German adolescents 2002-2010. BMC Public Health 2014; 14:351..

Considerando que o uso de medicamentos pode ser um indicador do estado de saúde 2121. Neutel CI. Drug utilization patterns as indicators. Pharmacoepidemiol Drug Saf 1998; 7:131-3. e que a prática de atividade física contribui para a prevenção de doenças, torna-se relevante a realização de estudos associando esses comportamentos. Em adultos, alguns esforços nesse sentido têm sido desenvolvidos 2222. Bertoldi AD, Hallal PC, Barros AJD. Physical activity and medicine use: evidence from a population-based study. BMC Public Health 2006; 6:224.,2323. Bardel A, Wallander MA, Svardsudd K. Reported current use of prescription drugs and some of its determinants among 35 to 65-year-old women in mid-Sweden: a population-based study. J Clin Epidemiol 2000; 53:637-43.,2424. Eggen AE. Pattern of drug use in a general population - prevalence and predicting factors: the Tromso study. Int J Epidemiol 1994; 23:1262-70.,2525. Suzuki CS, Moraes SA, Freitas IC. Atividade física e fatores associados em adultos residentes em Ribeirão Preto, SP. Rev Saúde Pública 2011; 45:311-20.,2626. Silva LJ, Azevedo MR, Matsudo S, Lopes GS. Association between levels of physical activity and use of medication among older women. Cad Saúde Pública 2012; 28:463-71.,2727. Payne J, Neutel I, Cho R, DesMeules M. Factors associated with women&apos;s medication use. BMC Women&apos;s Health 2004; 4 Suppl 1:S29, porém, os resultados não são consistentes. Em adolescentes, são poucas as evidências disponíveis, e os resultados sugerem não haver associação entre prática de atividade física e uso de medicamentos 2828. Bertoldi AD, Tavares NUL, Hallal PC, Araújo CL, Menezes ANB. Medicine use among adolescents: the 11-year follow-up of the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. Cad Saúde Pública 2010; 26:1945-53.. Contudo, tanto os estudos com adultos quanto com adolescentes foram realizados com delineamento transversal. Essa característica metodológica limita a interpretação dos resultados, não permitindo atribuir uma relação de causa e efeito entre esses comportamentos. Considerando o exposto, o objetivo deste estudo foi avaliar associações transversais e longitudinais entre nível de atividade física, tempo de tela e uso de medicamentos em adolescentes.

Métodos

Amostra

As mães de todos os nascidos vivos na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, cujas famílias residiam na cidade no ano de 1993 (n = 5.265) foram abordadas por uma equipe de pesquisa ainda no hospital. Foi feito um convite para que as crianças participassem de um estudo de coorte de nascimentos. Apenas 16 mães recusaram que seus filhos participassem do estudo.

Ao longo da infância, subamostras dos participantes foram acompanhadas, sendo que foram realizados acompanhamentos com todos os participantes da coorte quando esses tinham, em média, 11, 15 e 18 anos de idade. Nos acompanhamentos realizados aos 11 e 15 anos, os adolescentes foram localizados por meio de uma combinação de estratégias de busca e visitados no domicílio pela equipe de pesquisa. Foram aplicados questionários para mães e adolescentes, sendo entrevistados 4.452 e 4.325 adolescentes aos 11 e 15 anos, respectivamente.

Para o acompanhamento aos 18 anos, todos os participantes da coorte foram convidados a comparecer na clínica, no Programa de Pós-graduação em Epidemiologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Nesse acompanhamento, 4.106 participantes foram entrevistados. Em todos os acompanhamentos, uma ampla investigação sobre saúde foi realizada. Maiores detalhes metodológicos sobre os acompanhamentos podem ser encontrados em publicações prévias 2929. Victora CG, Hallal PC, Araújo CL, Menezes AM, Wells JC, Barros FC. Cohort profile: the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. Int J Epidemiol 2008; 37:704-9.,3030. Gonçalves H, Assunção MC, Wehrmeister FC, Oliveira IO, Barros FC, Victora CG, et al. Cohort profile update: the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort follow-up visits in adolescence. Int J Epidemiol 2014; 43:1082-8.. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da UFPel, e os participantes e/ou responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Variáveis

As variáveis de exposição utilizadas neste estudo foram a prática de atividade física e o tempo de tela. Os desfechos foram o uso de medicamentos nos 15 dias anteriores à entrevista e o uso de medicamentos de forma contínua, medidos aos 18 anos de idade. Além disso, no acompanhamento dos 11 anos, o uso de algum medicamento nos 15 dias anteriores à entrevista (não/sim), a escolaridade da mãe (anos completos de estudo), a renda familiar (somatório da renda recebida no mês anterior à entrevista considerando todos os membros da família) e o índice de massa corporal (razão entre peso e o quadrado da altura, ambos coletados por entrevistadores padronizados) foram utilizados como variáveis de ajuste nas análises multivariáveis.

Prática de atividade física

A prática de atividade física (minutos por semana) nos acompanhamentos dos 11 e 15 anos foi mensurada por meio de autorrelato da frequência semanal e do tempo despendido em uma lista de atividades físicas de lazer, a qual foi construída com base em atividades comuns à realidade local. Além disso, perguntas específicas sobre modo e tempo de deslocamento para a escola foram realizadas. Esse instrumento foi submetido a estudo de validação, apresentando alta repetibilidade, mas apenas razoável validade concorrente quando comparado com pedômetros 3131. Bastos JP, Araujo CL, Hallal PC. Prevalence of insufficient physical activity and associated factors in Brazilian adolescents. J Phys Act Health 2008; 5:777-94..

Para a mensuração da prática de atividade física no acompanhamento dos 18 anos, foi realizada medida de atividade física por meio de acelerômetros (modelo GENEActiv. Activinsights, Kimbolton, Reino Unido). Detalhes metodológicos sobre a logística de coleta de dados foram publicados previamente 3232. Knuth AG, Assunção MCF, Gonçalves H, Menezes AMB, Santos IS, Barros AJD, et al. Descrição metodológica do uso de acelerometria para mensurar a prática de atividade física nas coortes de nascimentos de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, 1993 e 2004. Cad Saude Publica 2013; 29:557-65.. Em resumo, os acelerômetros eram entregues aos participantes no momento da visita à clínica e recolhidos pela equipe de pesquisa após um período médio de cinco dias. Essa estratégia garantiu que todos os participantes tivessem usado o aparelho em, pelo menos, um dia de final de semana. Os acelerômetros foram utilizados no pulso não dominante de cada participante.

Tempo de tela

O tempo de tela foi medido em todos os acompanhamentos por meio de um questionário padronizado incluindo questões relacionadas ao tempo diário despendido, em um dia de semana normal, assistindo à televisão, usando computador e jogando videogame. A variável foi criada por meio da soma do tempo despendido nessas atividades.

Uso de medicamentos

O uso de medicamento foi medido por um questionário padronizado. Foi investigado o uso de, pelo menos, um medicamento nos 15 dias anteriores à entrevista, período recordatório mais frequentemente utilizado em estudos sobre uso de medicamentos 3333. Bertoldi A, Barros AJ, Wagner A, Ross-Degnan D, Hallal PC. A descriptive review of the methodologies used in household surveys on medicine utilization. BMC Health Serv Res 2008; 8:222.. Esse questionário foi aplicado para as mães dos adolescentes aos 11 anos e para os próprios adolescentes aos 18 anos. Os medicamentos foram classificados por grupos terapêuticos, segundo a classificação internacional Anatomical Therapeutical Chemical (ATC) 3434. WHO Collaborating Centre for Drug Statistics Methodology. ATC/DDD Index 2014. http://www.whocc.no/atc_ddd_index/ (acessado em 27/Out/2014).
http://www.whocc.no/atc_ddd_index/...
da Organização Mundial da Saúde (nível 1 da classificação), e por frequência de uso deles (se ocasional ou contínuo). Foram considerados como contínuos os medicamentos usados todos os dias (ou quase todos) sem data para interrupção. A escolha por considerar o uso de medicamentos aos 18 anos de duas formas (15 dias anteriores à entrevista e uso contínuo) foi realizada, pois as razões para a utilização de forma eventual ou contínua são diferentes, e a atividade física e o tempo de tela podem se associar, de forma distinta, a essas duas formas. Por fim, os contraceptivos não foram considerados nas análises, pois o seu uso não estaria relacionado com indicação de algum problema de saúde que apresentasse associação inversa com a prática de atividade física ou direta com o tempo de tela. Ainda, o fato de inserir os contraceptivos nas análises elevaria, em muito, a prevalência de uso de medicamentos entre as meninas.

Análises estatísticas

Inicialmente, foi realizada uma descrição do uso de medicamentos entre os participantes da coorte aos 18 anos. Foi utilizado o teste exato de Fisher para mostrar diferenças no uso de medicamentos entre meninas e meninos. Para a descrição da atividade física e do tempo de tela, foram utilizados os valores de mediana e da frequência relativa de sujeitos que atendem as recomendações para atividade física (300 ou mais minutos de atividade física por semana 3535. Strong WB, Malina RM, Blinkie CJ, Daniels SR, Dishman RK, Gutin B, et al. Evidence based physical activity for school age youth. J Pediatr 2005; 146:732-7.) e para o tempo de tela (menos do que duas horas por dia 3636. Barlow SE; Expert Committee. Expert committee recommendations regarding the prevention, assessment, and treatment of child and adolescent overweight and obesity: summary report. Pediatrics 2007; 120:164-92.). Essas análises foram realizadas em cada idade (11, 15 e 18 anos), envolvendo toda a amostra, e por sexo. Para as associações entre prática de atividade física, tempo de tela ao longo da adolescência e uso de medicamentos aos 18 anos, todas as variáveis de exposição foram categorizadas em tercis. A associação dessas variáveis com a prevalência de uso de medicamentos aos 18 anos foi testada por meio de teste qui-quadrado para tendência linear. Foram realizados testes de interação entre as variáveis de exposição e sexo. Testes de interação com nível de significância inferior a 0,20 foram considerados significativos. Assim, foram encontradas interações entre o tempo de tela aos 11 anos e sexo (pinteração = 0,084) para o uso total de medicamentos e entre a prática de atividade física aos 11 anos (pinteração = 0,058) e aos 18 anos (pinteração = 0,142) para o uso de medicamentos contínuos. Dessa forma, todas as análises foram estratificadas por sexo. Num segundo momento, foram conduzidas análises de regressão logística tendo o uso de medicamentos nos 15 dias anteriores à entrevista (ocasional ou contínuo) e o uso de medicamentos (apenas contínuo) como desfechos dicotômicos. Além da prática de atividade física e o tempo de tela aos 11, 15 e 18 anos, o uso de medicamentos aos 11 anos, a escolaridade da mãe, a renda familiar e o índice de massa corporal aos 11 anos foram utilizados como variáveis de ajuste. Todas as variáveis consideradas para o ajuste permaneceram no modelo final. Foram consideradas diferenças estatisticamente significativas aquelas cujo valor de p foi inferior a 0,05. As análises estatísticas foram conduzidas no pacote estatístico Stata 12.1 (StataCorp LP, College Station, Estados Unidos).

Resultados

Pouco mais de um terço da amostra relatou ter usado algum medicamento durante os 15 dias que antecederam as entrevistas, sendo essa frequência estatisticamente superior no sexo feminino (Tabela 1). Os grupos terapêuticos mais utilizados foram de medicamentos para o sistema nervoso (23%), sistema respiratório (6,6%) e sistema musculoesquelético (5,8%). Entre os medicamentos para o sistema nervoso, os analgésicos corresponderam a mais de 50%, com o restante se dividindo entre antiepiléticos, antiparkinsonianos, psicolépticos e psicoanalépticos.

Aproximadamente, um em cada dez adolescentes relatou fazer uso de algum medicamento de forma contínua, tendo o sexo feminino novamente uma frequência estatisticamente superior à do sexo masculino (Tabela 1). Considerando apenas os jovens que utilizaram medicamentos de uso contínuo, 52,3% utilizaram medicamento para o sistema nervoso, 21,8% para o sistema respiratório e 21,3 % para o trato alimentar e metabolismo (Tabela 1).

Tabela 1:
Descrição do uso de medicamentos nos últimos 15 dias (todos e apenas os de uso contínuo), exceto contraceptivos, aos 18 anos em toda a amostra e estratificada por sexo. Coorte de nascimentos de 1993 de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil.

As análises descritivas relativas à atividade física indicaram que os valores de mediana aos 11 (283 minutos/semana) e aos 15 anos (280 minutos/semana) foram próximos, sendo maiores entre os meninos (370 minutos/semana aos 11 anos; 433 minutos/semana aos 15 anos) do que entre as meninas (220 e 200 minutos/semana aos 11 e 15 anos, respectivamente). Com relação ao tempo de tela, os valores de mediana foram os mesmos aos 11 e 18 anos (4 horas/dia) e uma hora superior aos 15 anos. No sexo masculino, os valores de mediana foram de 4, 5 e 4,5 horas/dia aos 11, 15 e 18 anos, respectivamente. Entre as meninas, a mediana do tempo de tela foi de 4 horas/dia nas três idades.

Cerca da metade dos adolescentes atingiu a recomendação de prática de atividade física (≥ 300 minutos/semana) tanto aos 11 (48,4%) quanto aos 15 anos (48,2%). Quando essa análise é realizada por sexo, a frequência de meninos que atende a recomendação (58,4% aos 11 anos e 63,4% aos 15 anos) é superior à de meninas (38,8% aos 11 anos e 34,2% aos 15 anos). A frequência de adolescentes com tempo de tela superior à recomendação (< 2 horas/dia) foi de 75%, 80,2% e 77,4% aos 11, 15 e 18 anos respectivamente, sendo muito próxima entre meninos (75,6%, 82,3% e 78,8% aos 11, 15 e 18 anos) e meninas (74,5%, 78,3% e 76% aos 11, 15 e 18 anos).

A Tabela 2 apresenta a prevalência de uso de medicamentos aos 18 anos de acordo com os tercis de atividade física e tempo de tela em cada acompanhamento. Analisando os resultados de toda a amostra, em todas as idades, à medida que o nível de atividade física aumenta, a prevalência de uso de medicamentos diminui. Contudo, quando as análises são estratificadas por sexo, essas associações deixam de existir, permanecendo significativas para a atividade física somente no sexo masculino aos 18 anos. Nas análises entre o tempo de tela e o uso de medicamentos, adolescentes que relataram despender maior tempo de tela aos 15 anos tiveram maior prevalência de uso de medicamentos aos 18 anos. Quando os resultados são separados por sexo, essa associação é encontrada, para o sexo masculino, aos 11 e 15 anos e, para o sexo feminino, aos 15 anos.

Tabela 2:
Associação entre atividade física e tempo de tela aos 11, 15 e 18 anos e uso de medicamentos nos últimos 15 dias, exceto contraceptivos, aos 18 anos: análise bruta. Coorte de nascimentos de 1993 de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil.

Após ajuste para o uso de medicamentos aos 11 anos, escolaridade da mãe, renda e índice de massa corporal (IMC) aos 11 anos, as associações entre a atividade física e o uso de medicamentos aos 18 anos mantiveram-se significativas aos 15 e 18 anos para toda a amostra e apenas aos 18 anos para o sexo masculino. Em relação ao tempo de tela, meninos do tercil mais alto aos 15 anos tiveram um odds ratio (OR) 1,42 maior de utilizarem medicamento aos 18 anos, quando comparados aos adolescentes do tercil mais baixo (Tabela 3).

Tabela 3:
Associação entre atividade física e tempo de tela aos 11, 15 e 18 anos e uso de medicamentos aos 18 anos nos últimos 15 dias, exceto contraceptivos: análise ajustada. Coorte de nascimentos de 1993 de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil.

As Tabelas 4 e 5 apresentam, respectivamente, as associações brutas e ajustadas entre a prática de atividade física e tempo de tela aos 11, 15 e 18 anos e o uso contínuo de medicamentos pelos adolescentes aos 18 anos. Similar ao ocorrido nas análises envolvendo o uso de medicamentos nos últimos 15 dias, quando as análises são realizadas com toda a amostra, a prevalência de uso de medicamentos de forma contínua diminui de forma estatisticamente significativa à medida que o nível de atividade física aumenta. No entanto, nas análises estratificadas por sexo, associações significativas foram encontradas para o sexo masculino, referentes à prática de atividade física aos 11 e 18 anos. Nas análises envolvendo o tempo de tela, não foi encontrada nenhuma associação significativa.

Tabela 4:
Associação entre atividade física e tempo de tela aos 11, 15 e 18 anos e uso de medicamentos de uso contínuo aos 18 anos, exceto contraceptivos: análise bruta. Coorte de nascimentos de 1993 de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil.

Tabela 5:
Associação entre atividade física e tempo de tela aos 11, 15 e 18 anos e uso de medicamentos de uso contínuo aos 18 anos, exceto contraceptivos: análise ajustada. Coorte de nascimentos de 1993 de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil.

Discussão

Considerando a busca realizada em diferentes bases de dados, acreditamos que este seja o primeiro estudo a analisar as associações prospectivas entre o nível de atividade física e o tempo de tela com o uso de medicamentos em adolescentes. Além disso, nossas análises incluíram o nível de atividade física estimado por questionário e por acelerômetros e o uso de medicamentos nos últimos quinze dias e de forma contínua. Ainda, com relação ao tempo de tela, possivelmente este seja o primeiro estudo a associar esse comportamento ao uso de medicamentos. Estudos abordando essa temática em crianças e adolescentes são escassos, mas, em adultos e idosos, associações entre o nível de atividade física e o uso de medicamentos têm sido testadas no Brasil 2222. Bertoldi AD, Hallal PC, Barros AJD. Physical activity and medicine use: evidence from a population-based study. BMC Public Health 2006; 6:224.,2525. Suzuki CS, Moraes SA, Freitas IC. Atividade física e fatores associados em adultos residentes em Ribeirão Preto, SP. Rev Saúde Pública 2011; 45:311-20.,2626. Silva LJ, Azevedo MR, Matsudo S, Lopes GS. Association between levels of physical activity and use of medication among older women. Cad Saúde Pública 2012; 28:463-71. e em outros países 2323. Bardel A, Wallander MA, Svardsudd K. Reported current use of prescription drugs and some of its determinants among 35 to 65-year-old women in mid-Sweden: a population-based study. J Clin Epidemiol 2000; 53:637-43.,2424. Eggen AE. Pattern of drug use in a general population - prevalence and predicting factors: the Tromso study. Int J Epidemiol 1994; 23:1262-70.,2727. Payne J, Neutel I, Cho R, DesMeules M. Factors associated with women&apos;s medication use. BMC Women&apos;s Health 2004; 4 Suppl 1:S29.

Embora a maior parte dos estudos realizados com adultos e idosos indique associação entre a prática de atividade física e o menor uso de medicamentos, alguns estudos não apontam para a mesma direção. Um estudo 2222. Bertoldi AD, Hallal PC, Barros AJD. Physical activity and medicine use: evidence from a population-based study. BMC Public Health 2006; 6:224. realizado no Sul do Brasil com mais de 3 mil indivíduos entre 20 e 98 anos analisou a associação transversal entre o nível de atividade física e o uso de medicamentos nos últimos 15 dias. Os resultados indicaram que, mesmo após ajuste para um conjunto de outras variáveis, indivíduos que não atingiram a recomendação de 150 minutos semanais de atividade física de intensidade moderada a vigorosa apresentaram chance significativamente superior de utilizarem medicamentos. Ainda, a proporção de indivíduos utilizando três ou quatro medicamentos foi significativamente superior entre aqueles que relataram zero minuto por semana de prática de atividade física.

Em outro estudo populacional realizado no Brasil 2525. Suzuki CS, Moraes SA, Freitas IC. Atividade física e fatores associados em adultos residentes em Ribeirão Preto, SP. Rev Saúde Pública 2011; 45:311-20., os autores encontraram associações significativas entre não atingir a recomendação de prática de atividade física e um maior uso de medicamentos entre os homens, tanto na análise bruta quanto na análise ajustada. Por outro lado, no estudo de Payne et al. 1717. Holstein BE, Hansen EH, Due P, Almarsdóttir AB. Self-reported medicine use among 11- to 15-year-old girls and boys in Denmark 1988-1998. Scand J Public Health 2003; 31:334-41. realizado com indivíduos canadenses com mais de 20 anos, não foi encontrada nenhuma relação entre o uso de medicamentos (com e sem prescrição) e o nível de atividade física (regular, ocasional e infrequente) para os dois sexos.

Os resultados inconsistentes sobre a associação entre nível de atividade física e uso de medicamentos encontrados em adultos também foram encontrados no presente estudo com adolescentes. Todavia, é importante destacar que, apesar de as associações entre o nível de atividade física e o uso de medicamentos não serem claras tanto em adultos quanto nos adolescentes de nosso estudo, as razões possivelmente sejam diferentes. As classes de medicamentos mais utilizadas e os motivos para o uso por esses dois grupos são distintos. Apesar de, em ambos, os analgésicos aparecerem com elevada frequência, entre os adultos, os medicamentos para o sistema cardiovascular são os mais utilizados 66. Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saúde Pública 2004; 38:228-38.,3737. Loyola Filho AI, Uchoa E, Firmo JOA, Lima-Costa MF. Estudo de base populacional sobre o consumo de medicamentos entre idosos: Projeto Bambuí. Cad Saúde Pública 2005; 21:545-53., e, entre os adolescentes, são os medicamentos para os sistemas nervoso e respiratório e os anti-inflamatórios 2828. Bertoldi AD, Tavares NUL, Hallal PC, Araújo CL, Menezes ANB. Medicine use among adolescents: the 11-year follow-up of the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. Cad Saúde Pública 2010; 26:1945-53.,3838. Silva CH, Giugliani ER. Consumo de medicamentos em adolescentes escolares: uma preocupação. J Pediatr (Rio J.) 2004; 80:326-32..

Com relação às análises prospectivas de nosso estudo, embora algumas associações significativas tenham sido encontradas entre atividade física, o tempo de tela e o uso de medicamentos aos 18 anos, de um modo geral, os resultados não permitem confirmar inequivocamente a existência de associação entre os comportamentos. Entre as associações com a atividade física (questionários), a frequência de uso de medicamentos aos 18 anos, tanto de qualquer tipo de medicamento quanto entre aqueles usados de forma contínua, diminuiu linearmente do primeiro para o terceiro tercil. Esses resultados poderiam nos levar a crer que o nível de atividade física dos 11 aos 15 anos fosse um comportamento preditor para o uso de medicamentos ao final da adolescência. No entanto, quando as análises são estratificadas por sexo, a maioria das associações deixa de ser estatisticamente significativas. Possivelmente, a modificação nos resultados seja decorrente do fato de que meninas são, ao mesmo tempo, menos ativas e usam mais medicamentos 44. Andersen A, Holsten BE, Hansen EH. Is medicine use in adolescence risk behaviour? Cross-sectional survey of school-aged children from 11 to 15. J Adolesc Health 2006; 39:362-6.,99. Bertoldi AD, Silveira MPT, Menezes ANB, Assunção MCF, Gonçalves H, Hallal PC. Tracking of medicine use and self-medication from infancy to adolescence: 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. J Adolesc Health 2012; 51(6 Suppl):S11-S5.,1919. Coll Cv, Knuth AG, Bastos JP, Hallal PC, Bertoldi AD. Time trends of physical activity among Brazilian adolescents over a 7-years period. J Adolesc Health 2014; 54:209-13.,2020. Bucksch J, Inchley J, Hamrik Z, Finne E, Kolip P; HBSC Study Group Germany. Trends in television time, non-gaming PC use and moderate-to-vigorous physical activity among German adolescents 2002-2010. BMC Public Health 2014; 14:351.,2828. Bertoldi AD, Tavares NUL, Hallal PC, Araújo CL, Menezes ANB. Medicine use among adolescents: the 11-year follow-up of the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. Cad Saúde Pública 2010; 26:1945-53..

Com relação ao tempo de tela, associações estatisticamente significativas foram encontradas apenas entre exposição aos 15 anos e uso de medicamentos aos 18 anos. Ao realizarmos as análises ajustadas, essas associações se mantêm significativas para toda a amostra e para o sexo masculino.

Os resultados das análises transversais (atividade física estimada por acelerometria), diferentemente do que foi encontrado nas análises prospectivas (atividade física estimada por questionários), indicaram que, aos 18 anos, quantidades mais altas de atividade física estão associadas a um menor uso de medicamentos, tanto nos últimos 15 dias quanto de forma contínua. Esses resultados podem estar relacionados às transformações comportamentais associadas com o ingresso na vida adulta e suas responsabilidades, tais como o ingresso no mercado de trabalho e a necessidade em auxiliar na renda familiar ou em seu próprio sustento. Essa nova realidade social que se apresenta ao final da adolescência e início da vida adulta, muitas vezes, acaba por modificar os padrões adotados de atividade física ao longo da adolescência e contribui para o aparecimento de problemas de saúde. Além disso, nessa fase da vida, também é descrito aumento na prevalência de doenças sexualmente transmissíveis, da obesidade e de uso de tabaco e álcool 3939. Centers for Disease Control and Prevention, National Center for Chronic Disease Prevention and Health Promotion, Division of Adolescent and School Health; Health Resources and Services Administration, Maternal and Child Health Bureau, Office of Adolescent Health; National Adolescent Health Information Center, University of California. Improving the health of adolescents & young adults: a guide for States and Communities. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention/National Center for Chronic Disease Prevention and Health Promotion/Division of Adolescent and School Health; 2004., que também contribuem para piora das condições de saúde e uso de medicamentos. Nesse novo panorama social, os indivíduos que conseguem manter níveis mais altos de atividade física talvez se beneficiem e desenvolvam menos queixas de saúde e, assim como em adultos e idosos fisicamente ativos 2020. Bucksch J, Inchley J, Hamrik Z, Finne E, Kolip P; HBSC Study Group Germany. Trends in television time, non-gaming PC use and moderate-to-vigorous physical activity among German adolescents 2002-2010. BMC Public Health 2014; 14:351.,2121. Neutel CI. Drug utilization patterns as indicators. Pharmacoepidemiol Drug Saf 1998; 7:131-3.,2323. Bardel A, Wallander MA, Svardsudd K. Reported current use of prescription drugs and some of its determinants among 35 to 65-year-old women in mid-Sweden: a population-based study. J Clin Epidemiol 2000; 53:637-43.,2424. Eggen AE. Pattern of drug use in a general population - prevalence and predicting factors: the Tromso study. Int J Epidemiol 1994; 23:1262-70., não façam uso de medicamentos de forma tão frequente quanto seus pares menos ativos. Uma explicação alternativa é que a medida de atividade física por acelerometria é menos suscetível a erro de classificação, aumentando a chance de identificar associações com desfechos em saúde.

Não obstante os aspetos positivos e a originalidade do estudo, algumas limitações devem ser apontadas. As análises sobre o uso de medicamentos aos 18 anos foram realizadas considerando todos os grupos de medicamentos reunidos. Análises com os grupos de medicamentos estratificados poderiam identificar associações entre o nível de atividade física e o tempo de tela com determinados grupos de medicamentos. No entanto, a realização desse procedimento em nosso estudo reduziria o tamanho amostral, comprometendo o poder estatístico. Outra limitação envolve o uso de questionários aos 11 e 15 anos e de acelerômetros aos 18 anos. Ambos disponibilizam informações sobre o nível de atividade física, porém não o medem da mesma forma. Enquanto os resultados dos questionários expressam atividades físicas no lazer e deslocamento, o acelerômetro disponibiliza informações sobre a quantidade total de atividade física durante o período de uso do equipamento. Tais diferenças ficam expostas ao analisarmos os resultados de um estudo 4040. Hallal PC, Reichert FF, Ekelund U, Dumith SC, Menezes AM, Victora CG, et al. Bidirectional cross-sectional and prospective associations between physical activity and body composition in adolescence: Birth cohort study. J Sports Sci 2012; 30:185-92. em que na mesma amostra a prevalência de indivíduos que atingiram a recomendação de atividade física semanal foi de 47% e 82% para a atividade física estimada por questionário e por acelerômetro, respectivamente.

Em conclusão, nossos resultados indicaram que o nível de atividade física e o tempo de tela no início da adolescência e na adolescência média não estão claramente associados ao uso de medicamentos aos 18 anos, embora algumas associações significativas tenham sido encontradas. Ao final da adolescência, por outro lado, níveis mais elevados de atividade física parecem estar associados à menor utilização de medicamentos para o sexo masculino. A realização de novos estudos pode trazer informações que contribuam para aprofundar a compreensão sobre essa temática durante a adolescência.

Agradecimentos

Ao PRONEM/FAPERGS/CNPq (processo no 003/2011); Wellcome Trust; União Europeia; PRONEX; CNPq e Ministério da Saúde pelo apoio financeiro.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Maio 2016

Histórico

  • Recebido
    28 Jan 2015
  • Revisado
    13 Jul 2015
  • Aceito
    27 Ago 2015
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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