Propriedades psicométricas da Satisfaction with Life Scale em adultos jovens brasileiros

Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale in young Brazilian adults

Propiedades psicométricas de la Satisfaction with Life Scale en adultos jóvenes brasileños

Bianca Nubia Souza Silva Lucas Arrais de Campos Wanderson Roberto da Silva João Marôco Juliana Alvares Duarte Bonini Campos Sobre os autores

Resumos

A Satisfaction with Life Scale (SWLS) foi proposta originalmente na língua inglesa para medir a percepção geral do indivíduo em relação à vida. O objetivo do estudo é avaliar as propriedades psicométricas da SWLS quando aplicada a indivíduos adultos jovens e estimar a influência de características demográficas na satisfação com a vida. É uma amostra não probabilística de indivíduos adultos jovens (18 a 35 anos) de ambos os sexos de Araraquara, São Paulo, Brasil. Avaliou-se o ajustamento da SWLS aos dados por análise confirmatória, utilizou-se os índices: índice de ajuste comparativo (CFI, em inglês), índice de Tucker-Lewis (TLI, em inglês) e raiz quadrada média residual padronizada (SRMR, em inglês). A confiabilidade foi estimada pelo coeficiente alfa ordinal e ômega. A invariância fatorial foi estimada por análise multigrupos, usando-se a estatística teste da diferença de CFI (ΔCFI). A comparação dos escores médios de satisfação com a vida segundo o sexo, a idade, o estrato econômico e o exercício de atividade laboral foi realizada por análise de variância (ANOVA). Participaram 2.170 indivíduos (feminino: 67,8%; idade: 22,09 anos). O ajustamento do modelo às diferentes amostras foi adequado (CFI = 0,981-0,998; TLI = 0,962-0,996; SRMR = 0,026-0,040; ômega = 0,842-0,869; alfa = 0,862-0,889). Observou-se invariância estrita para as variáveis avaliadas. Os dados obtidos com a SWLS foram válidos, confiáveis e invariante entre as amostras de diferentes sexo, idade, estrato econômico e exercício de atividade laboral. A satisfação com a vida foi maior entre os indivíduos de estrato econômico mais elevado, não diferindo segundo sexo, idade e exercício de atividade laboral.

Palavras-chave:
Adulto; Satisfação Pessoal; Psicometria


The Satisfaction with Life Scale (SWLS) was originally proposed in the English language to measure the individual’s overall perception in relation to life. The study aims to evaluate the psychometric properties of SWLS when applied to young adults and estimate the influence of demographic characteristics on life satisfaction, in a non-probabilistic sample of young adult individuals (18 to 35 years) of both sexes in Araraquara, São Paulo State, Brazil. We assessed the fit of SWLS to the data by confirmatory analysis, using the comparative fit index (CFI), Tucker-Lewis index (TLI), and standardized root mean square residual (SRMR). Reliability was estimated by the alpha ordinal coefficient and omega. Factor invariance was estimated by multigroup analysis, with CFI test of statistical difference (ΔCFI). Comparison of the mean scores on satisfaction with life according to sex, age, economic stratum, and employment status was performed with analysis of variance (ANOVA). Participation included 2,170 individuals (females: 67.8%; age: 22.09 years). The model’s fit to the different samples was adequate (CFI = 0.981-0.998; TLI = 0.962-0.996; SRMR = 0.026-0.040; omega = 0.842-0.869; alpha = 0.862-0.889). Strict invariance was seen for the target variables. Life satisfaction was greater among individuals in higher economic strata. The data obtained with SWLS were valid, reliable, and invariant between samples with different sex, age, economic strata, and employment status. Life satisfaction was greater among individuals from higher economic strata and did not differ by sex, age, or employment status.

Keywords:
Adult; Personal Satisfaction; Psychometrics


La Satisfaction with Life Scale (SWLS) se propuso originalmente en lengua inglesa para medir la percepción general del individuo en relación con la vida. El objetivo del estudio es evaluar las propiedades psicométricas de la SWLS, cuando se aplica a individuos adultos jóvenes, así como estimar la influencia de las características demográficas en la satisfacción con la vida. Se trata de una muestra no-probabilística de individuos adultos jóvenes (18 a 35 años) de ambos sexos de Araraquara, São Paulo, Brasil. Se evaluó el ajuste del SWLS a los datos por análisis confirmatorio, se utilizaron los índices: índice de ajuste compartimentado (CFI, en inglés), índice de Tucker-Lewis (TLI, en inglés) y raíz cuadrada media estandarizada residual (SRMR, en inglés). La confiabilidad se estimó por el coeficiente alfa ordinal y omega. La invariancia factorial se estimó por análisis multigrupos, utilizando la estadística test de la diferencia de CFI (ΔCFI). La comparación de las puntuaciones medias de satisfacción con la vida según: sexo, edad, estrato económico y ejercicio de actividad laboral, se realizó mediante el análisis de variancia (ANOVA). Participaron 2.170 individuos (sexo femenino: 67,8%; edad: 22,09 años). El ajuste del modelo a las diferentes muestras fue adecuado (CFI = 0,981-0,998; TLI = 0,962-0,996; SRMR = 0,026-0,040; omega = 0,842-0,869; alfa = 0,862-0,889). Se observó invariancia estricta para las variables evaluadas. La satisfacción con la vida fue mayor entre los individuos de mayor estrato económico. Los datos obtenidos con la SWLS fueron válidos, confiables e invariantes entre muestras de diferentes sexo, edad, estrato económico y ejercicio de actividad laboral. La satisfacción con la vida fue mayor entre individuos de estrato económico más elevado, no difiriendo según sexo, edad y ejercicio de actividad laboral.

Palabras-clave:
Adulto; Satisfacción Personal; Psicometría


Introdução

Nas últimas décadas, a experiência subjetiva tem sido estudada por meio de diversos construtos, entre eles pode-se citar o bem-estar subjetivo 11. Machado L. Bem-estar subjetivo: implicações para psiquiatria e para a psicologia médica. Rio de Janeiro: Medbook; 2017.. O bem-estar subjetivo se refere à avaliação da vida realizada pelo indivíduo com base em seu próprio conjunto de critérios 22. Pavot W, Diener E. The satisfaction with life scale and the emerging construct of life satisfaction. J Posit Psychol 2008; 3:137-52.. Esse construto é formado por um componente afetivo relacionado com a felicidade e um componente cognitivo inerente à satisfação com a vida 33. Diener E. New findings and future directions for subjective well-being research. Am Psychol 2012; 67:590-7.. O componente afetivo envolve as experiências de emoções, sejam elas prazerosas (afetos positivos) ou não (afetos negativos) 44. Lyubomirsky S, King LA, Diener E. The benefits of frequent positive affect: does happiness lead to success? Psychol Bull 2005; 131:803-55.. Já o componente cognitivo é o julgamento de como a pessoa avalia a sua própria vida, levando em consideração a vida como um todo ou componentes específicos da mesma 33. Diener E. New findings and future directions for subjective well-being research. Am Psychol 2012; 67:590-7.. A satisfação com a vida é um produto cognitivo, diante disto, não se pode dizer que ela é uma experiência direta e verificável, nem um fato pessoal conhecido, ela envolve uma comparação entre a situação vivida atualmente pelo indivíduo e os padrões internalizados 33. Diener E. New findings and future directions for subjective well-being research. Am Psychol 2012; 67:590-7..

Os principais modelos do bem-estar são apresentados em dois diferentes modelos teóricos denominados bottom-up e top-down. Nas teorias top-down, investiga-se de que forma os fatores internos ou intrínsecos, tais como os valores pessoais, podem influenciar no bem-estar do indivíduo e parte do pressuposto de que as pessoas possuem uma predisposição para interpretar as experiências da própria vida de forma positiva e negativa. Já para os modelos de bottom-up levam-se em consideração como os processos externos, por exemplo, as situações de vida e as variáveis demográficas, podem influenciar no bem-estar 55. Luhmann M, Hofmann W, Eid M, Lucas RE. Subjective well-being and adaptation to life events: a meta-analysis. J Pers Soc Psychol 2012; 102:592-615..

Nos últimos anos, a preocupação em mensurar o bem-estar subjetivo de indivíduos e populações tem aumentado, contudo, como este trata de um conceito latente (não mensurável diretamente - construto) sua medida ainda representa um desafio 11. Machado L. Bem-estar subjetivo: implicações para psiquiatria e para a psicologia médica. Rio de Janeiro: Medbook; 2017.. Para realizar a avaliação desse construto alguns instrumentos são apresentados na literatura, tais como a Subjective Happines Scale (SHS), Escala de Bem-Estar Subjetivo (EBES), a Satisfaction with Life Scale (SWLS), a Oxford Happines Inventory (OHI), a Positive and Negative Affect Schedule-Expanded (PANAS-X) 22. Pavot W, Diener E. The satisfaction with life scale and the emerging construct of life satisfaction. J Posit Psychol 2008; 3:137-52.,33. Diener E. New findings and future directions for subjective well-being research. Am Psychol 2012; 67:590-7.,44. Lyubomirsky S, King LA, Diener E. The benefits of frequent positive affect: does happiness lead to success? Psychol Bull 2005; 131:803-55., entre outros. Esses são instrumentos denominados psicométricos, ou seja, construídos com base em métodos padronizados com a finalidade de medir conceitos abstratos, não mensurados diretamente (como, por exemplo, afetos, comportamentos e percepções) 66. Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014.. Porém, é importante destacar que a escolha do instrumento para a avaliação do bem-estar subjetivo deve estar elencada no contexto de aplicação e na adequação do instrumento escolhido para amostra nos diferentes contextos 77. Silva WR, Dias JCR, Pimenta F, Campos JADB. Assessment of the body shape concern: a challenge. Psychology, Community & Health 2014; 3:103-19..

Uma das primeiras escalas confeccionadas para avaliar o bem-estar subjetivo em indivíduos adultos foi a SWLS 88. Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with life scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5.. A SWLS foi desenvolvida por Diener et al. 88. Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with life scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5. e tem sido muito utilizada, principalmente, por ser uma escala de fácil preenchimento e ter se mostrado válida e confiável em diferentes amostras e contextos 99. Emerson SD, Guhn M, Gadermann AM. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale: reviewing three decades of research. Qual Life Res 2017; 26:2251-64.,1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.,1111. Diener E. The remarkable changes in the science of subjective well-being. Perspect Psychol Sci 2013; 8:663-6.. O instrumento foi traduzido em diferentes idiomas: francês 1212. Blais MR, Vallerand RJ, Pelletier LG, Brière NM. L'échelle de satisfaction de vie: validation canadienne-française du 'Satisfaction with Life Scale'. Can J Behav Sci 1989; 21:210., espanhol 1313. Pons D, Atienza FL, Balaguer I, García-Merita ML. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance for adolescents and elderly persons. Percept Mot Skills 2000; 91:62-8., holandês 1414. Arrindell WA, Heesink J, Feij JA. The Satisfaction with Life Scale (SWLS): appraisal with 1700 healthy young adults in the Netherlands. Pers Individ Dif 1999; 26:815-26., chinês 1515. Sachs J. Validation of the satisfaction with life scale in a sample of Hong Kong university students. Psychologia 2003; 46:225-34., hebraico 1616. Anaby D, Jarus T, Zumbo BD. Psychometric evaluation of the Hebrew language version of the Satisfaction with Life Scale. Soc Indic Res 2010; 96:267-74., português 1717. Gouveia VV, Milfont TL, Fonseca PN, Coelho JAPM. Life satisfaction in Brazil: testing the psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) in five Brazilian samples. Soc Indic Res 2009; 90:267-77., alemão 1818. Glaesmer H, Grande G, Braehler E, Roth M. The German version of the Satisfaction with Life Scale (SWLS). Eur J Psychol Assess 2011; 27:127-32. e foi empregado em diferentes populações 99. Emerson SD, Guhn M, Gadermann AM. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale: reviewing three decades of research. Qual Life Res 2017; 26:2251-64.,1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.,1919. Tomás J, Gutiérrez M, Sancho P, Romero I. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) by gender and age in Angola. Pers Indiv Dif 2015; 85:182-6. e em diferentes culturas e nações 22. Pavot W, Diener E. The satisfaction with life scale and the emerging construct of life satisfaction. J Posit Psychol 2008; 3:137-52.,1919. Tomás J, Gutiérrez M, Sancho P, Romero I. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) by gender and age in Angola. Pers Indiv Dif 2015; 85:182-6..

A partir da aplicação da SWLS em diferentes contextos, a literatura tem destacado a influência das características demográficas na satisfação com a vida dos indivíduos 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.. Alguns estudos apontam relação significativa entre a satisfação com a vida e a idade, o sexo 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70., o estrato econômico 2020. Yun YH, Rhee YE, Kang E, Sim JA. The Satisfaction with Life Scale and the Subjective Well-Being Inventory in the general Korean population: psychometric properties and normative data. Int J Environ Res Public Health 2019; 16:1538. e o trabalho 2121. Vazquez C, Duque A, Hervas G. Satisfaction with Life Scale in a representative sample of Spanish adults: validation and normative data. Span J Psychol 2013; 16:E82.. Em relação à idade, alguns autores observaram que as pessoas mais jovens apresentaram uma posição mais positiva em relação ao bem-estar 2222. Lehmann BA, Bos A, Rijken M, Cardol M, Peters GJ, Kok G, et al. Ageing with an intellectual disability: the impact of personal resources on well-being. J Intellect Disabil Res 2013; 57:1068-78., o mesmo ocorre entre as mulheres 2323. Graham C, Chattopadhyay S. Gender and well-being around the world. International Journal of Happiness and Development 2013; 1:212-32.. Contudo, essa relação não é consensual, Glaesmer et al. 1818. Glaesmer H, Grande G, Braehler E, Roth M. The German version of the Satisfaction with Life Scale (SWLS). Eur J Psychol Assess 2011; 27:127-32. e Vazquez et al. 2121. Vazquez C, Duque A, Hervas G. Satisfaction with Life Scale in a representative sample of Spanish adults: validation and normative data. Span J Psychol 2013; 16:E82. mostraram que nem a idade nem o sexo estavam significativamente associados ao bem-estar em uma amostra representativa de indivíduo adultos da Alemanha e Espanha, respectivamente. Com relação às condições socioeconômicas, Vazquez et al. 2121. Vazquez C, Duque A, Hervas G. Satisfaction with Life Scale in a representative sample of Spanish adults: validation and normative data. Span J Psychol 2013; 16:E82. enfatizaram que as pessoas empregadas relataram uma melhor satisfação com a vida em comparação com as desempregadas.

Visto que a SWLS é um instrumento passível de mensuração de parâmetros psicométricos, é imprescindível avaliar a validade e confiabilidade dos dados recolhidos com o mesmo quando aplicado a uma determinada amostra, pois apenas desta maneira é possível garantir a qualidade da medida que está sendo apresentada 66. Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014.. Embora estudos tenham mostrado as propriedades psicométricas da SWLS quando aplicada a indivíduos adultos de diferentes contextos 22. Pavot W, Diener E. The satisfaction with life scale and the emerging construct of life satisfaction. J Posit Psychol 2008; 3:137-52.,1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70., poucas pesquisas avaliaram como o instrumento mede a satisfação com a vida em diferentes subgrupos. Frente ao exposto, este estudo tem como objetivo avaliar as propriedades psicométricas da SWLS quando aplicada a indivíduos adultos jovens e estimar a influência de características demográficas na satisfação com a vida.

Métodos

Delineamento de estudo e aspectos éticos

Trata-se de um estudo observacional do tipo transversal, com amostragem não probabilística delineada por conveniência. O cálculo do tamanho amostral mínimo foi realizado considerando-se a necessidade de dez respondentes por parâmetro a ser estimado no modelo final 2424. Hair JF, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Multivariate data analysis: a global perspective. Upper Saddle River: Prentice Hall; 2009., para que as abordagens analíticas possam ser adequadamente realizadas. Levando-se em conta que a SWLS apresenta dez parâmetros a serem estimados, o tamanho mínimo de amostra deverá ser de 100 sujeitos por subgrupo de estudo. Ainda, considerando-se uma taxa de perda de 20%, esse valor deverá ser de 125 sujeitos. Contudo, dado que o objetivo do trabalho foi estudar as propriedades psicométricas da SWLS para a população de adultos jovens, a amostra deve ser suficientemente grande para capturar de forma conveniente a variabilidade populacional. Por esse motivo, optou-se por trabalhar com uma amostra da população de tamanho mais alargado, muito superior às recomendações usuais para a realização dos testes estatísticos 2525. Campos JADB, Marôco J. Maslach Burnout inventory-student survey: Portugal-Brazil cross-cultural adaptation. Rev Saúde Pública 2012; 46:816-24..

A amostra foi composta por indivíduos adultos jovens (18 a 35 anos), brasileiros da comunidade de Araraquara, São Paulo, Brasil (amostra normativa), de ambos os sexos. Como critérios de exclusão foram adotados o fato de ser gestante, lactante ou portador de deficiência visual grave que comprometa a leitura dos instrumentos de coleta de dados. Cabe esclarecer que a escolha por trabalhar com indivíduos adultos jovens foi feita pelo fato destes estarem inseridos numa etapa da vida sustentada por anseios e expectativas de construção de suas identidades pessoais e profissionais, assumindo diferentes papéis e responsabilidades, o que torna a avaliação da satisfação com a vida uma oportunidade para entender este processo, pois é nesta fase que os compromissos do papel do adulto gradualmente se cristalizam 2626. Papaila DE, Feldman RD. Desenvolvimento físico e cognitivo no início da vida adulta e no adulto jovem. In: Papaila DE, Feldman RD, organizadores. Desenvolvimento humano. 12ª Ed. Porto Alegre: AMGH Editora; 2013. p. 450-81.. Para a composição da amostra, inicialmente, os indivíduos foram recrutados na Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho (UNESP) entre os estudantes, funcionários técnico-administrativos e docentes. Em seguida, esses indicaram novos participantes, adotando-se, portanto, o processo de amostragem em bola de neve.

A pesquisa foi divulgada entre os funcionários, estudantes e professores da UNESP (campus de Araraquara) por meio de diferentes meios de comunicação (e-mails, convites pessoais, rede social, entre outros). O instrumento foi aplicado em formato de papel e foi preenchido pelos participantes, de forma individual, em sala reservada para este fim. Foram convidados a participar 3.063 indivíduos, destes, 8% não aceitaram o convite. Dos 2.818 que aderiram ao estudo, 23% desistiram durante o preenchimento dos instrumentos. Assim, a amostra final foi composta por 2.170 indivíduos.

Apenas os participantes que assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram incluídos na amostra de estudo. O desenvolvimento deste projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Faculdade de Odontologia de Araraquara (UNESP) (C.A.A.E 88600318.3.0000.5416). Os dados foram apresentados sequencialmente, de acordo com a declaração Fortalecendo a Comunicação de Estudos Observacionais em Epidemiologia (STROBE) 2727. von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP, et al. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. J Clin Epidemiol 2008; 61:344-9..

Caracterização da amostra e variáveis de estudo

Para a caracterização da amostra foram levantadas informações como sexo, idade, estado civil, trabalho e o estrato econômico dos participantes. Esse estrato foi estimado utilizando-se o Critério Brasil (ABEP) 2828. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica Brasil 2018. São Paulo: Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa; 2018.. A satisfação com a vida foi estimada usando-se a SWLS descrita a seguir.

Instrumento de medida

A SWLS foi proposta originalmente na língua inglesa para avaliar a satisfação geral com a própria vida 2929. Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with Life Scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5.. A escala é unifatorial, composta por cinco itens cujas respostas estão dispostas em escala Likert de 7 pontos (1: discordo totalmente a 7: concordo totalmente). Neste estudo, foi utilizada a versão em português proposta por Gouveia et al. 1717. Gouveia VV, Milfont TL, Fonseca PN, Coelho JAPM. Life satisfaction in Brazil: testing the psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) in five Brazilian samples. Soc Indic Res 2009; 90:267-77.. Os cinco itens de avaliação global são: (1) na maioria dos aspectos, minha vida é próxima ao meu ideal; (2) as condições da minha vida são excelentes; (3) estou satisfeito com minha vida; (4) dentro do possível, tenho conseguido as coisas importantes que quero da vida; e (5) se pudesse viver uma segunda vez não mudaria quase nada na minha vida.

Análise dos indicadores psicométricos

As medidas resumo (média, mediana e desvio padrão - DP) e de forma da distribuição (assimetria e curtose) foram estimadas com o intuito de verificar a distribuição das respostas dos participantes dadas aos itens do instrumento. Valores absolutos de assimetria e curtose acima de 3 e 7, respectivamente, foram considerados fortes desvios da normalidade 66. Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014.,3030. Finney SJ, DiStefano C. Non-normal and categorical data in structural equation modeling. In: Hancock GR, Mueller RO, editors. Structural equation modeling: a second course. 2nd Ed. Charlotte: Information Age Publishing; 2006. p. 439-92..

Validade de construto

Para a avaliação dos indicadores de validade e confiabilidade, a amostra total foi aleatoriamente subdividida em duas partes, sendo denominadas “Amostra Teste” e “Amostra de Validação”, e as propriedades psicométricas da SWLS foram avaliadas para as duas amostras separadamente.

Para a verificação do ajustamento do modelo teórico proposto para o instrumento, à amostra de estudo foi realizada a análise fatorial confirmatória (AFC). Foi utilizado o método de estimação média ponderada dos mínimos quadrados e variação ajustada (WLSMV, em inglês). Como índices de avaliação da qualidade do ajustamento do modelo aos dados foram usados o índice de ajuste comparativo (CFI, em inglês), o índice de Tucker-Lewis (TLI, em inglês) e o raiz quadrada média residual padronizada (SRMR, em inglês). O ajustamento foi considerado aceitável quando χ2/gl ≤ 5,0; CFI e TLI ≥ 0,90; e SRMR < 0,08 66. Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014.. O peso fatorial (λ) ≥ 0,50 foi considerado adequado. Quando o ajustamento do modelo não foi aceitável, foram calculados os índices de modificação usando-se o método dos multiplicadores de Lagrange (ML). Valores de ML > 11 foram inspecionados.

A validade convergente foi avaliada com base na variância extraída média (VEM) 66. Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014.. A VEM foi estimada utilizando-se a proposta de Fornell & Larcker 3131. Fornell C, Larcker DF. Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research 1981; 18:39-50. e foi considerada adequada se ≥ 0,50.

As análises foram realizadas com os pacotes lavaan e semTools no programa R (http://www.r-project.org).

Invariância fatorial

Para avaliar se a proposta fatorial obtida se mantém nas amostras independentes (teste x validação), foi realizada a avaliação da invariância fatorial por meio da análise multigrupos. Foi utilizada a estatística teste da diferença de CFI (ΔCFI) para a comparação dos pesos fatoriais (λ), limiares (t) e variância/covariância dos resíduos (Cov/Res). Foram considerados os valores de CFI dos modelos configuracional (M0), do modelo dos pesos fatoriais (M1), do modelo dos thresholds (M2) e do modelo dos resíduos (M3). Atestou-se invariância quando a redução do CFI (ΔCFI) foi inferior a 0,01 3232. Cheung GW, Rensvold RB. Evaluating goodness-of-fit indexes for testing measurement invariance. Struct Equ Modeling 2002; 9:233-55.. O mesmo procedimento foi adotado para a avaliação da invariância entre as subamostras agrupadas segundo as características demográficas idade, sexo, exercício de atividade laboral e nível econômico.

Confiabilidade

A confiabilidade foi avaliada usando-se as métricas de consistência interna coeficiente alfa ordinal (α) e coeficiente ômega (ω) calculadas com o pacote semTools do programa R. Os valores α e ω ≥ 0,7 foram indicadores de consistência interna satisfatória 66. Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014..

Comparação dos escores de satisfação com a vida

Os escores de satisfação com a vida foram calculados usando-se a média aritmética das respostas dadas aos itens do modelo da SWLS ajustado aos dados. Para a separação dos subgrupos foram consideradas as características sexo (masculino; feminino), idade (< 25 anos; ≥ 25 anos), exercício de atividade laboral (não; sim) e estrato econômico [baixo: estratos C (R$ 2.165,00), D e E (R$ 768,00); alto: estratos A (R$ 20.888,00) e B (R$ 7.053,00)], estes valores são referentes à renda média domiciliar apresentada para os estratos do Critério Brasil 2828. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica Brasil 2018. São Paulo: Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa; 2018.. Cabe esclarecer que a definição do ponto de corte para a idade foi realizada após a avaliação da característica dos participantes da amostra de estudo. Como houve predominância de indivíduos em fase universitária, optou-se por trabalhar com o percentil 75 das idades na amostra, que representa exatamente a idade de finalização dos estudantes universitários (24 anos). Assim, considerou-se os grupos: < 25 anos e ≥ 25 anos.

Após a verificação e a apresentação de evidências que sustentam a existência de invariância forte da SWLS, procedeu-se a comparação entre os escores de satisfação com a vida nessas amostras. Foi utilizada a análise de variância (ANOVA) e o tamanho do efeito foi estimado a partir do η2 p. Os pressupostos de normalidade e homocedasticidade foram testados e confirmados em todos os subgrupos (assimetria < 3, curtose < 7, teste de Levene: p > 0,05). As comparações múltiplas foram realizadas usando-se o pós-teste de Tukey. O nível de significância adotado foi de 5%.

Resultados

A amostra foi constituída por 2.170 adultos, sendo a maioria do sexo feminino (67,9%). A média de idade foi de 22,09 anos (DP = 3,74 anos) (78,9% < 25 anos e 21,1% ≥ 25 anos). Dos participantes, 69,6% relataram não exercer atividade laboral. Com relação ao nível econômico, 16,6% pertenciam ao estrato A, 46,5% ao B, 36,5% ao C e 0,4% aos estratos D e E. Cabe esclarecer que nem todos os participantes responderam a todas as informações demográficas (6,4% não responderam à ABEP e, portanto, o nível econômico não pôde ser estimado; 2,5% não responderam se trabalham ou não e apenas uma pessoa não identificou o sexo). Essa ausência de informação não impactou nas análises realizadas.

As medidas resumo das respostas dadas para cada um dos itens são apresentadas na Tabela 1. Nenhum item da SWLS mostrou valor absoluto de assimetria e curtose indicativo de fortes desvios à distribuição normal.

Tabela 1
Estatística descritiva das respostas dadas aos itens da Satisfaction with Life Scale (SWLS) pelos participantes.

Na Tabela 2, apresentamos os indicadores psicométricos da SWLS ajustada às diferentes subamostras.

Tabela 2
Indicadores psicométricos da Satisfaction with Life Scale (SWLS) para a amostra.

O ajustamento do modelo e a confiabilidade foram adequados para todas as subamostras. Observou-se invariância estrita (forte) entre os modelos para todas as características avaliadas, apontando que a SWLS operacionaliza o conceito satisfação com a vida da mesma maneira nos diferentes subgrupos abrindo, portanto, a possibilidade de comparações entre os mesmos.

Na Tabela 3, mostramos a comparação dos escores médios de satisfação com a vida de acordo com o sexo, a idade, o exercício de atividade laboral e o estrato econômico.

Tabela 3
Comparação dos escores médios de satisfação com a vida de acordo com o sexo, a idade, o exercício de atividade laboral (trabalho) e o estrato econômico.

Observou-se diferença significativa na satisfação com a vida entre os diferentes estratos econômicos (p < 0,001), sendo que os indivíduos com os maiores estratos apresentaram os maiores escores de satisfação. Essa diferença foi consequência da resposta dada ao item 2 da SWLS (Figura 1).

Figura 1
Comparação dos escores médios das respostas dadas aos itens da Satisfaction With Life Scale (SWLS) pelos participantes dos diferentes estratos econômicos.

Discussão

O presente estudo confirmou a validade e a confiabilidade dos dados para a avaliação do bem-estar subjetivo em adultos. O ajustamento adequado da SWLS aos dados corrobora os resultados apresentados para amostras em diferentes contextos na literatura 2929. Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with Life Scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5.,3333. Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17..

A SWLS é um dos instrumentos mais utilizados no mundo para medir o bem-estar subjetivo 3333. Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17.. Embora os estudos científicos tenham apresentado evidências para o uso da SWLS e mostrado boas propriedades psicométricas, incluindo validade e confiabilidade 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.,2929. Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with Life Scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5.,3333. Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17., ainda existem questões importantes que precisam ser abordadas. Uma questão diz respeito à invariância da escala, que embora muitas evidências apoiem o uso em adultos em geral 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.,3333. Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17., poucas pesquisas avaliaram como o instrumento mede a satisfação com a vida em subgrupos 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.,3434. Atienza FL, Balaguer I, Garci´a-Merita ML. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance across sexes. Pers Individ Dif 2003; 35:1255-60.,3535. Zweig JS. Are women happier than men? Evidence from the Gallup World Poll. J Happiness Stud 2015; 16:515-41..

As conclusões relativas à invariância são inconsistentes na literatura, alguns estudos relataram que a SWLS apresenta operacionalização distinta entre os sexos 3434. Atienza FL, Balaguer I, Garci´a-Merita ML. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance across sexes. Pers Individ Dif 2003; 35:1255-60. e as idades 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70., e outro relatou que a escala é invariante nestas condições 3535. Zweig JS. Are women happier than men? Evidence from the Gallup World Poll. J Happiness Stud 2015; 16:515-41.. A falta de invariância apresentada nesses estudos pode ser explicada muitas vezes pelo tamanho inadequado e/ou a composição da amostra 3333. Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17.. Neste estudo, observou-se invariância de medida estrita da SWLS nas diferentes amostras testadas.

A avaliação das diferenças existentes na satisfação com a vida entre indivíduos de diferentes sexos tem sido de grande interesse. Assim, evidências relacionadas à invariância entre os sexos da SWLS torna-se relevante como pressuposto para a utilização do instrumento em ambos os sexos e para viabilizar a realização de comparações diretas entre os sexos. A invariância da SWLS entre os sexos tem sido testada 3434. Atienza FL, Balaguer I, Garci´a-Merita ML. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance across sexes. Pers Individ Dif 2003; 35:1255-60.,3636. Shevlin M, Brunsden V, Miles J. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance, mean structures and reliability. Pers Individ Dif 1998; 25:911-6., contudo, poucos estudos 1919. Tomás J, Gutiérrez M, Sancho P, Romero I. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) by gender and age in Angola. Pers Indiv Dif 2015; 85:182-6.,3333. Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17.,3636. Shevlin M, Brunsden V, Miles J. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance, mean structures and reliability. Pers Individ Dif 1998; 25:911-6. avaliaram ou atestaram a invariância estrita da SWLS. As evidências apresentadas pelo presente estudo corroboram os resultados apresentados por Bai et al. 3737. Bai X, Wu C, Zheng R, Ren X. The psychometric evaluation of the Satisfaction with Life Scale using a nationally representative sample of China. J Happiness Stud 2011; 12:183-97. e por Tomás et al. 1919. Tomás J, Gutiérrez M, Sancho P, Romero I. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) by gender and age in Angola. Pers Indiv Dif 2015; 85:182-6., que verificaram invariância estrita da SWLS quando aplicada a homens e mulheres em uma amostra de adultos chineses e angolanos, respectivamente. É importante enfatizar a necessidade de condução do processo de validação dos instrumentos utilizados para a mensuração de parâmetros psicométricos e avaliação da invariância entre grupos sempre que apresentar alterações das características amostrais, visto que a validade e a confiabilidade são propriedades dos dados obtidos e não do instrumento por si só 3838. Silva WR, Dias JCR, Marôco J, Campos JADB. Confirmatory factor analysis of different versions of the Body Shape Questionnaire applied to Brazilian university students. Body Image 2014; 11:384-90. e que as comparações entre os grupos só podem ser realizadas se a invariância for confirmada 3939. Millsap RE, Yun-Tein J. Assessing factorial invariance in ordered-categorical measures. Multivariate Behav Res 2004; 39:479-515..

Além da invariância estrita entre os sexos, observou-se invariância estrita para a idade o que já havia sido relatado apenas por Tomás et al. 1919. Tomás J, Gutiérrez M, Sancho P, Romero I. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) by gender and age in Angola. Pers Indiv Dif 2015; 85:182-6.. Com relação à invariância estrita da SWLS entre amostras de diferentes estratos econômicos e exercício de atividade laboral verificada, estas evidências podem ser consideradas um diferencial deste estudo, uma vez que não foram encontrados trabalhos que realizaram estas avaliações. Diante disso, os resultados encontrados contribuem com a ampliação do conhecimento das possibilidades de utilização da SWLS. Considerando que esse é um instrumento curto, de fácil aplicação ou preenchimento em estudos epidemiológicos e clínicos, e que operacionaliza o conceito satisfação com a vida de forma equivalente em subgrupos distintos, abre-se a possibilidade de utilização do mesmo para o rastreamento desta condição em grupos com diferentes características.

Com relação à comparação dos escores médios de satisfação com a vida, não foi verificada diferença entre os indivíduos das duas faixas etárias estudadas. Hinz et al. 1010. Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70., por sua vez, encontraram diferenças na satisfação com a vida de indivíduos de 50 a 59 anos e os mais jovens, sendo que os primeiros estavam mais insatisfeitos. Desse modo, sugerimos que sejam realizados estudos futuros que possam incluir indivíduos de diferentes fases de desenvolvimento.

Com relação ao exercício de atividade laboral, os resultados encontrados vão ao encontro dos apresentados por Vazquez et al. 2121. Vazquez C, Duque A, Hervas G. Satisfaction with Life Scale in a representative sample of Spanish adults: validation and normative data. Span J Psychol 2013; 16:E82. que verificaram, em amostra espanhola, uma melhor satisfação com a vida entre as pessoas que relataram trabalhar. Pode-se especular que isso esteja relacionado ao fato de incluirmos em nossa amostra apenas adultos jovens com o predomínio de indivíduos que relataram não exercer atividade laboral, o que pode ter minimizado a variabilidade dos dados.

Em relação ao estrato econômico, os resultados sugerem que a renda tem uma relação positiva e significativa com a satisfação com a vida. Esses achados são consistentes com os estudos anteriores 1111. Diener E. The remarkable changes in the science of subjective well-being. Perspect Psychol Sci 2013; 8:663-6.,2020. Yun YH, Rhee YE, Kang E, Sim JA. The Satisfaction with Life Scale and the Subjective Well-Being Inventory in the general Korean population: psychometric properties and normative data. Int J Environ Res Public Health 2019; 16:1538.. Apesar disso, a relação entre a renda e a satisfação com a vida deve ser interpretada com cautela, visto que a literatura apresenta uma inconsistência nos achados e aponta que condições culturais e sociais também devem ser consideradas 11. Machado L. Bem-estar subjetivo: implicações para psiquiatria e para a psicologia médica. Rio de Janeiro: Medbook; 2017.. Um aspecto que tem sido relatado como interferente no bem-estar é a presença da desigualdade social nos países; a literatura mostra que pessoas que vivem em países com muita desigualdade social tendem a se sentir mais insatisfeitas 4040. Diener E, Biswas-Diener R. Will money increase subjective well-being? Soc Indic Res 2002; 57:119-69.,4141. Suh EM, Oishi S. Subjective well-being across cultures. Online Readings in Psychology and Culture 2002; 10. https://scholarworks.gvsu.edu/orpc/vol10/iss1/1/.
https://scholarworks.gvsu.edu/orpc/vol10...
,4242. Oshio T, Kobayashi M. Income inequality, perceived happiness, and self-rated health: evidence from nationwide surveys in Japan. Soc Sci Med 2010; 70:1358-66.. Diener & Seligman 4343. Diener E, Seligman ME. Beyond money: toward an economy of well-being. Psychol Sci Public Interest 2004; 5:1-31. relataram que a condição financeira é mais importante para os indivíduos que vivem em países pobres, e que o aumento do salário em países ricos como os da Europa e os Estados Unidos não gerou aumento no bem-estar geral dos indivíduos. Para os autores, isso pode ocorrer porque pessoas felizes tendem a concentrar seus ideais em outros objetivos sociais e morais e não somente na condição financeira. Com isso, estudiosos sugerem que o dinheiro é um preditor de bem-estar e satisfação com a vida apenas em países pobres 4040. Diener E, Biswas-Diener R. Will money increase subjective well-being? Soc Indic Res 2002; 57:119-69.,4141. Suh EM, Oishi S. Subjective well-being across cultures. Online Readings in Psychology and Culture 2002; 10. https://scholarworks.gvsu.edu/orpc/vol10/iss1/1/.
https://scholarworks.gvsu.edu/orpc/vol10...
. Esse fato pode ser observado na Figura 1, em que fica claro que em nossa amostra a satisfação com a vida esteve longe do ideal (valor máximo da escala), destacando a diferença significativa dos escores médios observados para o item 2 (“as condições da minha vida são excelentes”) entre os participantes com diferentes níveis econômicos. Pode-se especular que dentro da nossa realidade a interpretação sobre as condições de vida podem ter sido remetidas a condições relacionadas ao conforto e sustento, o que por sua vez depende do estrato econômico do indivíduo. Por esse motivo, esse item apresentou maior capacidade discriminante em relação ao nível econômico do que os demais. Assim, a realização de estudos transnacionais futuros, envolvendo países com diferentes níveis de desenvolvimento, poderá ser interessante no sentido de agregar informações para esta discussão.

Como limitações deste trabalho, pode-se citar o seu desenho de estudo transversal que inviabiliza o estabelecimento de relações de causa e efeito entre as variáveis investigadas, o delineamento amostral não probabilístico que pode limitar a validade externa dos dados para outras amostras e a alta prevalência de estudantes universitários na amostra, o que resultou na apresentação de dados referentes a indivíduos mais jovens (75% < 25 anos). Destaca-se ainda que essa última limitação também causou impacto na característica do nível econômico da amostra, uma vez que, no Brasil, o acesso à universidade ainda é predominantemente das classes de maior poder econômico. Apesar dessas limitações, espera-se que este estudo possa contribuir com profissionais e pesquisadores de diferentes áreas, para o entendimento da satisfação com a vida de indivíduos adultos jovens com diferentes características, permitindo a realização de discussões e reflexões que possam sustentar a elaboração de ações educativas, preventivas e de intervenção voltadas à melhoria da vida das pessoas.

Conclusão

Os dados obtidos com a SWLS para a amostra de indivíduos adultos foram válidos e confiáveis. Observou-se invariância estrita da SWLS entre as amostras de diferentes sexos, idades, estratos econômicos e exercício de atividade laboral. A satisfação com a vida foi maior entre indivíduos de estrato econômico mais elevado, não diferindo segundo sexo, idade e exercício de atividade laboral.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES; código de financiamento 001) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP; processos #2017/20315-7, #2018/06739-1, #2019/17200-9 e #2019/24424-0).

Referências

  • 1
    Machado L. Bem-estar subjetivo: implicações para psiquiatria e para a psicologia médica. Rio de Janeiro: Medbook; 2017.
  • 2
    Pavot W, Diener E. The satisfaction with life scale and the emerging construct of life satisfaction. J Posit Psychol 2008; 3:137-52.
  • 3
    Diener E. New findings and future directions for subjective well-being research. Am Psychol 2012; 67:590-7.
  • 4
    Lyubomirsky S, King LA, Diener E. The benefits of frequent positive affect: does happiness lead to success? Psychol Bull 2005; 131:803-55.
  • 5
    Luhmann M, Hofmann W, Eid M, Lucas RE. Subjective well-being and adaptation to life events: a meta-analysis. J Pers Soc Psychol 2012; 102:592-615.
  • 6
    Marôco J. Análise de equações estruturais: fundamentos teóricos, software & aplicações. 2ª Ed. Pêro Pinheiro: ReportNumber; 2014.
  • 7
    Silva WR, Dias JCR, Pimenta F, Campos JADB. Assessment of the body shape concern: a challenge. Psychology, Community & Health 2014; 3:103-19.
  • 8
    Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with life scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5.
  • 9
    Emerson SD, Guhn M, Gadermann AM. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale: reviewing three decades of research. Qual Life Res 2017; 26:2251-64.
  • 10
    Hinz A, Conrad I, Schroeter ML, Glaesmer H, Brähler E, Zenger M, et al. Psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS), derived from a large German community sample. Qual Life Res 2018; 27:1661-70.
  • 11
    Diener E. The remarkable changes in the science of subjective well-being. Perspect Psychol Sci 2013; 8:663-6.
  • 12
    Blais MR, Vallerand RJ, Pelletier LG, Brière NM. L'échelle de satisfaction de vie: validation canadienne-française du 'Satisfaction with Life Scale'. Can J Behav Sci 1989; 21:210.
  • 13
    Pons D, Atienza FL, Balaguer I, García-Merita ML. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance for adolescents and elderly persons. Percept Mot Skills 2000; 91:62-8.
  • 14
    Arrindell WA, Heesink J, Feij JA. The Satisfaction with Life Scale (SWLS): appraisal with 1700 healthy young adults in the Netherlands. Pers Individ Dif 1999; 26:815-26.
  • 15
    Sachs J. Validation of the satisfaction with life scale in a sample of Hong Kong university students. Psychologia 2003; 46:225-34.
  • 16
    Anaby D, Jarus T, Zumbo BD. Psychometric evaluation of the Hebrew language version of the Satisfaction with Life Scale. Soc Indic Res 2010; 96:267-74.
  • 17
    Gouveia VV, Milfont TL, Fonseca PN, Coelho JAPM. Life satisfaction in Brazil: testing the psychometric properties of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) in five Brazilian samples. Soc Indic Res 2009; 90:267-77.
  • 18
    Glaesmer H, Grande G, Braehler E, Roth M. The German version of the Satisfaction with Life Scale (SWLS). Eur J Psychol Assess 2011; 27:127-32.
  • 19
    Tomás J, Gutiérrez M, Sancho P, Romero I. Measurement invariance of the Satisfaction with Life Scale (SWLS) by gender and age in Angola. Pers Indiv Dif 2015; 85:182-6.
  • 20
    Yun YH, Rhee YE, Kang E, Sim JA. The Satisfaction with Life Scale and the Subjective Well-Being Inventory in the general Korean population: psychometric properties and normative data. Int J Environ Res Public Health 2019; 16:1538.
  • 21
    Vazquez C, Duque A, Hervas G. Satisfaction with Life Scale in a representative sample of Spanish adults: validation and normative data. Span J Psychol 2013; 16:E82.
  • 22
    Lehmann BA, Bos A, Rijken M, Cardol M, Peters GJ, Kok G, et al. Ageing with an intellectual disability: the impact of personal resources on well-being. J Intellect Disabil Res 2013; 57:1068-78.
  • 23
    Graham C, Chattopadhyay S. Gender and well-being around the world. International Journal of Happiness and Development 2013; 1:212-32.
  • 24
    Hair JF, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Multivariate data analysis: a global perspective. Upper Saddle River: Prentice Hall; 2009.
  • 25
    Campos JADB, Marôco J. Maslach Burnout inventory-student survey: Portugal-Brazil cross-cultural adaptation. Rev Saúde Pública 2012; 46:816-24.
  • 26
    Papaila DE, Feldman RD. Desenvolvimento físico e cognitivo no início da vida adulta e no adulto jovem. In: Papaila DE, Feldman RD, organizadores. Desenvolvimento humano. 12ª Ed. Porto Alegre: AMGH Editora; 2013. p. 450-81.
  • 27
    von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP, et al. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. J Clin Epidemiol 2008; 61:344-9.
  • 28
    Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica Brasil 2018. São Paulo: Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa; 2018.
  • 29
    Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with Life Scale. J Pers Assess 1985; 49:71-5.
  • 30
    Finney SJ, DiStefano C. Non-normal and categorical data in structural equation modeling. In: Hancock GR, Mueller RO, editors. Structural equation modeling: a second course. 2nd Ed. Charlotte: Information Age Publishing; 2006. p. 439-92.
  • 31
    Fornell C, Larcker DF. Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research 1981; 18:39-50.
  • 32
    Cheung GW, Rensvold RB. Evaluating goodness-of-fit indexes for testing measurement invariance. Struct Equ Modeling 2002; 9:233-55.
  • 33
    Clench-Aas J, Nes RB, Dalgard OS, Aarø LE. Dimensionality and measurement invariance in the Satisfaction with Life Scale in Norway. Qual Life Res 2011; 20:1307-17.
  • 34
    Atienza FL, Balaguer I, Garci´a-Merita ML. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance across sexes. Pers Individ Dif 2003; 35:1255-60.
  • 35
    Zweig JS. Are women happier than men? Evidence from the Gallup World Poll. J Happiness Stud 2015; 16:515-41.
  • 36
    Shevlin M, Brunsden V, Miles J. Satisfaction with life scale: analysis of factorial invariance, mean structures and reliability. Pers Individ Dif 1998; 25:911-6.
  • 37
    Bai X, Wu C, Zheng R, Ren X. The psychometric evaluation of the Satisfaction with Life Scale using a nationally representative sample of China. J Happiness Stud 2011; 12:183-97.
  • 38
    Silva WR, Dias JCR, Marôco J, Campos JADB. Confirmatory factor analysis of different versions of the Body Shape Questionnaire applied to Brazilian university students. Body Image 2014; 11:384-90.
  • 39
    Millsap RE, Yun-Tein J. Assessing factorial invariance in ordered-categorical measures. Multivariate Behav Res 2004; 39:479-515.
  • 40
    Diener E, Biswas-Diener R. Will money increase subjective well-being? Soc Indic Res 2002; 57:119-69.
  • 41
    Suh EM, Oishi S. Subjective well-being across cultures. Online Readings in Psychology and Culture 2002; 10. https://scholarworks.gvsu.edu/orpc/vol10/iss1/1/
    » https://scholarworks.gvsu.edu/orpc/vol10/iss1/1/
  • 42
    Oshio T, Kobayashi M. Income inequality, perceived happiness, and self-rated health: evidence from nationwide surveys in Japan. Soc Sci Med 2010; 70:1358-66.
  • 43
    Diener E, Seligman ME. Beyond money: toward an economy of well-being. Psychol Sci Public Interest 2004; 5:1-31.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    15 Jun 2020
  • Revisado
    29 Ago 2020
  • Aceito
    04 Set 2020
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br