Avanços e desafios nos 20 anos da Política Nacional de Alimentação e Nutrição

Avances y desafíos en los 20 años de la Política Nacional de Alimentación y Nutrición

Sandra Maria Chaves dos Santos Flávia Pascoal Ramos Maria Angélica Tavares de Medeiros Mayline Menezes da Mata Francisco de Assis Guedes de Vasconcelos Sobre os autores

Resumos

Objetivou-se analisar aspectos dos processos de formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), de 1999 a abril de 2020. Trata-se de artigo de debate, utilizando-se de fontes documentais institucionais, busca bibliográfica em base de dados nacionais e internacionais, teses e dissertações. Adotou-se a teoria do ciclo das políticas públicas para sistematizar e apresentar o conjunto das informações. A PNAN foi instituída em 1999 e atualizada 10 anos depois, em processo participativo, fundamentando-se em abordagem inovadora centrada nos paradigmas das práticas alimentares saudáveis, do direito humano à alimentação e da segurança alimentar e nutricional, alinhados ao Sistema Único de Saúde. Quanto à implementação, verificam-se avanços relativos à publicação dos Guias Alimentares com diretrizes nacionais; ao fomento à pesquisa em alimentação e nutrição; à ação coletiva para construção da agenda regulatória, ainda que com embates, e à descentralização de recursos financeiros para execução das ações da PNAN. O monitoramento e a avaliação focaram-se na situação alimentar e nutricional; constatou-se a insuficiência de mecanismos para retroalimentar a política. Após 20 anos, a PNAN mantém o desafio de cumprimento efetivo do seu compromisso histórico: a garantia universal do direito humano à alimentação adequada e saudável.

Palavras-chave:
Segurança Alimentar; Avaliação em Saúde; Política Pública


El objetivo fue analizar aspectos de los procesos de formulación, actualización e implementación de la Política Nacional de Alimentación y Nutrición (PNAN), de 1999 a abril de 2020. Se trata de un artículo de debate, donde se utilizaron fuentes documentales institucionales, búsqueda bibliográfica, en base de datos nacionales e internacionales, tesis y disertaciones. Se adoptó la teoría del ciclo de las políticas públicas para sistematizar y presentar el conjunto de la información. La PNAN se instituyó en 1999, y se actualizó 10 años después, en un proceso participativo, fundamentándose en un abordaje innovador, centrado en los paradigmas de las prácticas alimentarias saludables, del derecho humano a la alimentación y de la seguridad alimentaria y nutricional, alineados en el Sistema Único de Salud. Respecto a la implementación, se verifican avances relacionados con la publicación de las Guías Alimentarias con directrices nacionales; al fomento a la investigación en alimentación y nutrición; a la acción colectiva para la construcción de la agenda regulatoria, aunque con complicaciones, y a la descentralización de recursos financieros para la ejecución de las acciones de la PNAN. El monitoreo y la evaluación se centraron en la situación alimentaria y nutricional; se constató la insuficiencia de mecanismos para retroalimentar la política. Tras 20 años, la PNAN mantiene el desafío de cumplimiento efectivo de su compromiso histórico: la garantía universal del derecho humano a una alimentación adecuada y saludable.

Palabras-clave:
Seguridad Alimentaria; Evaluación en Salud; Política Pública


Introdução

A Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), aprovada em 10 de junho de 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008., com atualização instituída, a partir de processo participativo, e publicada em 2011 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., completou 20 anos; tendo “como pressupostos os direitos à saúde e à alimentação e é orientada pelos princípios doutrinários e organizativos do Sistema Único de Saúde (SUS)22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. (p. 22).

Nessas duas décadas, a sociedade brasileira vivenciou transformações em seu contexto socioeconômico e político. No campo da alimentação e nutrição, foco da PNAN, a transição alimentar e nutricional imprimiu a necessidade de adoção de novos paradigmas frente à emergente e complexa realidade alimentar e nutricional 33. Vasconcelos FAG. A ciência da nutrição em trânsito: da nutrição e dietética à nutrigenômica. Rev Nutr 2010; 23:935-45.,44. Vasconcelos FAG, Batista Filho M. História do campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva no Brasil. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:81-90.,55. Batista Filho M, Souza AI, Miglioli TC, Santos MC. Anemia e obesidade: um paradoxo da transição nutricional brasileira. Cad Saúde Pública 2008; 24 Suppl 2: S247-57.,66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,99. Vasconcelos FAG, Machado ML, Medeiros MAT, Neves JA, Recine E, Pasquim EM. Public policies of food and nutrition in Brazil: from Lula to Temer. Rev Nutr 2019; 32:e180161.. Em contrapartida, o debate e a ação da sociedade civil e de governos, no campo da segurança alimentar e nutricional (SAN), ocorreram consistentemente a partir de 2003. A criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), em 2006, e a inclusão do direito humano à alimentação adequada (DHAA) na Constituição Federal, em 2010, adensaram saberes e práticas neste campo 1010. Brasil. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional - SISAN com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Diário Oficial da União 2006; 18 set.,1111. Brasil. Emenda Constitucional nº 64, de 4 de fevereiro de 2010. Altera o art. 6º da Constituição Federal para introduzir a alimentação como direito social. Diário Oficial da União 2010; 4 fev..

Constitui-se objetivo deste artigo analisar aspectos dos processos de formulação e atualização da PNAN, no período de 1999 a abril de 2020, contextualizando elementos que demarcaram alguns dos desafios à implementação das diretrizes estruturantes desta política.

Um olhar sobre a PNAN: aspectos teóricos e metodológicos

A PNAN é uma política pública de corte social 1212. Souza C. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias 2006; 8:20-45.,1313. Lahera E. Política y políticas públicas. Santiago de Chile: División de Desarrollo Social, Comisión Económica para América Latina y el Caribe; 2004.. Significa que, ao focar a problemática alimentar e nutricional em uma sociedade estruturalmente desigual como a brasileira, esta política, necessariamente, integrará o cenário de disputas sobre que problemas enfrentar, como, para quem, quando e com que recursos 1212. Souza C. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias 2006; 8:20-45.,1313. Lahera E. Política y políticas públicas. Santiago de Chile: División de Desarrollo Social, Comisión Económica para América Latina y el Caribe; 2004..

Ao abordar a trajetória da PNAN, desde a primeira versão 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008., em 1999, até os dias atuais, adotaram-se aproximações ao modelo teórico do ciclo das políticas públicas 1212. Souza C. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias 2006; 8:20-45.,1313. Lahera E. Política y políticas públicas. Santiago de Chile: División de Desarrollo Social, Comisión Económica para América Latina y el Caribe; 2004.. Segundo essa tipologia de análise, haveria um processo dinâmico e de aprendizagem na história de vida de cada ação pública, identificado por diferentes estágios, representados em uma desagregação que facilitaria a apreensão da política em foco 1414. Baptista TWF, Rezende M. A ideia de ciclo na análise de políticas públicas. In: Mattos RA, Baptista TWF, organizadores. Caminhos para análise das políticas de saúde. Porto Alegre: Rede Unida; 2015. p. 221-72.,1515. Secchi L. Políticas públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos. 2a Ed. São Paulo: Cengage Learning; 2013.. No Quadro 1 apresentam-se as características centrais das etapas analíticas do processo constitutivo da metodologia adotada. Aspectos relativos ao monitoramento e à avaliação da política foram distribuídos ao longo do texto, especialmente quando do desenvolvimento da diretriz 4 da PNAN 2011: “gestão das ações de alimentação e nutrição”.

Quadro 1
Etapas do modelo teórico do ciclo de políticas públicas adotadas no estudo da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN). Brasil, 2020.

Diferentes fontes documentais foram utilizadas, incluindo relatórios de gestão da Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição (CGAN), disponíveis de 2003 a 2018, e pesquisa bibliográfica nas seguintes bases de dados: SciELO, Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior do Ministério da Educação (CAPES/MEC), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD), utilizando os termos “avaliação de políticas de alimentação e nutrição” e “Política Nacional de Alimentação e Nutrição”.

Formação da agenda e processo de formulação da PNAN (1997-1999)

Entre os estudos investigados 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57.,1919. Observatório de Doenças Crônicas não Transmissíveis. O caso do Brasil: Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN): 1999-2005. https://www.paho.org/carmen/wp-content/uploads/2012/06/O-Caso-de-Brasil.pdf (acessado em 01/Mar/2020).
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,2020. Pinheiro ARO. Análise histórica do processo de formulação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (2003-2006): atores, ideias, interesses e instituições na construção de consenso político [Tese de Doutorado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2009., identifica-se o contexto histórico de formulação da PNAN 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. como momento de avanço da política neoliberal de fortalecimento do Estado Mínimo brasileiro, cuja emergência ocorrera no início da década de 1990, com intensificação no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso - FHC (1995-1998) 2121. Sallum Jr. B, Goulart JO. O Estado brasileiro contemporâneo: liberalização econômica, política e sociedade nos governos FHC e Lula. Revista de Sociologia e Política 2016; 24:115-35.,2222. Rodrigues CHL, Jurgenfeld VF. Desnacionalização e financeirização: um estudo sobre as privatizações brasileiras (de Collor ao primeiro governo FHC). Economia e Sociedade 2019; 28:393-420..

Nesse sentido, apontam-se as seguintes evidências: (1) a extinção, em 1995, do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), instituído em abril de 1993 para assessorar o governo no enfrentamento da fome e da miséria; e (2) a extinção do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN), em 1997, autarquia vinculada ao Ministério da Saúde, criada em 1972, para assistir o governo na formulação da política de alimentação e nutrição e funcionar como órgão central das atividades da área 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57..

Por outro lado, mesmo no contexto de Estado Mínimo, identificado pela literatura do campo da política pública de alimentação e nutrição 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57.,1919. Observatório de Doenças Crônicas não Transmissíveis. O caso do Brasil: Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN): 1999-2005. https://www.paho.org/carmen/wp-content/uploads/2012/06/O-Caso-de-Brasil.pdf (acessado em 01/Mar/2020).
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, há que conceber o processo de agenda e formulação da PNAN como produto da correlação de forças sociais e de múltiplos interesses estabelecidos naquela conjuntura. Consequentemente, também se faz necessário vislumbrar as janelas de oportunidades e as contradições no interior do Estado que permitiram a formulação das diretrizes, das ações e dos programas da PNAN naquele momento histórico.

Em 1998, o governo FHC criou a Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição (CGPAN), à época vinculada à Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde, para desempenhar competências, direitos e obrigações do extinto INAN. Analisa-se a criação da CGPAN como tentativa de redução do tamanho do Estado, pois, relativamente ao órgão antecessor (INAN), assemelhado a um ministério de alimentação e nutrição, perdia status institucional no Ministério da Saúde. Tal criação também representaria o rompimento com o modelo de planejamento autocrático implantado em 1964 e conduzido pelo INAN durante 25 anos 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57..

Desde a sua criação, a CGPAN, denominada CGAN em 2010 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011., tem sido coordenada por nutricionistas. Essa escolha pode representar um contraponto à história de gestão das agências estatais das políticas públicas de alimentação e nutrição, cuja coordenação coube, hegemonicamente, a gestores médicos 1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57..

Em análise do contexto de formulação da PNAN, Pinheiro & Carvalho 1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83. destacam o papel de técnicos, intelectuais orgânicos e acadêmicos na construção da agenda, como estratégia de resistência e valorização da alimentação e nutrição no Ministério da Saúde, em função da extinção do INAN.

Coube à CGPAN, à época sob a gestão de Denise Costa Coitinho (2000-2003), coordenar o processo participativo de formulação da PNAN. Tal processo foi constituído pela realização de eventos técnico-científicos, com participação de representantes de instituições governamentais e não governamentais do campo da alimentação e nutrição, pactuando-se as contribuições apresentadas para a formulação da política 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008.,66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1919. Observatório de Doenças Crônicas não Transmissíveis. O caso do Brasil: Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN): 1999-2005. https://www.paho.org/carmen/wp-content/uploads/2012/06/O-Caso-de-Brasil.pdf (acessado em 01/Mar/2020).
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Embasada em abordagem ousada e inovadora à época, a PNAN estabeleceu como eixos norteadores os paradigmas de práticas alimentares e estilos de vida saudáveis, do DHAA e da SAN. No Quadro 2, sintetizam-se as sete diretrizes programáticas, as ações e os programas que concretizaram a PNAN no período 1999-2011.

Quadro 2
Síntese das diretrizes e principais ações e programas da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008.. Brasil, 2020.

Em análise realizada por duas gestoras da CGPAN, Elisabetta Recine (2003) e Ana Beatriz Vasconcellos (2005 a 2010), ressaltam-se elementos contextuais que fomentaram a construção da agenda 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9..

A PNAN foi elaborada a partir de evidências epidemiológicas fortes - que nortearam a argumentação e a definição de suas diretrizes. Apesar de ser formulada em uma época de fortalecimento dos argumentos por um ‘Estado Mínimo’, valorizou a intersetorialidade, contextualizou-se como elemento de contribuição da SAN e adotou o direito humano à alimentação adequada como princípio66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9. (p. 77).

As gestoras 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9. apontam, como fundamentação das sete diretrizes da PNAN 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008., o cenário de transição epidemiológica e nutricional brasileiro do final dos anos 1990, caracterizado pela sobreposição de doenças carenciais e agravos nutricionais devido ao perfil de consumo de alimentos 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.,66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57..

Em artigo publicado pela terceira gestora, Maria de Fátima Cruz Correia de Carvalho (2003-2005), em colaboração, acrescentam-se relevantes informações sobre a agenda de construção da PNAN 1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30. (p. 125): “Os eixos de ação definidos na I Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional realizada em 1994 foram estratégicos para a construção da PNAN, muitos deles sendo incorporados entre suas diretrizes”.

Outra gestora da CGAN, Patrícia Constante Jaime (2011-2014), em artigo sobre o diálogo da PNAN com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), salientou o processo de construção da agenda 77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40. (p. 4333): “Representa uma conquista no que se refere à legitimação das ações nesta área e na definição da contribuição do setor saúde para garantia da SAN e concretização do direito humano à alimentação, reafirmando a necessidade de diálogo e articulação para a realização de ações que não se restringem ao setor saúde, mas precisam estar em contínua interação com outros setores”.

A agenda de atualização da PNAN (2010-2011)

O processo de atualização da PNAN, após 10 anos de vigência, iniciou-se nos primeiros meses de 2010. Buscou-se garantir legitimidade e participação social de atores e das entidades vinculados ao campo da alimentação e nutrição, levando em consideração a complexidade e heterogeneidade de atores, ideias, interesses e instituições integrantes desse campo 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,99. Vasconcelos FAG, Machado ML, Medeiros MAT, Neves JA, Recine E, Pasquim EM. Public policies of food and nutrition in Brazil: from Lula to Temer. Rev Nutr 2019; 32:e180161.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57.,2020. Pinheiro ARO. Análise histórica do processo de formulação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (2003-2006): atores, ideias, interesses e instituições na construção de consenso político [Tese de Doutorado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2009..

Inaugurou-se a agenda com a realização de seminários, entre março e abril de 2010, nos 26 estados brasileiros, contando com cerca de 2000 participantes, entre representações de usuários, profissionais de saúde e gestores. Debateram-se proposições de atualização, pautadas em documento base organizado pela CGPAN em parceria com a Comissão Intersetorial de Alimentação e Nutrição (CIAN) do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Em junho de 2010, realizou-se o Seminário Nacional para consolidar as propostas de atualização, oriundas dos seminários estaduais, englobando 250 participantes, entre delegados estaduais, representantes de entidades, palestrantes e convidados 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.,2424. Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição, Conselho Nacional de Saúde. Seminário Nacional de Alimentação e Nutrição no SUS - PNAN 10 anos: relatório final. Brasília: Ministério da Saúde; 2010..

Tal processo se desencadeou na gestão de Ana Beatriz Vasconcellos, sendo concluído na gestão de Patrícia Jaime.

Na atualização, reafirmou-se o pressuposto de promoção da garantia do direito à saúde e à alimentação, alinhando-se aos princípios do SUS - universalidade, integralidade, equidade, descentralização, regionalização, hierarquização e participação popular. Agregaram-se também cinco novos princípios norteadores: (1) a alimentação como elemento de humanização das práticas de saúde; (2) o respeito à diversidade e à cultura alimentar; (3) o fortalecimento da autonomia dos indivíduos; (4) a determinação social e a natureza interdisciplinar e intersetorial da alimentação e nutrição; e (5) a SAN com soberania 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Assim, na PNAN 2011 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., nove diretrizes foram instauradas, desdobradas em ações e programas (Quadro 3).

Quadro 3
Síntese das diretrizes e principais ações e programas da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) 2011 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Brasil, 2020.

Na análise comparativa dos documentos da PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. e da PNAN 2011 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. (Quadros 2 e 3), constatam-se as atualizações realizadas. Analisando as nove diretrizes da PNAN 2011, observa-se que houve foco no setor saúde, já que, a partir de 2006, um conjunto de ações relacionadas à SAN tornou-se competência de outros setores da administração federal 2020. Pinheiro ARO. Análise histórica do processo de formulação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (2003-2006): atores, ideias, interesses e instituições na construção de consenso político [Tese de Doutorado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2009.. Na PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. (p. 17), a SAN é contemplada no propósito da política “A presente Política Nacional de Alimentação e Nutrição integra a Política Nacional de Saúde, inserindo-se, ao mesmo tempo, no contexto da segurança alimentar e nutricional”; na diretriz 1, “estímulo às ações intersetoriais com vistas ao acesso universal aos alimentos” e na seção de responsabilidades institucionais e na definição de distintos órgãos envolvidos e suas atribuições, por exemplo. Em contrapartida, o propósito da PNAN 2011 está centrado no setor saúde e no reforço às ações intersetoriais para SAN localizado na diretriz “cooperação e articulação para a SAN”.

Observa-se que, em geral, as ações e os programas desenvolvidos na PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. foram contemplados na PNAN 2011 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., sendo atualizados, realocados e/ou ressignificados (mudaram de terminologias e/ou de estratégias operacionais). Duas das novas diretrizes incorporadas avançam em relação à versão anterior: “gestão das ações de alimentação e nutrição” e “participação e controle social”.

Entre as justificativas para a realização da atualização da PNAN, indicadas por duas gestoras da CGAN, Patrícia Jaime e Denise Coitinho, destaca-se a aprovação dos instrumentos legais sobre SAN, aliada às alterações no cenário epidemiológico nacional, que exigiam mudanças na reorganização do setor saúde 88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36..

Em síntese, enquanto desdobramento do Movimento de Reforma Sanitária que instituiu o princípio do direito à saúde e a criação do SUS, a formulação e a atualização da PNAN podem ser entendidas como uma pactuação dos múltiplos e conflitantes interesses de atores e instituições da sociedade civil e do Estado, vinculados ao campo da alimentação e nutrição em busca da garantia dos princípios do DHAA e da SAN 66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.,1616. Pinheiro ARO, Carvalho DBB. Estado e mercado: adversários ou aliados no processo de implementação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição? Elementos para um debate sobre medidas de regulamentação. Saúde Soc 2008; 17:170-83.,1717. Pinheiro ARO, Carvalho MFCC. Transformando o problema da fome em questão alimentar e nutricional: uma crônica desigualdade social. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:121-30.,1818. Vasconcelos FAG. Combate à fome no Brasil: uma análise histórica de Vargas a Lula. Rev Nutr 2005; 18:439-57.,1919. Observatório de Doenças Crônicas não Transmissíveis. O caso do Brasil: Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN): 1999-2005. https://www.paho.org/carmen/wp-content/uploads/2012/06/O-Caso-de-Brasil.pdf (acessado em 01/Mar/2020).
https://www.paho.org/carmen/wp-content/u...
,2020. Pinheiro ARO. Análise histórica do processo de formulação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (2003-2006): atores, ideias, interesses e instituições na construção de consenso político [Tese de Doutorado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2009..

Implementação da PNAN

No espaço deste artigo, optou-se por apontar e refletir sobre algumas das ações e dos programas concernentes às diretrizes da PNAN, sobretudo daqueles que delimitam a interseção entre PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. e PNAN 2011 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., ao longo dos 20 anos investigados (Quadros 2 e 3).

A diretriz 1, “organização da atenção nutricional”, envolve ações e programas relacionados aos cuidados para promover e proteger a saúde, prevenir, diagnosticar e tratar agravos de indivíduos, famílias e comunidades, juntamente às demais ações do SUS 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Pressupondo a atenção primária à saúde (APS) como ordenadora do cuidado, as ações de alimentação e nutrição são de responsabilidade geral dos profissionais de saúde 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.,33. Vasconcelos FAG. A ciência da nutrição em trânsito: da nutrição e dietética à nutrigenômica. Rev Nutr 2010; 23:935-45.,44. Vasconcelos FAG, Batista Filho M. História do campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva no Brasil. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:81-90.,55. Batista Filho M, Souza AI, Miglioli TC, Santos MC. Anemia e obesidade: um paradoxo da transição nutricional brasileira. Cad Saúde Pública 2008; 24 Suppl 2: S247-57.,66. Recine E, Vasconcellos AB. Políticas nacionais e o campo da alimentação e nutrição em saúde coletiva: cenário atual. Ciênc Saúde Colet 2011; 16:73-9.,77. Alves KPS, Jaime PC. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição e seu diálogo com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ciênc Saúde Colet 2014; 19:4331-40.,88. Jaime PC, Delmuè DCC, Campello T, Silva DO, Santos LMP. Um olhar sobre a agenda de alimentação e nutrição nos trinta anos do Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2018; 231829-36.. Tal diretriz apresenta equivalência com a de prevenção e controle dos distúrbios nutricionais e de doenças associadas à alimentação e nutrição na PNAN 1999 (Quadros 2 e 3).

Em estudo de revisão 2525. Pereira TN, Monteiro RA, Santos LMP. Alimentación y nutrición en atención primaria en Brasil. Gac Sanit 2018; 32:297-303. sobre as ações de alimentação e nutrição na APS, realizado em 2018, verificou-se que 52,4% delas se voltavam ao diagnóstico e 30,1% à assistência e ao tratamento de agravos. Já aquelas de promoção da alimentação adequada e saudável (PAAS), tiveram registro de 16,5%, revelando limites na ocorrência dessas ações.

Concernentemente às ações de prevenção das carências nutricionais específicas e de controle de agravos nutricionais, reconhece-se importante tradição em programas de suplementação de micronutrientes no Brasil 2626. Bortolini GA, Oliveira TFV, Silva SA, Santin RC, Medeiros OL, Spaniol AM, et al. Ações de alimentação e nutrição na atenção primária à saúde no Brasil. Rev Panam Salud Pública 2020; 44:e39.. Destacam-se os programas nacionais de suplementação de ferro (PNSF) e de vitamina A (PNSVA), a Estratégia de Fortificação da Alimentação Infantil com Micronutrientes em pó (NutriSUS) e iodação do sal (Quadro 3). Alguns destes são bem avaliados, a exemplo da iodação do sal, enquanto a cobertura e a efetividade de outros são questionadas 2727. Souza IMS, Santos SMC. Política Nacional de Alimentação e Nutrição: avaliação da implantação de programas em municípios baianos. Demetra (Rio J.) 2017; 12:137-55..

O enfrentamento do sobrepeso e da obesidade desafia a agenda de alimentação e nutrição e as equipes da APS que, concomitantemente, lidam com agravos de menor magnitude, como desnutrição infantil 2626. Bortolini GA, Oliveira TFV, Silva SA, Santin RC, Medeiros OL, Spaniol AM, et al. Ações de alimentação e nutrição na atenção primária à saúde no Brasil. Rev Panam Salud Pública 2020; 44:e39., que permanece, todavia, como grave problema de saúde pública em crianças menores de cinco anos pertencentes a povos e comunidades tradicionais e naquelas residentes em bolsões de pobreza 2828. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS 2006: dimensões do processo reprodutivo e da saúde da criança. Brasília: Ministério da Saúde; 2009..

As ações de PAAS, diretriz 2, na PNAN 2011 (Quadro 3) fundamentam-se nas dimensões de incentivo, apoio, proteção e promoção da saúde, combinando estratégias entre si; somam-se às ações de “regulação dos alimentos, envolvendo rotulagem e informação, publicidade e melhoria do perfil nutricional dos alimentos22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. (p. 32).

As ações de incentivo consistem no estímulo e no empoderamento da população para as escolhas saudáveis, por meio de campanhas públicas que favoreçam a disseminação de informações relacionadas à alimentação e à saúde, em sintonia com as culturas e os ambientes alimentares 2929. Gabriel CG, Fagundes A. Promoção da alimentação saudável na atenção básica. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2016.. Salienta-se a aprovação de Guias Alimentares, por orientar as diretrizes do Ministério da Saúde, a atuação de profissionais de saúde e a comunidade em geral. Na perspectiva de duas recentes gestoras da CGAN, Gisele Ane Bortolini (2019-atual) e Michele Lessa de Oliveira (2015-2019), as diretrizes alimentares nacionais são instrumentos centrais para implementar a PAAS, subsidiando políticas de saúde e de SAN 3030. Bortolini GA, Moura ALP, Lima AMC, Moreira HOM, Medeiros O, Diefenthaler ICM, et al. Guias alimentares: estratégia para redução do consumo de alimentos ultraprocessados e prevenção da obesidade. Rev Panam Salud Pública 2019; 43:e59.. Essa diretriz é compatível com a de promoção de práticas alimentares e estilo de vida saudáveis, da PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008..

Em 2002, publicou-se a primeira versão do Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de Dois Anos e, em 2006, o Guia Alimentar para a População Brasileira, atualizado e ampliado em 2014 (Quadros 2 e 3). Ao adotar a classificação NOVA dos alimentos, baseada na extensão e no propósito do processamento industrial deles, este guia se diferencia por considerar a alimentação para além da ingestão de nutrientes, preconizando o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados, em detrimento de produtos ultraprocessados 3030. Bortolini GA, Moura ALP, Lima AMC, Moreira HOM, Medeiros O, Diefenthaler ICM, et al. Guias alimentares: estratégia para redução do consumo de alimentos ultraprocessados e prevenção da obesidade. Rev Panam Salud Pública 2019; 43:e59.,3131. Monteiro CA, Cannon G, Lawrence M, Costa-Louzada ML, Pereira-Machado P. Ultra-processed foods, diet quality, and health using the NOVA classification system. Rome: Food and Agriculture Organization, United Nations; 2019.. Tal revisão foi reconhecida internacionalmente, com o Brasil servindo de modelo para outros países e liderando uma rede de guias, como parte da Década de Ação pela Nutrição (2016-2025). Revisou-se também o Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de Dois Anos, alinhando-se ao guia de 2014, como ferramenta indutora de políticas de proteção, promoção da saúde e prevenção de agravos nutricionais nos primeiros anos de vida 2626. Bortolini GA, Oliveira TFV, Silva SA, Santin RC, Medeiros OL, Spaniol AM, et al. Ações de alimentação e nutrição na atenção primária à saúde no Brasil. Rev Panam Salud Pública 2020; 44:e39..

Um exemplo de política baseada nas recomendações apresentadas pelos Guias Alimentares, que fomenta o acesso de indivíduos e coletividades às práticas alimentares saudáveis, é o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que, em 2020 3232. Ministério da Educação. Resolução nº 06, de 08 de maio de 2020. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE. Diário Oficial da União 2020; 12 mai., teve suas normas atualizadas para se adequar às diretrizes alimentares nacionais. Adicionalmente, a implantação de políticas fiscais, como a taxação de produtos ultraprocessados, se baseadas nos guias alimentares, poderia impedir e/ou reduzir a exposição da população aos fatores de risco para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) 2929. Gabriel CG, Fagundes A. Promoção da alimentação saudável na atenção básica. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2016..

O avanço da PAAS requer, todavia, a articulação de diferentes setores que protagonizam mudanças estruturais no padrão de consumo e no sistema alimentar vigente. Nesse contexto, a publicação do Marco de Referência de Educação Alimentar e Nutricional para as Políticas Públicas (2012) 3333. Amparo-Santos L. Avanc¸os e desdobramentos do marco de refere^ncia da educac¸a~o alimentar e nutricional para poli´ticas pu´blicas no a^mbito da universidade e para os aspectos culturais da alimentac¸a~o. Rev Nutr 2013; 26:595-600., conformou princípios e diretrizes, oportunizando um campo comum de reflexão/orientação dessas práticas.

A diretriz 3, “vigilância alimentar e nutricional (VAN)”, é essencial à organização e à gestão da alimentação e nutrição no SUS, respondendo pelo monitoramento contínuo e pela predição de tendências e seus determinantes entre a população usuária da APS 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. (Quadro 3). Desde a PNAN 19991, sob a diretriz “monitoramento da situação alimentar e nutricional”, recomendou-se a adoção de estratégias de vigilância epidemiológica (Quadros 2 e 3). Revela-se historicamente o apoio à realização e à divulgação de dados de diferentes pesquisas e inquéritos populacionais, para conhecer a situação alimentar e nutricional da população brasileira 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006., consoante as ações de promoção de linhas de investigação (PNAN 1999) 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. e pesquisa, inovação e conhecimento em alimentação e nutrição (PNAN 2011) 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. (Quadros 2 e 3).

A média de cobertura nacional do estado nutricional pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) variou de 9,78% a 14,92% e a de consumo alimentar de 0,1 a 0,4%, entre 2008 e 2013 3737. Nascimento FA, Silva SA, Jaime PC. Cobertura da avaliação do estado nutricional no Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional brasileiro: 2008 a 2013. Cad Saúde Pública 2017; 33:e00161516.,3838. Nascimento FA, Silva SA, Jaime PC. Cobertura da avaliação do consumo alimentar no Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional Brasileiro: 2008 a 2013. Rev Bras Epidemiol 2019; 22:e190028.. Constatou-se tendência de aumento da cobertura do sistema, sobretudo para crianças, gestantes e adolescentes. Persistem limitações como: baixa cobertura e utilização; ausência de estrutura física; inconsistências nos registros; e problemas de gestão, planejamento e de avaliação das ações de alimentação e nutrição 3838. Nascimento FA, Silva SA, Jaime PC. Cobertura da avaliação do consumo alimentar no Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional Brasileiro: 2008 a 2013. Rev Bras Epidemiol 2019; 22:e190028.,3939. Ferreira CS, Rodrigues LA, Bento IC, Villela MPC, Cherchiglia ML, César CC. Fatores associados à cobertura do Sisvan Web para crianças menores de 5 anos, nos municípios da Superintendência Regional de Saúde de Belo Horizonte, Brasil. Ciênc Saúde Colet 2018; 23:3031-40..

Na diretriz 4, “gestão das ações de alimentação e nutrição”, define-se o caráter intersetorial da PNAN, tornada referência para garantir o DHAA e o direito à saúde. Configura-se a política como essencial na articulação dos dois sistemas, o SUS e o SISAN, assim como no diálogo com outros setores governamentais. A criação da Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN), em 2007, contribuiu para o aprimoramento da articulação intersetorial no processo de gestão da PNAN 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. Tal diretriz também pressupõe a elaboração de estratégias que promovam o planejamento, o monitoramento e a avaliação das ações de alimentação e nutrição, bem como assegurem o financiamento tripartite para sua implementação 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. (Quadro 3).

Quanto ao planejamento, no âmbito federal, as ações da PNAN ficam contempladas em instrumentos oficiais, como os planos nacionais. Verificam-se desafios, objetivos, metas, iniciativas e ações sob responsabilidade da CGAN nos Planos Nacionais de Saúde (PNS), nos Planos Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN) e nos Planos Plurianuais (PPA) 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. Constam metas também no II Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo) e no Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das DCNT no Brasil (2011-2022) 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018. (Quadro 3). A identificação dessas ações nos instrumentos oficiais de planejamento denota a relevância que a alimentação e nutrição assumiu na agenda pública e na política nacional.

Sobre o monitoramento de metas compartilhadas no quadriênio 2016-2019, alcançadas em 2018, podem ser citados alguns exemplos 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018., a saber: acompanhamento, na APS, de, pelo menos, 73% de famílias cobertas pelo Programa Bolsa Família com as condicionalidades de saúde (PPA, PNS, PLANSAN); aumento de 18 para 20,7 milhões no número de educandos cobertos pelo Programa Saúde na Escola (PSE), 98,1% da meta alcançada (PPA, PNS, PLANSAN) 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006..

Sobre o monitoramento e avaliação nesses 20 anos de implementação, foram identificados dados de monitoramento de programas e ações facultados pelas diretrizes da PNAN, bem como a realização de parcerias internacionais para avaliar programas específicos 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.. Entretanto, não se identificou um sistema institucionalizado de avaliação com parâmetros que permitam concluir sobre o grau de desempenho na direção do propósito da política.

A implementação da PNAN é viabilizada pela garantia de linha orçamentária e de corpo técnico 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.. Observa-se o crescimento expressivo do orçamento, acima de 600% 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006., em 15 anos (Tabela 1), o que pode ser um indicador da relevância do tema no Governo Federal.

Tabela 1
Financiamento da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN): dados orçamentários no período de 2003-2018. Brasil, 2020.

Ao analisar dados da previsão orçamentária e da execução financeira da CGAN, de 2003 a 2018 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006., constata-se que, para a maioria dos anos, tal execução ultrapassou 70% (Tabela 1). Em 2014 e 2016, a execução foi inferior a 50%: o bloqueio orçamentário e a liberação apenas ao final de dezembro do mesmo ano, além da não publicação de processos abertos pela CGAN, em 2016, explicariam tais resultados 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018..

A partir de 2006, implantou-se um mecanismo de financiamento das ações de alimentação e nutrição, incentivo financeiro de custeio para apoiar a estruturação e a implementação das ações pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. O financiamento das ações de alimentação e nutrição foi progressivamente ampliado em número de municípios atendidos e de recursos liberados, e atende a estados, Distrito Federal e a municípios com população superior a 30 mil habitantes 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018..

Os recursos do financiamento das ações de alimentação e nutrição têm apoiado a organização de gestores locais de alimentação e nutrição, bem como a articulação com as demais áreas da APS e com conselhos municipais de SAN, na elaboração de plano de ação para a execução do recurso. Segundo o monitoramento da CGAN, entretanto, houve baixa execução financeira dos recursos do financiamento das ações de alimentação e nutrição por Estados e municípios 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. Em dois estudos 4040. Reis CS. Avaliação da utilização do repasse fundo a fundo para estruturação e implementação das ações de alimentação e nutrição [Dissertação de Mestrado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2015.,4141. Pires ACL. Implementação das ações de alimentação e nutrição no SUS: perfil e caracterização em municípios brasileiros [Dissertação de Mestrado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2017. avaliando a execução municipal do financiamento das ações de alimentação e nutrição, no período de 2006 a 2016, identificaram-se avanços na implementação das ações da PNAN, conquanto permaneçam obstáculos administrativos e burocráticos e a não institucionalização da área nos municípios.

Na diretriz 5, “participação e controle social”, reforça-se o papel da sociedade civil na gestão da PNAN nas três esferas de governo 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Sobressaem o CNS, por intermédio da CIAN, e o CONSEA, como espaços estratégicos de discussão sobre as ações de alimentação e nutrição no SUS e de articulação intersetorial com a SAN. A extinção do CONSEA, desde 2019, que resultou na não convocação da VI Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, comprometeu a participação da sociedade civil na gestão de políticas de interesse para a SAN. Seguem, como objetivos a serem alcançados, a criação de CIAN nas demais esferas de governo, objetivando potencializar o debate sobre a implementação da PNAN e o diálogo intersetorial.

Sobre a diretriz 6, “qualificação da força de trabalho”, identificada como “desenvolvimento e capacitação de recursos humanos” na PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008., desenvolveram-se iniciativas voltadas à formação em alimentação e nutrição para o SUS, incluindo a capacitação técnico-profissional, a promoção de cursos de especialização em gestão da PNAN, a criação da Rede de Alimentação e Nutrição do SUS (RedeNutri) e de Centros Colaboradores em Alimentação e Nutrição (CECAN) (Quadro 3). Porém, a qualificação de profissionais da APS, especialmente de médicos e enfermeiros, constitui desafio a ser superado 2626. Bortolini GA, Oliveira TFV, Silva SA, Santin RC, Medeiros OL, Spaniol AM, et al. Ações de alimentação e nutrição na atenção primária à saúde no Brasil. Rev Panam Salud Pública 2020; 44:e39..

Na diretriz 7, “controle e regulação dos alimentos”, retomam-se aspectos das diretrizes “promoção de práticas alimentares e estilos de vida saudáveis e garantia da segurança e da qualidade dos alimentos” da PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008.. Registra-se intensa atuação da CGAN na implementação do Plano de Redução do Consumo de Sal, mediante compromissos firmados entre o Ministério da Saúde e o setor produtivo de alimentos, e na elaboração do Plano de Redução de Açúcares em Alimentos Industrializados 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. Por mais que seja um acordo voluntário, trata-se de iniciativa que evidencia a importância do papel regulador do Estado no apoio e na proteção da alimentação adequada e saudável 4242. Henriques P, O'Dwyer G, Dias PC, Barbosa RMS, Burlandy L, Henriques P , et al. Políticas de saúde e de segurança alimentar e nutricional: desafios para o controle da obesidade infantil. Ciênc Saúde Colet 2018; 23:4143-52..

A diretriz 7 pode ser identificada como agregadora de ações complementares àquelas previstas na diretriz 2, na medida em que a alimentação adequada e saudável é a direção das proposições regulatórias (Quadros 2 e 3).

Quanto à regulação do ambiente alimentar escolar, registra-se profundo debate desde 2006, com a publicação da Portaria Interministerial nº 1010/20063535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018., seguida de tentativas de aprovação de regulação de cantinas escolares. Da mesma forma, aconteceu mobilização para a regulação da publicidade de alimentos direcionada ao público infantil, bem como para a tributação de bebidas adoçadas. Esta última, apesar de não contemplada na PNAN, também constitui medida regulatória custo-efetiva para a PAAS, recomendada pela Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) 4343. Organização Pan-Americana da Saúde. Impostos de saúde: uma introdução. Brasília: Organização Pan-Americana de Saúde; 2020..

A implementação dessas ações foi ratificada em acordos internacionais e se articula ao Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das DCNT no Brasil (2011-2022) e à Estratégia Intersetorial de Prevenção e Controle da Obesidade (2014) 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. No entanto, são poucos os avanços na proteção da alimentação saudável que impactem sobre o ambiente alimentar, visto que essas agendas permanecem marcadas por conflitos com a indústria de alimentos, que utiliza estratégias para atrasar e/ou impedir sua aprovação. Há diversos exemplos, como a judicialização promovida pelo setor regulado, seguida de suspensão de resolução aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), após ampla discussão participativa incluindo o setor, que dispunha sobre a oferta, propaganda e publicidade de alimentos com conteúdo excessivo de determinados nutrientes 4444. Gomes FS, Castro IRR, Monteiro CA. Publicidade de alimentos no Brasil: avanços e desafios. Ciênc Cult (São Paulo) 2010; 62:48-51..

Em análise das repercussões das ações corporativas da indústria de alimentos sobre a regulação na América Latina, revelou-se um conjunto de estratégias que obstam avanços 4545. Mialon M, Gomes FS. Public health and the ultra-processed food and drink products industry: corporate political activity of major transnationals in Latin America and the Caribbean. Public Health Nutr 2019; 22:1898-908.. O Brasil foi um dos primeiros países a adotar uma rotulagem nutricional obrigatória, em 2003 e em 2020, aprovou a rotulagem nutricional frontal, materializada na RDC nº 4294646. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução de Diretoria Colegiada nº 429, de 8 de outubro de 2020. Dispõe sobre a rotulagem nutricional dos alimentos embalados. Diário Oficial da União 2020; 9 out., cuja discussão se prolongou por anos, dada a resistência da indústria de alimentos. A despeito do avanço dessa indústria, o resultado final não correspondeu integralmente ao que foi proposto pela sociedade civil, sendo adotado um modelo ainda não testado em estudos comparativos 4747. Catalan M. Uma reflexão frugal acerca do recém-aprovado modelo de rotulagem de alimentos e bebidas no Brasil. Revista Eletrônica Direito e Sociedade 2020; 8:9-15..

No tocante à atuação da sociedade civil, persistem obstáculos quanto à participação nas negociações e nos processos decisórios, particularmente para a redução de nutrientes críticos. Contudo, a sociedade civil tem atuado via mobilização popular, campanhas, manifestos e abaixo-assinados, contribuindo para assegurar a transparência nas decisões governamentais, além de intensificar o controle social 4848. Martins APB. Publicidade de alimentos não saudáveis: os entraves e as perspectivas de regulação no Brasil. v. 2. São Paulo: Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor; 2014. (Cadernos Idec. Série Alimentos).,4949. Figueiredo AVA, Recine E, Monteiro R. Regulação dos riscos dos alimentos: as tensões da Vigilância Sanitária no Brasil. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:2353-66..

A diretriz 8, “pesquisa, inovação e conhecimento em alimentação e nutrição”, equivalente à diretriz “promoção do desenvolvimento de linhas de investigação” na PNAN 1999 11. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008., contempla a produção de conhecimento e o apoio à pesquisa, para gerar evidências à implementação da PNAN 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Pressupõe diálogo com a vigilância alimentar e nutricional, para conhecer a situação alimentar e nutricional da população brasileira, e investimento em pesquisas em alimentação e nutrição 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Identificaram-se ações de apoio desenvolvidas pelos CECAN, na realização de pesquisas e na avaliação de programas 2323. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2007-2010: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3535. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2011-2014: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.,3636. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2003-2006: Coordenação-Geral da Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.. Entre 2004 e 2019, publicaram-se editais em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), para fomentar pesquisas na área de alimentação e nutrição (Quadro 4). Mais recentemente, a partir de 2018, as chamadas nº 26/2018 e 28/2019 respondem às necessidades de qualificação da força de trabalho 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018..

Quadro 4
Listagem de editais de pesquisa de interesse para alimentação e nutrição no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasil, 2004-2019.

Uma agenda de pesquisa em alimentação e nutrição foi mobilizada a partir de 2008, em diálogo com pesquisadores de instituições acadêmicas das macrorregiões brasileiras 3434. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de gestão 2015-2018: Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.. Ocorreram dois Encontros Nacionais sobre Agenda Estratégica de Pesquisa em Alimentação e Nutrição no SUS, o primeiro em 2016 e o segundo em 2019. Por esses elementos, pode-se afirmar a existência de estratégia definida para promover o alcance dos objetivos da diretriz 8.

Na diretriz 9, “cooperação e articulação para SAN”, reafirma-se a intersetorialidade 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., princípio essencial que está contemplado em diversas iniciativas, por exemplo, na implementação do Programa Bolsa Família e do PSE. A CAISAN potencializou isso ao ampliar oportunidades de articulação e parceria intersetorial. O maior desafio se refere ao desmonte do arcabouço institucional para a formulação de políticas de SAN, aliado às consequências da Emenda Constitucional nº 95, que alterou o teto dos gastos, reduzindo as ações de proteção social. A extinção do CONSEA e a paralisação da ação da CAISAN compõem esse cenário, em decorrência do qual não foi formulado o III Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional 2020-2023, que seria resultante da VI Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

Considerações finais

Neste artigo, objetivou-se analisar o processo de formulação, implementação e atualização da PNAN no período de 1999 a abril de 2020, valendo-se de pesquisa documental e bibliográfica.

No quesito agenda e formulação da política, concluiu-se que a PNAN tem uma história dinâmica, consoante os maiores problemas nacionais no campo da alimentação e nutrição, saúde e da SAN, contemplando revisões com participação de atores relevantes.

Em termos de implementação, consistem avanços as ações de PAAS, ressaltando-se a publicação dos Guias Alimentares com diretrizes nacionais; o fomento à pesquisa em alimentação e nutrição; e a ação coletiva para a construção da agenda regulatória, mediante efetivação de resoluções e acordos internacionais, ainda que com embates. O fortalecimento e a descentralização de recursos financeiros para execução das ações da PNAN são também positividades. Persistem desafios quanto à gestão orçamentária do financiamento das ações de alimentação e nutrição e à cobertura e à utilização do SISVAN, às estratégias para o enfrentamento das DCNT e à prevenção do sobrepeso, da obesidade e das carências nutricionais. Quanto ao monitoramento e à avaliação, constatou-se foco no acompanhamento e na avaliação da situação alimentar e nutricional da população e no monitoramento de programas, mas não se identificou um sistema que permitisse avaliar o alcance das diretrizes da PNAN.

No vazio institucional decorrente da extinção do CONSEA, no desmonte crescente da política e dos programas de SAN, urge reconstruir o diálogo perdido da PNAN com a PNSAN. Tal tarefa demandará a formulação e a implantação de agenda pública a ser constituída por ações multidisciplinares e intersetoriais.

Para além de uma fecunda trajetória de 20 anos, torna-se inadiável para a PNAN perseverar com o compromisso histórico de contribuir para a garantia do direito humano à alimentação saudável e sustentável a todos os que habitam o território brasileiro.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    03 Jun 2020
  • Revisado
    12 Jan 2021
  • Aceito
    18 Jan 2021
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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