Vacinas e redes sociais: o debate em torno das vacinas no Instagram e Facebook durante a pandemia de COVID-19 (2020-2021)

Vaccines and social media: a debate around vaccines on Instagram and Facebook during the COVID-19 pandemic (2020-2021)

Vacunas y redes sociales: el debate en torno a las vacunas en Instagram y Facebook durante la pandemia de COVID-19 (2020-2021)

Eleonora de Magalhães Carvalho Marcelo Alves do Santos Junior Luiz Felipe Fernandes Neves Thaiane Moreira de Oliveira Luisa Massarani Marilia Sá Carvalho Sobre os autores

Resumos

Tendo em vista que a Internet e, em especial, as redes sociais funcionam como lócus para a circulação de informações sobre a COVID-19, o objetivo deste estudo foi verificar a atenção dispensada à temática das vacinas no Instagram e Facebook em postagens feitas ao longo de dois anos de pandemia, identificando a temporalidade em que a discussão sobre os diferentes imunizantes nas redes sociais ocorreu e apontando atores que permearam as discussões envolvendo o tema. A coleta de dados foi feita pela interface gráfica do CrowdTangle, a partir de termos de consulta em português relacionados às vacinas aprovadas para uso no Brasil e contemplou postagens de páginas públicas no Facebook e perfis abertos no Instagram feitas de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2021. O banco de dados analisado possui 3.876.408 publicações (2.901.457 no Facebook e 974.952 no Instagram). Os resultados evidenciaram uma alternância das vacinas Pfizer, CoronaVac, AstraZeneca e Janssen como foco de discussão, acompanhando temporalmente o debate público que se estabeleceu no país em torno dos dilemas e avanços relativos ao desenvolvimento, à produção, à distribuição e à aplicação dos imunizantes. Também foram identificadas referências às instituições envolvidas na aquisição e produção dos imunizantes, como o Ministério da Saúde, o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), presentes entre os mil atores sociais que mais despertaram comentários por parte dos usuários em ambas as redes. Evidenciou-se que o debate sobre imunizantes, nos canais e no período analisados, foi permeado por meios de comunicação ligados ao jornalismo, além de páginas e perfis ligados a políticos e celebridades.

Palavras-chave:
Vacinas; Rede Social; Pandemias; Desinformação


Considering that the Internet and especially social media work as a locus for the circulation of information on COVID-19, this study aimed to assess the attention given to the vaccine theme on Instagram and Facebook in posts throughout two years of pandemic, identifying the temporality in which discussion about the different immunizing agents in social media and highlighting the actors who permeated the discussions on the subject. Data were collected using the CrowdTangle graphical interface, based on search terms in Portuguese related to vaccines approved for use in Brazil and it included posts from public Facebook pages and open Instagram profiles made from January 1st, 2020, to December 31st, 2021. The database included 3,876,408 posts (2,901,457 on Facebook and 974,952 on Instagram). The results showed an alternation of Pfizer, CoronaVac, AstraZeneca, and Janssen vaccines as the focus of discussion, following the public debate established in the country around the dilemmas and advances related to the development, production, distribution, and application of immunizing agents. References to institutions involved in the acquisition and production of immunizing agents were also identified, such as the Brazilian Ministry of Health, the Butantan Institute, and the Oswaldo Cruz Foundation, present among the thousand social actors that most generated comments from users in both networks. It was evidenced that the debate on immunizing agents, in the analyzed channels and period, was permeated by social media related to journalism and politicians and celebrities’ pages and profiles.

Keywords:
Vaccines; Social Networking; Pandemics; Disinformation


Dado que Internet y, en particular, las redes sociales funcionan como espacios de circulación de la información sobre el COVID-19, el objetivo de este estudio fue verificar la atención prestada al tema de las vacunas en Instagram y Facebook en los posts realizados a lo largo de dos años de pandemia, identificando la temporalidad en que se produjo la discusión sobre los diferentes inmunizantes en las redes sociales y señalando los actores que permeaban las discusiones que involucraban el tema. La recopilación de datos se realizó mediante la interfaz gráfica de CrowdTangle, a partir de términos de consulta en portugués relacionados con las vacunas aprobadas para su uso en Brasil y contempló publicaciones de páginas públicas en Facebook y perfiles abiertos en Instagram realizadas desde el 1º de enero de 2020 hasta el 31 de diciembre de 2021. La base de datos analizada cuenta con 3.876.408 publicaciones (2.901.457 en Facebook y 974.952 en Instagram). Los resultados mostraron una alternancia de las vacunas de Pfizer, CoronaVac, AstraZeneca y Janssen como foco de discusión, siguiendo temporalmente el debate público que se estableció en el país en torno a los dilemas y avances relacionados con el desarrollo, la producción, la distribución y la aplicación de los inmunizantes. También se identificaron referencias a instituciones involucradas en la adquisición y producción de inmunizantes, como el Ministerio de Salud de Brasil, el Instituto Butantan y la Fundación Oswaldo Cruz, presentes entre los mil actores sociales que más despertaron comentarios de los usuarios en ambas redes. Fue evidente que el debate sobre los inmunizadores, en los canales y período analizados, estuvo permeado por medios vinculados al periodismo, además de páginas y perfiles vinculados a políticos y celebridades.

Palabras-clave:
Vacunas; Red Social; Pandemias; Desinformación


Introdução

Desde o início da pandemia de COVID-19, oficialmente declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em março de 2020 11. World Health Organization. WHO Director-General's opening remarks at the media briefing on COVID-19 - 11 March 2020. https://www.who.int/director-general/speeches/detail/who-director-general-s-opening-remarks-at-the-media-briefing-on-covid-19---11-march-2020 (acessado em 14/Mar/2022).
https://www.who.int/director-general/spe...
, instituições de pesquisa de todo o mundo passaram a realizar estudos e testes para o desenvolvimento de um imunizante contra a doença causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), no que foi caracterizado como a “corrida pela vacina” 22. Massarani L, Neves LFF. Communicating the "race" for the COVID-19 vaccine: an exploratory study in newspapers in the United States, the United Kingdom, and Brazil. Front Commun (Lausanne) 2021; 6:643895.. Tema tradicionalmente presente no ambiente comunicacional 33. Catalan-Matamoros D, Peñafiel-Saiz C. How is communication of vaccines in traditional media: a systematic review. Perspect Public Health 2019; 139:34-43., a vacina ganhou ainda mais destaque por representar a esperança de conter uma crise sanitária global e foi tema recorrente na Internet e nas redes sociais digitais.

A comunicação - e, mais especificamente, aquela representada pelas redes sociais - desempenha um papel fundamental. É a arena por onde circulam, ao mesmo tempo, as informações confiáveis relacionadas à necessidade de se proteger e a desinformação propagada pelos movimentos antivacina 44. Hussain A, Ali S, Ahmed M, Hussain S. The anti-vaccination movement: a regression in modern medicine. Cureus 2018; 10:e2919.,55. Johnson N, Velásquez N, Restrepo N, Leahy R, Gabriel N, El Oud S, et al. The online competition between pro- and anti-vaccination views. Nature 2020; 582:230-3.. Apesar de haver interesse do público por informações favoráveis às vacinas nas redes sociais, estudo realizado em 2020 estimou que 13,5% dos links com maior número de engajamento eram de notícias falsas 66. Massarani L, Leal T, Waltz I. O debate sobre vacinas em redes sociais: uma análise exploratória dos links com maior engajamento. Cad Saúde Pública 2020; 36 Suppl 2:e00148319.. Além disso, observou-se que a comunicação produzida pelas instituições acadêmico-científicas tem uma participação limitada em pautar essas conversações. Embora haja um predomínio da fonte jornalística profissional, a pesquisa de Almeida 77. Almeida AM. Movimento antivacinas na internet: da apropriação e recirculação do jornalismo de saúde ao empoderamento em grupos no Facebook [Dissertação de Mestrado]. Curitiba: Universidade Federal do Paraná; 2019., a partir de grupos antivacina no Facebook (https://www.facebook.com/), mostra que esses conteúdos são apropriados pelos participantes com interpretações articuladas às suas crenças.

Apesar de o Brasil contar com um bem-sucedido Programa Nacional de Imunizações (PNI) 88. Silva Junior JB. 40 anos do Programa Nacional de Imunizações: uma conquista da saúde pública brasileira. Epidemiol Serv Saúde 2013; 22:7-8., responsável pela erradicação da poliomielite e do sarampo (até 2019), a hesitação em vacinar já vinha aumentando 99. Brown AL, Sperandio M, Turssi CP, Leite RMA, Berton VF, Succi RM, et al. Vaccine confidence and hesitancy in Brazil. Cad Saúde Pública 2018; 34:e00011618.. A vacinação contra a COVID-19 foi inserida em um contexto de disputa política que desde o início marcou a gestão da pandemia no país 1010. Bisol J. Politização da vacina é irresponsabilidade sanitária. Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário 2020; 9:192-7.,1111. The Lancet. COVID-19 in Brazil: "so what?". Lancet 2020; 395:1461.. Parte das discussões giraram em torno da eficácia dos imunizantes, da aquisição de doses e da obrigatoriedade da vacinação. Tópicos relacionados às vacinas contra COVID-19 foram capitaneados de forma controversa por lideranças políticas 1010. Bisol J. Politização da vacina é irresponsabilidade sanitária. Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário 2020; 9:192-7.,1212. Massarani L, Leal T, Waltz I, Medeiros A. Infodemia, desinformação e vacinas: a circulação de conteúdos em redes sociais antes e depois da COVID-19. Liinc em Revista 2021; 17:e5689.,1313. Monari A, de Araújo K, de Souza M, Sacramento I. Legitimando um populismo anticiência: análise dos argumentos de Bolsonaro sobre vacinação contra Covid-19 no Twitter. Liinc em Revista 2021; 17:e5707. e celebridades 1414. Dos Santos Jr. M. Clones do YouTube: replataformização da irrealidade e infraestruturas de desinformação sobre a Covid-19. Fronteiras - Estudos Midiáticos 2021; 23:140-59.,1515. Brotas A, Rocha Costa M, Massarani L. Enquadramentos e desinformação sobre vacina contra COVID-19 no YouTube: embaralhamentos entre ciência e negacionismo. Mídia & Cotidiano 2021; 15:73-100.,1616. Massuchin M, Santos M. A intersecção entre desinformação, religião e pandemia: a atuação de canais religiosos no youtube no contexto da COVID-19. Tropos 2021; 10:1-30., que disputavam a arena digital, sobretudo nas redes sociais digitais, com informações muitas vezes contrárias ao que as principais instituições científicas do país estavam apresentando.

Nosso objetivo neste estudo é analisar como a temática das vacinas está presente no Facebook e no Instagram (https://www.instagram.com/), respectivamente, a segunda e a terceira redes sociais mais utilizadas no Brasil 1717. DataReportal. Digital 2022: Brazil. https://datareportal.com/reports/digital-2022-brazil (acessado em 14/Mar/2022).
https://datareportal.com/reports/digital...
, bem como os principais atores sociais envolvidos na veiculação de conteúdos sobre os imunizantes em 2020 e 2021. Nossa análise permitirá identificar o papel desempenhado pelas instituições de pesquisa e saúde no debate digital.

Métodos

Os dados apresentados neste estudo foram coletados no dia 3 de janeiro de 2022 pela interface gráfica do CrowdTangle (https://www.crowdtangle.com/) - ferramenta do Facebook que disponibiliza acesso à base histórica de publicações a partir de uma lista de palavras-chave. A extração considerou postagens de páginas públicas no Facebook e perfis abertos no Instagram indexados pelo sistema. Os termos de consulta utilizados para a busca foram: vacina, vacinas, vacinar, vacinei, vacinou, vachina, vacinação, vacinal, vacinada, vacinadas, vacinados, vacinado, v4c1n4, coronavac, pfizer, janssen e astrazeneca. Esses termos foram selecionados para abranger variações linguísticas referentes às vacinas, em função de concordância, substantivos, flexões verbais ou variações morfológicas. Além disso, também incluímos nomes de fabricantes, como CoronaVac, AstraZeneca e Janssen, e termos com grafias como v4c1n4 e vachina para capturar usos de comunidades específicas. A cobertura temporal da coleta compreende os dias entre 1º de janeiro de 2020 e 31 de dezembro de 2021.

O dataset coletado originalmente era composto por 4.238.898 publicações, que foram posteriormente filtradas pelas palavras-chave de busca e pela exclusão de postagens em português de Portugal (publicações com links com a terminação “.pt”). Durante o processo de decupagem, notou-se que algumas publicações não continham nenhum dos termos de busca entre os elementos textuais. Eventualmente, isso ocorre por causa do mecanismo de indexação e matching do procedimento de coleta. Então, para garantir a validade dos dados, realizamos uma filtragem das postagens já extraídas para manter apenas aqueles que citassem textualmente os termos da busca. O banco de dados final possui 3.876.408 publicações, sendo 2.901.457 no Facebook e 974.952 no Instagram.

Depois de tratados e organizados, os dados foram analisados a partir de técnicas de estatísticas descritivas, comparando o total e a média de publicações e o total de comentários por: (a) plataforma; (b) séries temporais (agregadas em meses e dias); e (c) atores (perfis que publicaram os conteúdos nas plataformas). Além disso, criamos manualmente um dicionário de palavras com duas categorias: (a) vacinas (AstraZeneca, CoronaVac, Janssen e Pfizer) e (b) organizações (Instituto Butantan, Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz, Ministério da Saúde e Sistema Único de Saúde - SUS) para realizar uma análise automatizada dos textos 1818. Welbers K, Van Atteveldt W, Benoit K. Text analysis in R. Commun Methods Meas 2017; 11:245-65.. Todos os procedimentos de tratamento, organização, análise e visualização foram elaborados por scripts (Material Suplementar: http://cadernos.ensp.fiocruz.br/static//arquivo/supl-1-0547-22_1241.pdf e http://cadernos.ensp.fiocruz.br/static//arquivo/supl-2-0547-22_8170.pdf) escritos pelos autores na linguagem R (http://www.r-project.org).

Para uma análise complementar, a partir dos mil atores sociais que se demonstraram mais populares no Instagram e no Facebook, observados a partir de diferentes métricas, estabeleceu-se um recorte dos 50 mais comentados em cada uma das plataformas e, a partir dessa delimitação, foram formulados os seguintes perfis organizadores: (i) mídia, que abarca páginas e perfis de veículos noticiosos tradicionais e de mídia alternativa - essa última aqui compreendida como mídias que não fazem parte de conglomerados midiáticos 1919. Atton C. Alternative media. Londres: SAGE; 2002.,2020. Alves M. Desarranjo da visibilidade, desordem informacional e polarização no Brasil entre 2013 e 2018 [Tese de Doutorado]. Niterói: Universidade Federal Fluminense; 2019.; (ii) políticos, independentemente de filiação partidária ou espectro ideológico; (iii) instituições de pesquisa; (iv) celebridades e perfis de entretenimento; e (v) outros, que incluem fundações, organizações do poder público ou não e perfis que não puderam ser inseridos em uma das classificações anteriores. Cada uma dessas categorias recebeu um código, o qual foi empregado pelos pesquisadores sem duplicidade para a classificação dos atores do Instagram e do Facebook que compõem o recorte, de modo a viabilizar a agregação e exploração dos dados. Os resultados da aplicação da codificação foram submetidos a uma rodada de verificação por pares, não se identificando desvios relevantes.

Além dos comentários e curtidas, verificados isoladamente, o parâmetro engajamento também foi utilizado para identificar as publicações que mais estimularam a interação do público. O parâmetro em questão se refere à soma de curtidas e comentários no Instagram e à soma de curtidas, comentários e compartilhamentos no Facebook (métricas fornecidas pelas plataformas). A partir de um recorte de 5 mil postagens com maior grau de engajamento em cada rede, buscou-se identificar os principais atores responsáveis pelas mensagens mais populares.

Como nota metodológica, ponderamos que os dados apresentados a seguir foram utilizados de forma agregada em alguns momentos, principalmente para permitir a melhor observação de alguns resultados, em particular a visualização, por meio de gráficos, da temporalidade em que a temática das vacinas se desenvolveu em ambas as redes e as citações às instituições envolvidas no seu processo de desenvolvimento, aquisição e/ou distribuição no país. Entretanto, no tocante aos atores sociais que se destacaram nos debates sobre os imunizantes, consideramos mais pertinente apresentá-los separadamente, de modo a permitir a melhor caracterização da dinâmica que se estabeleceu em cada uma das plataformas, uma vez que Instagram e Facebook apresentam diferenças em suas estruturas, funcionalidades, algoritmos e modelos de datificação 2121. Bossetta M. The digital architectures of social media: comparing political campaigning on Facebook, Twitter, Instagram, and Snapchat in the 2016 U.S. election. Journal Mass Commun Q 2018; 95:471-96.. Ao comportar lógicas de comunicação próprias, a arquitetura dessas redes sugere usos particulares das possibilidades tecnológicas, sendo capaz de influenciar as normas de interação entre os usuários 2222. Papacharissi Z. The virtual geographies of social networks: a comparative analysis of Facebook, LinkedIn and ASmallWorld. New Media Soc 2009; 11:199-220.,2323. Waterloo S, Baumgartner S, Peter J, Valkenburg P. Norms of online expressions of emotion: comparing Facebook, Twitter, Instagram, and WhatsApp. New Media Soc 2017; 20:1813-31..

Resultados

Volume e temporalidade

Observando Instagram e Facebook em conjunto, a discussão sobre vacinas começou a ganhar volume nas redes em março de 2020, quando se iniciaram os primeiros testes em humanos de imunizantes contra a COVID-19 (Figura 1). A partir de dezembro do mesmo ano, o número de publicações relacionadas ao tema ultrapassou, pela primeira vez, 100 mil menções no agregado mensal das duas redes sociais (151.107 menções). Em comparação com o mês anterior, janeiro de 2021 alcançou o dobro de menções. Em fevereiro, as vacinas foram citadas 224.267 vezes e, a partir de março, o volume de publicações sobre imunizantes foi de 353.398 menções/mês, permanecendo no patamar de mais de 300 mil postagens/mês até julho.

Figura 1
Publicações sobre vacinas. Instagram e Facebook (1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2021).

Analisados separadamente, tanto Instagram como Facebook possuem temporalidades semelhantes, com referências diárias às vacinas alcançando o pico em janeiro de 2021 (dia 19: 25.514 menções no Facebook e dia 18: 8.835 menções no Instagram). Notou-se que se postou e comentou mais no Facebook, com volume 2,9 vezes maior de postagens e 1,3 maior de comentários que no Instagram (Tabela 1). Já no Instagram predominaram as curtidas, quase quatro vezes mais frequentes (3,9) que no Facebook.

Tabela 1
Indicadores gerais das redes sociais Instagram e Facebook (1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2021).

As vacinas em foco

Considerando-se a totalidade de postagens que compuseram o escopo desta pesquisa, a vacina mais citada em todo o período estudado foi a CoronaVac, com 519.838 menções. Em seguida aparecem a Pfizer, com 436.676 citações; AstraZeneca, com 406.153; e Janssen, com 96.958. Essa contagem da menção textual das palavras nas postagens, observada temporalmente, permitiu identificar os momentos em que determinado imunizante foi mais comentado e, portanto, esteve em evidência nas redes (Figura 2). Os resultados indicaram alternância no imunizante em foco.

Figura 2
Comparativo mensal das citações às principais vacinas. Instagram e Facebook (1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2021).

Em linhas gerais, o debate envolvendo as vacinas começou a se estabelecer nas redes a partir da segunda metade de 2020, com a CoronaVac protagonizando a circulação de conteúdo sobre imunizantes a partir de setembro daquele ano, atingindo pico de menções entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021. Apenas no dia 17 de janeiro de 2021, quando a vacinação começou no Brasil com a aplicação da CoronaVac, ela foi mencionada 14.617 vezes, somadas as postagens de Instagram e Facebook.

A partir de outubro de 2020, a Pfizer integrou o debate nas redes e, de modo semelhante ao que houve com a CoronaVac, apresentou curva ascendente de menções até dezembro daquele ano. Diferentemente da vacina da Sinovac, a do laboratório norte-americano desacelerou, sendo proporcionalmente pouco mencionada até abril de 2021.

Assim como as duas anteriores, ainda em 2020 circularam no Instagram e no Facebook menções à vacina da AstraZeneca, em particular a partir de novembro daquele ano. A curva relativa às postagens com menções ao imunizante permaneceu estável, com leve ascensão ao longo do primeiro semestre de 2021, atingindo pico de menções em maio e julho.

Entre os imunizantes aprovados para uso no Brasil, o da Janssen foi o menos presente nas postagens coletadas e o que demorou mais tempo a entrar nesses debates, começando a se tornar relevante em número de postagens em fevereiro de 2021, com pico de menções entre maio e junho.

Também se revelou presente nas postagens pesquisadas menção ao termo “vachina” (5.678 citações, com pico nos dias 12 e 18 de janeiro de 2021, com 203 e 152 menções, respectivamente), uma forma pejorativa utilizada por determinados grupos para se referir às vacinas, em particular à CoronaVac - neologismo a partir da combinação das primeiras sílabas das palavras “vacina” e “China”.

A coleta identificou referências ao SUS, cuja sigla foi mencionada 570.719 vezes, e ao Ministério da Saúde, que obteve 405.048 citações. O aumento considerável no conjunto de termos encontrados nas postagens relacionadas às principais instituições de saúde brasileiras se deu a partir do início da vacinação. Nesse aspecto, destaca-se a presença de instituições responsáveis pelo desenvolvimento das vacinas no Brasil: o Instituto Butantan, citado 265.310 vezes, e a Fiocruz, 181.518 (Figura 3).

Figura 3
Comparativo mensal das citações às instituições. Instagram e Facebook (1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2021).

Principais atores sociais

Dos mil atores que se demonstraram mais populares no debate sobre vacinas no Instagram, três perfis despertaram mais de um milhão de comentários: o do Presidente Jair Messias Bolsonaro (1.258.533), o do jornal O Povo Online (1.247.774) e o do então Governador de São Paulo João Doria (1.144.468). Fechando o top 5 de perfis com mais comentários, na sequência estão Mídia Ninja e Quebrando o Tabu, ambos do segmento de mídia alternativa (em número de curtidas, esses perfis ocuparam o segundo e o primeiro lugar, respectivamente com 46.311.797 e 48.363.712 cliques). No que tange ao número de impressões (métrica do Instagram que corresponde ao total de vezes que um conteúdo foi visualizado, inclusive por uma mesma conta múltiplas vezes, seja ela seguidora ou não), o perfil de Bolsonaro também se destacou (57.232.589 visualizações) - apesar de, relativamente, haver poucas postagens do presidente utilizando os termos pesquisados, somando 165 publicações em 2020 e 2021.

Fazendo-se um recorte dos 50 atores sociais com mais comentários no Instagram, notou-se a prevalência de veículos de mídia (21 perfis). Também foi expressiva a presença de celebridades e agentes derivados desse universo, como perfis de humor e de fofoca (totalizando 11) - conjunto do qual se sobressai a ex-BBB Juliette, que, com apenas nove postagens, movimentou a rede, conquistando mais de 15 milhões de curtidas e 239.482 comentários. Dez perfis foram identificados como canais de políticos. Considerando-se a filiação partidária do político no período analisado (conforme parâmetros estabelecidos por Bolognesi et al. 2424. Bolognesi B, Ribeiro E, Codato A. Uma nova classificação ideológica dos partidos políticos brasileiros. Dados Rev Ciênc Sociais 2021; 66:e20210164.), identificou-se a prevalência do espectro ideológico de direita (6 perfis) sobre o de esquerda (4 perfis). Apenas duas instituições diretamente ligadas à área da saúde compuseram o recorte: o Ministério da Saúde, em 19º lugar (com 427.172 comentários e 1.251 postagens) e, entre os agentes autorizados cientificamente a falar sobre vacinas, o Instituto Butantan apareceu em 29º, com 280.887 comentários em 915 postagens. Pela métrica dos comentários, a Fiocruz ocupou o 198º lugar (48.836) no Instagram.

No Facebook, sete atores conquistaram mais de um milhão de comentários, sendo eles ou veículos de mídia - portais ou sites de notícias (UOL Notícias, G1, Quebrando o Tabu, CNNBrasil e O Antagonista, associando a mídia tradicional à mídia alternativa) ou perfis políticos (Jair Messias Bolsonaro e João Doria). A página de Bolsonaro também estava entre as mais curtidas, ocupando o primeiro lugar (13.584.087 curtidas), seguida pela da Fiocruz (12.128.357 curtidas), na 16ª posição entre as mais comentadas (723.750).

No recorte dos 50 atores mais comentados, 78% da amostragem foi composta por veículos de mídia (21 canais) e páginas de políticos (18 ao todo - 10 de direita e 8 de esquerda). Na amostragem ainda se destacaram perfis de celebridades e entretenimento (4) e de instituições de pesquisa (2), com a Fiocruz na 16ª posição (723.750 comentários) e o Instituto Butantan em 25º (417.191). O Ministério da Saúde, incluído na categoria “outros” (5), apareceu em 17º lugar (668.186), ao lado de outras instituições do poder público e da sociedade civil.

Atores por publicação

Levando-se em conta as 5 mil publicações com mais interações em cada plataforma, foi possível identificar a recorrência de alguns agentes que despontaram em popularidade, “engajando” internautas em torno da discussão sobre vacinas nas redes. Nesse sentido, o debate no Instagram se deu proeminentemente mediado por celebridades, com todas as mensagens que ultrapassaram um milhão de engajamentos (n = 14) caracterizadas por pertencerem a artistas e atletas que aderiram publicamente à vacinação, como a ex-BBB Juliette (responsável por nove das dez postagens com mais engajamento na rede, dentro do recorte pesquisado), o jogador de futebol Neymar Jr., os influenciadores Giovanna Ewbank e Whindersson Nunes, as atrizes Cleo Pires (perfil All and Everything) e Mel Maia, a skatista Rayssa Leal e as apresentadoras Tatá Werneck e Xuxa.

Entre as postagens que geraram mais interações no Facebook, destacaram-se as de Jair Bolsonaro, cuja mensagem com mais engajamento foi postada em 24 de outubro de 2020 e trazia a foto do presidente ao lado de um cachorro e os dizeres “Boa noite a todos. Vacina obrigatória só aqui no Faísca”, registrando 851.233 interações com o conteúdo. A postagem da cantora Preta Gil, de 11 de junho de 2021, em que defendeu o uso de máscara para conter a COVID-19 e lamentou o baixo número de vacinados no país, ocupou o segundo lugar no mesmo ranking (775.458 interações).

Além das citadas, dez postagens provenientes de políticos, celebridades ou páginas de humor ultrapassaram 500 mil engajamentos. Uma postagem relacionando a vacina à “Marca da Besta”, feita pelo Pastor Antônio Júnior (autointitulado “dono do maior canal cristão do mundo no YouTube, com mais de 9 milhões de inscritos”) também integrou o recorte (728.321), assim como a mensagem do Instituto Butantan, na qual a instituição prestou solidariedade à família de Tarcísio Meira, morto em virtude de complicações da COVID-19 em 2021 (541.502).

A coleta identificou menções às vacinas não apenas relacionadas ao combate ao SARS-CoV-2, ressaltando que, mesmo em um contexto pandêmico, o uso de imunizantes faz parte de um debate mais amplo e se encontra presente nas redes a partir de diferentes atores, perspectivas e lugares de fala. A postagem da vereadora e protetora dos animais Carol Midori (741.978 interações no Facebook; terceiro lugar do ranking de engajamentos) exemplifica a questão: na mensagem, ela fez referência a vacinas como parte de um conjunto de ações relacionadas ao resgate de cães abandonados nas ruas. O uso de imunizante como parte dos cuidados com os animais em geral esteve presente em várias outras postagens que engajaram os internautas em ambas as plataformas.

Discussão

As instituições de pesquisa dividem e disputam espaço com atores sociais não científicos no debate digital sobre ciência e saúde. As mídias sociais, com sua ecologia complexa que envolve particularidades em termos de estrutura de rede, funcionalidade, filtragem algorítmica e datificação 2121. Bossetta M. The digital architectures of social media: comparing political campaigning on Facebook, Twitter, Instagram, and Snapchat in the 2016 U.S. election. Journal Mass Commun Q 2018; 95:471-96.,2525. Maia RC, Rezende TA. Democracia e a ecologia complexa das redes sociais online: um estudo sobre discussões acerca do racismo e da homofobia. Intexto 2015; (34):492-512., tornaram-se territórios utilizados por uma multiplicidade de atores para opinar sobre uma ampla gama de questões científicas 2626. Brossard D. New media landscapes and the science information consumer. Proc Natl Acad Sci U S A 2013; 110:14096-101. - o que, em última análise, acaba por impactar o processo de formação da opinião pública sobre os mais diversos assuntos, entre eles as vacinas.

Neste estudo, observamos como temas relacionados às vacinas circularam no Instagram e Facebook, a partir de postagens feitas por páginas e perfis brasileiros, com a discussão acompanhando temporalmente o debate público que se estabeleceu no país em torno dos dilemas e avanços relativos ao desenvolvimento, à produção, à distribuição e à aplicação dos imunizantes contra a COVID-19. Notou-se que a discussão começou a se fazer relevante nas redes a partir dos primeiros testes dos imunizantes em humanos, em março de 2020. Entretanto, foi a partir de dezembro do mesmo ano que ocorreu um aumento expressivo de engajamento gerado pelas postagens relacionadas ao assunto, coincidindo com o momento em que o Reino Unido se tornou o primeiro país ocidental a aprovar uma vacina contra a COVID-19, além do começo da vacinação em diversos países, como Estados Unidos e Chile. Os dados revelaram que as redes refletiram o aquecimento das discussões no Brasil sobre a aprovação de imunizantes, além da expectativa para o início da vacinação no país. Contextualizar a discussão contribui, portanto, para compreender o protagonismo inicial da CoronaVac e da Pfizer, seguidas pela AstraZeneca, nas discussões que se estabeleceram em ambas as redes, evidenciando a porosidade das esferas públicas e a capacidade que elas possuem de se influenciarem mutuamente 2727. Habermas J. Direito e Democracia: entre faticidade e validade. v. II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; 1997.,2828. Maia R. Democracia e a internet como esfera pública virtual: aproximação às condições de deliberação. In: Gomes W, Maia R, organizadores. Comunicação e Democracia - problemas & perspectivas. São Paulo: Paulus; 2008. p. 277-92..

A CoronaVac obteve protagonismo entre o findar de 2020 e o início de 2021, sendo o primeiro imunizante a ser aprovado e aplicado nacionalmente. O evento foi explorado midiaticamente a partir de São Paulo, pela administração de João Dória, em um contexto marcado pela lentidão e desarticulação do Ministério da Saúde na compra de imunizantes, “gerando um cenário de incerteza que agrava a crise sanitária2929. Paula JE, Camilo LP, Siqueira EW. A corrida pela vacinação contra a Covid-19 no Brasil: como as fake news e o descaso do governo podem influenciar na imunização? https://cjt.ufmg.br/2021/02/03/acorrida-pela-vacinacao-contra-a-covid-19-no-brasil-como-as-fake-news-e-o-descaso-dogoverno-podem-influenciar-na-imunizacao/ (acessado em 24/Fev/2022).
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. Cabe, ainda, observar que ela entrou no debate público brasileiro pautada por parte da mídia como “a vacina chinesa”, enquadramento adotado por agentes do governo para desqualificar o imunizante e que também se fez presente nas redes. O achado “vachina” entre os resultados pode ser compreendido como resultado e também sintoma da complexidade do problema que envolve a divulgação científica e a circulação de desinformação, fenômeno no qual se incluem disputas de narrativas entre diferentes atores sociais.

Já a Pfizer se fez mais presente nas redes a partir de abril de 2021, quando o Brasil recebeu o primeiro lote do imunizante, em meio a críticas de atrasos na compra da vacina e a questionamentos iniciais em relação à sua distribuição e armazenagem. Isso gerou um forte engajamento das pessoas nas redes, que se manteve com os desdobramentos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), instalada em 27 de abril de 2021 para investigar irregularidades nas ações do governo no enfrentamento à pandemia. Inicialmente prevista para durar 90 dias, a “CPI da Pandemia” acabou sendo prorrogada por mais 90, concluindo que o atraso na compra das vacinas foi “deliberado” e “a mais grave omissão do Governo Federal3030. Senado Federal. CPI da Pandemia - relatório final. https://legis.senado.leg.br/comissoes/mnas?codcol=2441&tp=4 (acessado em 26/Out/2021).
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A AstraZeneca, por sua vez, tem em sua trajetória no Brasil a vinculação a uma instituição de pesquisa em saúde muito conhecida pelos brasileiros, percebida como “patrimônio da sociedade brasileira” e considerada por muitos “a mais importante para o país3131. Massarani L, Polino C, Mendes I, Fagundes V, Castelfranchi Y. Como brasileiros e brasileiras veem a Fiocruz: um estudo em 12 cidades do país. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia; 2020. (p. 26). A disponibilização do imunizante, portanto, caminhou juntamente à expectativa de uma produção da vacina totalmente em solo nacional pela Fiocruz, assim como a CoronaVac, pelo Instituto Butantan. Por outro lado, o debate sobre a AstraZeneca foi atravessado por notícias relacionadas a efeitos colaterais graves, envolvendo inclusive a morte de uma gestante, em maio de 2021, período em que o imunizante atingiu o pico de menções nas redes.

A judicialização do debate, com o Supremo Tribunal Federal (STF) sendo provocado a decidir quanto à obrigatoriedade da vacinação contra a COVID-19 e à autonomia de estados e municípios para estabelecer regras para a imunização 3232. Oliveira V, Madeira L. Judicialização da política no enfrentamento à Covid-19: um novo padrão decisório do STF? Revista Brasileira de Ciência Política 2021; (35):e247055.,3333. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 770. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6068402 (acessado em 05/Set/2022).
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, também contribuiu para acrescentar mais um elemento que merece atenção em estudos de conteúdo que venham a ser realizados. Neste trabalho, destacamos que, apenas em dezembro de 2020, foram identificadas mais de 151 mil publicações relacionadas aos imunizantes nas redes, corroborando estudos que demonstraram que a pandemia provocou um crescimento significativo da relevância da vacinação como tema de debate público - a exemplo do demonstrado por Massarani et al. 1212. Massarani L, Leal T, Waltz I, Medeiros A. Infodemia, desinformação e vacinas: a circulação de conteúdos em redes sociais antes e depois da COVID-19. Liinc em Revista 2021; 17:e5689., que identificaram aumento de 8,6 vezes da média de engajamento dos links sobre vacina em 2020, em comparação com 2018-2019.

Os resultados apontaram atores sociais que se destacaram em meio à profusão de informações que circularam no Instagram e no Facebook, entre eles instituições brasileiras que são referência em saúde no país e com acordos de transferência de tecnologia para a produção de imunizantes contra a COVID-19 no Brasil - o Instituto Butantan e a Fiocruz. As duas vacinas mais citadas ao longo de todo o primeiro semestre de 2021, inclusive, foram provenientes de seus laboratórios. Esse protagonismo deve ser compreendido a partir de uma chave de leitura que contemple, além da discussão científica, as disputas políticas que atravessam o debate sobre as vacinas no país. Nesse sentido, convém pontuar que as plataformas digitais possuem um grande potencial para a promoção da saúde, embora tenham se mostrado como espaços propícios para a circulação de desinformação, inclusive no tocante à segurança e à eficácia das vacinas 66. Massarani L, Leal T, Waltz I. O debate sobre vacinas em redes sociais: uma análise exploratória dos links com maior engajamento. Cad Saúde Pública 2020; 36 Suppl 2:e00148319.,1212. Massarani L, Leal T, Waltz I, Medeiros A. Infodemia, desinformação e vacinas: a circulação de conteúdos em redes sociais antes e depois da COVID-19. Liinc em Revista 2021; 17:e5689.,3434. Cossard A, Francisci G, Kalimeri K, Mejova Y, Paolotti D, Starnini M. Falling into the echo chamber: the Italian vaccination debate on Twitter. Proceedings of the International AAAI Conference on Web and Social Media 2020; 14:130-40.,3535. Ginossar T, Cruickshank I, Zheleva E, Sulskis J, Berger-Wolf T. Cross-platform spread: vaccine-related content, sources, and conspiracy theories in YouTube videos shared in early Twitter COVID-19 conversations. Hum Vaccin Immunother 2022; 18:1-13.,3636. Kata A. Anti-vaccine activists, web 2.0, and the postmodern paradigm - an overview of tactics and tropes used online by the anti-vaccination movement. Vaccine 2012; 30:3778-89.,3737. Olive J, Hotez P, Damania A, Nolan M. The state of the antivaccine movement in the United States: a focused examination of nonmedical exemptions in states and counties. PLoS Med 2018; 15:e1002578.. Mas, a despeito de um cenário em que a hesitação vacinal se insere como parte de um problema mais abrangente e em que as instituições produtoras de conhecimento e verdade encontram-se desacreditadas por parte da sociedade 3838. Albuquerque A, Quinan R. Crise epistemológica e teorias da conspiração: o discurso anti-ciência do canal -Professor Terra Plana-. Mídia e Cotidiano 2019; 13:83-104.,3939. Oliveira T. Desinformação científica em tempos de crise epistêmica: circulação de teorias da conspiração nas plataformas de mídias sociais. Fronteiras - Estudos Midiáticos 2020; 22:21-35., é interessante constatar que as principais instituições de saúde brasileiras à frente das pesquisas e do desenvolvimento de vacinas no país estavam presentes no recorte pesquisado, inclusive entre os perfis do Instagram e páginas do Facebook que mais obtiveram comentários.

No Instagram, em parte devido a suas características relacionadas à prevalência de um viés estético 2323. Waterloo S, Baumgartner S, Peter J, Valkenburg P. Norms of online expressions of emotion: comparing Facebook, Twitter, Instagram, and WhatsApp. New Media Soc 2017; 20:1813-31., as celebridades e outros agentes vinculados ao entretenimento revelaram-se vozes potentes nas discussões sobre as vacinas. A literatura chama a atenção para o potencial catalisador e formador de opinião que pessoas famosas possuem nos debates estabelecidos na Internet, muitas vezes contribuindo para a propagação de desinformação e impulsionando movimentos antivacina 4040. Vasconcellos-Silva P, Castiel L. A internet na história dos movimentos anti-vacinação. ComCiência 2010; (121). http://comciencia.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-76542010000700011&lng=es&nrm=iso.
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. Por outro lado, nossos resultados demonstram que, entre aquelas que conquistaram maior interação, encontram-se celebridades que se notabilizaram pela defesa das medidas de isolamento e da vacinação para o combate à COVID-19. Ressalta-se que, ao se pensar uma gestão mais estratégica da comunicação sobre saúde na contemporaneidade, há que se contemplar esses agentes e com eles construir pontes para a difusão de informação de qualidade, ratificando perspectivas que enfatizem o potencial de outros conteúdos, que não os estritamente jornalísticos e/ou científicos, para estimular o debate sobre ciências - a exemplo do demonstrado por Kirby 4141. Kirby D. Science and technology in film: themes and representations. In: Bucchi M, Trench B, editores. Handbook of public communication of science and technology. 2ª Ed. Nova York: Routledge; 2014. p. 97-112. e Singhal et al. 4242. Singhal A, Papa M, Sharma D, Pant S, Worrell T, Muthusuamy N. Entertainment education and social change: the communicative dynamics of social capital. Journal of Creative Communications 2006; 1:1-18..

Os dados evidenciaram também uma discussão sobre imunizantes fortemente permeada por políticos, com destaque no Facebook, a partir de postagens que obtiveram, em alguns casos, mais de um milhão de comentários mencionando as vacinas e protagonizando as que geraram maior engajamento. Dentro dessa categoria encontramos representantes de espectros ideológicos dicotômicos, com uma prevalência da direita, acirrando a disputa por visibilidade estabelecida por diferentes vozes nas redes sociais. Esse resultado pode ser compreendido como um alerta para o possível viés do debate que se estabeleceu a partir das postagens desses atores sociais, em sintonia com estudos apontando uma relação entre alinhamento ideológico à direita e estratégias negacionistas e de deslegitimação da ciência 4343. Oliveira T, Evangelista S, Alves M, Quinan R. "Those on the right take chloroquine": the illiberal instrumentalisation of scientific debates during the COVID-19 pandemic in Brasil. Javnost 2021; 28:165-84.. Novas investigações poderão afirmar com maior precisão quanto ao enviesamento da discussão sobre as vacinas nas redes sociais, contemplando estudos sobre ideologia partidária e os discursos políticos promovidos nas redes sociais, o que não é o foco neste trabalho. De toda sorte, a multiplicidade de atores sociais encontrada em nossa amostra aponta no sentido de um debate sobre vacinas permeado por uma diversidade de perspectivas que vão além da dicotomia esquerda-direita.

Os resultados convergiram ainda na direção de estudos anteriores que apontaram as organizações de notícias como fonte proeminente no conteúdo sobre a COVID-19 4444. Stocking G, Matsa KE, Khuzam M. As COVID-19 emerged in U.S., Facebook posts about it appeared in a wide range of public pages, groups. Washington DC: Pew Research Center; 2020.. Porém, sugerimos observar o fenômeno a partir de lentes ampliadas, considerando veículos de mídia de forma mais abrangente, ou seja, aqueles ligados à produção jornalística em um sentido lato, seja ela norteada por parâmetros tradicionais ou alternativos de produção de notícias e opinião.

Considerações finais

Os resultados deste estudo indicaram um debate público sobre ciência e saúde atravessado por políticos e celebridades que, em um contexto de pandemia global, estimularam as discussões sobre vacinas, pautando o assunto ao lado de meios de comunicação jornalísticos e instituições científicas. Esses agentes sociais disputam o mesmo espaço e contribuem para circular interpretações capazes de engajar as pessoas em discussões que apresentam desdobramentos no tocante à adesão ou não aos imunizantes, o que acrescenta mais uma camada para a compreensão do complexo fenômeno que é a hesitação vacinal na atualidade.

Identificar que as trocas de mensagens são, nas redes de relacionamento, permeadas por diferentes agentes, e que estes possuem pesos distintos no tocante à mobilização que geram na audiência, contribui para o planejamento estratégico da divulgação científica e de políticas públicas de saúde, contemplando um cenário de desinformação e acirramento das disputas políticas, inclusive no que diz respeito ao debate sobre vacinas 4545. Mønsted B, Lehmann S. Characterizing polarization in online vaccine discourse - a large-scale study. PLoS One 2022; 17:e0263746.. Além disso, com a pandemia de COVID-19, ficou ainda mais evidente que o envolvimento das pessoas em questões científicas é fundamental para a sociedade e deve caminhar ao lado da compreensão pública sobre esses temas - daí a importância de as instituições científicas participarem das discussões para além dos espaços acadêmicos ou científicos, bem como repensarem (ou atualizarem) constantemente as formas de interação com o público.

Pondera-se, por fim, que os dados obtidos possibilitaram identificar temporalidades e atores que marcaram a difusão de mensagens sobre as vacinas no Instagram e no Facebook, porém, as dinâmicas dessas redes envolvem a coleta e o tratamento de um grande volume de informações, as quais ainda abrem espaço para o desenvolvimento de pesquisas futuras.

Agradecimentos

Este artigo foi realizado no escopo do Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Conta com apoio do edital CNPq (PROEP-COC, PPSUS e ARC). E. M. Carvalho, T. M. Oliveira, L. Massarani e M. S. Carvalho agradecem ao CNPq respectivamente pela bolsa de Apoio à Difusão do Conhecimento 1A, Produtividade em Pesquisa 2, Pq 1B e Pq 1B. T. M. Oliveira e L. Massarani agradecem à Faperj pelo Jovem Cientista do Nosso Estado e Cientista do Nosso Estado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    25 Mar 2022
  • Revisado
    23 Set 2022
  • Aceito
    14 Out 2022
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br