Dinâmica do capitalismo financeirizado e o sistema de saúde no Brasil: reflexões sob as sombras da pandemia de COVID-19

The dynamics of financialized capitalism and the Brazilian health system: reflections in the shadows of the COVID-19 pandemic

Dinámica del capitalismo financiarizado y el sistema de salud en Brasil: reflexiones bajo las sombras de la pandemia de COVID-19

José Carlos de Souza Braga Giuliano Contento de Oliveira Sobre os autores

Resumos

A pandemia de COVID-19 no Brasil explicitou a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) e as limitações do sistema de saúde vigente no país, composto pelos setores público e privado, no contexto do capitalismo financeirizado em que instabilidades e crises típicas são estruturalmente determinadas. Nesse sentido, o artigo discute o sistema de saúde no Brasil sob a égide do capitalismo financeirizado e à luz da pandemia de COVID-19. Sustenta-se que a financeirização enquanto padrão sistêmico de riqueza potencializa processo de coisificação das relações socioeconômicas que é imanente a esse sistema, tornando indispensável o provimento dos serviços de saúde pelo Estado.

Palavras-chave:
Financiamento dos Sistemas de Saúde; Sistemas Nacionais de Saúde; Capitalismo; COVID-19


The COVID-19 pandemic in Brazil has highlighted the importance of the Brazilian Unified National Health System (SUS) and the limitations of the country’s prevailing health system, consisting of the public and private sectors, in the context of financialized capitalism in which typical instabilities and crises are structurally determined. The article discusses the Brazilian health system under the aegis of financialized capitalism and during the COVID-19 pandemic. The article contends that financialization as a systemic pattern of wealth increases the process of commodification of socioeconomic relations which is inherent to this system, making the State’s provision of health services indispensable.

Keywords:
Health System Financing; National Health Systems; Capitalism; COVID-19


La pandemia de COVID-19 en Brasil explicitó la importancia del Sistema Único de Salud (SUS) y las limitaciones del sistema de salud vigente en el país, compuesto por los sectores público y privado, en el contexto del capitalismo financiarizado, donde las inestabilidades y crisis típicas están determinadas estructuralmente. En ese sentido, el artículo discute el sistema de salud en Brasil bajo la égida del capitalismo financiarizado y a la luz de la pandemia de COVID-19. Se sostiene que la financiarización, como patrón sistémico de riqueza, potencia el proceso de cosificación de las relaciones socioeconómicas que es inmanente a este sistema, convirtiendo en indispensable la provisión de los servicios de salud por parte del Estado.

Palabras-clave:
Financiación de los Sistemas de Salud; Sistemas Nacionales de Salud; Capitalismo; COVID-19


Introdução

A pandemia de COVID-19 no Brasil revelou-se alarmante. Até o final do mês de setembro de 2020, já eram mais de 140 mil óbitos e cerca de 4,8 milhões de casos, segundo os dados oficiais (embora seja constatado o problema da subnotificação dos números de óbitos e casos da doença). O significativo aumento dos casos de síndrome respiratória aguda (SRAG) sem origem identificada, especialmente nas regiões de baixo nível socioeconômico, indica relevante subnotificação dos dados oficiais de casos e mortes de COVID-19 11. Souza WM, Buss LF, Candido DS, Carrera J-P, Li S, Zarebski AE, et al. Epidemiological and clinical characteristics of the COVID-19 epidemic in Brazil. Nat Hum Behav 2020; 4:856-65.. A pandemia explicitou a enorme desigualdade social prevalecente no país, revelou o caráter imprescindível do sistema público de saúde e, também, as suas limitações, diante de uma situação permanente e crescente de subfinanciamento.

O capitalismo financeirizado, caracterizado pela busca incessante pela valorização e acumulação da riqueza, em sua forma mais geral, sob dominância financeira, exacerba a tensão entre expansão e crise, a concorrência intercapitalista e a desigualdade social. Sob o tipo específico de desenvolvimento capitalista que caracteriza o subdesenvolvimento, essas contradições se revelam de forma mais explícita e radical. A vida e, por suposto, o direito a ela tendem a tornar-se simples mercadorias como quaisquer outras.

Nesse sentido, o artigo discute o sistema de saúde no Brasil sob a égide do capitalismo financeirizado, em suas determinações internacional e brasileira, no contexto da crítica situação sanitária mencionada. Argumenta-se que a financeirização corresponde ao modo de ser da riqueza no capitalismo contemporâneo e que, ao exacerbar a concorrência entre corporações como capitais centralizados nas diferentes esferas de valorização da riqueza e concorrer para elevar a desigualdade social, atua no sentido de potencializar o movimento de reificação, coisificação, imanente a esse sistema. No Brasil, isso se revelou de forma bastante contundente na crise sanitária provocada pela pandemia de COVID-19, em que os mais ricos, cobertos pelo sistema de saúde suplementar ou capazes de arcar com os custos dos serviços de saúde, tiveram mais êxito no diagnóstico e tratamento da doença do que os mais pobres. Não fosse a existência do Sistema Único de Saúde (SUS), a situação seria muito pior.

O artigo está dividido em mais três seções, além desta introdução e da conclusão. A seguir, discute-se o capitalismo financeirizado a partir do conceito de financeirização, de modo a propiciar a compreensão da gênese, da estrutura e da dinâmica desse sistema. Depois, analisa-se o sistema de saúde no Brasil, com destaque ao sistema público de saúde e ao papel crescente ocupado pelo sistema privado. Por fim, discute-se a pandemia de COVID-19 e alguns dos seus principais efeitos no Brasil, no contexto internacional de instabilidade e de alta incerteza.

Capitalismo financeirizado

A financeirização corresponde ao padrão sistêmico de riqueza do capitalismo contemporâneo. Compreende-se o termo “padrão” da forma como se tem definido (moeda-crédito-patrimônio, com expressiva importância da capitalização financeira), gerido (macroestrutura financeira, espaço onde se dá a negociação de ativos monetário-financeiros) e realizado (importância crescente dos ganhos financeiros relativamente aos operacionais) a riqueza no capitalismo hodierno. “Sistêmico”, por seu turno, envolve toda a multiplicidade de atores relevantes desse sistema, ainda que em diferentes graus e intensidades, seja de forma direta seja indireta. A expressão “de riqueza”, por sua vez, designa, no capitalismo, as decisões que visam à permanente valorização e acumulação da riqueza sob a forma de moedas e quase-moedas - ativos financeiros com alto grau de liquidez 22. Braga JCS, Oliveira GC, PJW Wolf, Palludeto AWA, Deos SS. For a political economy of financialization: theory and evidence. Economia e Sociedade 2017; 26(n. espec):829-56.,33. Braga JCS. A financeirização da riqueza: a macroestrutura financeira e a nova dinâmica dos capitalismos centrais. Economia e Sociedade 1993; 2:25-57.,44. Braga JCS. Financeirização global: o padrão sistêmico da riqueza do capitalismo. In: Fiori JL, Tavares MC, organizadores. Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. Petrópolis: Editora Vozes; 1997. p. 195-242.,55. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: teoria da dinâmica e financeirização do capitalismo. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 2000.,66. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: uma contribuição à teoria da dinâmica capitalista [Tese de Doutorado]. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 1985..

A financeirização deve ser compreendida, pois, como subproduto da progressiva interpenetração e interdependência das esferas produtivo-tecnológica-comercial e monetário-financeira das economias, esferas que constituem uma totalidade única, porque são indissociáveis. É um processo, portanto, que foi se conformando ao longo do tempo histórico e que se consolidou com a dissolução dos acordos de Bretton Woods (Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas, New Hampshire, Estados Unidos), no início dos anos 1970 33. Braga JCS. A financeirização da riqueza: a macroestrutura financeira e a nova dinâmica dos capitalismos centrais. Economia e Sociedade 1993; 2:25-57.,77. Belluzzo LGM. O dinheiro e as transfigurações da riqueza: uma economia política da globalização. In: Foori JL, Tavares MC, organizadores. Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. Petrópolis: Editora Vozes; 1997. p. 151-93.,88. Oliveira GC. Instabilidade estrutural e evolução dos fluxos internacionais de capitais privados líquidos para a periferia (1990-2009). In: Cintra MAM, Gomes KR, organizadores. As transformações no sistema financeiro internacional. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2012. p. 501-45.. Por isso, a financeirização corresponde a um desdobramento lógico-histórico-dialético do capitalismo, que culminou com a fusão das formas parciais de capital sob dominância financeira. Trata-se, dessa forma, de um modo de ser desse sistema, e não de uma deformação.

Mas por que sob dominância financeira? Porque, como indicado, no capitalismo contemporâneo a riqueza se apresenta, sobretudo, sob a forma de ativos monetário-financeiros. Dessa forma, as oscilações dos preços desses ativos em seus respectivos mercados de negociação provocam alterações do valor monetário (de mercado) dessa riqueza, influenciando as decisões de gasto dos atores econômicos, como investimento e consumo 66. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: uma contribuição à teoria da dinâmica capitalista [Tese de Doutorado]. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 1985.,99. Coutinho L, Belluzzo LG. Financeirização da riqueza, inflação de ativos e decisões de gasto em economias abertas. Economia e Sociedade 1998; 7:137-50.,1010. Oliveira GC. Financeirização da riqueza e dinâmica econômica. Ensaios FEE 2009; 30:727-54..

Nesse sistema, as decisões de balanço dos detentores de riqueza são regidas a partir de um cálculo financeiro geral formado por ganhos operacionais e não operacionais, de tal modo que as suas expectativas em relação aos ganhos decorrentes das negociações com ativos financeiros são cruciais para as suas decisões de gasto. Com efeito, a dinâmica econômica (vale dizer, as flutuações da produção, da renda e do emprego ao longo do tempo) passa a ser cada vez mais ditada pelos preços (atuais e esperados) dos ativos financeiros negociados nos diversos mercados do mundo.

É nesse sentido que o capitalismo contemporâneo pode ser denominado “capitalismo financeirizado” ou “capitalismo sob dominância financeira”, pois as decisões de balanço desses atores ocorrem sob a prevalência desse padrão sistêmico de riqueza. Por decisões de balanço, vale esclarecer, compreende-se a gestão dinâmica de ativos e passivos com diferentes graus de liquidez, maturidades e taxas de juros, estando contempladas, evidentemente, as decisões de gasto dos atores.

Procura-se, com essas definições, não apenas melhor caracterizar o capitalismo hodierno, no sentido de identificar mais rigorosamente a natureza desse sistema, mas, a partir disso, compreender a sua dinâmica cada vez mais instável e determinada pelas finanças em geral.

Nesse sistema, não apenas as instituições financeiras buscam e viabilizam, sempre que possível, ganhos decorrentes de negociações com ativos financeiros. Empresas que atuam no dito “setor produtivo”, conforme já salientado, também atuam de forma relevante nos diferentes segmentos dos mercados financeiros, cada vez mais mundializados e integrados. A concorrência financeira está superposta e conectada ao acirramento da concorrência industrial e comercial 44. Braga JCS. Financeirização global: o padrão sistêmico da riqueza do capitalismo. In: Fiori JL, Tavares MC, organizadores. Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. Petrópolis: Editora Vozes; 1997. p. 195-242.. Por isso, o capitalismo financeirizado não implicou estagnação da economia mundial desde o fim do sistema de Bretton Woods, pois isso suporia a ausência de interdependência e interpenetração entre as esferas produtivo-tecnológica-comercial e monetário-financeira das economias.

Nesse sistema, as grandes corporações, que ditam a divisão internacional do trabalho, são multinacionais, multissetoriais e multifuncionais. Isto é, elas atuam em diversos países, em diversos setores econômicos e nas diferentes esferas de valorização da riqueza. Por isso, o capitalismo financeirizado suscita a crescente centralização e concentração do capital, além da exacerbação da concorrência entre as corporações no âmbito da mesoestrutura. Mesoestrutura é definida como o espaço correspondente à concorrência entre as corporações como capitais centralizados, com os capitais operando como capital em geral, nas diferentes esferas de valorização da riqueza 55. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: teoria da dinâmica e financeirização do capitalismo. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 2000..

Do ponto de vista da dinâmica, importa destacar que as flutuações econômicas passaram a ser cada vez mais ditadas pelas finanças, e o capitalismo financeirizado potencializou a instabilidade, vale dizer, a tensão entre expansão e crise intrínseca às economias capitalistas 22. Braga JCS, Oliveira GC, PJW Wolf, Palludeto AWA, Deos SS. For a political economy of financialization: theory and evidence. Economia e Sociedade 2017; 26(n. espec):829-56.,33. Braga JCS. A financeirização da riqueza: a macroestrutura financeira e a nova dinâmica dos capitalismos centrais. Economia e Sociedade 1993; 2:25-57.,1111. Guttmann R. Uma introdução ao capitalismo dirigido pelas finanças. Novos Estudos 2008; 82:11-33.. Evidentemente, essa instabilidade apresentou variações entre os diversos países do mundo, a depender, em medida considerável, das suas respectivas formas de inserção nesse sistema, mais ou menos subordinadas.

Essas formas diferenciadas de inserção dos países, cumpre esclarecer, decorreram não apenas das suas escolhas realizadas, mas, sobretudo, da posição ocupada por cada um deles na economia mundial e no sistema monetário-financeiro internacional, bem como das circunstâncias históricas então prevalecentes quando da consolidação do capitalismo financeirizado. Está dito “sobretudo” porque as respectivas condições e circunstâncias históricas impuseram maior ou menor grau de liberdade para os países realizarem as suas escolhas com relação às suas respectivas estratégias de desenvolvimento, quando existentes.

Países de moedas inexpressivas (inconversíveis) internacionalmente e que se inseriram de forma subordinada no capitalismo financeirizado, como o Brasil, apresentaram, de maneira geral, trajetórias econômicas marcadas por crises e instabilidades crônicas, que muitas vezes se traduziram em regressos econômicos e sociais significativos. A ausência de crescimento econômico mais duradouro, elevado e consistente ao longo do tempo dificultou sobremaneira, para muitos desses países, a realização de políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de vida da população.

A esta altura, seria ocioso registrar que o dólar corresponde à moeda da financeirização e que a economia mundial constitui um sistema hierarquizado tanto no âmbito monetário-financeiro como na dimensão produtivo-tecnológico-comercial 55. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: teoria da dinâmica e financeirização do capitalismo. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 2000.,1212. Tavares MC. A retomada da hegemonia norte-americana. In: Tavares MC, Fiori JL, organizadores. Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. Petrópolis: Editora Vozes; 1997. p. 27-53.. Esse padrão sistêmico de riqueza teve suas sementes plantadas no mercado de dólares fora dos Estados Unidos, vale dizer, no âmbito do euromercado, já a partir de meados dos anos 1950, e atingiu a sua plenitude nesse mesmo país 1313. Cintra MAM. A dinâmica do novo regime monetário-financeiro americano: uma hipótese de interpretação. Estud Av 2000; (39):103-41..

Nesse sentido, ao mesmo tempo em que a globalização financeira, viabilizada pela crescente liberalização e desregulamentação dos mercados financeiros, suscitou a mundialização desse padrão sistêmico de riqueza, a financeirização, por seu turno, concorreu para ampliar o grau de abertura dos mercados financeiros das economias nacionais, diante do risco de exclusão desses países dos fluxos voluntários internacionais de capital. Assim sendo, a globalização financeira e a financeirização são fenômenos coetâneos e que, além disso, apresentam causação mútua.

Submetidos à supremacia dos mercados e, portanto, à instabilidade estrutural dos fluxos internacionais de capital, os países periféricos inseridos nesse sistema de forma mais subordinada apresentaram baixo grau de autonomia para administrar as suas políticas econômicas para fins domésticos 1010. Oliveira GC. Financeirização da riqueza e dinâmica econômica. Ensaios FEE 2009; 30:727-54.. Isso, evidentemente, produz efeitos socioeconômicos muito adversos, ante a indissociabilidade entre o econômico e o social. Tais economias, sob a égide do capitalismo financeirizado e da globalização financeira, tornaram-se ainda mais suscetíveis a ataques especulativos, a efeitos-contágio, a profecias autorrealizáveis e aos impactos adversos decorrentes do redirecionamento de carteiras de ativos dos detentores de riqueza induzido por mudanças, não raro súbitas e inesperadas, nos mercados financeiros internacionais.

Isso se deve às diferenças estruturais entre países centrais e periféricos, incluindo o fato de a hierarquia monetária internacional suscitar assimetrias financeiras importantes entre esses dois grupos de países, de forma geral. As assimetrias financeiras envolvem duas dimensões. A primeira é ligada à determinação preponderantemente exógena dos fluxos internacionais de capital. A segunda é ligada ao fato de que os países periféricos representam a menor parte da alocação da riqueza financeira global, embora mudanças nesses fluxos impliquem oscilações substanciais em seus preços-chave macroeconômicos 1414. Prates DM. As assimetrias do sistema monetário e financeiro internacional. Revista de Economia Contemporânea 2005; 9:263-8..

Isso ocorre porque esse atual padrão sistêmico de riqueza, estruturalmente instável, suscita elevado grau de instabilidade dos fluxos internacionais de capital. Essa situação torna as economias com inserção mais subordinada nesse sistema altamente sensíveis a mudanças de humor dos investidores globais, capazes de desencadear interações disruptivas entre fluxos internacionais de capital, taxa de câmbio, sistemas financeiros domésticos e os níveis de produto, renda e emprego.

Seria, também, ocioso afirmar que o capitalismo financeirizado potencializa desigualdade não apenas entre os países, mas, também, dentro dos países. São fartas e contundentes as evidências a respeito da crescente desigualdade de renda e riqueza na quase totalidade dos países do mundo nos últimos cinquenta anos 1515. Piketty T. Capital in the twenty-first century. Cambridge/London: Belknap; 2014.. Não fossem as políticas de transferência de renda realizadas pelos Estados-nacionais, em maior ou menor magnitude, a desigualdade social seria ainda mais elevada.

O aumento da desigualdade social decorreu, destacadamente, da conjunção dos seguintes fatores: (i) crescente concentração e centralização do capital capitaneado pelas grandes corporações multinacionais, multissetoriais e multifuncionais 55. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: teoria da dinâmica e financeirização do capitalismo. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 2000.; (ii) expressiva ampliação do estoque de riqueza sob a forma de ativos financeiros, coadunada com o crescimento dos rendimentos financeiros em ritmo bastante superior ao Produto Interno Bruto (PIB) das economias 55. Braga JCS. Temporalidade da riqueza: teoria da dinâmica e financeirização do capitalismo. Campinas: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas; 2000.,1515. Piketty T. Capital in the twenty-first century. Cambridge/London: Belknap; 2014.; (iii) expressivo avanço tecnológico-produtivo-comercial, o qual, juntamente com os fatores anteriores e a redução do poder dos sindicatos, concorreu para aumentar a participação dos lucros e reduzir a participação dos salários na renda nacional 1616. Reich RB. Supercapitalismo: como o capitalismo tem transformado os negócios, a democracia e o cotidiano. Rio de Janeiro: Elsevier; 2008..

Nunca o mundo foi tão rico do ponto de vista material. Isso, vale destacar, se dá em meio a bilhões de pessoas em situação de vulnerabilidade social. Esses cidadãos demandam serviços públicos muitas vezes inexistentes ou apenas parcialmente disponíveis. Em última instância, eles têm menos direito à vida do que outros.

O atual sistema de saúde no Brasil

Como muitos no mundo, o atual sistema de saúde no Brasil pode ser caracterizado como um sistema misto, no sentido de contar tanto com a participação do setor público, a partir do SUS, como do setor privado, por meio do sistema de saúde suplementar, formado por empresas de seguro-saúde, cooperativas médicas e de autogestão, além do sistema de desembolso direto, no qual os serviços de saúde são pagos diretamente pelos clientes 1717. Rodrigues da Silva PEM. Diagnóstico do setor saúde da região metropolitana de Campinas. Campinas: Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, Universidade Estadual de Campinas; 2007..

No Brasil, contudo, os planos e seguros privados de saúde suplementar, embora possam disponibilizar aos seus clientes serviços de saúde adicionais aos fornecidos pelo sistema público, também oferecem coberturas dos serviços oferecidos por esse último, duplicando a cobertura e tornando o acesso a esses serviços bastante desigual entre os que podem e os que não podem adquirir um plano de saúde ou seguro saúde privados ou arcar com essas despesas de forma direta 1818. Santos IS, Ugá MAD, Porto SM. O mix público-privado no sistema de saúde brasileiro: financiamento, oferta e utilização de serviços de saúde. Ciênc Saúde Colet 2008; 13:1431-40..

O atual sistema público de saúde no Brasil foi organizado a partir da Constituição Federal de 1988. Esta, por sua vez, foi expressivamente influenciada pelo processo de redemocratização do país e pelo Movimento da Reforma Sanitária, que assegurou aos cidadãos o acesso universal e integral à saúde sob responsabilidade do Estado. Esse sistema passou a ser implementado a partir de 1990, por meio das Leis nº 8.080 e nº 8.142, quando foi instituído o SUS.

Vale sempre lembrar que, de acordo com o artigo 6º da Constituição Federal de 1988 1919. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União 1998; 5 out., “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” . A palavra “saúde” aparece nada menos que 83 vezes na Constituição de 1988. O detalhamento sobre a saúde, ademais, está compreendido no âmbito da seguridade social, capítulo II da Constituição de 1988. A seção II desse capítulo dispõe sobre a saúde. Não por outra razão, do ponto de vista do financiamento, a Constituição de 1988 determina que o SUS “...será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes1919. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União 1998; 5 out..

Ainda com relação à Constituição de 1988, cumpre também destacar o artigo 196: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação1919. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União 1998; 5 out..

A Constituição de 1988 assegura, dessa forma, o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde, a partir do SUS. Esse mandamento constitucional, no entanto, ainda está distante de ser devidamente cumprido.

O atual sistema de saúde no Brasil conta com a participação altamente relevante do setor privado, condição que torna o acesso da população muito desigual aos serviços de atenção à saúde. Diversos fatores concorreram e concorrem para isso, valendo destacar, com base nos objetivos desse artigo, os seguintes: (i) o fato de ser o setor saúde um relevante espaço para a atuação do setor privado, com vistas à geração de lucro; (ii) a herança do modelo de assistência à saúde (médico-hospitalar) da previdência social, vigente antes da Constituição de 1988, que contava com expressiva participação do setor privado, seja a partir da demanda do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) e, depois, do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), de materiais e serviços no mercado, seja a partir do sistema de desembolso direto, ou seja, da compra desses serviços por parte da pequena parcela da população que podia fazê-lo; e (iii) o elevado nível de desigualdade social no Brasil, que torna muito difícil o financiamento de um sistema público de saúde de alta qualidade e, ao mesmo tempo, de acesso universal e igualitário.

O setor saúde constitui um complexo econômico altamente dinâmico e sofisticado, no sentido de entrelaçar empresas financeiras e não financeiras que formam um sistema com relevantes encadeamentos intra e intersetoriais. Esse entrelaçamento, frise-se, potencializa as possibilidades de valorização e acumulação da riqueza.

Do ponto de vista estrito da sua estrutura produtiva, esse sistema contempla três subsistemas 2020. Gadelha CAG, Maldonado J, Vargas MA, Barbosa PR, Costa L. A dinâmica do sistema produtivo da saúde: inovação e complexo econômico-industrial. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012.,2121. Gadelha CAG, Maldonado JMSV, Costa LS. O complexo produtivo da saúde e sua relação com o desenvolvimento: um olhar sobre a dinâmica da inovação em saúde. In: Giovanella L, Escorel S, Lobato LVC, Noronha JC, Carvalho AI, organizadores. Políticas e sistema de saúde no Brasil. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012. p. 209-37., a saber: (1) o subsistema formado pelas indústrias química e de biotecnologia, contemplando as indústrias farmacêutica, de produção de vacinas, de hemoderivados e de reagentes para diagnóstico; (2) o subsistema composto pelas indústrias eletromecânicas e de materiais, envolvendo os setor de produção de equipamentos, materiais e insumos médico-hospitalares e odontológicos; e (3) o subsistema envolvendo a prestação de serviços de saúde, composto pelos hospitais, laboratórios e serviços de diagnóstico e tratamento. No caso do Brasil, o setor saúde representa aproximadamente 10% do PIB.

Esse complexo econômico, contudo, não se restringe apenas ao sistema dito “produtivo”. Isso ocorre porque, no contexto do capitalismo financeirizado, as corporações geram resultados não apenas a partir de receitas operacionais, mas, também, de receitas não operacionais, a partir da negociação com ativos financeiros, contando com sofisticados departamentos de tesouraria. Ademais, as “empresas produtivas” do setor saúde têm, frequentemente, relação direta com o sistema financeiro, possuindo capital aberto e participação societária importante de fundos de investimento, bancos, fundos de previdência, fundos de pensão, seguradoras etc. Por fim, mas não menos importante, planos e seguros de saúde privados contam com a atuação direta das sociedades seguradoras, instituições que integram o sistema financeiro e que, em muitos casos, fazem parte do conglomerado econômico controlado por grandes bancos.

O setor saúde corresponde, portanto, a um complexo econômico, no sentido de contar com expressiva interpenetração e interdependência entre as órbitas produtivo-tecnológico-comercial e monetário-financeira de valorização e acumulação da riqueza, pois isso corresponde ao modo de ser do capitalismo financeirizado. Por esse motivo, as grandes empresas do setor saúde explicitam de forma bastante notável as características marcantes da financeirização 2222. Bahia L, Scheffer M, Tavares LR, Braga IF. Das empresas médicas às seguradoras internacionais: mudanças no regime de acumulação e repercussões sobre o sistema de saúde no Brasil. Cad Saúde Pública 2016; 32 Suppl:e00154015.,2323. Sestelo JAF. Dominância financeira na assistência à saúde: a ação política do capital sem limites no século XXI. Ciênc Saúde Colet 2018; 23:2027-33.,2424. Sestelo JAF, Cardoso AM, Braga IF, Mattos LV, Andrietta LS. A financeirização das políticas sociais e da saúde no Brasil do século XXI: elementos para uma aproximação inicial. Economia e Sociedade 2017; 26(n. espec):1097-126.. O setor saúde assim compreendido coloca em evidência o amplo potencial de valorização da riqueza propiciado às corporações que nele participam de forma direta e indireta, bem como permite a sua devida compreensão, estrutura e dinâmica de atuação e geração de resultados.

No caso das grandes empresas de assistência suplementar no Brasil, a financeirização se manifesta de maneira eloquente, com os ganhos financeiros cumprindo papel indispensável para a geração de resultados positivos para os acionistas, como mostrado na Tabela 1. Pode-se verificar que, em 2018, os ganhos financeiros foram relevantes para a maior parte das grandes empresas do setor, tanto das seguradoras como das operadoras de planos de saúde. A Bradesco Saúde, caso mais elucidativo dentre os selecionados, registrou resultado financeiro de R$ 1,36 bilhão em 2018.

Tabela 1
Resultados, ativo e retorno sobre o patrimônio de grandes seguradoras do ramo saúde e operadoras de planos de saúde no Brasil, 2018 (R$ milhões).

No que diz respeito ao financiamento de um sistema público de saúde de alta qualidade e, ao mesmo tempo, de acesso universal e igualitário, são diversas as dificuldades que se apresentam. Embora o gasto total em saúde no Brasil corresponda a uma participação no PIB igual ou superior à verificada em alguns países desenvolvidos, o gasto público em saúde corresponde a menos da metade desse gasto total, ante aproximadamente 70% ou mais do gasto total verificado nos países que possuem sistemas de saúde universais. Além disso, mas não menos importante, o fato de o Brasil ser um país populoso, de renda média e marcado por elevada desigualdade social, torna o gasto público per capita em saúde muito abaixo do gasto privado, bem como bastante aquém do necessário para viabilizar um sistema público de saúde com acesso universal e igualitário, com alta qualidade 2525. Reis AAC, Sóter APM, Furtado LAC, Pereira SSS. Tudo a temer: financiamento, relação público e privado e o futuro do SUS. Saúde Debate 2016; 40(n. espec):122-35.. Isso, vale salientar, torna o direito à saúde altamente desigual, em um país onde 26% da população estão vinculados a planos de assistência médica 2626. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: ciclos de vida. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020..

Muito longe de encerrar essa ampla e complexa discussão a respeito do evidente subfinanciamento do SUS no Brasil, que envolve questões como o descumprimento constitucional da destinação mínima obrigatória para esse sistema durante muito tempo, renúncia fiscal, supressão de fontes de financiamento etc., do ponto de vista mais estruturante o fato é que as disposições da Constituição de 1988 não foram cumpridas, em grande medida, em razão da ausência de uma base adequada de financiamento, capaz de suportá-las 2525. Reis AAC, Sóter APM, Furtado LAC, Pereira SSS. Tudo a temer: financiamento, relação público e privado e o futuro do SUS. Saúde Debate 2016; 40(n. espec):122-35.. Isso, evidentemente, decorreu não apenas da ausência de apoio político e de lobby do setor privado, mas, também, do fato de a economia brasileira ter apresentado desempenho bastante ruim depois dos anos 1980.

Vencido o problema da alta inflação e superada a crise da dívida externa, a economia brasileira conviveu durante muito tempo sob condições macroeconômicas adversas, as quais culminaram com baixo crescimento econômico e ausência de desenvolvimento. No âmbito das condições macroeconômicas adversas, chamou a atenção, ao longo do período posterior à estabilização dos preços, além do crescimento econômico baixo, em média, e bastante volátil, a prevalência de taxa básica de juros muito elevada, o que contribuiu para aumentar a dívida pública, consolidar o principal vetor da financeirização no Brasil, representado pelos títulos públicos, e dificultar a viabilização de uma base estável de financiamento do SUS.

Mesmo durante todo o período de geração persistente de superávits fiscais primários entre o segundo governo Fernando Henrique Cardoso e o primeiro governo Dilma Rousseff, com exceção de 2014, em todos os anos houve déficit fiscal nominal, diante da carga de juros nominais muito superior aos superávits fiscais primários realizados (Tabela 2). Isso, evidentemente, resultou na elevação da dívida pública e concorreu para a imposição de maior restrição fiscal. A prática de juros elevados, no entanto, decerto contribuiu para a viabilização de ganhos financeiros elevados para os detentores de riqueza. Depois de 2014, como mostra a Tabela 2, a combinação entre juros nominais elevados e déficits fiscais primários resultou em uma elevação persistente da dívida bruta do setor público, que atingiu, em proporção do PIB, 85,5% em junho de 2020, pelos dados do Banco Central do Brasil, e irá terminar 2020 em 98,2% segundo previsão do Fundo Monetário Internacional (FMI), ante 60,2% em 2013. É importante esclarecer que a dívida bruta do governo geral, calculada e divulgada pelo FMI, considera o total dos títulos públicos emitidos pelo governo geral, contemplando, portanto, a carteira de títulos do Banco Central do Brasil não utilizada para operações de mercado aberto. Por isso, os dados do FMI são superiores aos dados do Banco Central do Brasil.

Tabela 2
Necessidades de financiamento do setor público e dívida bruta no Brasil, em percentual do Produto Interno Bruto (PIB), 1995-2020.

Nos anos 2000, mais especificamente durante os dois governos Luiz Inácio Lula da Silva, houve certa expectativa de que, com as taxas mais elevadas de crescimento econômico e a regulamentação pela Lei Complementar nº 1412727. Brasil. Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012. Regulamenta o § 3o do art. 198 da Constituição Federal para dispor sobre os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde; estabelece os critérios de rateio dos recursos de transferências para a saúde e as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas 3 (três) esferas de governo; revoga dispositivos das Leis nos 8.080, de 19 de setembro de 1990, e 8.689, de 27 de julho de 1993; e dá outras providências. Diário Oficial da União 2012; 16 jan., em 2012, da Emenda Constitucional nº 292828. Brasil. Emenda Constitucional nº 29, de 13 de setembro de 2000. Altera os arts. 34, 35, 156, 160, 167 e 198 da Constituição Federal e acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde. Diário Oficial da União 2000; 14 set., de 2000, que estabeleceu limites mínimos para a aplicação de recursos em saúde dos entes da federação a partir de fontes estáveis de financiamento, o SUS poderia voltar a avançar e ter as suas ações robustecidas. Isso, contudo, não ocorreu em função, essencialmente, da incapacidade dos diversos governos de promover o desenvolvimento econômico do Brasil.

A economia brasileira não entrou em default, como alguns dos seus vizinhos, mas, também, ficou muito longe de retomar o caminho do desenvolvimento 2929. Cintra MAM. Suave fracasso: a política macroeconômica brasileira entre 1999-2005. Novos Estudos Cebrap 2005; 73:39-56.. A crise financeira global de 2008 explicitou a fragilidade da economia brasileira e a sua crescente dependência dos altos preços internacionais das commodities para promover a aceleração do ritmo de crescimento econômico, em vista de sua estrutura produtiva e comercial cada vez mais baseada em produtos de baixa intensidade em conhecimento e tecnologia, diante do amplo e profundo processo de desindustrialização verificado no país.

Em 2015 e 2016, a economia brasileira registrou profunda recessão, em um contexto de elevada instabilidade política. Depois de então, apresentou crescimento econômico rastejante, incapaz de retomar o nível de produção de 2014. A conjunção entre baixo crescimento, carga de juros nominais da dívida pública elevada e déficit público conduziu o país para um permanente quadro de restrição fiscal. Isso resultou na aprovação, em 2016, do teto dos gastos públicos (Emenda Constitucional nº 95, a “PEC do teto dos gastos”), criado no governo Michael Temer e que limita as despesas do Governo Federal por 20 anos (não podendo ser superior à inflação registrada no ano imediatamente anterior). Juntamente com a chamada “regra de ouro”, a Emenda Constitucional nº 95 impede o endividamento público para despesas de custeio, a menos que créditos suplementares ou especiais para finalidades específicas sejam aprovados pelo Congresso Nacional, o que concorreu para limitar substancialmente os gastos públicos no país. No caso dos gastos em saúde, a Emenda Constitucional nº 95 significou a desvinculação dos 15% da receita corrente líquida do Governo Federal para esse fim, uma vez que apenas a reposição da inflação não acompanhou o crescimento das receitas da União, aprofundando o subfinanciamento do SUS.

A Figura 1 apresenta os gastos público e privado em saúde no Brasil. Embora o gasto total em % do PIB não seja muito diferente de muitos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), vale observar que: (i) o Brasil é um país de renda média e altamente desigual, ou seja, com elevada concentração da renda; e (ii) o gasto privado é superior ao gasto público, apesar de contar com um sistema público e universal de saúde que assiste parcela majoritária da população. Entre 2000 e 2017, os gastos públicos em saúde aumentaram de 3,47% para 3,95% do PIB, enquanto os gastos privados subiram de 4,86% para 5,47% do PIB. Ou seja, em 2017, os gastos públicos em saúde no Brasil representavam 41,9% dos gastos totais em saúde, a despeito de o sistema público de saúde atender aproximadamente – da população. Revela-se, pois, uma situação de permanente e crescente situação de subfinanciamento do sistema público de saúde.

Figura 1
Gastos com saúde, percentual do Produto Interno Bruto (PIB) e proporção de despesas públicas e privadas, Brasil, 2000 a 2017.

O setor privado, por sua vez, além de contar com subsídios do Estado a partir de mecanismos de renúncia fiscal, dispõe de parcela majoritária de prestadores. Essa condição ocasiona: (i) o acesso altamente diferenciado da população aos serviços de saúde; e (ii) uma expressiva interconexão entre os sistemas público e privado, com este atendendo a demanda daquele nos diferentes subsistemas que formam o setor saúde:

“...Trata-se de um sistema de saúde que, embora constitucionalmente definido como universal e integral, tem o setor privado prestador sustentado pela compra estatal de serviços e um segmento de seguradoras e operadoras de planos de saúde fortemente subsidiado pelo Estado, pelos distintos instrumentos de renúncia fiscal...1818. Santos IS, Ugá MAD, Porto SM. O mix público-privado no sistema de saúde brasileiro: financiamento, oferta e utilização de serviços de saúde. Ciênc Saúde Colet 2008; 13:1431-40. (p. 1438-9).

A desigualdade do direito à saúde no Brasil reflete, em verdade, a enorme desigualdade social do país. O SUS, na prática, atende preponderantemente àqueles que não têm condição de pagar por um plano de saúde ou seguro saúde - a maior parte da população brasileira, frise-se. Aqueles que têm condição de adquirir plano/seguro ou de pagar diretamente pelos serviços de saúde utilizam o SUS de maneira apenas complementar, quando atendimentos, medicamentos e/ou procedimentos médico-hospitalares de alto custo não são cobertos pelo sistema de saúde suplementar. Por isso, a desigualdade social dificulta a superação do círculo vicioso prevalecente no sistema de saúde brasileiro, qual seja, a utilização preponderante do sistema público pelas classes sociais mais baixas, desinteresse da população pertencente às classes sociais mais elevadas de sustentar o sistema e precarização e subfinanciamento do SUS, condição que reforça o afastamento da classe média e o seu uso majoritário por aqueles que não podem se vincular a planos de saúde, reintroduzindo o círculo vicioso. Vale destacar que a vinculação a um plano de saúde é o terceiro maior desejo de consumo dos brasileiros, de acordo com pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) Inteligência realizada em suas três edições, a saber, 2015, 2017 e 2019.

A pandemia de COVID-19 e o direito à vida

No capitalismo financeirizado, conforme discutido, a concorrência se dá nas mais diversas e possíveis esferas de valorização da riqueza e se apresenta de forma potencializada, intermitente e cada vez mais intensa. O “amor ao dinheiro” e a subsequente busca permanente, insaciável e crescente de valorizar e acumular riqueza sob a forma mais geral pelos atores econômicos, a partir de ganhos operacionais e não operacionais, magnifica o processo de reificação, transformando não apenas a força de trabalho, mas também a própria vida humana e, por suposto, o direito a ela em mercadorias. Um sistema que tem essa lógica e dinâmica, ademais, possui enorme capacidade de destruição do meio ambiente e, conseguintemente, da biodiversidade.

Tem surgido mais evidências a respeito da relação entre doenças e biodiversidade 3030. Ostfeld RS, Keesing F. Biodiversity and disease risk: the case of Lyme disease. Conserv Biol 2000; 4:722-8.,3131. United Nations Environment Programme. UNEP Frontiers 2016 Report: emerging issues of environmental concern. Nairobi: United Nations Environment Programme; 2016.,3232. Zohdhy S, Schwartz TS, Oaks JR. The coevolution effect as a driver of spillover. Trends Parasitol 2019; 35:399-408.. A perda de biodiversidade e, por extensão, de habitats selvagens ou comunidades ecológicas, tem sido cada vez mais relacionada ao surgimento e à proliferação de doenças zoonóticas como o Ebola, o vírus do Nilo Ocidental, a SARS-CoV-1, o vírus de Marburg, o Zika vírus, a SARS-CoV-2 etc. De acordo com Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (2016) 3131. United Nations Environment Programme. UNEP Frontiers 2016 Report: emerging issues of environmental concern. Nairobi: United Nations Environment Programme; 2016., as doenças zoonóticas correspondem a 60% de todas as doenças infecciosas em humanos e a 75% de todas as doenças infecciosas emergentes.

O SARS-CoV-2, causador da COVID-19, surgiu na China no fim de 2019, na cidade de Wuhan.

A doença chegou ao Brasil no final de fevereiro de 2020, quando foi registrado o primeiro caso, de acordo com o Ministério da Saúde. No final de setembro do mesmo ano, segundo as estatísticas oficiais, já eram quase 5 milhões de casos e mais de 140 mil mortes. A doença, como seria o esperado em um país marcado por extremas desigualdades inter e intrarregionais, foi muito mais letal para a população que vive nas regiões mais pobres do país e nas periferias dos grandes centros urbanos. Ela foi, portanto, muito mais letal para os mais pobres do que para os mais ricos.

A pandemia afetou muito adversamente a economia brasileira. Depois da profunda recessão de 2015 e 2016, quando o PIB registrou retração de 3,5% e 3,3%, respectivamente, e da tímida recuperação registrada nos anos seguintes, insuficiente para a economia brasileira recuperar o nível de produção de 2014, no primeiro trimestre de 2020, a economia brasileira registrou retração de 1,4% em relação ao mesmo período do ano anterior e, no segundo trimestre, queda de nada menos que 11,4%, também considerando igual período do ano pregresso. Com efeito, a taxa de desemprego passou de 11%, no quarto trimestre de 2019, para 13,3% no segundo trimestre de 2020. Nesse contexto, o número de beneficiários de planos privados de saúde no Brasil decresceu de 47,0 milhões para 46,7 milhões entre dezembro de 2019 e junho de 2020 3333. Instituto de Estudos de Saúde Suplementar. Relatório do emprego na cadeia produtiva da saúde. São Paulo: Instituto de Estudos de Saúde Suplementar; 2019..

Os efeitos da COVID-19 sobre a população somente não foram ainda piores em razão da existência do SUS e da aprovação e promulgação, em maio de 2020, da Emenda Constitucional nº 106/20203434. Brasil. Emenda Constitucional nº 106, de 7 de maio de 2020. Institui regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento de calamidade pública nacional decorrente de pandemia. Diário Oficial da União 2020; 8 mai., mais conhecida como “PEC 10/20 do orçamento de guerra”, que permitiu, entre outras coisas, a separação dos gastos públicos emergenciais destinados ao enfrentamento da pandemia do Orçamento Geral da União (OGU). A partir disso, houve flexibilização da “regra de ouro” para a realização dos gastos destinados ao enfrentamento da crise sanitária mediante endividamento público, inclusive para despesas correntes. A Emenda Constitucional nº 106/2020, vale salientar, prevê revogação automática no último dia de 2020.

De um lado, a pandemia revelou o caráter imprescindível do sistema público de saúde no Brasil, haja vista que, caso inexistente, a SARS-CoV-2 decerto teria provocado um número de óbitos ainda mais alarmante do que o registrado. Nas regiões Norte e Nordeste, apenas 14,7% e 16,6% das pessoas, respectivamente, estavam vinculadas a planos privados de saúde em 2019 2626. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: ciclos de vida. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020..

De outro, a pandemia revelou os diversos problemas do sistema público de saúde no Brasil, em grande medida decorrentes do seu subfinanciamento. Isso se traduziu, evidentemente, em diferenças na oferta de recursos assistenciais para clientes de planos de saúde e o restante da população 3535. Grupo de Pesquisa e Documentação sobre Empresariamento na Saúde. Recursos para o enfrentamento da Covid-19: orçamento, leitos, respiradores, testes e equipamentos de proteção individual: notas técnicas. https://sites.usp.br/geps/falhas-e-omissoes-no-enfrentamento-da-covid-19/ (acessado em 01/Set/2020).
https://sites.usp.br/geps/falhas-e-omiss...
,3636. Batista A, Antunes B, Faveret G, Peres I, Marchesi J, Cunha JP, et al. Nota técnica 11 - 27/05/2020 análise socioeconômica da taxa de letalidade da COVID-19 no Brasil. https://www.sites.google.com/view/nois-pucrio (acessado em 01/Set/2020).
https://www.sites.google.com/view/nois-p...
.

Essas evidências não deixam dúvidas de que, no capitalismo hodierno (financeirizado), a vida e, por suposto, o direito a ela têm preço e custam caro. O acesso e o uso daqueles que podem pagar por serviços de saúde no setor privado são maiores do que os daqueles que não podem pagar diretamente. Não se trata, evidentemente, de uma peculiaridade brasileira, mas a dimensão verificada no país impressiona, decerto porque, no contexto do tipo específico de desenvolvimento capitalista que caracteriza o subdesenvolvimento, as contradições desse sistema são mais radicais e se explicitam de forma mais contundente.

Conclusão

A pandemia de COVID-19 no Brasil revelou-se uma crise não apenas sanitária, mas também econômica e social. A elevada desigualdade social no país e, consequentemente, a expressiva disparidade do acesso aos serviços de saúde foram ainda mais explicitadas com a pandemia, em vista dos seus efeitos mais letais sobre os mais pobres, relativamente aos mais ricos. Não fosse o SUS, a despeito dos seus problemas, em grande medida decorrentes do seu subfinanciamento, a situação teria sido muito pior.

O capitalismo financeirizado, caracterizado pela crescente importância das formas mais avançadas de valorização da riqueza, do ponto de vista da lógica do capital, potencializa a concorrência intercapitalista e exacerba a reificação, transformando, inclusive, a própria vida humana em uma mercadoria como outra qualquer.

Em um sistema como esse, os serviços de saúde devem ser assegurados pelo Estado, de forma ampla e qualificada, diante da capacidade restrita que o setor privado possui de viabilizá-los ao conjunto da população, especialmente em um país como o Brasil, altamente desigual. A pandemia explicitou essa necessidade.

Não é fácil, contudo, viabilizar isso. A financeirização como padrão sistêmico de riqueza no capitalismo contemporâneo aumenta a desigualdade social e constrange a realização de políticas públicas autônomas e mais abrangentes, universais. Essa condição dificulta a conformação de um sistema público de saúde capaz de assegurar o direito à vida de toda a população, especialmente no caso dos países periféricos inseridos de forma altamente subordinada nesse sistema, como o Brasil.

Dificuldade, contudo, não significa impossibilidade. Se, de um lado, a pandemia revelou intensa e dramaticamente a desigualdade do acesso aos serviços de saúde e, no limite, do direito à vida, de outro mostrou que o SUS é imprescindível. Esse legado, articulado com a retomada do desenvolvimento nacional, pode lançar as bases para avanços importantes e necessários para transformar o acesso aos serviços de saúde e, conseguintemente, o direito à vida, um direito de todos os cidadãos, de forma verdadeiramente indiferenciada.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Nov 2020
  • Aceito
    09 Dez 2020
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br