Diálogos entre o método da cartografia e alguns pressupostos filosóficos de Hannah Arendt na pesquisa em educação

Diálogos entre el método de la cartografía y algunas presuposiciones filosóficas de Hannah Arendt en la investigación en educación

Carolina Terruggi Martinez Adriana Marcondes Machado Sobre os autores

Resumos

O artigo aventura-se nas fronteiras do método cartográfico e dos escritos de Hannah Arendt sobre ação, política e educação. Desse encontro, busca-se construir posições para uma pesquisa feita em campo no âmbito da educação, tendo em vista a implicação do pesquisador no processo da pesquisa, reconhecendo-se como parte desse processo e rompendo com sua suposta neutralidade; a aceitação da imprevisibilidade no percurso de criação da pesquisa; e, por fim, o compromisso político com o coletivo com o qual se trabalha e com o mundo que nós, pesquisadores e pesquisados, habitamos. Apresentam-se também questões suscitadas a partir da relação de uma das autoras, como pesquisadora, com o seu campo de pesquisa, tomando a experiência como produtora de pensamento sobre os desafios metodológicos de trabalhos pautados na cartografia.

Palavras-chave
Cartografia; Pesquisa-intervenção; Método; Política; Ação


El artículo se aventura en las fronteras del método cartográfico y de los escritos de Hannah Arendt sobre acción, política y educación. A partir de ese encuentro, se busca construir posiciones para una investigación realizada en el campo en el ámbito de la educación: la implicación del investigador en el proceso de la investigación, reconociéndose como parte de ese proceso y rompiendo con su supuesta neutralidad. La aceptación de la imprevisibilidad en el recorrido de creación de la investigación; y, finalmente, el compromiso político con el colectivo con el que se trabaja y con el mundo que nosotros, investigador e investigados, habitamos. También se presentan cuestiones suscitadas a partir de la relación de una de las autoras como investigadora, con su campo de investigación utilizando la experiencia como productora de pensamiento sobre los desafíos metodológicos de trabajo pautados en la cartografía.

Palabras clave
Cartografía; Investigación-intervención; Método; Política; Acción


Introdução

– Y están apareciendo en el mundo unas series de problemas que ningún país del mundo, ni el más grande, puede arreglar, y que necesitan acuerdos mundiales.– Cómo cual?– Los pobres de África... no son de África, son de nuestra humanidad. El problema de la inmigración clandestina que se quiere meter em Europa se arregla arreglando la pobreza en África y no construyendo muros. Tenemos que hacer um esfuerzo porque ese problema es de la humanidad toda. Tenemos que empezar a pensar como especie. Entonces, aplaudimos la integración financiera. Aplaudimos las comunicaciones, y la política? Quién se va a hacer cargo de ese continente de nylon (plástico) que se está armando en el Pacífico más grande que Europa? Y el derretimento de los polos, cómo vamos a enfrentar eso? Es decir, hay que pensar por el mundo entero.

Entrevista com José Pepe Mujica(c(c)José Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai, em entrevista concedida a Jordi Évole para seu programa Salvados, em 2014. Tradução pelas autoras:E estão aparecendo no mundo uma série de problemas que nenhum país do mundo, nem o maior, pode consertar e que necessitam de acordos mundiais.Como qual?Os pobres da África... não são da África, são de nossa humanidade. O problema da imigração clandestina que colocam em pauta na Europa se trabalha consertando a pobreza na África, e não construindo muros. Temos que fazer um esforço porque esse problema é de toda a humanidade. Temos que começar a pensar como espécie. Então, aplaudimos a integração financeira, aplaudimos as comunicações, e a política? Quem vai tomar responsabilidade dessa quantidade de plástico, maior que a Europa, que está se juntando no Pacífico? E o derretimento dos polos, como vamos enfrentar? Ou seja, tem-se que pensar pelo mundo inteiro.)

Escolhemos Pepe Mujica para o tom inicial do artigo com a intenção de alargar as bordas da responsabilização, do cuidado com o mundo e com o outro. Nossa questão é a responsabilização do pesquisador que se debruça sobre realidades múltiplas nas pesquisas com seres humanos, tendo como compromisso a melhoria da educação pública para todos. Essa posição, que alude a uma luta bastante ampla, tem sido convocada constantemente nos dias atuais e sustenta o terreno que dispara as reflexões que serão apresentadas. A articulação entre alguns pressupostos filosóficos de Hannah Arendt com o método cartográfico ressaltará o plano da experiência como aquele que possibilita reflexões sobre a realidade da educação brasileira em cada local que acontece. A escrita buscará focar aproximações teórico-metodológicas que se arriscam nas fronteiras dos dois construtos teóricos mencionados, motivada pela experiência vivida no encontro entre campo e pesquisadora. Focaremos, nesse texto, a pesquisa empírica como plano da experiência em que as questões da pesquisa foram suscitadas. Como afirmam Passos e Barros11 Passos E, Barros RB. A cartografia como método de pesquisa-intervenção. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 17-31., é o plano da experiência “que agencia sujeito e objeto, teoria e prática, num mesmo plano de produção ou de coemergência”11 Passos E, Barros RB. A cartografia como método de pesquisa-intervenção. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 17-31. (p. 17).

A pesquisa-intervenção pautada no método cartográfico parte de saberes advindos principalmente da análise institucional (René Lourau) e da esquizoanálise (Félix Guattari e Gilles Deleuze). Inspirado nesses pensadores, um grupo de autores formalizou pistas que marcam o lugar ético-político desse modo de fazer pesquisa22 Passos E, Kastrup V, Escóssia L. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015.. Arriscaremos articulações entre os conceitos de ação e política de Hannah Arendt e a pesquisa-intervenção pautada no método da cartografia.

O conceito de experiência de Larrosa33 Larrosa J. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica; 2018., que beira a literatura e a ciência, inicia essa conjectura aproximativa. O autor parte da raiz grega da palavra “experiência” – periculum –, que traz significações como “travessia” e “passagem”, chegando até a derivação peiratês, que significa “pirata”, para ressaltar o sujeito da experiência a partir dessa figura: o “sujeito da experiência tem algo desse ser fascinante que se expõe atravessando um espaço indeterminado e perigoso, pondo-se nele à prova e buscando nele sua oportunidade, sua ocasião”33 Larrosa J. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. (p. 26). É esse ser viajante, aberto à experiência, que nos anima a pensar essa maneira de pesquisar, pois, sem nos definir, desenvolve um saber que não pode ser colocado na lógica de um método científico a ser reproduzido. Em se tratando de uma metodologia que se distancia do sentido clássico de método, pautado na possibilidade de reprodução, comprovação e prescrição, a cartografia se abre para o plano das relações em que há uma dimensão de incerteza que poderíamos nomear como um devir pirata: navega-se em águas incertas, com a bússola mostrando direções, e as ações para se chegar onde se pretende vão depender do que acontecer no caminho.

A experiência, tomada como afetação, é o que nos acontece, e não aquilo que se dá fora de nós, valorizando a dependência nas relações humanas; isto é, o fato de que aquilo que se passa diz respeito a um conjunto, formaliza-se em relações.

Apresentaremos, brevemente, o contorno da experiência concreta da pesquisa que motiva as reflexões metodológicas aqui apresentadas, dando lugar às singularidades que a constituem. Trata-se de um mestrado em andamento (sendo uma das autoras a mestranda e a outra, a orientadora) a partir do qual se acompanha uma escola municipal de ensino fundamental I e II da periferia da zona norte de São Paulo. A nova gestão (diretora e vice-diretores)(d(d)Ao assumir o cargo, o(a) diretor(a) faz a indicação dos dois assistentes de direção que comporão a equipe com ele(a), conforme consta no 9º art. da Portaria da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo n. 2174, de 14 de abril de 2011.), ao chegar na instituição, propôs a construção de um projeto político pedagógico de forma coletiva. Somaram-se ao grupo gestor a(o)s coordenadora(e)s que aceitaram entrar nessa empreitada e que eram, antes, professora(e)s da escola. Depois de anos com gestões substitutas, o empossamento dessa gestão por concurso para direção efetiva fortaleceu a possibilidade de continuidade de projetos a longo prazo na escola: repensar o currículo, fomentar a formação dos professores e democratizar as decisões institucionais, entre outras ações que requerem tempo. De maneira geral, há duas grandes diferenças que marcam esse momento da escola: a mudança na maneira como são conduzidas as tomadas de decisões e as transformações empreendidas no currículo – a valorização da diversidade das expressões culturais e da voz dos estudantes, a interdisciplinaridade na construção do conhecimento, e o combate ao racismo, ao machismo e à LGBTfobia. A escola foi inaugurada há 18 anos e essa proposta vem sendo implantada, dentro dessa história institucional, há três anos. Os projetos empreendidos nesse tempo provocaram intensas mudanças referentes à duração das aulas; à implementação de novas disciplinas e de projetos variados; à vivência de assembleias; à eliminação da expulsão e da suspensão; à intensificação das tensões entre os profissionais; à realização de conselhos de classe participativos com os estudantes; às novas maneiras de lidar com a indisciplina; e às mudanças no espaço físico com as portas adesivadas, o piso novo e a horta.

Como estudar esse movimento em curso? Conhecer um campo em movimento, uma realidade que não é delimitada por fatos acabados, só é possível em suas transformações. É a partir das variações que conseguimos compreender as coisas44 Machado AM. A experiência sensível e a constituição do problema em um trabalho de intervenção. In: Machado AM, Lerner ABC, Fonseca PF, organizadores. Concepções e proposições em psicologia e educação: a trajetória do Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo [Internet]. São Paulo: Blucher; 2017 [citado 16 Jul 2020]. p. 31-48. Disponível em: https://www.blucher.com.br/livro/detalhes/concepcoes-e-proposicoes-em-psicologia-e-educacao-1363
https://www.blucher.com.br/livro/detalhe...
. Estudamos uma escola pouco conformada com o seu modo de funcionar, em que muitas mudanças estão se dando. Os profissionais dessa instituição repensam as práticas e têm muitas dúvidas e incertezas. Nesse movimento de ampliação do debate das razões e das maneiras de existir da escola nesse território, as questões políticas têm sido colocadas no centro das práticas institucionais e, para a pesquisa, a cartografia e as concepções de ação e política de Hannah Arendt têm orientado o trabalho.

Os pontos que buscaremos ressaltar nesse modo cartográfico de fazer pesquisa em aproximação com as discussões de Hannah Arendt são: 1) a implicação do pesquisador na pesquisa – responsabilizando-o pelas relações que estabelece em campo e as intervenções que produz no mundo; 2) a aceitação da imprevisibilidade como parte do processo; e 3) o acesso ao coletivo e à dimensão política da pesquisa.

O pesquisador produtor de mundo

Aproveitamos a fala de José Pepe Mujica para reivindicar um compromisso do pesquisador com seu entorno e expandir as fronteiras da responsabilização pelo que se faz e pelo que se diz sobre a realidade estudada. É preciso situar os escritos na singularidade da pesquisa que abrange o encontro de uma pesquisadora com o campo em que se produz a realidade sobre a qual se debruça, pois as ações do pesquisador recortam o plano em que trabalha, constituindo linhas possíveis de análise.

O pesquisador, para a pesquisa-intervenção, é um ser situado entre outros seres que, ao fazer seu trabalho, age no mundo. Suas ações se dão em relações e geram efeitos na medida em que uma “ação tem sempre uma reação em cadeia”55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018. (p. 236). A fala e a escrita são atos que constroem a realidade.

Hannah Arendt nos apresenta a pluralidade humana como um fato sem escolha, como um fato constitutivo do que somos – vivemos juntos na Terra –55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018., assim também o é para a pesquisa-intervenção pautada na cartografia. Há um fazer conjugado, junto, que é inerente a essa natureza de pesquisa. Não “junto” no sentido de todos nos tornarmos pesquisadores, mas considerando que, “quando eu me insiro no mundo, é em um mundo onde outros já estão presentes”66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201. (p. 191). A pluralidade humana é parte do que somos e, assim como alerta José Pepe Mujica, a partir do momento em que estamos no mundo, as questões do mundo são nossas. Assim também ocorre na pesquisa. Entrar na escola pela via do encontro e acessar os componentes diversos dessa realidade implica romper as classificações e hierarquizações que organizam nossa relação com a realidade77 Escóssia L, Tedesco S. O coletivo de forças como experiência cartográfica. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 92-108.. É uma entrada que pede que estejamos abertos às entrelinhas – que, no método cartográfico, referem-se ao que é denominado como extracódigos: o que não é óbvio ao nosso olhar88 Passos E, Barros RB. Por uma política da narratividade. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 150-171..

É requerida uma atenção do pesquisador para o percurso em que as questões ganham relevo e os objetivos são definidos a partir da relação com o campo e não aprioristicamente. Isto é, o método (a forma de fazer) produz efeitos no processo da pesquisa, no pesquisador e nos resultados que devem ser considerados nas análises11 Passos E, Barros RB. A cartografia como método de pesquisa-intervenção. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 17-31..

Nossa ação na pesquisa não é diferente das outras ações sobre o mundo. Agir, para Arendt55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018.,66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201., é tomar uma iniciativa, começar, colocar algo em movimento. Agimos por meio de palavras e atos. O caráter momentâneo e espontâneo da ação, ou seja, ser iniciada, realizada e terminada em determinado contexto, exige que não a pensemos em termos funcionais, como a produção de algo para um fim externo. A história criada pela ação não é fabricada fora de um contexto, exatamente porque parte de uma teia de relações já existentes66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201. em que se realiza e estabelece relações outras. Não há controle sobre as conexões da ação depois de lançada no mundo, ela tem caráter ilimitado e irreversível, uma “tendência inerente de romper todos os limites e transpor todas as fronteiras”55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018. (p. 236). Em uma pesquisa que tem como primazia as relações humanas, o incerto e o indeterminado são inerentes ao procedimento, não são desvios ou erros, pois são elementos constitutivos da própria natureza das relações com as quais se trabalha. Nesse domínio, “todo processo é causa de novos processos imprevisíveis”66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201. (p. 193). Há interdependência nas ações, o pesquisador faz parte, influencia e não tem controle sobre os efeitos que se dão no encontro e que devem ser considerados na pesquisa.

Por meio da ação, revela-se e constitui-se quem somos. A ação é atrelada a pessoas. Inclusive, “uma ação sem um nome, um ‘quem’ ligado a ela, é sem sentido”66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201. (p. 191). Na pesquisa, isso ocorre pela maneira como agimos com nossos interlocutores ou construímos os discursos da pesquisa. O pesquisador é força presente na arena de produção das relações, das análises e da escrita.

A pesquisa-intervenção exige ruptura com uma escrita exteriorizada. Quando o próprio procedimento implica conhecer as forças no jogo em que se constituem as práticas institucionais e as formas de pensar e agir no cotidiano, a escrita requer uma narratividade que não defina a existência do “eles” como fora do “nós” que escreve.

Portanto, a pesquisa tem responsabilidade pela marca deixada no mundo. Ela traça sentidos possíveis que se tornam memória. Arendt apresenta os processos do agir em conjunto com sua extensibilidade no tempo por seus efeitos.

O que perdura no domínio dos assuntos humanos são esses processos, e sua perduração é ilimitada, tão independente da perecibilidade da matéria e da mortalidade dos humanos quanto o é a perduração da própria humanidade. O motivo pelo qual jamais podemos prever com certeza o resultado e o fim de qualquer ação é simplesmente que a ação não tem fim55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018.. (p. 288)

A imprevisibilidade como parte do processo

O plano coletivo em que a pesquisa se dá, o fato de ela mesma produzir o campo, não constitui falta de rigor metodológico. A questão da postura do pesquisador – uma postura de abertura às relações e, portanto, à imprevisibilidade da ação – representa, na cartografia, uma ética, como vemos em Escóssia e Tedesco77 Escóssia L, Tedesco S. O coletivo de forças como experiência cartográfica. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 92-108. a partir de Simondon:

Agir eticamente significa colocar-se como ponto singular de uma infinidade aberta de relações, sem que sua ação se ampare em normas que funcionam como formas a priori, impostas do exterior à ação77 Escóssia L, Tedesco S. O coletivo de forças como experiência cartográfica. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 92-108.. (p. 106)

Essa abertura se articula com o caráter ilimitado da ação e com outro caráter apresentado por Arendt: a imprevisibilidade55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018.,66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201.. Essa dimensão lembra o pirata da experiência de Larrosa, que se põe em um espaço perigoso e indeterminado, aberto para experimentar o que vier. O pirata carrega sua bússola, tem uma direção e aceita indeterminações que ocorrem no processo.

O pesquisador possui algumas ferramentas que controla e decide: a frequência com que irá à escola, as pessoas e as atividades que acompanhará, as companhias bibliográficas, enfim, uma série de decisões que devem contribuir para um alicerce responsável no percurso. Mas, como já apontamos, há imprevisibilidade na pesquisa-intervenção que deve fazer parte das análises.

Em se tratando de pesquisa em escolas que trabalham com crianças, há um fator a mais para alargar essa imprevisibilidade. Trata-se da presença desses recém-chegados ao mundo, dos portadores do novo. Como Arendt aponta em seu único texto que disserta diretamente sobre a educação denominado “A crise da educação”99 Arendt H. Entre o passado e o futuro. 6a ed. São Paulo: Perspectiva; 2007., esse âmbito da sociedade tem sempre que lidar diretamente com a natalidade – a vinda de alguéns novos e únicos, diferentes de qualquer outro alguém que já tenha existido antes. Esses alguéns trazem consigo a possibilidade de começar algo novo. Há sempre aí uma tensão entre a responsabilidade de apresentar-lhes o mundo e de não os impedir de trazer o novo.

Na pesquisa, a presença da natalidade insiste no caráter intempestivo e transgressor de certezas. O que nos dá orientação aos caminhos da pesquisa nesse âmbito é a responsabilidade para com a educação e, consequentemente, para com o mundo. Para Arendt55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018.,66 Arendt H. Trabalho, obra, ação. Cad Etica Filos Polit. 2005; 1(7):174-201., a promessa é aquilo que nos ajuda a lidar com a imprevisibilidade da ação humana e, na pesquisa em educação, os compromissos éticos firmados com o campo são promessas de sentido à pesquisa.

Em síntese, ao incluir a imprevisibilidade como parte do processo da pesquisa, podemos firmar algumas posições importantes a serem ressaltadas sobre essa maneira de pesquisar. Primeiro, ao comprometer-se com um coletivo, a imprevisibilidade não será uma escolha, uma vez que ela é inerente a essa forma de pesquisar. Em segundo lugar, admiti-la no processo não dispensa compromissos que atuem como promessas, garantindo certas “ilhas de previsibilidade”, desde que possíveis de serem cumpridas55 Arendt H. A condição humana. 13a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2018.. Por fim, temos que considerar a especificidade da educação nesse aspecto da pesquisa, por ser um meio em que a relação com o novo tem lugar especial, no sentido de implicar um compromisso de abertura no presente na relação com a infância.

No método cartográfico, lidar com a imprevisibilidade está implicado em um modo de fazer que considera a processualidade na construção das coisas. A escrita dos processos de mudança em que o pesquisador e o campo se implicam passa a ser foco.

Toda experiência cartográfica acompanha processos, mais do que representa estados de coisa; intervém na realidade, mais do que a interpreta; monta dispositivos, mais do que atribui a eles qualquer natureza; dissolve o ponto de vista dos observadores, mais do que centraliza o conhecimento em uma perspectiva identitária e pessoal88 Passos E, Barros RB. Por uma política da narratividade. In: Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia. Porto Alegre: Sulina; 2015. p. 150-171.. (p. 170)

A busca pela descentralização do saber mantém a implicação(e(e)“É necessário frisar que a implicação não diz respeito à noção de comprometimento, motivação ou relação pessoal com o campo de pesquisa/intervenção; ao contrário, explorar a implicação é falar das instituições que nos atravessam. [...] A implicação denuncia que aquilo que a instituição deflagra em nós é sempre efeito de uma produção coletiva, de valores, interesses, expectativas, desejos, crenças que estão imbricados nessa relação.”10 (p. 47).) do pesquisador no campo de análise. Ao ter que lidar, inevitavelmente, com a imprevisibilidade da ação por tratar-se de uma pesquisa com um grupo de pessoas que agem e reagem a ela, a direção ética da pesquisa refere-se ao compromisso do pesquisador com o cumprimento de acordos feitos ao longo da pesquisa. Assim, a imprevisibilidade reorganiza as ações e não as impede. Como nos apontam Vicente e Filho1111 Vicente JJNB, Martins Filho JRF. Imprevisibilidade e irreversibilidade da ação. Theoria. 2015; 7(17):135-46.:

Promessa e cumprimento constituem a faculdade possível para o confronto com a imprevisibilidade da ação. É necessário que a promessa seja cumprida para que haja efetiva proporção entre a imprevisibilidade e o poder de prometer1111 Vicente JJNB, Martins Filho JRF. Imprevisibilidade e irreversibilidade da ação. Theoria. 2015; 7(17):135-46.. (p. 144)

Isso nos leva à próxima seção do texto, em que refletiremos sobre a responsabilidade assumida com o coletivo.

A afirmação da política na pesquisa

Compreendendo a pesquisa como ação política, utilizaremos a concepção arendtiana para articular política-pesquisa-intervenção. Alguns conceitos da autora alargam nossa compreensão sobre a política nos encontros desta pesquisa. Primeiro, o próprio conceito de política como campo do debate público e da pluralidade de opiniões. Em segundo lugar, o conceito de amor mundi, bastante precioso para as pesquisas em educação, que significa um cuidado com o mundo, uma preocupação com o comum dos seres humanos. E, em terceiro lugar, o conceito que Arendt empresta de Kant referente à mentalidade alargada.

Ao tomar a política como os modos coletivos de decidir sobre a maneira como queremos viver e conduzir os assuntos públicos, nossa posição nesse debate defende o compromisso com vidas oprimidas e sem participação nos processos de decisão. A concepção fundante desse modo de fazer pesquisa que reconhece sermos objetivados por aquilo que buscamos objetivar na pesquisa1212 Rocha ML, Aguiar KF. Micropolítica e o exercício da pesquisa-intervenção: referenciais e dispositivos em análise. Psicol Cienc Prof. 2007; 27(4):648-63. Doi: https://doi.org/10.1590/S1414-98932007000400007.
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traz o desafio de tensionarmos, também em nós, o exercício de alargamento das conexões e inclusões na política. Do contrário, trataríamos a exclusão estrutural como problema apenas do campo pesquisado. E, em se tratando de uma pesquisa que toca nesses processos de decisão, ela não se furta em reconhecer-se como um fazer político e, portanto, em colocar esse desafio de alargamento para si.

Rocha e Aguiar1212 Rocha ML, Aguiar KF. Micropolítica e o exercício da pesquisa-intervenção: referenciais e dispositivos em análise. Psicol Cienc Prof. 2007; 27(4):648-63. Doi: https://doi.org/10.1590/S1414-98932007000400007.
https://doi.org/10.1590/S1414-9893200700...
recuperam de Lourau uma provocação à suposta separação que fazemos entre teoria e política:

O intelectual [...] com sua linguagem de sábio, com a manipulação ou o consumo ostensivo do discurso instituído e o jogo das interpretações múltiplas, dos “pontos de vista” e “níveis de análise”, esconde-se atrás da cortina das mediações que se interpõem entre a realidade política e ele. O intelectual programa a separação entre teoria e política: é para comer-te melhor, minha filha..., mas esquece que é o único que postula tal separação, tal desgarramento1212 Rocha ML, Aguiar KF. Micropolítica e o exercício da pesquisa-intervenção: referenciais e dispositivos em análise. Psicol Cienc Prof. 2007; 27(4):648-63. Doi: https://doi.org/10.1590/S1414-98932007000400007.
https://doi.org/10.1590/S1414-9893200700...
. (p. 656)

Para Arendt1313 Arendt H. A promessa da política. Rio de Janeiro: DIFEL; 2008., há uma separação entre pensar e agir, estando o segundo mais conectado ao âmbito da política. Uma diferença de concepções pede demarcação aqui. Arendt, ao diferir pensar e agir, defende que o primeiro estaria mais voltado para um momento de pensamento privado do indivíduo, e o segundo, mais conectado às suas ações no mundo (quando um pensamento se materializa em atos e palavras faladas, ganhando visibilidade no mundo público)1414 Magalhães TC. Ação e pensamento em Hannah Arendt. In: Mello CM, Braga LM, organizadores. Filosofia do direito e o tempo. Juiz de Fora: Editar; 2011. p. 25-30.. Arendt resguarda a dimensão da ação política para os momentos em que estamos em coletivo, lidando com as diferenças e decidindo algo em conjunto. Tem algo de improvável e incalculável que é possível na política e que depende das pessoas agindo em conjunto.

Na concepção do método cartográfico, essa separação não é possível. Para Deleuze1515 Deleuze G. Dois regimes de loucos: textos e entrevistas (1975-1995). São Paulo: Editora 34; 2016., um dos autores inspiradores dessa perspectiva de pesquisa, o pensamento é ação realizada corporal e coletivamente. Busca-se romper com a dualidade entre mente e corpo e caminhar rumo à subjetivação produzida e vivida socialmente.

Recuperando nosso objetivo de experimentar algumas proposições de Arendt e da pesquisa-intervenção para fortalecer posições éticas nas pesquisas no campo da educação, investimos no diálogo entre as duas resguardando suas diferenças e atentas a contribuições dos dois universos teóricos que permitam defendermos a pesquisa enquanto ação política.

A ação realizada com aqueles que contribuem com a produção de dados e análises da pesquisa é uma ação dependente, implicada em um coletivo, sejam eles atores de um território prático ou teórico, despontando cuidados ético-políticos com aqueles com os quais nos relacionamos.

Com isso, recuperamos a política arendtiana costurando-a a pesquisas que dizem respeito à pluralidade dos indivíduos, ao espaço público e à produção de comuns. Na política, um tema “é forçado ao campo aberto em que se pode mostrar de todos os lados”99 Arendt H. Entre o passado e o futuro. 6a ed. São Paulo: Perspectiva; 2007. (p. 300). O tema se engendra nos jogos de forças do território habitado na pesquisa. O pesquisador não é dono do tema ou das questões referentes à pesquisa, ele acompanha o jogo, compõe e está aberto ao imprevisto, da política e da pesquisa, que reorganiza as ações e reflexões.

Na escola pública pesquisada, há vários debates com a participação de todos os segmentos da comunidade. Neles, efetivam-se atos políticos e experimenta-se uma liberdade que movimenta as fixações de uma pesquisa. Esses atos são maneiras de cuidar do comum dos indivíduos, são atos de amor mundi. No âmbito da produção da própria pesquisa, pensamo-la como produção de um discurso sobre o mundo que produz novos mundos e, portanto, requer refletir e tomar certas posições a partir da seguinte questão: que mundo queremos produzir? Essa questão implica um julgamento político que “não elimina riscos, mas afirma a liberdade humana e o mundo que as pessoas livres compartilham. [...] ele estabelece a realidade da liberdade humana num mundo comum”1313 Arendt H. A promessa da política. Rio de Janeiro: DIFEL; 2008. (p. 11).

Para essa questão, sobre o mundo que queremos, é preciso mentalidade alargada(f(f)Hannah Arendt trabalha o conceito de mentalidade alargada a partir do juízo reflexionante de Kant: “[...] esse modo alargado de pensar, que sabe, enquanto juízo, como transcender suas próprias limitações individuais, não pode funcionar em estrito isolamento e solidão; ele necessita da presença dos outros ‘em cujo lugar’ cumpre pensar, cujas perspectivas deve levar em consideração e sem os quais ele nunca tem a oportunidade de sequer chegar a operar”9 (p. 275).). Brayner1616 Brayner F. Educar para o julgamento (estética, política e educação). In: Carvalho JSF, Custódio CO, organizadores. Hannah Arendt: a crise na educação e o mundo moderno. São Paulo: Intermeios, Fapesp; 2017., pensando a partir de Arendt, destaca: “quando se julga, se julga enquanto membro de uma comunidade” (p. 191), por isso a necessidade do alargamento dos olhares sobre o fenômeno. Julga-se pensando no comum, não na vantagem individual, e a validade do julgamento está em sua comunicabilidade para os outros1616 Brayner F. Educar para o julgamento (estética, política e educação). In: Carvalho JSF, Custódio CO, organizadores. Hannah Arendt: a crise na educação e o mundo moderno. São Paulo: Intermeios, Fapesp; 2017.. Essa discussão provoca a inserção do debate sobre a pesquisa no campo em que ela se dá. Para isso, não são suficientes devolutivas gerais no fim do trabalho, pois os saberes conquistados participam do processo, os acordos são discutidos e revistos, a pesquisa se torna um corpo que se compõe no enfrentamento de problemáticas do cotidiano. Nesse sentido, o compromisso do discurso acadêmico é com o fortalecimento do campo comum dos indivíduos.

O exercício desse compromisso não é fácil. As dificuldades de produção de comum, de momentos de diálogo sobre as ações do cotidiano em rotinas bombardeadas de demandas urgentes de um território vulnerável são vividas ao mesmo tempo que as dificuldades de construção de uma escrita comprometida com os pressupostos ético-políticos trabalhados neste texto. O caminho se faz com deslizes e falhas que, se aproveitados como oportunidades, ampliam a compreensão da complexidade presente na vida cotidiana. A direção ética da bússola não falha quando o pensamento se permite duvidar, espantar-se e se inconformar com o próprio fazer.

São nos tensionamentos que a ação política se dá e que será possível a ruptura com um pensamento estereotipado que acredita em processos lineares prenhes de prescrições de sucesso.

Enlaçamentos com a experiência da pesquisa no campo

O campo de pesquisa demandou atenção ao processo político-pedagógico de construção do trabalho do grupo de educadores e demandou cuidados: como dar visibilidade àquilo que fica invisibilizado no cotidiano do processo de decisões do grupo? Como participar do movimento grupal comprometida de maneira ética com a diversidade que se apresenta na comunidade escolar? Como habitar um campo, como pesquisadora, afirmando as tensões, dificuldades e dúvidas disparadas por essa relação?

Essas questões revelam que a relação da pesquisadora com o campo de pesquisa é encarnada e política. As posições metodológicas apresentadas exigem uma relação com o campo que suporte dúvidas que não serão resolvidas de forma isolada pela pesquisadora. Se partíssemos de certezas prévias sobre o que é ser uma escola-periférica-em-busca-de-um-projeto-político-pedagógico-coletivo apegando-nos a categorias gerais, aniquilaríamos a imprevisibilidade, a política e a responsabilidade nos encontros.

Apoiando-nos nas reflexões metodológicas trabalhadas neste artigo, as responsabilidades políticas e científicas da pesquisa apostam nas relações por vir que estão fora da cadeia previsível de pensamento e dependem do coletivo.

Amarrações

Em tempos de banalização da política, em que fica reduzida aos âmbitos partidário e governamental, há um distanciamento em relação à concepção arendtiana de política e ao método cartográfico; daí a importância em inserir essas discussões no debate sobre a produção acadêmica. O método da cartografia, ao enfatizar as questões aqui apresentadas – sobre o coletivo, o rompimento com a neutralidade, a política e o inesperado –, compõe uma atitude implicada com aqueles com os quais realizamos a pesquisa. Nesse sentido, as contribuições de Hannah Arendt mostram-se potentes para alargar as bordas dessa implicação, por meio dos conceitos de ação, política, mentalidade alargada e amor mundi.

O amor mundi, como dissemos, é o compromisso que assumimos com o cuidado do mundo. “Este mundo é comum a toda a humanidade: é o que há de comum entre os que habitam a Terra em qualquer tempo”1717 Lima EMFA. Vida ativa, mundo comum, políticas e resistências: pensar a terapia ocupacional com Hannah Arendt [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2017. (p. 59). Compreensão que convoca um ato necessário de responsabilização pelo que nos cerca, visto que “nenhuma vida humana é possível sem um mundo que testemunha a presença de outros seres humanos”1717 Lima EMFA. Vida ativa, mundo comum, políticas e resistências: pensar a terapia ocupacional com Hannah Arendt [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2017. (p. 59). É um ato que nos conecta globalmente, como marca Pepe Mujica.

Uma pesquisa que habita uma escola que valoriza o diálogo e o debate e se vê enredada por posições conflituosas tem posição: visa conquistar e socializar saberes que alarguem as bordas da responsabilização, do cuidado com o mundo e com o outro. Portanto, a pesquisa tem compromisso com esse alargamento.

  • (c)
    José Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai, em entrevista concedida a Jordi Évole para seu programa Salvados, em 2014. Tradução pelas autoras:
    • E estão aparecendo no mundo uma série de problemas que nenhum país do mundo, nem o maior, pode consertar e que necessitam de acordos mundiais.

    • Como qual?

    • Os pobres da África... não são da África, são de nossa humanidade. O problema da imigração clandestina que colocam em pauta na Europa se trabalha consertando a pobreza na África, e não construindo muros. Temos que fazer um esforço porque esse problema é de toda a humanidade. Temos que começar a pensar como espécie. Então, aplaudimos a integração financeira, aplaudimos as comunicações, e a política? Quem vai tomar responsabilidade dessa quantidade de plástico, maior que a Europa, que está se juntando no Pacífico? E o derretimento dos polos, como vamos enfrentar? Ou seja, tem-se que pensar pelo mundo inteiro.

  • (d)
    Ao assumir o cargo, o(a) diretor(a) faz a indicação dos dois assistentes de direção que comporão a equipe com ele(a), conforme consta no 9º art. da Portaria da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo n. 2174, de 14 de abril de 2011.
  • (e)
    “É necessário frisar que a implicação não diz respeito à noção de comprometimento, motivação ou relação pessoal com o campo de pesquisa/intervenção; ao contrário, explorar a implicação é falar das instituições que nos atravessam. [...] A implicação denuncia que aquilo que a instituição deflagra em nós é sempre efeito de uma produção coletiva, de valores, interesses, expectativas, desejos, crenças que estão imbricados nessa relação.”1010 Romagnoli RC. O conceito de implicação e a pesquisa-intervenção institucionalista. Psicol Soc. 2014; 26(1):44-52. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-71822014000100006.
    https://doi.org/10.1590/S0102-7182201400...
    (p. 47).
  • (f)
    Hannah Arendt trabalha o conceito de mentalidade alargada a partir do juízo reflexionante de Kant: “[...] esse modo alargado de pensar, que sabe, enquanto juízo, como transcender suas próprias limitações individuais, não pode funcionar em estrito isolamento e solidão; ele necessita da presença dos outros ‘em cujo lugar’ cumpre pensar, cujas perspectivas deve levar em consideração e sem os quais ele nunca tem a oportunidade de sequer chegar a operar”99 Arendt H. Entre o passado e o futuro. 6a ed. São Paulo: Perspectiva; 2007. (p. 275).

  • Financiamento

    A pesquisa que dispara as discussões metodológicas deste artigo advém de um mestrado em andamento realizado com financiamento (bolsa) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
  • Martinez CT, Machado AM. Diálogos entre o método da cartografia e alguns pressupostos filosóficos de Hannah Arendt na pesquisa em educação. Interface (Botucatu). 2021; 25: e190835 https://doi.org/10.1590/Interface.190835

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    26 Nov 2019
  • Aceito
    11 Jul 2020
UNESP Botucatu - SP - Brazil
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