Cartografia das condições de trabalho de homens quilombolas e as intersecções para a informalidade e a saúde mental

Mapping the working conditions of quilombola men and intersections between informality and mental health

Cartografías de las condiciones de trabajo de hombres quilombolas y las intersecciones para la informalidad y la salud mental

Sérgio Vinícius Cardoso de Miranda Jannefer Leite de Oliveira Cristina Andrade Sampaio João Felício Rodrigues NetoSobre os autores

Resumos

O estudo mapeou as condições de trabalho de homens quilombolas residentes no norte do estado de Minas Gerais, Brasil. Utilizou-se o método cartográfico proposto por Gilles Deleuze e Félix Guattari. Os dados foram produzidos em 23 comunidades, por meio de entrevistas individuais, observação de campo e registro das afetações em um diário. A análise de discurso possibilitou a construção de três categorias temáticas e a elaboração de um fluxograma descritor das linhas de força do trabalho. A intersecção de raça/etnia, gênero, região, classe e escolaridade colabora para a precariedade e informalidade ocupacional. No trabalho, as linhas flexíveis permitem vivências de prazer e as linhas duras, o desenvolvimento de adoecimento mental. Nesse sentido, as políticas públicas focadas nos quilombolas necessitam de articulação e fortalecimento pelo Estado, além do esforço para a participação de todos os atores envolvidos, principalmente os homens quilombolas.

Palavras clave
Grupo com ancestrais do continente africano; Marcadores sociais; Trabalho; Iniquidades; Saúde mental


This study mapped the working conditions of Quilombola men living in the north of the State of Minas Gerais, Brazil using the cartographic method proposed by Gilles Deleuze and Félix Guattari. The data were produced in 23 communities using individual interviews, field observations and documentation of affectations in a diary. Discourse analysis enabled the construction of three thematic categories and a flow diagram depicting the lines of work force. The intersection between race/ethnicity, gender, region, class, and level of education contributes to employment precariousness and informality. With regard to work, the flexible lines allow experiences of pleasure and the hard lines lead to the development of mental illness. Policies directed at Quilombolas therefore need to be articulated and strengthened by the government and efforts are needed to promote the participation of all actors involved, especially Quilombola men.

Keywords
African continental ancestry group; Social markers; Work; Iniquities; Mental health


El estudio mapeó las condiciones de trabajo de hombres quilombolas residentes en el norte del Estado de Minas Gerais, Brasil. Se utilizó el método cartográfico propuesto por Gilles Deleuze y Félix Guattari. Los datos se obtuvieron en 23 comunidades, por medio de entrevistas individuales, observación de campo y registro de las afectaciones en un diario. El Análisis de Discurso posibilitó la construcción de tres categorías temáticas y la elaboración de un diagrama de flujo descriptor de las líneas de fuerza del trabajo. La intersección de raza/etnia, género, región, clase y escolaridad colabora para la precariedad e informalidad ocupacional. En el trabajo, las líneas flexibles permiten vivencias de placer y las líneas duras el desarrollo de la enfermedad mental. En ese sentido, las políticas públicas enfocadas en los quilombolas necesitan articulación y fortalecimiento por parte del estado, además del esfuerzo para la participación de todos los actores envueltos, principalmente los hombres quilombolas.

Palabras-chave
Grupo con ancestrales del continente africano; Marcadores sociales; Trabajo; Iniquidades; Salud mental


Introdução

As comunidades quilombolas são formadas por grupos étnico-raciais que possuem ancestralidade negra e trajetória histórica ligadas ao processo de resistência contra a escravidão11 Decreto nº 4.887, de 20 de Novembro de 2003. Regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos. Diário Oficial da União. 21 Nov 2003.. Esses grupos ocupam territórios vivos e compartilham características sociais e culturais que contribuem para a formação da sua identidade e preservação de tradições de origem africana. A caracterização dessa população deve seguir critérios de autoatribuição – atestados pelas próprias comunidades e pela Fundação Cultural Palmares.

Os quilombolas são categorizados como comunidades e populações tradicionais, com modos de vida, produção e reprodução social relacionadas à terra, com o trabalho e com a luta para a conquista de direitos constitucionais22 Sampaio CA. Representações culturais de quilombolas-vazanteiros: um segmento da cultura inclusiva no acampamento Rio São Francisco [tese]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2012.. Essa população enfrenta grandes obstáculos na operacionalização das políticas públicas, além da descontinuidade das ações propostas pelo Estado33 Silva ARF. Políticas públicas para comunidades quilombolas: uma luta em construção. Polit Trab. 2018; 48:115-28.. Diante desse contexto, emerge uma reflexão sobre os marcadores sociais da diferença e as implicações para o trabalho e a saúde dos homens quilombolas.

Os marcadores de raça, etnia, gênero, região, classe e escolaridade identificam e excluem esses homens pela sua ancestralidade, cultura, cor de pele, papel social de provedor, local de moradia, renda, nível de escolaridade e divisão social do trabalho44 Cancela CD, Moutinho L, Simões JA. Raça, etnicidade, sexualidade e gênero: em perspectiva comparada. São Paulo: Terceiro Nome; 2015.. As relações de gênero são articuladas por meio da demarcação dos papéis de homens e mulheres na organização das comunidades. De forma hierárquica, o homem detém o domínio do processo produtivo e o sustento das famílias e a mulher apresenta a responsabilidade do cuidado da casa, dos filhos, da pequena produção nos quintais e do artesanato55 Monteiro KS. As mulheres quilombolas na Paraíba: terra, trabalho e território [dissertação]. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba; 2013..

A maioria das comunidades quilombolas estão situadas em áreas rurais, ocupando diferentes ecossistemas e explorando por meio do trabalho os recursos naturais que compõem os seus territórios. O trabalho, conforme Marx66 Marx K. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural; 1985., é indispensável à sobrevivência humana e fundamental para a organização social; tem como principal função a produção de valores de uso e de valores de troca; e permite que os indivíduos alcancem sua emancipação psicossocial.

De acordo com Dejours77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71., existe uma distinção entre condições de trabalho e organização do trabalho. As condições de trabalho são as caraterísticas relacionadas aos conteúdos ergonômicos e que repercutem sobre as condições físicas do trabalhador. A organização do trabalho comporta o conteúdo significativo do trabalho e exerce maior influência ou pressão sobre o aparelho psíquico. Nesse sentido, o trabalho apresenta influência direta sobre o processo saúde-doença, com impactos no bem-estar físico e psicológico e consequências de mal-estar e adoecimento mental.

Na saúde coletiva, a psicodinâmica do trabalho assume papel de destaque na abordagem da relação entre trabalho e saúde mental. Por meio da circulação da fala e escuta das vivências intersubjetivas dos trabalhadores, é possível identificar as diversas influências do trabalho para o prazer e o sofrimento77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71.. As vivências de prazer se manifestam pela satisfação, realização, reconhecimento, valorização e convivência com outros trabalhadores, que possibilitam a estruturação psíquica, a identidade e a expressão da subjetividade no trabalho88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992..

As vivências de sofrimento são expressas pelos males causados no corpo, na mente e nas relações socioprofissionais. O sofrimento patogênico é produzido pelas pressões existentes no trabalho e pela insatisfação propiciada pelo conteúdo significativo das tarefas executadas. O trabalhador passa então a utilizar estratégias de defesa para suportar o contexto de trabalho, transformando o sofrimento em efeitos negativos para a saúde mental77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71.,88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992..

Além da exposição aos riscos psicossociais no trabalho, os quilombolas enfrentam a discriminação racial que se manifesta fortemente no mercado de trabalho brasileiro. Existem diferenças significativas no acesso à educação e, respectivamente, baixa escolaridade entre a população negra e rural99 Madeira Z, Gomes DDO. Persistentes desigualdades raciais e resistências negras no Brasil contemporâneo. Serv Soc Soc. 2018; 133:463-79.. Estudos indicam que os negros apresentam maior dificuldade para obter uma inserção regular no mercado de trabalho, são mais afetados pela precariedade ocupacional, desenvolvem trabalho para subsistência e possuem rendimento mensal inferior ao salário mínimo1010 Martins TCS. O negro no contexto nas novas estratégias do capital: desemprego, precarização e informalidade. Serv Soc Soc. 2012; 1(111):450-67.,1111 Proni MW, Gomes DC. Precariedade ocupacional: uma questão de gênero e raça. Estud Av. 2015; 29(85):137-51..

Em 2019, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional por amostra de domicílios (PNAD). Rio de Janeiro: IBGE; 2019., os negros representavam 55,8% da população brasileira e 54,9% da força de trabalho nacional. A taxa de desemprego dos trabalhadores pretos e pardos foi superior à dos brancos (13,6% versus 9,2%). Enquanto 34,6% de pessoas brancas se encontravam em condições informais de trabalho, a informalidade atingiu 47,3% de pretos e pardos. Pretos e pardos que compõem a população negra do país também foram a maioria entre os trabalhadores desocupados (64,2%).

Nesse sentido, as desigualdades sociais, raciais e de trabalho são construídas na lógica capitalista, nas relações de produção, na estrutura de classes e, consequentemente, na forma de organização do poder do Estado sobre a sociedade. O objetivo deste estudo foi realizar o mapeamento das condições de trabalho de homens quilombolas e as contribuições dos marcadores sociais para os processos produtivos e de adoecimento mental.

Material e métodos

Trata-se de um estudo qualitativo, fundamentado no método cartográfico proposto por Gilles Deleuze e Félix Guattari. A cartografia se estrutura no campo teórico da esquizoanálise ou filosofia da diferença, permitindo o exercício de diversas modalidades de práticas interventivas ou pesquisa-intervenção nos âmbitos clínico-individual, grupal ou institucional1313 Rolnik S. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre: Sulina; 2007.,1414 Romagnoli RC. A cartografia e a relação pesquisa e vida. Rev Psicol Soc. 2009; 21(2):166-73..

Nesse devir, o inconsciente é compreendido como uma usina de produção, com máquinas que operam no social e no presente e atravessam os corpos dos sujeitos, seus territórios e suas relações1515 Deleuze G, Guattari F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. 2a ed. São Paulo: Ed. 34; 2011.. No mundo vivido, as múltiplas conexões de redes são formadas por uma organização formal e não formal que possibilita dar vida aos processos sociais, conectando demandas e experiências produzidas pelos sujeitos, em um processo chamado de “rizoma”1313 Rolnik S. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre: Sulina; 2007.,1414 Romagnoli RC. A cartografia e a relação pesquisa e vida. Rev Psicol Soc. 2009; 21(2):166-73..

Um rizoma é construído por redes que compõem mapas vivos, com estrutura acêntrica e com múltiplas entradas e saídas. O fundamento do rizoma é a própria multiplicidade. Um rizoma pode ser rompido e retomado em seguida, com uma de suas linhas de força e de segmentaridade (flexíveis, duras ou de fuga)1515 Deleuze G, Guattari F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. 2a ed. São Paulo: Ed. 34; 2011.. A cartografia possibilita captar a existência do trabalho vivo e dinâmico e apresenta-se como uma potente ferramenta para investigações qualitativas no campo da Saúde do Trabalhador.

Em Minas Gerais, até 2019 existiam 397 comunidades quilombolas, distribuídas por mais de 155 municípios. Destas comunidades, 310 foram certificadas pela Fundação Cultural Palmares. O norte do estado é a região com a maior concentração, com 79 comunidades em 28 municípios1616 Fundação Cultural Palmares. Quadro geral de comunidades remanescentes de quilombos (CRQs) [Internet]. Braília; 2019 [citado 4 Jan 2020]. Disponível em: http://www.palmares.gov.br/wp-content/uploads/2015/07/tabela-de-crq-completa-quadro-geral-3.pdf
http://www.palmares.gov.br/wp-content/up...
. A região é classificada pela Secretaria de Estado da Saúde com uma das 13 macrorregiões de saúde, abrangendo 86 municípios divididos em nove microrregiões1717 Minas Gerais (Estado). Secretaria Estadual de Saúde. Plano Estadual de Saúde de Minas Gerais. Belo Horizonte: Secretaria de Estado de Saúde; 2011..

O ponto de partida para a produção de dados ocorreu por meio de conversas via telefone com Referências da Superintendência Regional de Saúde e, em seguida, com os coordenadores de Atenção Primária à Saúde dos municípios que possuíam quilombos certificados, para apresentar o projeto e obter os contatos dos agentes comunitários de saúde (ACS) responsáveis pelas famílias quilombolas. Os ACS foram fundamentais na articulação com as comunidades e como guias nos deslocamentos pelos territórios.

As datas das viagens foram agendadas, previamente, com os líderes comunitários e presidentes de associações de quilombolas. Para chegarmos até as comunidades, utilizamos o sistema de posicionamento global (GPS) e mapas disponíveis em aplicativos de internet; e seguimos placas com os nomes e direção dos quilombos. Foram visitadas oito microrregiões, totalizando 16 municípios e 23 comunidades rurais rastreadas (figura 1). A microrregião de Pirapora não participou do estudo pelo fato de não possuir quilombos.

Figura
Territórios quilombolas visitados na macrorregião.

Participaram do campo de pesquisa homens quilombolas, maiores de 18 anos, que no momento estivessem desempenhando alguma atividade produtiva e residindo nas comunidades da macrorregião. Para rastrear os processos de produção de subjetividades, utilizamos as pistas da cartografia1818 Passos E, Kastrup V, Escóssia L, organizadores. Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sullina; 2015. observando, captando, escutando, orientando e promovendo uma mistura de sujeito e objeto, da produção do trabalho e do trabalho em produção.

A produção de dados no campo ocorreu no período de janeiro a setembro de 2019, com duas viagens mensais para os quilombos, com duração de aproximadamente dois dias cada. Foram realizadas 94 entrevistas individuais em profundidade; observação do mundo vivido e dos processos de trabalho; e registros em um diário cartográfico. Os encontros foram gravados em áudio, tendo duração média de 50 minutos. Cada homem quilombola recebeu a sigla “HQ”, seguida por um número de ordem, chegando até 94.

Os dados foram analisados de acordo com a técnica de análise de discurso proposta por Michel Pêcheux1919 Pêcheux M. Semântica e discurso. Campinas: Pontes; 1988. e Eni Orlandi2020 Orlandi E. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes; 2007.. Os sentidos foram construídos pela integração entre ideologia, história e linguagem, ancorados nos marcadores sociais e articulados com os diferentes tipos de trabalho executados pelos homens quilombolas, permitindo, assim, uma compreensão integral de todas as observações realizadas em campo.

No primeiro momento da análise, realizamos a transcrição do corpus bruto, preservando ao máximo a fidelidade entre o diálogo e o texto transcrito. Em seguida, foram realizadas uma leitura e releitura minuciosa de todas as entrevistas para conferir materialidade linguística aos discursos que foram inseridos em uma matriz de análise elaborada pelos pesquisadores.

No segundo momento, ocorreu a passagem do objeto discursivo para o processo discursivo com a síntese dos discursos, ou seja, o que foi dito pelos homens em nível de interdiscurso e intradiscurso. Para finalizar, identificamos a existência de uma articulação do enunciado com a enunciação e a constituição de processos de formação discursiva nas linhas de força do trabalho.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), por meio do Parecer Consubstanciado nº 2.821.454, de 14 de agosto de 2018. Todos os entrevistados assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido após os pesquisadores deixarem claros os objetivos do estudo, a preservação do sigilo das informações e o retorno social.

Resultados e discussão

Caracterização dos territórios e participantes

As observações de campo registradas no diário cartográfico possibilitaram reconstruir todas as experiências vivenciadas. Até as comunidades, percorremos rodovias de asfalto e estradas de terra. No período da seca, muita poeira; no tempo chuvoso, por diversas vezes ficamos atolados no meio do caminho. Atravessamos de balsa o Rio São Francisco por duas vezes e sentimos todas as dificuldades enfrentadas pelos quilombolas para se deslocarem.

As características gerais dos quilombos se assemelham entre si em toda a região cartografada. Existem comunidades mais estruturadas, com casas próximas umas das outras, ruas asfaltadas e comunidades com casas dispersas, sendo algumas muito distantes. Em quase todas as comunidades encontra-se uma pequena Igreja Católica, templo da Congregação Cristã no Brasil e uma Associação de Comunidades Quilombolas. Existem também pequenos comércios de variedades e bebidas.

A maioria das comunidades não possuem escola, sendo necessário os estudantes se deslocarem em ônibus escolares até os distritos rurais ou a sede dos municípios. As equipes de Saúde da Família acompanham tanto a população rural quanto os quilombolas. Os médicos, enfermeiros e dentistas atendem de três a quatro vezes por semana nas unidades básicas de saúde dos maiores distritos. Alguns quilombos recebem o atendimento médico uma vez por mês, na sede das associações, em galpões ou na casa de algum morador.

A maioria dos entrevistados tinha idade entre 40 a 59 anos (60,6%), casada ou em união estável (70,2%) e autodeclarava-se negra (82,9%). Seguiam religião ou culto católico 52,1% dos entrevistados; religião evangélica, 42,5%; e de matriz africana, 3,1%. Em todas as comunidades, verifica-se a baixa escolaridade, na qual a maior parte dos homens possuía apenas o ensino fundamental incompleto (44,6%) ou eram analfabetos (15,9%).

A maior parte dos entrevistados começou a trabalhar antes dos 14 anos (68,0%) e os principais tipos de ocupação foram: trabalhador na agricultura (27,6%), trabalhador no manejo de eucalipto (15,9%), pedreiro (14,8%), trabalhador na carvoaria (13,8%) e na criação de animais (6,3%). Todos relataram não possuir vínculo com a previdência social, trabalhando em média 44 horas semanais (41,7%) e apresentando renda familiar inferior ou igual a um salário-mínimo (69,1%). Foram considerados como principais riscos psicossociais do trabalho seu ritmo intenso, esforço físico, baixa remuneração, discriminação e ausência de apoio social.

Para avançar na compreensão da produção de subjetividade, priorizamos, a partir desse momento, as informações resultantes dos diálogos com os entrevistados. A análise do material empírico permitiu a construção de três categorias temáticas e a elaboração de um fluxograma descritor das linhas de força do trabalho (figura 2).

Figura 2
Fluxograma descritor das linhas de força presentes no trabalho dos homens quilombolas

O trabalho dos homens nos quilombos

Iniciamos a discussão pelo recorte de gênero e as vivências masculinas no trabalho. Os homens quilombolas desenvolvem principalmente o trabalho na agricultura. Antes de iniciar o período chuvoso, realizam a limpeza da área a ser cultivada com o auxílio de ferramentas manuais para em seguida plantarem e colherem os grãos. Nos diálogos, foi possível identificar a existência de linhas flexíveis que aproximam os homens do trabalho com a terra. Essa forte relação é considerada uma das marcas da ancestralidade negra.

Aqui os homens trabalham e vivem da terra. Plantamos o milho, o feijão e a mandioca. (HQ-9)

A nossa riqueza é poder preparar a terra. Tá ali o dia todo mexendo com ela, cultivando a lavoura para depois colher. (HQ-61)

O trabalho é na enxada e na foice. É o que a gente aprendeu a fazer, um trabalho braçal. [...] Por meio do trabalho que o homem sustenta a casa e a sua família. (HQ-12)

Nas interações com a terra, a população quilombola expressa na categoria “trabalho” a sua autonomia para reprodução e manutenção da vida2121 Costa JBA. Processos e territorializações e o deslizamento de conteúdos na etnicidade quilombola em Agreste. Rev Argumento. 2013; 1(7):117-44.. Nos quilombos, a identidade masculina associa-se diretamente ao valor do trabalho. O papel social de garantir o sustento familiar/ser o provedor encontra-se dentro dos atributos da masculinidade hegemônica44 Cancela CD, Moutinho L, Simões JA. Raça, etnicidade, sexualidade e gênero: em perspectiva comparada. São Paulo: Terceiro Nome; 2015.,55 Monteiro KS. As mulheres quilombolas na Paraíba: terra, trabalho e território [dissertação]. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba; 2013.. Esse ideal de masculinidade acaba configurando as práticas relacionais entre homens e mulheres, hierarquizando e estabelecendo relações assimétricas de poder e trabalho2222 Connell R, Messerschmidt J. Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Estud Fem. 2013; 21(1):241-82..

Essas comunidades apresentam grande dependência e manutenção histórica do cultivo do feijão, milho e mandioca. A prática do cultivo anual desses alimentos é considerada um importante marcador cultural dessas populações2121 Costa JBA. Processos e territorializações e o deslizamento de conteúdos na etnicidade quilombola em Agreste. Rev Argumento. 2013; 1(7):117-44.. Em estudo realizado por Marques e Silva2323 Marques SMT, Silva GP. Trabalho e acidentes no meio rural do Oeste Catarinense - Santa Catarina, Brasil. Rev Bras Saude Ocup. 2003; 28(107-108): 101-5., 75% dos trabalhadores rurais ainda utilizavam exclusivamente a enxada, machado, foice e facões na agricultura. As dificuldades financeiras são apontadas como o principal fator para a não mecanização da produção.

No trabalho rural, outra atividade muito desenvolvida é a criação de animais:

Eu crio umas vaquinhas para tirar o leite. (HQ-77)

A gente tem o costume de cuidar de galinhas, é para nós mesmos. (HQ-57)

Às vezes dá para vender uns ovos e frangos na cidade. O porco a gente engorda, mata e depois come. (HQ-02)

Nessas comunidades, a produção da alimentação precisa ser contínua e apresentar diversidade de produtos, além de estar inserida na cultura alimentar local. A agricultura de subsistência é reconhecida como uma prática que assegura os produtos básicos para o consumo familiar, e a comercialização do excedente de sua produção, como uma importante fonte de renda para os quilombolas2424 Santos RC, Silva MS. Condições de vida e itinerários terapêuticos de quilombolas de Goiás. Saúde Soc. 2014; 23(3):1049-63.,2525 Sousa MSR, Santos JJF. Territorialidade quilombola e trabalho: relação não dicotômica cultura e natureza. Rev Katálysis. 2019; 22(1):201-9..

Na região, existem grandes fazendas que desenvolvem a monocultura de eucalipto e que se tornaram uma importante oportunidade de trabalho.

Por essas bandas tem muita plantação de eucalipto. Fazendas e mais fazendas para trabalhar. (HQ-81)

A gente planta as mudas, roça os matos e depois ajuda no corte da madeira. (HQ-66)

Sob a ótica capitalista de produção, o crescimento da monocultura de eucalipto no Brasil tem gerado diversos conflitos ambientais, envolvendo principalmente a deterioração dos recursos hídricos, contaminação por agrotóxicos, desmatamentos e concentração fundiária2626 Duarte FC. A expansão da monocultura de eucalipto no noroeste fluminense e seu potencial para a geração de conflitos socioambientais [dissertação]. Campos dos Goytacazes: Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro; 2012.. O estado de Minas Gerais destaca-se pela produção de eucalipto, devido principalmente à grande demanda para fabricação de carvão vegetal2727 Dias EC, Assunção AA, Guerra CB, Prais HAC. Processo de trabalho e saúde dos trabalhadores na produção artesanal de carvão vegetal em Minas Gerais, Brasil. Cad Saude Publica. 2002; 18(1):269-77..

Uma parte dos homens da comunidade trabalham lá nas carvoarias. (HQ-34)

Eu vou enchendo os fornos e fico de olho na queima da madeira. (HQ-60)

Depois que vira o carvão eu tiro e ensaco tudo. Tem uns homens que ficam só fazendo a carga nos caminhões. (HQ-1)

Na região, existem muitas carvoarias, canaviais, engenhos e alambiques que geram diferentes oportunidades de emprego e renda para os homens quilombolas.

Essa região é muito forte na plantação de cana. O bom é que dá emprego para muitos homens. A gente coloca para moer e depois faz rapadura. (HQ-78)

O movimento no alambique não para. A pinga vende muito. [...] Tem que produzir o ano todo. (HQ-18)

Nas comunidades quilombolas, a informalidade e a falta de emprego abrem a possibilidade para alguns homens buscarem alternativas como a construção civil, sendo ajudantes ou pedreiros, mesmo que haja necessidade de deslocamento entre o campo e a cidade.

Por aqui tem muito homem que trabalha de servente e de pedreiro. Eu sou pedreiro aqui mesmo na comunidade. (HQ-90)

Ajudo fazer a massa de cimento, rebocar parede e o acabamento. A maioria das construções é na cidade, a gente vai e volta todo dia. (HQ-13)

Em estudo realizado na Paraíba, a função de pedreiro foi identificada como uma das atividades mais desempenhadas pelos homens quilombolas (39,2%)2828 Silva JAND. Condições sanitárias e de saúde em Caiana dos Crioulos, uma comunidade quilombola do Estado da Paraíba. Saúde Soc. 2007; 16(2):111-24.. Em dois quilombos de Goiás, esse trabalho foi o mais citado entre os indivíduos que saíram das comunidades para buscar emprego nos centros urbanos2424 Santos RC, Silva MS. Condições de vida e itinerários terapêuticos de quilombolas de Goiás. Saúde Soc. 2014; 23(3):1049-63..

A grande aceitação pelas populações locais das atividades cartografadas nesse estudo foi compreendida como uma linha flexível de produção do trabalho. Porém, a maioria dos trabalhadores possui apenas um vínculo de trabalho temporário e sem a garantia de direitos trabalhistas.

Os marcadores sociais e a informalidade no trabalho

As narrativas a seguir permitiram identificar as contribuições e subjetividades das linhas duras do trabalho, além dos efeitos das intersecções de raça/etnia, região, classe e escolaridade para a existência de altas taxas de informalidade.

No quilombo não tem muita oportunidade de emprego. A gente tenta fazer de tudo um pouco. É o que aparecer. (HQ-40)

Acaba que a maioria dos homens trabalha para eles mesmo. A hora que não tá trabalhando, o jeito é ficar parado. (HQ-75)

Nunca trabalhei de carteira assinada. O contrato é de boca mesmo, na confiança. (HQ-20)

Segundo a Organização Internacional do Trabalho, são classificados como trabalhadores informais aqueles que não possuem carteira de trabalho assinada e consequentemente não são cobertos pelos benefícios trabalhistas. No Brasil, a informalidade inclui ainda os assalariados sem contrato formal, os trabalhadores por conta própria que não contribuem para a previdência social e os trabalhadores não remunerados2929 International Labour Office. Women and men in the informal economy: a statistical picture. 3th ed. Geneva: ILO; 2018.,1010 Martins TCS. O negro no contexto nas novas estratégias do capital: desemprego, precarização e informalidade. Serv Soc Soc. 2012; 1(111):450-67..

De dia trabalho na roça e à noite, no barzinho. Vendo cereais, bolacha, bebidas. Tem sinuca e às vezes um forró. [...] Eu faço também umas viagens como táxi, carregando as pessoas até a cidade. Isso tudo é para ganhar um dinheirinho a mais. (HQ-42)

O trabalho no capitalismo passou a ser entendido como uma mercadoria e o trabalhador, a ser explorado intensamente pela sua força de trabalho66 Marx K. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural; 1985.. A abertura de pequenos comércios e o desempenho de uma variedade de funções informais apresenta-se como alternativas para o desemprego ou baixos rendimentos. Nesses territórios, o Estado deve promover ações direcionadas para o cooperativismo, associativismo e/ou o microempreendedorismo individual, com a formalização e garantia dos direitos trabalhistas.

O preconceito e a discriminação apresentam-se como linhas duras muito presentes no cotidiano de vida e trabalho dessa população.

O homem que é negro tem que se virar para sobreviver. (HQ-23)

Tudo para nós é muito mais difícil. O trabalho então, nem se fala. Eu acho que é um preconceito pela cor da nossa pele. (HQ-85)

A gente tem orgulho de falar que é quilombola e que faz parte dessa comunidade. Mas ainda tem muito olho torto com o nosso povo. (HQ-28)

A discriminação racial no trabalho surgiu durante o período da formação social brasileira. Com o fim do trabalho escravo e com a proclamação da República, o monopólio do poder passou a ser exercido pelos grandes proprietários rurais, que valorizaram intensamente a política do imigrante branco como símbolo da redefinição social e cultural1010 Martins TCS. O negro no contexto nas novas estratégias do capital: desemprego, precarização e informalidade. Serv Soc Soc. 2012; 1(111):450-67.. Nesse processo, os negros foram profundamente bloqueados do trabalho assalariado e inseridos fortemente nas ocupações mais precárias e informais.

Nos territórios visitados, percebemos que os homens quilombolas são estratificados por linhas de força que impõem dificuldades para a obtenção de emprego e fragilidades na sua manutenção. A elevada proporção de trabalhadores negros em situação ocupacional muito precária sugere a existência de processos de segregação social, que se refletem exatamente na forma de inserção desses sujeitos no mercado de trabalho1010 Martins TCS. O negro no contexto nas novas estratégias do capital: desemprego, precarização e informalidade. Serv Soc Soc. 2012; 1(111):450-67.,3030 Silva RA, Menezes JA. Relações étnico-raciais e educação nas comunidades quilombolas. Pesqui Prat Psicossociais. 2018; 13(3):1-17..

A raça e etnia exercem, portanto, influência no trabalho, tanto na admissão em um determinado tipo ou relação de emprego quanto na definição de sua remuneração. Para Silva e Menezes3030 Silva RA, Menezes JA. Relações étnico-raciais e educação nas comunidades quilombolas. Pesqui Prat Psicossociais. 2018; 13(3):1-17., as pessoas que apresentam atributos iguais, exceto quanto à raça, são valorizadas de forma distinta pelos empregadores, apenas em virtude da cor da sua pele, caracterizando a existência direta de preconceito racial.

Os quilombolas enfrentam linhas duras impostas pela dualidade dos marcadores de região e classe. A pobreza na zona rural é maior do que nas cidades e atinge mais severamente essa população33 Silva ARF. Políticas públicas para comunidades quilombolas: uma luta em construção. Polit Trab. 2018; 48:115-28.,2525 Sousa MSR, Santos JJF. Territorialidade quilombola e trabalho: relação não dicotômica cultura e natureza. Rev Katálysis. 2019; 22(1):201-9.. Nesse sentido, para esses homens, a discriminação ocorre também em virtude das condições de pobreza extrema.

Nossa região é muito pobre. Por aqui não tem emprego não. [...] Lugar esquecido pelos governantes. (HQ-91)

A vida no quilombo é muito difícil, muita pobreza. O jeito é sair para fora, ir para as cidades para trabalhar e colocar comida dentro de casa. (HQ-16)

No estado de Minas Gerais, a região norte concentra 24,7% dos agricultores familiares em situação de pobreza e é considerada uma das regiões mais pobres do Brasil2727 Dias EC, Assunção AA, Guerra CB, Prais HAC. Processo de trabalho e saúde dos trabalhadores na produção artesanal de carvão vegetal em Minas Gerais, Brasil. Cad Saude Publica. 2002; 18(1):269-77.. Devido à proximidade geográfica, a região acompanha o comportamento da economia nordestina, com características muito semelhantes ao perfil econômico e social. Existem localidades estagnadas e que concentram grandes bolsões de pobreza a exemplos dos quilombos visitados.

A pesquisa sobre desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil3131 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil entre 2012 e 2018. Rio de Janeiro: IBGE; 2018. apontou que nas distintas regiões do país, entre 2012 e 2018, os homens brancos ganharam 73,9% a mais do que os homens pretos ou pardos. O estudo revelou ainda que, em média, uma mulher branca ganha mais do que um homem negro. Na hierarquia social, significa que as mulheres brancas estão mais próximas dos homens brancos e acima dos homens negros.

Os quilombolas apresentam piores indicadores de escolaridade em relação aos brancos e aos pretos e pardos que residem em áreas urbanas. A intersecção dos marcadores analisados associa-se diretamente ao nível mais baixo de escolaridade desses homens.

É até uma vergonha falar, mas só sei escrever o meu nome e olha lá. (HQ-25)

Comecei trabalhar com doze anos para ajudar o meu pai na roça. [...] Eu só fiz até a segunda série primária. (HQ-80)

Aqui tinha uma escola, mas o prefeito fechou e levou os alunos para a cidade. O carro da prefeitura só andava quebrando e a gente não tinha como ir. (HQ-32)

As desvantagens no nível de escolaridade da população negra em relação à população branca continuam evidentes. Em 2018, a taxa de analfabetismo na população branca foi de 3,9% e na população negra, de 9,1%. O pior cenário em relação ao analfabetismo refere-se aos negros residentes em zona rural, chegando à 20,7% e 11,% em relação aos brancos 1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional por amostra de domicílios (PNAD). Rio de Janeiro: IBGE; 2019.,3131 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil entre 2012 e 2018. Rio de Janeiro: IBGE; 2018..

No período entre 2016 e 2018, a proporção de negros maiores de 25 anos com pelo menos o ensino médio completo subiu de 37,3% para 40,3%. Na população branca, esse percentual foi de 55,8%. Em relação a estar cursando o ensino superior, ocorreu um aumento de 50,5% para 55,6% entre os jovens negros, porém, tal número ainda está abaixo dos 78,8% dos universitários brancos. Dos jovens entre 18 e 24 anos com ensino médio completo e que não estavam frequentando a escola por terem que trabalhar ou procurar trabalho, 61,8% eram negros3131 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil entre 2012 e 2018. Rio de Janeiro: IBGE; 2018..

Estudos realizados com adultos em comunidades de Minas Gerais3232 Oliveira SKM, Caldeira AP. Fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis em quilombolas do norte de Minas Gerais. Cad Saude Colet. 2016; 24(4):420-7., Goiás2424 Santos RC, Silva MS. Condições de vida e itinerários terapêuticos de quilombolas de Goiás. Saúde Soc. 2014; 23(3):1049-63., Bahia3333 Kochergin CN, Proietti FA, César CC. Comunidades quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil: autoavaliação de saúde e fatores associados. Cad Saude Publica. 2014; 30(7):1487-501. e Rio Grande do Sul3434 Martins MM, organizador. Memórias de trabalho e não trabalho quilombola. São Leopoldo: Oikos; 2019. comprovam que os quilombolas possuem menor acesso à educação e baixa escolaridade. A ausência de uma rede de apoio social e de incentivo familiar; necessidades de trabalhar, longos deslocamentos até os centros urbanos; e dificuldade e/ou falta de transporte escolar são linhas duras que dificultam a continuidade da escolarização por essa população3030 Silva RA, Menezes JA. Relações étnico-raciais e educação nas comunidades quilombolas. Pesqui Prat Psicossociais. 2018; 13(3):1-17..

Políticas públicas quilombolas começaram a ser aplicadas de fato no Brasil a partir de 2003, com a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR)33 Silva ARF. Políticas públicas para comunidades quilombolas: uma luta em construção. Polit Trab. 2018; 48:115-28.. Entre 2004 e 2007, foram lançados o Programa Brasil Quilombola e o Programa de Aceleração do Crescimento Quilombola. Obras de infraestrutura – como habitação, saneamento, eletrificação, comunicação e vias de acesso – deveriam ter sido colocadas em prática, além de investimentos nas áreas da educação, assistência social e saúde33 Silva ARF. Políticas públicas para comunidades quilombolas: uma luta em construção. Polit Trab. 2018; 48:115-28.,99 Madeira Z, Gomes DDO. Persistentes desigualdades raciais e resistências negras no Brasil contemporâneo. Serv Soc Soc. 2018; 133:463-79..

Essas ações são consideradas linhas de fuga e permitem intervenções nas desigualdades e vulnerabilidades sociais. Entretanto, observa-se na literatura que ainda persistem discriminação racial; pobreza extrema; baixo índice de renda domiciliar e emprego informal; precárias condições de habitação; e dificuldade de acesso à educação e saúde2424 Santos RC, Silva MS. Condições de vida e itinerários terapêuticos de quilombolas de Goiás. Saúde Soc. 2014; 23(3):1049-63.,3030 Silva RA, Menezes JA. Relações étnico-raciais e educação nas comunidades quilombolas. Pesqui Prat Psicossociais. 2018; 13(3):1-17.,3333 Kochergin CN, Proietti FA, César CC. Comunidades quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil: autoavaliação de saúde e fatores associados. Cad Saude Publica. 2014; 30(7):1487-501..

Vivências de prazer e adoecimento mental no trabalho

Os aspectos psicossociais do trabalho dizem respeito à interação subjetiva entre o trabalhador, seu trabalho e o contexto social. Compreender esse processo exigiu uma observação, escuta e interação com os trabalhadores, além do rastreamento das linhas de força presentes nos territórios. De um modo geral, para os homens quilombolas, o trabalho permite uma interação social, expressando sentimentos como prazer e felicidade.

Eu gosto de tá ali trabalhando, fazendo alguma coisa útil para nós. O trabalho ajuda muito na vida da gente, ocupando a mente e o tempo. (HQ-41)

Quando estou trabalhando vou conversando com meus companheiros e esquecendo dos problemas. E quando a gente trabalha certinho eles confiam na gente e sempre chamam para um serviço. (HQ-76)

É uma felicidade poder trabalhar. Tenho bons amigos que fiz no serviço. Até o dono da fazenda ficou meu amigo. (HQ-22)

Em primeiro lugar, ressaltamos as linhas flexíveis do trabalho e as repercussões para a satisfação e realização pessoal. Para Dejours88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992., o ambiente e a natureza do trabalho influenciam o estado de saúde e o bem-estar em geral do ser humano. As vivências de prazer se manifestam também por meio da convivência; do apoio social; do reconhecimento profissional; da liberdade e autonomia para a execução das tarefas; e da valorização no trabalho77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71..

Assim, o trabalho não é, por si só, um fator de adoecimento. Determinados contextos podem viabilizar negociações, formação de compromissos de trabalho e ressonância entre o subjetivo e a realidade concreta77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71.,88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992.. Essas vivências surgem nos territórios existenciais por meio das linhas flexíveis que o trabalho traça no corpo, na psique e nas relações interpessoais, ou seja, nos mapas de segmentaridade que rodeiam e atravessam os trabalhadores88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992.,1515 Deleuze G, Guattari F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. 2a ed. São Paulo: Ed. 34; 2011..

Em contrapartida, no trabalho, esses homens encontram-se expostos e lutando diariamente contra inúmeras linhas duras, entre as quais se destacam os riscos psicossociais.

No canavial eu tenho que trabalhar muito rápido. Chega no final do dia o corpo e a cabeça tá pedindo descanso. (HQ-35)

Lá nos eucaliptos eles pagam muito pouco e só ficam exigindo para eu fazer um monte de serviço. De vez em quando eu fico muito nervoso com isso. (HQ-92)

Na roça é puxando enxada o dia inteirinho. O mesmo serviço todo dia e o pior é se esforçar tanto para ganhar quase nada. (HQ-83)

Essas condições de trabalho estão conectadas diretamente à monotonia, sobrecarga, grande esforço físico, mínimo conforto e tensão. Nas diversas ocupações, emergem histórias individuais e coletivas de trabalho precário, carregado de preconceito e discriminação. Somam-se a essa realidade a informalidade e a falta de apoio social. Como defesa, os trabalhadores gastam energia corporal na busca de dar conta da realização das atividades, o que acaba gerando angústia psicossomática e adoecimento mental77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71..

Os discursos possibilitaram identificar a existência de transtornos mentais comuns relacionados às linhas duras presentes nos ambientes de trabalho nos quilombos e seus entornos. Alguns homens relataram que a execução das suas funções acaba gerando angústia, ansiedade e depressão.

Teve uma época que eu não estava conseguindo dormir. Passava a noite inteirinha acordado. [...] Trabalhava em duas fazendas e ainda fazia uns bicos. O médico disse que era ansiedade e me passou uns comprimidos para dormir. (HQ-72)

Eu não tinha vontade de fazer mais nada. Foi aquele negócio de depressão. Mexer nos fornos de carvão é muito puxado. A gente só anda na pressão, aquilo é um inferno, eu uso remédio controlado até hoje. (HQ-60)

O sofrimento no trabalho traduz a luta do sujeito contra pressões e forças oriundas da organização do trabalho que o empurram na direção da doença e da desestabilização psíquica e somática77 Dejours C. Psicodinâmica do trabalho e teoria da sedução, Maringá. Psicol Estud. 2012; 17(3):363-71.,88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992.. O trabalhador inicia com um esgotamento emocional e em seguida apresenta quadros clínicos de medo; ansiedade; nervosismo; tensão; fadiga; mal-estar; e distúrbios de sono e psicossomáticos como gastrite e crises hipertensivas3535 Santos GBV, Alves MCGP, Goldbaum M, Cesar CLG, Gianini, RJ. Prevalência de transtornos mentais comuns e fatores associados em moradores da área urbana de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2019; 35(11):1-10..

No Brasil, dados sobre os transtornos mentais comuns em populações quilombolas são escassos. Pauli et al3636 Pauli S, Bairros FS, Nunes LN, Neutzling MB. Prevalência autorreferida de hipertensão e fatores associados em comunidades quilombolas do Rio Grande do Sul, Brasil. Cienc Saude Colet. 2019; 24(9):3293-303. encontraram uma prevalência de 29,3% em adultos residentes nessas comunidades. Na população rural, segundo Costa e Ludermir3737 Costa AG, Ludermir AB. Common mental disordersand social supportin a rural community in Zona da Mata, Pernambuco State, Brazil. Cad Saude Publica. 2005; 21(1):73-9., a prevalência foi de 36%. Assim, na tentativa de lidar com esse adoecimento mental, causado pelas linhas duras do trabalho, os homens quilombolas recorrem ao consumo de antidepressivos, benzodiazepínicos e principalmente ao uso abusivo de álcool.

Andava desgostoso do trabalho e por isso comecei a beber. (HQ-52)

Eu estava preocupado com umas coisas lá na construção e tomeis uma pinguinha. No início era para esquecer os problemas. Mas não consegui mais parar. (HQ-24)

O trabalho é tão pesado que a pinga ajuda aliviar um pouco. O jeito é beber. Saio do serviço e já passo no barzinho [...]. Bebo um pouco de tudo. (HQ-87)

Nessa perspectiva, Dejours88 Dejours C. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez-Oboré; 1992. apresenta a existência de duas formas de sofrimento no trabalho: o sofrimento criativo, no qual os sujeitos produzem estratégias e soluções adaptativas para manter a sua saúde diante das diversas pressões do trabalho; e o sofrimento patológico, no qual são feitas escolhas prejudiciais. O consumo de drogas e/ou bebidas alcoólicas são consequências diretas do sofrimento patológico e um grave problema de saúde pública. Em termos gerais, o uso abusivo dessas substâncias pode ocasionar prejuízos pessoais, familiares e sociais, além de diminuição na produtividade e aumento do absenteísmo.

Como políticas públicas de saúde, entre 2006 e 2012, o Ministério da Saúde garantiu o acréscimo de 50% nos valores repassados para equipes de Saúde da Família em territórios quilombolas e lançou a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra; a Política Nacional de Saúde das Populações do Campo, Floresta e Águas; e a Política Nacional de Saúde do Trabalhador.

Essas políticas deveriam ser linhas de fuga para o acesso da população negra do campo, em particular dos quilombolas, às ações de promoção da saúde e prevenção de agravos, com destaque para os riscos e doenças relacionadas ao trabalho, o sofrimento psíquico e os transtornos mentais derivados do uso abusivo de álcool. No entanto, a partir de 2019, com o Ministério da Saúde assumindo uma agenda neoliberal, as políticas públicas de saúde vêm sofrendo um desmonte, aumentando as iniquidades e desfavorecendo ainda mais os grupos vulneráveis.

Considerações finais

A cartografia permitiu conhecer as linhas de força e a rede de conexões entre os homens quilombolas, a terra e o mundo do trabalho. Não se tratou de interpretar uma realidade como se ela apresentasse apenas um sentido, mas de ativar o nosso radar e o nosso olho vibrátil para a compreensão das subjetividades e relações de trabalho estabelecidas em cada território.

A intersecção de raça/etnia, gênero, região, classe e escolaridade colabora diretamente para a exploração da força de trabalho dos homens, a existência da precariedade ocupacional e a manutenção das iniquidades sociais. Torna-se importante, portanto, que esforços sejam realizados para a formalização dos vínculos, recolhimento das contribuições trabalhistas e geração de benefícios para os trabalhadores. No trabalho, as linhas flexíveis permitem vivências de prazer e realização pessoal e as linhas duras contribuem para o desenvolvimento de transtornos mentais comuns.

Essas vulnerabilidades merecem atenção especial das políticas públicas de promoção da igualdade racial, de acesso ao mercado de trabalho e de saúde do trabalhador. Destacamos que, entre 2003 a 2012, ocorreram avanços na implementação dessas políticas, porém, a partir de 2017, deparamo-nos com um grande retrocesso dos direitos constitucionais da população quilombola.

Cabe destacar que, em 2019, com as reformas ministeriais, houve a absorção da SEPPIR ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, enfraquecendo ainda mais a luta e a representatividade dessa população. Nesse sentido, as políticas públicas focadas nos quilombolas apresentam-se como linhas de fuga e necessitam de articulação e fortalecimento pelo Estado, além do esforço para a participação de todos os atores envolvidos, principalmente os homens quilombolas.

Agradecimentos

Aos homens quilombolas, que permitiram cartografar o mundo vivido do trabalho, aos orientadores do doutorado, aos alunos de iniciação científica voluntária e ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

  • Miranda SVC, Oliveira JL, Sampaio CA, Rodrigues Neto JF. Cartografia das condições de trabalho de homens quilombolas e as intersecções para a informalidade e a saúde mental. Interface (Botucatu). 2021; 25: e200478 https://doi.org/10.1590/interface.200478

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    13 Jul 2020
  • Aceito
    17 Dez 2020
UNESP Botucatu - SP - Brazil
E-mail: intface@fmb.unesp.br