Cuidado fragmentado: resposta da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência para crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus

Fragmented care: the response of the Persons with Disabilities Care Network to children with Congenital Zika Syndrome

Cuidado fragmentado: respuesta de la Red de Cuidados de la Persona con Discapacidad para niños con Síndrome Congénito del Zika Virus

Carolina Melim Diogo Pereira Paulo Henrique dos Santos Mota Aylene Bousquat Sobre os autores

Resumo

O objetivo da pesquisa foi analisar a organização e estrutura que a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência (RCPD) oferece às crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus (SCZV) na Região de Saúde de Salvador (BA). Trata-se de uma pesquisa qualitativa que cotejou Itinerários Terapêuticos, das crianças com SCZV com a percepção, de gestores e profissionais da RCPD, sobre o funcionamento da rede. Ainda que existam concordâncias entre entrevistados, há problemas evidenciados somente pelas cuidadoras. Não existem mecanismos de regulação assistencial definidos entre os serviços da RCPD, levando as cuidadoras a navegarem pelo sistema de forma desgovernada em busca de assistência. A fragmentação do cuidado revelada impede o cuidado continuado e coordenado entre os diferentes serviços de saúde, resultando em intervenções pontuais. A SCZV coloca a proposta de RCPD em xeque, uma vez que há pouca congruência entre as trajetórias percorridas e a política nacional instituída.

Síndrome Congênita do Zika Vírus; Pessoa com deficiência; Serviços de saúde; Atenção à Saúde

Abstract

The aim of this study was to analyze the organization and structure that the Persons with Disabilities Care Network (RCPD) offers children with Congenital Zika Syndrome (CZS) in the Salvador Health Region (BA). We conducted a qualitative study to investigate the experiences of the children’s caregivers based on therapeutic itineraries and the perceptions of RCPD managers and professionals. Despite general agreement between the interviewees, only the caregivers highlighted problems. There are no health care regulation defined among the RCPD services, meaning that caregivers had to browse the system aimlessly to search for care. The fragmentation of care revealed by the findings prevents the provision of continuous care coordinated between the different health services, resulting in ad hoc care interventions. CZS highlights the limitations of the RCPD, demonstrating the incongruence between practice and national policy.

Congenital Zika Syndrome; Persons with disabilities; Health services; Health care

Resumen

Analizar la organización y estructura que la Red de Cuidados de la Persona con Discapacidad (RCPD) ofrece a los niños con Síndrome Congénito del Zika Virus (SCZV) en la Región de Salud de Salvador (Estado de Bahia). Investigación cualitativa que compara la experiencia de las cuidadoras de los niños con SCZV por medio de Itinerarios Terapéuticos y la percepción de gestores y profesionales de la RCPD. Aunque existen concordancias entre entrevistados, hay problemas que solamente son puestos en evidencia por las cuidadoras. No hay mecanismos de reglamentación asistencial definidos entre los servicios de la RCPD, haciendo que las cuidadoras naveguen por el sistema de manera desgobernada en busca de asistencia. La fragmentación del cuidado revelada impide el cuidado continuado y coordinado entre los diferentes servicios de salud, resultando en intervenciones puntuales. El SCZV pone en jaque la propuesta de RCPD puesto que hay poca congruencia entre las trayectorias recorridas y la política nacional instituida.

Síndrome Congénito de Zika; Persona con deficiencia; Servicios de salud; Atención de la salud

Introdução

O Zika vírus (ZIKV) foi descoberto em 1947 na Uganda11. Dick GWA, Kitchen SF, Haddow AJ. Zika Virus. I. Isolations and serological specificity. Trans R Soc Trop Med Hyg. 1952; 46(5):509-20. e permaneceu em anonimato até o surto nas Ilhas de Yap, Micronésia, em 200722. Duffy MR, Chen TH, Hancock WT, Powers AM, Kool JL, Lanciotti RS, et al. Zika Virus outbreak on Yap Island, federated states of Micronesia. New Engl J Med. 2009; 360(24):2536-43.. Após esse período, foram notificados casos na Polinésia Francesa e nas Ilhas do Pacífico33. Freitas P, Soares G, Oliveira A, Azevedo E, Maciel E. Políticas emergenciais em saúde: os paradoxos da epidemia do Zika vírus. In: Miranda AE, Rangel C, Moura RC, organizadoras. Questões sobre direitos humanos: justiça, saúde e meio ambiente. Vitória: Proex; 2018. p. 144-68.. Em 2015, a circulação do ZIKV foi confirmada no Brasil e posteriormente disseminou-se pelos territórios das Américas33. Freitas P, Soares G, Oliveira A, Azevedo E, Maciel E. Políticas emergenciais em saúde: os paradoxos da epidemia do Zika vírus. In: Miranda AE, Rangel C, Moura RC, organizadoras. Questões sobre direitos humanos: justiça, saúde e meio ambiente. Vitória: Proex; 2018. p. 144-68.,44. Bueno FTC. Vigilância e resposta em saúde no plano regional: um estudo preliminar do caso da febre do Zika vírus. Cienc Saude Colet. 2017; 22(7):2305-14..

Neste mesmo ano, o governo federal brasileiro decretou estado de emergência nacional de saúde pública, devido ao aumento significativo de casos de microcefalia em recém-nascidos. Os registros ocorreram principalmente no Nordeste, região historicamente negligenciada por políticas públicas44. Bueno FTC. Vigilância e resposta em saúde no plano regional: um estudo preliminar do caso da febre do Zika vírus. Cienc Saude Colet. 2017; 22(7):2305-14..

Transmitido principalmente pela picada do mosquito Aedes Aegypti, sexualmente e de forma vertical durante a gestação da mãe para o feto, o ZIKV despertou maior interesse global após ser identificado como a principal causa de doença infecciosa associada à Síndrome Congênita do Zika Vírus (SCZV)55. Garbin CAS, Teruel GP, Saliba TA, Moimaz SAS, Garbin AJÍ. Conhecimento e atitude das gestantes de alto risco sobre a transmissibilidade do vírus zika. Cienc Saude Colet. 2021; 26(1):233-40.,66. Petersen LR, Jamieson DJ, Powers AM, Honein MA. Zika Virus. New Engl J Med. 2016; 374(16):1552-63..

Durante a gestação, o bebê pode adquirir a SCZV ao ser exposto ao vírus. A síndrome apresenta um espectro clínico variado que pode levar a alterações no sistema nervoso central, como a microcefalia fetal ou pós-natal, déficits sensoriais e cognitivos, malformações osteoarticulares, disfagia, exacerbação e persistência dos reflexos primitivos e atraso no neurodesenvolvimento77. Saad T, PennaeCosta AA, Góes FV, Freitas M, Almeida JV, Santa Ignêz LJS, et al. Neurological manifestations of congenital Zika virus infection. Childs Nerv Syst. 2018; 34(1):73-8.. É importante ressaltar que a microcefalia, um sinal da SCZV, pode estar presente88. Teixeira GA, Dantas DNA, Carvalho GAFL, Silva AN, Lira ALBC, Enders BC. Análise do conceito síndrome congênita pelo Zika vírus. Cienc Saude Colet. 2020; 25(2):567-74..

A epidemia de ZIKV trouxe importantes consequências para a saúde da população e exige respostas urgentes do sistema de saúde44. Bueno FTC. Vigilância e resposta em saúde no plano regional: um estudo preliminar do caso da febre do Zika vírus. Cienc Saude Colet. 2017; 22(7):2305-14.,66. Petersen LR, Jamieson DJ, Powers AM, Honein MA. Zika Virus. New Engl J Med. 2016; 374(16):1552-63.. A garantia do cuidado adequado e oportuno para as crianças afetadas e suas cuidadoras não é uma tarefa trivial, e diversos entraves para a oferta dessa atenção têm sido descritos99. Albuquerque MSV, Lyra TM, Melo APL, Valongueiro SA, Araújo TVB, Pimentel C, et al. Access to healthcare for children with Congenital Zika Syndrome in Brazil: perspectives of mothers and health professionals. Health Policy Plan. 2019; 34(7):499-507.,1010. Pedrosa RKB, Guedes ATA, Soares AR, Vaz EMC, Collet N, Reichert APS. Itinerário da criança com microcefalia na rede de atenção à saúde. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2020; 24(3):1-8..

A síndrome requer uma resposta uníssona entre Atenção Primária à Saúde (APS), atenção especializada (AE), atenção hospitalar (AH) e serviços de reabilitação, atuando de forma resolutiva e interligada com recursos comunitários, assistenciais, farmacêuticos e intersetoriais11. Dick GWA, Kitchen SF, Haddow AJ. Zika Virus. I. Isolations and serological specificity. Trans R Soc Trop Med Hyg. 1952; 46(5):509-20.,88. Teixeira GA, Dantas DNA, Carvalho GAFL, Silva AN, Lira ALBC, Enders BC. Análise do conceito síndrome congênita pelo Zika vírus. Cienc Saude Colet. 2020; 25(2):567-74.. Assim, o tratamento da SCZV necessita de um sistema de saúde organizado em rede44. Bueno FTC. Vigilância e resposta em saúde no plano regional: um estudo preliminar do caso da febre do Zika vírus. Cienc Saude Colet. 2017; 22(7):2305-14.,1111. Williamson KE. Cuidado nos tempos de Zika: notas da pós-epidemia em Salvador (Bahia), Brasil. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):685-96. doi: 10.1590/1807-57622017.0856.
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Nesse cenário, a Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência (RCPD) instituída pelo Ministério da Saúde (MS) em 2012, destaca-se como rede prioritária para ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde ao cuidado das pessoas com deficiência (PcD), caracterizado como estado incapacitante temporário ou permanente; progressivo, regressivo ou estável; e intermitente ou contínuo1212. Mendes VLF. Saúde sem limite: implantação da rede de cuidados à saúde da pessoa com deficiência. Divulg Saude Debate. 2014; (52):146-52.,1313. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 793, de 24 de Abril de 2012. Institui a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência no âmbito do Sistema Único de Saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt0793_24_04_2012.html
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Atualmente existem crianças com SCZV vivendo com múltiplas deficiências e que necessitam de cuidados ofertados por rede de serviços pouco estudada. Nesse sentido, o presente artigo propõe-se a analisar a organização e a estrutura que a RCPD oferece para as crianças com SCZV na Região de Saúde de Salvador, BA, depois de cinco anos do pico da epidemia.

Método

Este trabalho faz parte da pesquisa “Desafios da implementação da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência em diferentes contextos regionais: abordagem multidimensional e multiescalar”, um estudo de abordagem qualitativa realizado em dezembro de 2019 na Região de Saúde de Salvador, BA. Procedeu-se à triangulação dos dados entre a experiência vivida pelas cuidadorasd das crianças com SCZV na busca pela atenção à saúde e a percepção dos gestores e profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS).

A Região de Saúde de Salvador é composta por dez municípios e situa-se no leste do estado da Bahia, região escolhida intencionalmente por pertencer ao estado com o maior número absoluto de casos confirmados entre os anos de 2015 e 2019, sendo o município de Salvador aquele com o maior número de casos1414. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria da Vigilância em Saúde. Síndrome congênita pelo vírus Zika associada à infecção - situação epidemiológica, ações desenvolvidas e desafios de 2015 a 2019. Bol Epidemiol Arboviroses [Internet]. 2019 [citado 28 Maio 2023]; 51(47):1-14. Disponível em: http://plataforma.saude.gov.br/anomalias-congenitas/boletim-epidemiologico-SVS-especial-2019.pdf
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As entrevistas com as cuidadoras das crianças com SCZV foram realizadas por meio de Itinerários Terapêuticos (IT). O instrumento visa descrever e analisar as práticas individuais e socioculturais de saúde, que se caracterizam pelos caminhos percorridos, produção e gerenciamento de cuidados que são empreendidos por duas lógicas diferentes: a dos serviços de saúde e a dos usuários e de suas famílias1515. Fausto MCR, Campos EMS, Almeida PF, Medina MG, Giovanella L, Bousquat A, et al. Therapeutic itineraries for patients with cerebrovascular accident: fragmentation of care in a regionalized health network. Rev Bras Saude Mater Infant. 2017; 17 Suppl 1:573-82..

A lógica dos serviços de saúde é materializada pelo exercício profissional e pela organização do sistema de saúde, enquanto a lógica dos usuários e de suas famílias é determinada pela busca dos cuidados, condicionada pela necessidade, expressa em trajetórias próprias, construídas a partir da utilização dos diferentes serviços de saúde. Neste estudo, foi dado enfoque ao fluxo dos usuários nos serviços de saúde, ou seja, utilizou-se o potencial do IT como uma metodologia avaliativa de serviços1616. Bousquat A, Giovanella L, Campos EMS, Almeida PF, Martins CL, Mota PHS, et al. Atenção primária à saúde e coordenação do cuidado nas regiões de saúde: perspectiva de gestores e usuários. Cienc Saude Colet. 2017; 22(4):1141-54..

O IT atua como uma ferramenta de suporte para a avaliação da efetividade das redes de serviços na garantia do acesso e para a detecção de necessidades no desenvolvimento de programas educativos em saúde, capacitação de profissionais e adequação de fluxo assistencial1717. Cabral ALLV, Martinez-Hemáez A, Andrade EIG, Cherchiglia ML. Itinerários terapêuticos: o estado da arte da produção científica no Brasil. Cienc Saude Colet. 2011; 16(11):4433-42..

Para identificar os sujeitos a serem entrevistados, os pesquisadores selecionaram dois serviços de saúde: um público e um filantrópico não contratualizado ao SUS. Estes foram escolhidos pela sua abrangência territorial e relevância no cuidado às crianças com SCZV. Em seguida, foi pedido aos profissionais a indicação de cuidadoras disponíveis para a entrevista. Os pesquisadores abordaram as cuidadoras para explicar a pesquisa e buscar o consentimento delas na participação desta.

As entrevistas foram orientadas por roteiro semiestruturado composto por dados sociodemográficos e três pilares para a compreensão temporal: pré-natal, parto e pós-natal. As dimensões de análises foram: gestação, contaminação pelo ZIKV, parto, acompanhamento da SCZV, busca de cuidados em reabilitação, acesso à exames, medicamentos e órteses, próteses e meios auxiliares (OPM) e suporte social. Buscou-se identificar os serviços de saúde utilizados, a forma de acesso e o tipo de suporte oferecido. Foi utilizado o critério de saturação de conteúdo, dado pela identificação e repetição dos temas pelos entrevistados1818. Fontanella BJB, Ricas J, Turato ER. Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas. Cad Saude Publica. 2008; 24(1):17-27..

Para as entrevistas com os gestores e prestadores de serviços, foram eleitos representantes do município-polo da Região de Saúde e dois municípios com maior e menor número de PcD segundo o Censo Demográfico de 2010 (Salvador, Santo Amaro e Saubara)1919. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nota técnica 01/2018 - Releitura dos dados de pessoas com deficiência no censo demográfico 2010 à luz das recomendações do Grupo de Washington [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2018 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/metodologia/notas_tecnicas/nota_tecnica_2018_01_censo2010.pdf
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. Foram utilizados roteiros e questionários estruturados a partir da abordagem de Viana et al.2020. Viana ALA, Bousquat A, Ferreira MP, Cutrim MAB, Uchimura LYT, Fusaro ER, et al. Region and networks: multidimensional and multilevel approaches to analyze the health regionalization process in Brazil. Rev Bras Saude Mater Infant. 2017; 17 Suppl 1:7-16.. Os autores compreendem que a organização de sistemas de saúde foi instituída em base territorial regional, coordenação da APS e organização dos serviços em Redes de Atenção à Saúde. Dessa forma, utilizam as seguintes categorias analíticas:

  1. Organização – identificação dos critérios de conformação da RCPD, planejamento, integração sistêmica, regulação assistencial e acesso aos serviços de saúde.

  2. Estrutura – disponibilidade e suficiência da força de trabalho, número de serviços, transporte sanitário e OPM.

Gestores foram selecionados por meio de sua posição dentro do arcabouço organizacional do SUS. Eles são responsáveis pelas pastas da saúde e pela área de cuidado às PcD na gestão estadual e nos municípios citados. Entre os profissionais, foram entrevistados representantes dos cuidados de diferentes modalidades de deficiências (física, auditiva, intelectual e visual) dos cinco Centros Especializados em Reabilitação (CER) de Salvador de uma instituição filantrópica e de um serviço ligado a uma universidade local.

Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas. No caso das cuidadoras, as entrevistas foram reconstituídas na forma de narrativa, a fim de prover uma compreensão em perspectiva temporal dos acontecimentos. Em seguida, realizou-se a análise de conteúdo, priorizando-se a identificação dos núcleos comuns, triangulando, assim, os diferentes pontos de vista entre os entrevistados (quadro 1). Os núcleos abarcam dois elementos centrais para compreensão da elaboração e implementação dos planos operativos da RCPD, conforme referência teórica1818. Fontanella BJB, Ricas J, Turato ER. Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas. Cad Saude Publica. 2008; 24(1):17-27.: aspectos relacionados à organização (serviços de APS, continuidade e coordenação do cuidado, organização de fluxos, regulação assistencial, acesso a serviços de reabilitação, comunicação entre os serviços) e relacionados à estrutura (capacidade instalada; distribuição territorial de serviços; transporte e mobilidade; e dispensação de OPM). Os questionários foram tabulados e analisados de forma descritiva.

Quadro 1
Dimensão, núcleos temáticos e variáveis de análise

Para preservar o anonimato dos entrevistados, suas identificações foram codificadas – G = Gestores estaduais e municipais; PP = Prestador Público; PF = Prestador Filantrópico; e C = Criança com SCZV – e enumeradas. Todos os entrevistados estavam cientes sobre a gravação, assim como os objetivos da pesquisa e a garantia de anonimato. Ao aceitarem participar da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Este estudo foi submetido ao Comitê de Ética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e aprovado com o CAAE número 14321719.6.0000.5421.

Resultados

Foram realizadas entrevistas com três gestores estaduais, três gestores municipais, nove prestadores – sendo dois prestadores públicos –, seis prestadores filantrópicos de serviços contratualizados ao SUS, um prestador filantrópico de serviço não contratualizado ao SUS e nove cuidadores (oito mulheres e um homem) de crianças com SCZV nascidas entre 2015 e 2016. A idade das crianças no período da coleta variou de três anos e dez meses a quatro anos e nove meses, sendo seis do sexo feminino e três do sexo masculino. Entre elas, sete crianças residiam em Salvador; uma, no município de Lauro de Freitas; e uma, em Mundo Novo.

As cuidadoras relataram acompanhamento em Unidades Básicas de saúde (UBS) de referência em algum momento do pré-natal. Nessa fase, quando constatadas alterações nos exames de imagem, receberam encaminhamento para serviços especializados em pré-natal de alto risco e deixaram de frequentar as UBS. O parto ocorreu para todas as entrevistadas em dois hospitais públicos de Salvador. Não relataram dificuldades em relação tanto ao acesso quanto ao procedimento em si. Obstante a isso, após o parto, as cuidadoras não receberam orientações sobre os possíveis acometimentos das crianças por parte tanto dos profissionais da APS quanto dos especialistas.

Após o nascimento, a partir do momento que ocorreu o encaminhamento para AE, a APS pouco aparece no processo de cuidado das crianças, surgindo no discurso dos entrevistados apenas eventualmente e como local de vacinação e distribuição de medicamentos. Duas cuidadoras relataram consultas esporádicas com o pediatra nas UBS. Contrariamente, os gestores e profissionais de saúde revelaram que, após o encaminhamento para a AE, o acompanhamento das gestantes nas UBS foi mantido.

Para 64,0% dos gestores, há dificuldades específicas para que a APS se constitua como coordenadora dos cuidados, enquanto para 23,1%, a APS realiza articulação com serviços de AE. O principal motivo apresentado é a baixa cobertura assistencial da Estratégia Saúde da Família e de equipes de Atenção Básica. O gráfico 1 apresenta a frequência com que as ações de coordenação do cuidado são realizadas pela APS. A falta de seguimento dos usuários na APS contrasta com as respostas dadas por gestores e profissionais quando questionados sobre as ações da APS para o cuidado das PcD (gráfico 1).

Gráfico 1
Coordenação do cuidado e ações da APS no cuidado às PcD, segundo gestores e profissionais da Região de Saúde de Salvador, BA, 2019.

As necessidades multifacetadas e a falta de informações sobre os acometimentos e prognóstico das crianças levaram as cuidadoras a buscar acompanhamentos em diferentes serviços de saúde de forma fragmentada. Os IT revelaram uma busca desgovernada por serviços de saúde, sendo utilizados concomitantemente de dez a 19 serviços diferentes. O relato de uma das cuidadoras apresenta a dimensão do problema: “porque quando a gente descobre algo na criança, a gente fica atirando para todos os lados, entendeu?” (Cuidadora C4). Essa busca sofre influência das concepções prévias acerca da qualidade do cuidado, da falta de orientações dadas pelos profissionais de saúde e do arranjo operacional do SUS. O resultado é a procura de informações por meio das mídias tradicionais, das mídias sociais e de grupos de apoio.

Nessa conjuntura, destaca-se o caso de C3, que frequenta múltiplos serviços de reabilitação e apoio social. A cada três meses, frequenta o serviço A para realização de exames e reavaliação da fisioterapia e terapia ocupacional. Quinzenalmente, a C3 é acompanhada por terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, pediatra e odontologista no serviço B. Duas vezes por semana é atendida por terapeuta ocupacional, além de ser acompanhada por neurologista esporadicamente em serviço privado. Aos sábados, faz natação e participa quinzenalmente de ações intersetoriais desenvolvidas em uma instituição filantrópica. No caso da cuidadora da C1, as filas de espera para atendimento na AE são constantes barreiras de acesso aos serviços de saúde:

[…] eu procurei fisioterapeuta aqui, quando cheguei, as meninas começaram a me falar que precisava de fono e terapia ocupacional […] aqui a demanda era grande e não tinha vaga. A gente só foi chamada porque houve o mutirão de mães que aparecia na televisão, reclamando que não tinha. A gente não tinha pra onde levar os nossos filhos. (Cuidadora da C1)

Como aspecto organizacional, a regulação assistencial é um mecanismo de gestão dos sistemas de saúde orientado por protocolos clínicos e operacionais; e direcionada à promoção dos princípios da equidade e da integralidade por meio do controle dos fluxos de oferta e demanda nos serviços de saúde2121. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A regulação no SUS: alguns conceitos [Internet]. Brasília: CONASS, 2016 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://www.conass.org.br/guiainformacao/a-regulacao-no-sus-alguns%20conceitos/#:~:text=A%20regula%C3%A7%C3%A3o%20no%20Setor%20Sa%C3%BAde,estatais%2C%20como%20segmentos%20privados%20lucrativos
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,2222. Vilarins GCM, Shimizu HE, Gutierrez MMU. A regulação em saúde: aspectos conceituais e operacionais. Saude Debate. 2012; 36(95):640-7.. Consonante com gestores e profissionais, a inexistência desse mecanismo leva à fragmentação experimentada pelos usuários. Cada equipamento de saúde funciona de forma independente, dado que não existem protocolos e diretrizes regulatórias. Os gestores dos serviços possuem a discricionariedade para estabelecer seus próprios mecanismos regulatórios.

Há divergências quanto aos procedimentos adotados para minimizar essa questão. Gestores ligados à secretaria estadual e às secretarias municipais de saúde afirmam que regular o acesso à reabilitação seria o caminho natural e que organizar a regulação é uma solução possível. Já os gestores dos serviços de reabilitação discordam e se dividem em dois grupos. O primeiro centra seu argumento no perfil do usuário e, para este, a oferta de serviços na instituição deve ser exclusiva para aqueles usuários que se enquadram em critérios próprios. O segundo grupo, composto por prestadores com histórico ancorado na benevolência e caridade, afirmam ser contra qualquer demanda regulatória por entenderem que os serviços devem prestar assistência independentemente do perfil clínico ou de pactuações. A situação é agravada pela diversidade de instituições habilitadas como CER dentro da RCPD, pois atuam com lógica própria, centrada em seus valores institucionais, e não nos propostos pelo SUS.

É notório como os prestadores filantrópicos possuem um papel central na organização na rede. Devido à relevância histórica1212. Mendes VLF. Saúde sem limite: implantação da rede de cuidados à saúde da pessoa com deficiência. Divulg Saude Debate. 2014; (52):146-52.,2323. Tuon L, Ceretta LB. Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência. Criciúma: UNESC; 2017., essas instituições detêm parte significativa de recursos físicos, regulatórios e humanos, além do reconhecimento popular, exercendo poder em instâncias informais suprimindo as ações pactuadas e os fluxos estabelecidos.

Gestores e profissionais reconhecem que a comunicação e articulação entre os serviços é insuficiente, carente de mecanismos formais e dependente de relações pessoais entre profissionais de saúde. A frase da cuidadora da C5 resume esse problema ao afirmar que o cuidado é:

[...] um quebra-cabeça, porque um profissional trabalha aqui, o outro trabalha dali, um trabalha de cá, […] elas vão se completando, mas não tem um lugar que tenha um olhar para o todo. Eu tenho que cuidar disso. (Cuidadora da C5)

Ainda segundo os gestores, a epidemia de ZIKV forçou a reestruturação da rede de serviços voltada ao cuidado das PcD e o rápido esforço governamental e dos serviços em responder a essa demanda. Nota-se, no entanto, que essa reestruturação prioriza o acesso das crianças microcefálicas. No caso da C4 que tem a SCZV, mas que não apresenta microcefalia, houve mais dificuldades para obtenção do diagnóstico e acesso à AE. Tal reestruturação não foi acompanhada pela resolutividade das necessidades das PcD. Quando questionados sobre a capacidade de resposta as necessidades dos usuários, 50% dos gestores e profissionais afirmam positivamente para casos de deficiência física, 35,7%, para casos de deficiência auditiva; e 28,6% para casos de deficiência intelectual e visual.

Quanto ao fornecimento de OPM, há um consenso de insuficiência. Para os gestores, o Estado possui uma grande demanda de concessão devido à centralização dessa ação no serviço de reabilitação estadual. Afirmam ainda que, para concessão dos dispositivos (como cadeiras de roda; e órteses de pé e mão), há espera em média de um ano. É comum o relato por parte das cuidadoras de atrasos na entrega e dificuldades de acesso a adaptações e manutenções das OPM.

A localização geográfica dos serviços, a distância das residências e o transporte sanitário deficitário são barreiras comuns apontadas por gestores ao acesso das PcD e de demais usuários a esses serviços. As cuidadoras afirmam que tais condições são experimentadas de forma diferente devido às restrições impostas pela deficiência. A maior parte dos usuários utiliza o transporte coletivo, mas, em alguns casos, não possuem o auxílio da cadeira de rodas devido à baixa acessibilidade nas ruas e dos transportes utilizados. Para as cuidadoras, os motoristas do transporte coletivo enxergam as crianças como um atraso no percurso. A fala a seguir revela tal experiência:

[...] quando eu pedi pra ele parar, eu vi ele falando “lá vem o atrasa lado”, tipo assim, o cadeirante vai atrasá-lo [...]. (Cuidadora da C1)

Nenhuma das cuidadoras citou conhecimento sobre os transportes gratuitos ofertados pelos serviços de saúde. Apesar de os gestores afirmarem a sua existência, apenas um serviço relatou que o recurso é ofertado.

Quadro 2
Comparação das respostas das cuidadoras e gestores/profissionais, segundo núcleo temático – Região de Saúde de Salvador, BA, 2019

Discussão

Diferentemente de outros estudos sobre o cuidado das crianças diagnosticadas com SCVZ2424. Ambrogi IG, Brito L, Diniz D. The vulnerabilities of lives: Zika, women and children in Alagoas state, Brazil. Cad Saude Publica. 2020; 36(12):1-12.

25. Souza MJ, Morais AC, Lima IS, Mascarenhas JS, Lima MM, Amorim RC. Itinerário terapêutico das famílias de crianças com microcefalia. Rev Baiana Enferm. 2021; 33:e32966.

26. Brunoni D, Blascovi-Assis SM, Osório AAC, Seabra AG, Amato CAH, Teixeira MCTV, et al. Microcefalia e outras manifestações relacionadas ao vírus Zika: impacto nas crianças, nas famílias e nas equipes de saúde. Cienc Saude Colet. 2016; 21(10):3297-302.

27. Scott RP, Lira LC, Matos SS, Souza FM, Silva ACR, Quadros MT. Itinerários terapêuticos, cuidados e atendimento na construção de ideias sobre maternidade e infância no contexto da Zika. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):673-84. doi: 10.1590/1807-57622017.0425.
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-2828. Mendes AG, Campos DS, Silva LB, Moreira MEL, Arruda LO. Enfrentando uma nova realidade a partir da síndrome congênita do vírus zika: a perspectiva das famílias. Cienc Saude Colet. 2020; 25(10):3785-94., aqui são apresentadas informações do ponto de vista dos gestores estaduais e municipais; dos profissionais de saúde e das cuidadoras.

Desde 2015, o ZIKV marca o cenário brasileiro com a declaração da Emergência Nacional de Saúde Pública, conforme o aumento nos índices de microcefalia em recém-nascidos. A rápida disseminação do ZIKV no Caribe e na América Central chamou a atenção da Organização Mundial da Saúde, que declarou em 2016 estado de Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional2020. Viana ALA, Bousquat A, Ferreira MP, Cutrim MAB, Uchimura LYT, Fusaro ER, et al. Region and networks: multidimensional and multilevel approaches to analyze the health regionalization process in Brazil. Rev Bras Saude Mater Infant. 2017; 17 Suppl 1:7-16.,2929. Kelly AH, Lezaun J, Löwy I, Matta GC, Nogueira CO, Rabello ET. Uncertainty in times of medical emergency: knowledge gaps and structural ignorance during the brazilian Zika crisis. Soc Sci Med. 2020; 246:112787.,3030. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vírus Zika no Brasil: a resposta do SUS [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/virus_zika_brasil_resposta_sus.pdf
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O Brasil, como epicentro global do ZIKV, teve 3.563 casos confirmados de 2015 a 2019, que aconteceram majoritariamente na região nordeste (61,9%)1414. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria da Vigilância em Saúde. Síndrome congênita pelo vírus Zika associada à infecção - situação epidemiológica, ações desenvolvidas e desafios de 2015 a 2019. Bol Epidemiol Arboviroses [Internet]. 2019 [citado 28 Maio 2023]; 51(47):1-14. Disponível em: http://plataforma.saude.gov.br/anomalias-congenitas/boletim-epidemiologico-SVS-especial-2019.pdf
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. Os estados com maior número de casos confirmados foram a Bahia (584 casos; 16,4%), sendo Salvador o município com mais casos (284 casos); Pernambuco (468 casos; 13,1%); e Rio de Janeiro (305 casos; 8,6%)1414. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria da Vigilância em Saúde. Síndrome congênita pelo vírus Zika associada à infecção - situação epidemiológica, ações desenvolvidas e desafios de 2015 a 2019. Bol Epidemiol Arboviroses [Internet]. 2019 [citado 28 Maio 2023]; 51(47):1-14. Disponível em: http://plataforma.saude.gov.br/anomalias-congenitas/boletim-epidemiologico-SVS-especial-2019.pdf
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. O alerta gerado pelas instituições de saúde pública durou menos de um ano, mas a epidemia deixou um legado permanente às famílias e crianças acometidas.

As entrevistas realizadas com as cuidadoras das crianças com SCZV são um recorte do início da epidemia no Brasil. A idade das crianças revela que elas nasceram nos meses iniciais do surto, e tal fato nos trouxe a possibilidade de verificar as respostas iniciais do SUS diante de uma epidemia e acompanhar o desenvolvimento do cuidado, sobretudo na reabilitação.

Ao se tratar de uma doença conhecida, os gestores e prestadores de serviços são os principais detentores de conhecimentos, já que possuem um mapeamento prévio dos possíveis desdobramentos. Contudo, no caso de uma doença desconhecida, o processo de descoberta e criação de respostas depende das famílias acometidas; gestores e prestadores de serviços; e, principalmente, dos pesquisadores3131. Scott P. Fim da epidemia da síndrome congênita do zika: pensão vitalícia e governança múltipla de domínios de cuidados. Áltera. 2020; 3(11):52-78.. A SCZV colocou em xeque a RCPD, ressaltando as discrepâncias entre gênero, classe, raça, região de saúde e deficiência, gerando profundas incertezas e importantes mudanças nas práticas sociais e nas condições de saúde1010. Pedrosa RKB, Guedes ATA, Soares AR, Vaz EMC, Collet N, Reichert APS. Itinerário da criança com microcefalia na rede de atenção à saúde. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2020; 24(3):1-8.,3232. Quadros MT, Matos SS, Silva ACR. Emergência, cuidado e assistência à saúde de crianças com síndrome congênita do zika vírus: notas sobre os serviços de saúde e a atuação das mães em Pernambuco. Rev Anthropol. 2019; 30(2):263-89.,3333. Scott P, Lira L, Matos S. Práticas sociais no epicentro da epidemia do Zika. Recife: UFPE; 2020..

Para garantir a integralidade do cuidado às PcD, é necessário haver ações de diversos serviços e atores articulados entre si, por meio de processos de pactuação interfederativa com estados e municípios, financiamento adequado e comprometimento dos trabalhadores e gestores de saúde1313. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 793, de 24 de Abril de 2012. Institui a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência no âmbito do Sistema Único de Saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt0793_24_04_2012.html
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,3434. Dubow C, Garcia EL, Krug SBF. Percepções sobre a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência em uma região de saúde. Saude Debate. 2018; 42(117):455-67.. Contudo, esse cenário ainda é incipiente para a RCPD, que permanece com desafios e falhas na proposta de integração, revelando uma política carente de atenção e investimentos tanto no aspecto estrutural quanto na instrumentalização dos profissionais3535. Machado WCA, Pereira JS, Schoeller SD, Júlio LC, Martins MMFPS, Figueiredo NMA. Integralidade na Rede de Cuidados da Pessoa com Deficiência. Texto Contexto Enferm. 2018; 27(3):1-9..

A declaração de Emergência Nacional possibilitou maior subsídio de recursos e mecanismos facilitadores do acesso das crianças com SCZV a serviços de saúde3232. Quadros MT, Matos SS, Silva ACR. Emergência, cuidado e assistência à saúde de crianças com síndrome congênita do zika vírus: notas sobre os serviços de saúde e a atuação das mães em Pernambuco. Rev Anthropol. 2019; 30(2):263-89.. Tal aspecto ficou evidente na visão dos gestores, que afirmam ter ocorrido uma reestruturação da rede a partir da epidemia, promovendo uma maior articulação entre os diversos atores e serviços. Entretanto, a experiência das cuidadoras não confirma tal perspectiva.

Os entraves começam quando são realizados os primeiros exames de pré-natal. Oliveira et al.3636. Oliveira PS, Lamy ZC, Guimarães CNM, Rodrigues CB, Silva AAM, Simões VMF, et al. Experiências de pais de crianças nascidas com microcefalia, no contexto da epidemia de Zika, a partir da comunicação do diagnóstico. Cad Saude Publica. 2019; 35(12):1-11. afirmam que a comunicação profissional-cuidador pode ser considerada inadequada e traumática, sendo utilizados dados errados, incompletos e controversos. Estratégias de acolhimento e orientações sobre o cuidar deveriam ser a tônica desse momento. Deve-se ressaltar que, embora a forma de comunicação seja essencial e possa definir a forma como as cuidadoras irão lidar com a situação, as entrevistas conduzidas pelo presente texto foram realizadas com crianças acometidas nos estágios iniciais da epidemia, o que pode ter sido um dificultador para o processo de comunicação.

Quando uma família tem o conhecimento da deficiência da criança, inicia-se uma batalha adaptativa para recuperar o equilíbrio. Embora somente um membro da família possua uma ou mais deficiências identificadas decorrentes da SCZV, todos os demais são afetados e, até certo ponto, incapacitados por elas. Sobre as mulheres, especialmente as mães, recai o trabalho de cuidar, assumindo o papel de protagonistas dessa “incapacitação” indireta1111. Williamson KE. Cuidado nos tempos de Zika: notas da pós-epidemia em Salvador (Bahia), Brasil. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):685-96. doi: 10.1590/1807-57622017.0856.
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A dificuldade no diagnóstico e a insuficiência de explicações podem atrasar a obtenção de cuidados2525. Souza MJ, Morais AC, Lima IS, Mascarenhas JS, Lima MM, Amorim RC. Itinerário terapêutico das famílias de crianças com microcefalia. Rev Baiana Enferm. 2021; 33:e32966.,3737. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Diretrizes de estimulação precoce: crianças de zero a 3 anos com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_estimulacao_criancas_0a3anos_neuropsicomotor.pdf
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. Segundo o protocolo de atenção à saúde e resposta à ocorrência da microcefalia relacionada à infecção pelo ZIKV3838. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Protocolo de atenção à saúde e resposta à ocorrência de microcefalia relacionada à infecção pelo vírus zika [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_resposta_microcefalia_relacionada_infeccao_virus_zika.pdf
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, após o nascimento, todas as crianças devem ser acompanhadas pela APS e encaminhadas para estimulação precoce em um serviço de reabilitação por uma equipe multiprofissional. No entanto, tais ações foram não conformes ao protocolo.

É pertinente ressaltar que a APS é fundamental para o funcionamento da rede e o acompanhamento das crianças com SCZV, devendo atuar de forma resolutiva nos cuidados primários e sendo ordenadora do cuidado em todos os pontos de atenção3838. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Protocolo de atenção à saúde e resposta à ocorrência de microcefalia relacionada à infecção pelo vírus zika [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_resposta_microcefalia_relacionada_infeccao_virus_zika.pdf
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. No entanto, é evidente a sua fragilidade tanto em oferecer uma atenção à saúde resolutiva quanto em realizar a coordenação do cuidado de forma efetiva3939. Duarte JS, Santos LOF, Sette GCS, Santos TFC, Alves FAP, Coriolano-Marinus MWL. Necessidades de crianças com síndrome congênita pelo Zika vírus no contexto domiciliar. Cad Saude Colet. 2019; 27(3):249-56.

40. Nóbrega VM, Silva MEA, Fernandes LTB, Viera CS, Reichert APS, Collet N. Chronic disease in childhood and adolescence: continuity of care in the health care network. Rev Esc Enferm USP. 2017; 51:1-8.
-4141. Santos-Pinto CB, Soares-Marangoni DA, Ferrari FP, Ajalla MEA, Venancio FA, Rosa TS, et al. Health demands and care of children with congenital Zika syndrome and their mothers in a Brazilian state. BMC Public Health. 2020; 20(1):762.. Embora os municípios da Região de Saúde estudada possuam baixa cobertura assistencial de APS4242. Cardoso MO, Vieira-da-Silva LM. Avaliação da cobertura da atenção básica à saúde em Salvador, Bahia, Brasil (2000 a 2007). Cad Saude Publica. 2012; 28(7):1273-84.,4343. Silva ES Jr, Medina MG, Aquino R, Fonseca ACF, Vilasbôas ALQ. Acessibilidade geográfica à atenção primária à saúde em distrito sanitário do município de Salvador, Bahia. Rev Bras Saude Mater Infant. 2010; 10 Suppl 1:49-60., todas as usuárias entrevistadas frequentaram o serviço em algum ponto do pré e pós-natal. Porém, esse acesso acontece de forma pontual, o que reflete na grande concentração de usuários no nível secundário.

Apesar de os gestores afirmarem a existência de práticas de coordenação do cuidado pela APS, as narrativas analisadas destacaram o papel de ordenação de forma distinta, gerando lacunas nos acompanhamentos dos usuários. Esses achados corroboram outras pesquisas que demonstram as dificuldades da APS em se estabelecer como coordenadora do cuidado, configurando entre os serviços especializados, hospitalares e de pronto atendimento uma disputa por essa tarefa4444. Almeida PF, Medina MG, Fausto MCR, Giovanella L, Bousquat A, Mendonça MHM. Coordenação do cuidado e atenção primária à saúde no Sistema Único de Saúde. Saude Debate. 2018; 42 Spec No 1:244-60.,4545. Almeida PF, Santos AM, Souza MKB. Atenção primária à saúde na coordenação do cuidado em regiões de saúde. Salvador: EDUFBA; 2015..

É observável a inexistência de fluxos assistenciais previamente definidos, tanto para o acesso a serviços de reabilitação quanto para exames específicos. Gestores de serviços públicos e filantrópicos contratualizados impõem resistência à implementação de mecanismos de regulação assistencial aos serviços de reabilitação.

O Estado, como efetivador de políticas públicas, é responsável pela regulação assistencial, encargo fundamental para harmonizar e articular oferta e demanda, a fim de promover o acesso aos serviços de saúde de forma equânime, ordenada, oportuna e racional. Os serviços públicos de saúde, de administração direta ou indireta, devem ser regulados pelo Estado4646. Vilarins GCM, Shimizu HE, Gutierrez MMU. A regulação em saúde: aspectos conceituais e operacionais. Saude Debate. 2012; 36(95):640-7.. Sem esse arranjo, a navegação no sistema passa a ser responsabilidade das famílias, potencializando uma relação dicotômica de coordenação. Assim, o Estado ou o município atua como provedor, ora transmite a responsabilidade aos cidadãos, que passam a ocupar o um novo papel na produção de cuidado3232. Quadros MT, Matos SS, Silva ACR. Emergência, cuidado e assistência à saúde de crianças com síndrome congênita do zika vírus: notas sobre os serviços de saúde e a atuação das mães em Pernambuco. Rev Anthropol. 2019; 30(2):263-89..

A regulação assistencial tem como objetivo promover a equidade do acesso aos serviços de saúde e garantir a integralidade da assistência universal2121. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A regulação no SUS: alguns conceitos [Internet]. Brasília: CONASS, 2016 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://www.conass.org.br/guiainformacao/a-regulacao-no-sus-alguns%20conceitos/#:~:text=A%20regula%C3%A7%C3%A3o%20no%20Setor%20Sa%C3%BAde,estatais%2C%20como%20segmentos%20privados%20lucrativos
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,2222. Vilarins GCM, Shimizu HE, Gutierrez MMU. A regulação em saúde: aspectos conceituais e operacionais. Saude Debate. 2012; 36(95):640-7.. Na sua ausência criam-se formas alternativas de acesso com um notável distanciamento entre as diretrizes políticas e de organização da RCPD.

Se por um lado, as intuições filantrópicas conveniadas ao SUS, por deterem capital social e relevância histórica, impõem ao restante da rede e ao poder público seu escopo de atuação em detrimento das necessidades de saúde da população, por outro, fluxos alternativos são estabelecidos pelos próprios profissionais de saúde que utilizam de sua discricionariedade para direcionar os fluxos assistenciais1616. Bousquat A, Giovanella L, Campos EMS, Almeida PF, Martins CL, Mota PHS, et al. Atenção primária à saúde e coordenação do cuidado nas regiões de saúde: perspectiva de gestores e usuários. Cienc Saude Colet. 2017; 22(4):1141-54..

A fragmentação do cuidado impede o cuidado continuado e coordenado entre os diferentes serviços de saúde. Os profissionais realizam intervenções pontuais, distanciando-se do cuidado integral4747. Duttine A, Smythe T, Sá MRC, Ferrite S, Zuurmond M, Moreira ME, et al. Congenital zika syndrome assessing the need for a family support programme in Brazil. Int J Environ Res Public Health. 2020; 17(10):1-14.. Esse cenário, aliado à insuficiência de vagas e às longas filas de espera, estimula a busca pelo acesso em diferentes serviços e aumenta os compromissos na agenda de cuidado das crianças, causando desgaste físico, mental e financeiro; desprendimento do tempo; e dificuldades para a formação de vínculos1010. Pedrosa RKB, Guedes ATA, Soares AR, Vaz EMC, Collet N, Reichert APS. Itinerário da criança com microcefalia na rede de atenção à saúde. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2020; 24(3):1-8.,4444. Almeida PF, Medina MG, Fausto MCR, Giovanella L, Bousquat A, Mendonça MHM. Coordenação do cuidado e atenção primária à saúde no Sistema Único de Saúde. Saude Debate. 2018; 42 Spec No 1:244-60..

A criação do vínculo busca garantir autonomia do paciente e compartilhamento da responsabilidade entre os profissionais de saúde e a família, com o oferecimento de suporte e informações importantes sobre o cuidado3939. Duarte JS, Santos LOF, Sette GCS, Santos TFC, Alves FAP, Coriolano-Marinus MWL. Necessidades de crianças com síndrome congênita pelo Zika vírus no contexto domiciliar. Cad Saude Colet. 2019; 27(3):249-56.. A falta de vínculo gera a busca por soluções em locais de sociabilidade aos que enfrentam uma condição semelhante. Nesses locais, a visibilidade da SCZV cresce, promovendo formas de superar as adversidades impostas2727. Scott RP, Lira LC, Matos SS, Souza FM, Silva ACR, Quadros MT. Itinerários terapêuticos, cuidados e atendimento na construção de ideias sobre maternidade e infância no contexto da Zika. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):673-84. doi: 10.1590/1807-57622017.0425.
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Cabe ressaltar que o tratamento das crianças com SCZV é longo, exaustivo e com desdobramentos ainda pouco conhecidos, exigindo um acompanhamento contínuo e reorganização das vidas dessas famílias. Desse modo, enquanto houver barreiras geográficas, organizacionais e de informação no sistema em rede, as famílias dessas crianças continuarão sobrecarregadas e invisíveis, acolhidas tão somente sob os olhos da solidariedade e união com outras famílias que dividem as mesmas experiências, dificuldades e anseios2828. Mendes AG, Campos DS, Silva LB, Moreira MEL, Arruda LO. Enfrentando uma nova realidade a partir da síndrome congênita do vírus zika: a perspectiva das famílias. Cienc Saude Colet. 2020; 25(10):3785-94..

A falta de coordenação no fluxo assistencial e continuidade informacional, aliada à necessidade da intervenção precoce, gera impactos na adesão e resolutividade do tratamento dessas crianças, que passa a ser constituído de inúmeras fendas e incógnitas3737. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Diretrizes de estimulação precoce: crianças de zero a 3 anos com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 28 Maio 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_estimulacao_criancas_0a3anos_neuropsicomotor.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
,4040. Nóbrega VM, Silva MEA, Fernandes LTB, Viera CS, Reichert APS, Collet N. Chronic disease in childhood and adolescence: continuity of care in the health care network. Rev Esc Enferm USP. 2017; 51:1-8.,4848. Porto RM. Zika vírus e itinerários terapêuticos: os impactos da pós-epidemia no estado Rio Grande do Norte. Ilha R Antr. 2020; 22(2):169-99.. Logo, essa realidade faz com que o fluxo seja dependente das famílias, que navegam pela rede em busca de locais que ofereçam respostas rápidas e resolutivas.

A epidemia de ZIKV aflige a saúde global, expondo a persistência de estruturas sociais, políticas e econômicas que reproduzem desvantagens e vulnerabilidades de determinadas populações e grupos4949. Lesser J, Kitron U. A geografia social do zika no Brasil. Estud Av. 2016; 30(88):167-75.,5050. Nunes J, Pimenta DN. A epidemia de Zika e os limites da saúde global. Lua Nova Rev Cult Polit. 2016; 98:21-46.. Embora a emergência sanitária tenha se extinguido, as necessidades multifacetárias continuam persistentes e ultrapassando as respostas oferecidas.

Apesar do fim da emergência nacional em saúde pela SCZV, anunciado pelo MS em 2017, o Brasil continua sendo um terreno fértil para proliferação do vetor da doença33. Freitas P, Soares G, Oliveira A, Azevedo E, Maciel E. Políticas emergenciais em saúde: os paradoxos da epidemia do Zika vírus. In: Miranda AE, Rangel C, Moura RC, organizadoras. Questões sobre direitos humanos: justiça, saúde e meio ambiente. Vitória: Proex; 2018. p. 144-68.. Retornar ao evento cinco anos após o ocorrido traz à tona as arestas deixadas e, em especial, recorda o debate sobre a preferência governamental por respostas imediatas, focadas apenas na solução sucinta de problemas com o objetivo de contenção e gestão de crises5050. Nunes J, Pimenta DN. A epidemia de Zika e os limites da saúde global. Lua Nova Rev Cult Polit. 2016; 98:21-46.. Esse caráter reativo posterga ações a longo prazo de criação de novas instituições, aparelhos e práticas de saúde; recusa o aprendizado no momento da epidemia; e desdenha das consequências advindas dela.

Considerações finais

A epidemia do ZIKV espelha profundas disparidades socioeconômicas no acesso à saúde, realçando barreiras estruturais e organizacionais no cuidado integral pré, peri e pós-natal de crianças com doenças crônicas. Os achados deste estudo demonstram a importante fragmentação do cuidado e a presença de lacunas nas trajetórias assistenciais das crianças com SCZV e de suas cuidadoras. A opção de cotejar os IT com as entrevistas realizadas com gestores e prestadores visou potencializar os achados, pontuando similaridades e discrepâncias entre os entrevistados.

Esta pesquisa reitera achados de estudos anteriores sobre incógnitas postas pelo ZIKV, sobrecarga na rede e desinteresse governamental2424. Ambrogi IG, Brito L, Diniz D. The vulnerabilities of lives: Zika, women and children in Alagoas state, Brazil. Cad Saude Publica. 2020; 36(12):1-12.

25. Souza MJ, Morais AC, Lima IS, Mascarenhas JS, Lima MM, Amorim RC. Itinerário terapêutico das famílias de crianças com microcefalia. Rev Baiana Enferm. 2021; 33:e32966.

26. Brunoni D, Blascovi-Assis SM, Osório AAC, Seabra AG, Amato CAH, Teixeira MCTV, et al. Microcefalia e outras manifestações relacionadas ao vírus Zika: impacto nas crianças, nas famílias e nas equipes de saúde. Cienc Saude Colet. 2016; 21(10):3297-302.

27. Scott RP, Lira LC, Matos SS, Souza FM, Silva ACR, Quadros MT. Itinerários terapêuticos, cuidados e atendimento na construção de ideias sobre maternidade e infância no contexto da Zika. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):673-84. doi: 10.1590/1807-57622017.0425.
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-2828. Mendes AG, Campos DS, Silva LB, Moreira MEL, Arruda LO. Enfrentando uma nova realidade a partir da síndrome congênita do vírus zika: a perspectiva das famílias. Cienc Saude Colet. 2020; 25(10):3785-94.. O cenário de uma nova epidemia é composto por diversas questões, que há muito tempo estão sem explicações imediatas. Passados cinco anos do início da epidemia, o cuidado às crianças e famílias acometidas ainda é obtido por ações externas às políticas para pessoas com deficiência e há pouca congruência entre os fluxos assistenciais estabelecidos e a política nacional instituída. A cronicidade dessa síndrome não pode ser esquecida junto com o fim da emergência nacional declarada, já que suas consequências se farão presentes por toda a vida daqueles que foram afetados e reforçam as limitações e barreiras do sistema de saúde.

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  • (d)
    Optou-se por utilizar os termos que identificam as cuidadoras no feminino devido ao fato de as entrevistadas serem majoritariamente mulheres.

  • Financiamento: Este artigo é produto da pesquisa “Desafios da implementação da Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência em diferentes contextos regionais: abordagem multidimensional e multiescalar”, financiada pelo CNPQ em cooperação com o Ministério da Saúde pela chamada MS-SCTIE-DECIT/CNPQ n. 35/2018.A autora Pereira CMD foi bolsista PIBIC e a autora Bousquat A é bolsista produtividade CNPQ.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Out 2022
  • Aceito
    26 Maio 2023
UNESP Botucatu - SP - Brazil
E-mail: intface@fmb.unesp.br