Avaliação da completitude das notificações compulsórias relacionadas ao trabalho registradas por município polo industrial no Brasil, 2007 - 2011

Juliane Kate Alvares Tarcísio Márcio Magalhães Pinheiro Alaneir de Fátima Santos Graziella Lage Oliveira Sobre os autores

Resumos

OBJETIVO:

Analisar a completitude dos campos de notificações dos agravos à saúde do trabalhador registrados em um município polo industrial brasileiro no período de 01/01/2007 a 31/12/2011.

MÉTODOS:

Pesquisa descritiva baseada em dados secundários e composta pela totalidade de registros relacionados ao trabalho (n = 2.345) no Sistema Nacional de Agravos de Notificação, utilizando critérios preconizados pelo Guidelines for Evaluating Public Health Surveillance Systems do Center for Disease Control and Prevention. Verificou-se a completitude dos campos presentes nas fichas de notificação e investigação por meio do percentual de campos preenchidos, do coeficiente de correlação de Spearman e de análise gráfica.

RESULTADOS:

Foi identificado um decréscimo no percentual de preenchimento para a maioria dos campos essenciais (n = 18; 64%). O grau de completitude dos campos obrigatórios foi elevado (> 85%), constatando-se que a maior parte dos campos não discriminados teve um preenchimento entre 0 e 25% e índices variados para os campos essenciais (0 - 98%). Foi verificada importante variabilidade na completitude dos campos essenciais, observando-se três variáveis com correlação negativa e significativa (rs= -0,9; p = 0,0347) e apenas uma com correlação positiva e também significativa.

CONCLUSÃO:

A qualidade da maioria dos dados armazenados foi classificada como regular a excelente para variáveis importantes quanto ao delineamento das condições de saúde do trabalhador e à deflagração de ações de vigilância. Todavia, recomenda-se o uso rotineiro de avaliações da qualidade dos dados dos sistemas de informação em saúde do trabalhador no Sistema Único de Saúde.

Notificação de doenças; Notificação de acidentes de trabalho; Vigilância em saúde do trabalhador; Vigilância epidemiológica; Sistemas de informação; Sistemas de computação


INTRODUÇÃO

Os acidentes e doenças relacionados ao trabalho representam um grande problema de saúde pública em todo o mundo e desafiam diversos países em relação à qualidade e abrangência de informações oficiais11. Hämäläinen P, Leena Saarela K, Takala J. Global trend according to estimated number of occupational accidents and fatal work-related diseases at region and country level. J Safety Res 2009; 40(2): 125-39. .

A apuração fidedigna dos agravos à saúde de trabalhadores no mundo varia entre os diferentes países11. Hämäläinen P, Leena Saarela K, Takala J. Global trend according to estimated number of occupational accidents and fatal work-related diseases at region and country level. J Safety Res 2009; 40(2): 125-39. . Em geral, o levantamento da proporção de acidentes é muito baixo e, comumente, a base para os cálculos considera apenas os trabalhadores segurados, não abrangendo sua totalidade, sobretudo aqueles do setor informal11. Hämäläinen P, Leena Saarela K, Takala J. Global trend according to estimated number of occupational accidents and fatal work-related diseases at region and country level. J Safety Res 2009; 40(2): 125-39. .

O campo da saúde do trabalhador no Brasil, ao longo dos anos, fez uso de dados securitários para delinear o perfil epidemiológico22. Santana V, Nobre L, Waldvogel BC. Acidentes de trabalho no Brasil entre 1994 e 2004: uma revisão. Ciênc Saúde Colet 2005; 4(10): 841-55.. Com a implantação, pelo Ministério da Saúde (MS), da notificação compulsória de agravos relacionados ao trabalho, em 2004, a questão da cobertura e qualidade de informações apresentou um grande avanço33. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 104, de 25 de janeiro de 2011. Define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional 2005 (RSI 2005), a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Diário Oficial da União. 26 de janeiro de 2011, Seção 1:37. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt0104_25_01_2011.html (Acessado em 13 de outubro de 2012)
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,44. Facchini LA, Nobre LCC, Faria NMX, Fassa AG, Thumé E, Tomasi E, et al. Sistema de Informação em Saúde do Trabalhador: desafios e perspectivas para o SUS. Ciênc Saúde Coletiva 2005; 4(10): 857-67..

A valorização do papel da informação na construção de políticas de saúde está diretamente relacionada à qualidade dos sistemas de informação em saúde (SIS) disponíveis55. Jorge MHPM, Laurenti R, Gotlieb SLD. Avaliação dos sistemas de informação em saúde no Brasil. Cad Saúde Colet 2010; 18(1): 7-18.,66. Laguardia J, Domingues CMA, Carvalho C, Lauerman CR, Macário E, Glatt R. Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan): desafios no desenvolvimento de um sistema de informação em saúde. Epidemiol Serv Saúde 2004; 13(3): 135-47.. A qualidade dos dados dos SIS constitui-se em um dos atributos de avaliação dos sistemas de vigilância em saúde preconizado pelo Center for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos, devendo ser examinada pela quantificação de respostas "ignoradas" ou "em branco" dos campos, pela duplicidade e também pela consistência dos registros, ou seja, o quanto eles se aproximam da verdade77. Center For Disease Control And Prevention (CDC). Update guidelines for evaluation public health surveillance systems: recommendations from the guideline working group. MMWR 2001; 50(RR13): 1-36..

No entanto, no Brasil, a despeito de toda evolução técnico-administrativa e política para o uso de informações em saúde no processo de gestão, a avaliação sistemática e contínua da qualidade dos dados não segue um plano regular, mas iniciativas esporádicas e isoladas88. Lima CRA, Schramm JMA, Coeli CM. Gerenciamento da qualidade da informação: uma abordagem para o setor saúde. Cad Saúde Coletiva 2010; 18(1): 19-31.,99. Lima CRA, Schramm JMA, Coeli CM, Silva MEM. Revisão das dimensões de qualidade dos dados e métodos aplicados na avaliação dos sistemas de informação em saúde. Cad Saúde Pública 2009; 25(10): 2095-109..

Em produções científicas no Brasil, as diretrizes do CDC para a análise da qualidade dos SIS vêm sendo utilizadas por diversos pesquisadores em diferentes agravos à saúde pública, como tuberculose, doença de chagas, dengue e hantavirose, dentre outras1010. Malhão TA, Oliveira GP, Codennoti SB, Moherdaui F. Avaliação da completitude do Sistema de Informação de Agravos de Notificação da Tuberculose, Brasil, 2001-2006. Epidemiol Serv Saúde 2010; 19(3): 245-56.

11. Oliveira PB, Oliveira GP, Codenotti SB, Saraceni V, Nóbrega AA, Sobel J. Avaliação do sistema de vigilância da tuberculose no município do Rio de Janeiro, 2001 a 2006. Cad Saúde Coletiva 2010; 18(3): 337-46.

12. Muguande OF, Ferraz ML, França E, Gontijo ED. Avaliação da qualidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica de doença de chagas aguda em Minas Gerais, 2005-2008. Epidemiol Serv Saúde 2011; 20(3): 317-25.

13. Duarte HHP, França EB. Qualidade dos dados da vigilância epidemiológica da dengue em Belo Horizonte, MG. Rev Saúde Pública 2006; 40(1): 134-42.
-1414. Santos ED, Garret DO. Avaliação do Sistema de Vigilância de Hantavírus no Brasil. Epidemiol Serv Saúde 2005; 14(1): 15-31.. No entanto, não foram encontrados estudos com tais parâmetros referentes às notificações dos agravos à saúde do trabalhador elencados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). O SINAN é o SIS de abrangência nacional, que registra diversos casos de agravos de notificação compulsória e, dentre eles, estão aqueles que possuem relação com o trabalho, contando com 11 definições distintas entre acidentes e doenças dessa natureza44. Facchini LA, Nobre LCC, Faria NMX, Fassa AG, Thumé E, Tomasi E, et al. Sistema de Informação em Saúde do Trabalhador: desafios e perspectivas para o SUS. Ciênc Saúde Coletiva 2005; 4(10): 857-67.. A implantação desse sistema no município de Betim, Minas Gerais, ocorreu a partir de 2007 através dos registros da Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde e, também, do Centro de Referência Regional de Saúde do Trabalhador (CEREST).

Assim, o presente estudo avaliou o atributo qualidade dos dados do sistema de informação que compõe a vigilância epidemiológica em saúde do trabalhador, por meio da análise da completitude das variáveis da ficha de notificação e investigação dos agravos relacionados ao trabalho, registrados no SINAN pelo município de Betim, Minas Gerais, no período de 2007 a 2011.

MÉTODOS

Foi realizada uma pesquisa descritiva sobre a completitude das fichas de notificação/investigação dos agravos relacionados ao trabalho, composta pelo total de 2.345 registros armazenados no SINAN do município de Betim, Minas Gerais, durante o período de 01/01/2007 a 31/12/2011.

POPULAÇÃO E ÁREA DO ESTUDO

O município de Betim está localizado na região metropolitana de Belo Horizonte e é considerado um polo industrial destacado nacionalmente, sobretudo por indústrias dos setores automobilístico e petroquímico. O município também abriga importantes empresas dos setores de serviços e logística1515. Betim. Prefeitura Municipal de Betim. Portal Betim. Disponível em: http://www.betim.mg.gov.br (Acessado em: 15 de abril de 2012).
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. Em 2010, Betim apresentava uma população de 378.089 habitantes, dos quais 201.129 eram economicamente ativos, e 6.313 empresas cadastradas1616. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). XII Censo Demográfico 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 (Acessado em 15 de abril de 2011).
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. Em 1994 o Sistema Único de Saúde (SUS) local iniciou ações de Vigilância em Saúde do Trabalhador (VISAT). O município sedia um CEREST que atua em parceria com os três níveis de atenção à saúde. Devido às suas características políticas, econômicas, demográficas e sanitárias, Betim foi escolhido para a presente pesquisa.

FONTES DE DADOS

Os dados dos agravos analisados estavam distribuídos em 9 fichas de notificação e investigação, contemplando 11 definições de caso correspondentes aos seguintes agravos: acidente de trabalho fatal, acidente com mutilação, acidente com criança e adolescente; acidente com exposição a material biológico; intoxicação exógena; lesões por esforços repetitivos ou distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (LER/DORT); dermatoses ocupacionais; pneumoconioses; perda auditiva induzida por ruído; transtornos mentais relacionados ao trabalho; e câncer relacionado ao trabalho33. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 104, de 25 de janeiro de 2011. Define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional 2005 (RSI 2005), a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Diário Oficial da União. 26 de janeiro de 2011, Seção 1:37. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt0104_25_01_2011.html (Acessado em 13 de outubro de 2012)
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. Os três primeiros agravos compõem a definição de caso do acidente de trabalho grave e dispostos em uma única ficha de notificação e investigação. O acesso aos dados sobre as intoxicações exógenas relacionadas ao trabalho ocorreu após filtro de seleção pelo campo 56 da ficha de notificação, o qual identifica se a exposição/contaminação foi decorrente do trabalho/ocupação.

DEFINIÇÃO DE VARIÁVEIS

Foram selecionadas as varáveis comuns a todas as fichas de notificação e, em seguida, classificadas por tipo de preenchimento do campo: campo-chave, campo obrigatório, campo essencial e campo não-discriminado, conforme o dicionário de dados do SINAN que os define da seguinte maneira: o campo-chave corresponde aos identificadores do registro no sistema; o campo obrigatório é aquele cuja ausência de dado impossibilita a inclusão da notificação ou da investigação no SINAN; o campo essencial é aquele que registra dado necessário à investigação do caso ou ao cálculo epidemiológico ou operacional; e o campo não-discriminado é aquele não definido pelo dicionário de dados do sistema1717. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Coordenação Geral de Doenças Transmissíveis. Gerência Técnica do Sinan. Roteiro para uso do Sinan net, análise da qualidade da base de dados e cálculo de indicadores epidemiológicos e operacionais. Brasília; 2008. Disponível em: http://www.sms.rio.rj.gov.br/coe/Documenta%E7%E3o%20SINANNET/Documenta%E7%E3o/caderno%20de%20analise%20SINANNET/HEPATITES.pdf (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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18. Brasil. Ministério da Saúde. SINAN-net: manual do sistema versão 4.0. SVS. Brasília; 2010. Disponível em: http://dtr2004.saude.gov.br/sinanweb/ (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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-1919. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Sistema de Informação de Agravos de Notificação - Sinan: normas e rotinas. 2 ed. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2007.. As variáveis foram organizadas em blocos de localização nas fichas: "Dados do paciente"; "Dados de residência"; "Dados da empresa"; "Antecedentes epidemiológicos"; e "Conclusão do caso". Foi apresentada a distribuição dos registros por ano de notificação, assim como a variação percentual proporcional por agravo referente a 2007 e 2011. Algumas variáveis foram dispostas em tabelas por tipo de campo, percentuais de preenchimento (número de campo preenchido/total de notificações x 100), percentuais de campo com informação ignorada ou vazio (número de campo vazio, com códigos 9 ou 99/total de notificações x 100) e qualidade (conforme escala do MS).

Em função da expressiva variabilidade do percentual de preenchimento dos campos essenciais, foi calculado o coeficiente não paramétrico de correlação linear de Spearman (rs), seu valor de p e a representação gráfica de suas completitudes ao longo do tempo (2007 a 2011). O uso do coeficiente não paramétrico foi precedido pela verificação da distribuição dos dados utilizando o teste de Kolmogorov Smirnoff.

ANÁLISE

A avaliação da qualidade dos dados foi baseada na consonância do Guidelines for Evaluating Public Health Surveillance Systems criado pelo CDC e nos procedimentos normatizados pelo MS para o SINAN77. Center For Disease Control And Prevention (CDC). Update guidelines for evaluation public health surveillance systems: recommendations from the guideline working group. MMWR 2001; 50(RR13): 1-36.,1717. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Coordenação Geral de Doenças Transmissíveis. Gerência Técnica do Sinan. Roteiro para uso do Sinan net, análise da qualidade da base de dados e cálculo de indicadores epidemiológicos e operacionais. Brasília; 2008. Disponível em: http://www.sms.rio.rj.gov.br/coe/Documenta%E7%E3o%20SINANNET/Documenta%E7%E3o/caderno%20de%20analise%20SINANNET/HEPATITES.pdf (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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,1818. Brasil. Ministério da Saúde. SINAN-net: manual do sistema versão 4.0. SVS. Brasília; 2010. Disponível em: http://dtr2004.saude.gov.br/sinanweb/ (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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. De acordo com o CDC, a completitude dos campos de um SIS constitui-se em um dos atributos que mensuram sua qualidade. Nesse sentido, sua medida se dá pela quantificação de respostas "ignoradas" ou "em branco" dos campos77. Center For Disease Control And Prevention (CDC). Update guidelines for evaluation public health surveillance systems: recommendations from the guideline working group. MMWR 2001; 50(RR13): 1-36.. O MS definiu uma escala de desempenho para a qualidade do SINAN baseada no percentual de preenchimento dos campos referentes ao total de notificações registradas no sistema e considera os seguintes critérios para a classificação da qualidade: excelente (acima de 90%); regular (entre 70 e 89%); ruim (abaixo de 70%)1717. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Coordenação Geral de Doenças Transmissíveis. Gerência Técnica do Sinan. Roteiro para uso do Sinan net, análise da qualidade da base de dados e cálculo de indicadores epidemiológicos e operacionais. Brasília; 2008. Disponível em: http://www.sms.rio.rj.gov.br/coe/Documenta%E7%E3o%20SINANNET/Documenta%E7%E3o/caderno%20de%20analise%20SINANNET/HEPATITES.pdf (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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. Para essa avaliação, o preenchimento do campo com a informação "ignorado", codificado pelos números 9, 99, ou vazia, foi considerado não preenchimento77. Center For Disease Control And Prevention (CDC). Update guidelines for evaluation public health surveillance systems: recommendations from the guideline working group. MMWR 2001; 50(RR13): 1-36.,2020. Romero DE, Cunha CB. Avaliação da qualidade das variáveis epidemiológicas e demográficas do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos, 2002. Cad Saúde Pública 2007; 23(3): 701-14.. O processamento e as análises dos dados foram realizados pelos programas computacionais SPSS versão 14 e Microsoft Office Excel 2007.

Esta investigação foi aprovada pela Secretaria Municipal de Saúde de Betim e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais.

RESULTADOS

Foram analisadas 2.345 notificações e investigações de agravos relacionados ao trabalho no período de 2007 a 2011. Foi observada uma tendência crescente na frequência dos registros com um incremento entre os anos 2009 e 2010 de aproximadamente 3,6 vezes. Em 2011, o percentual de crescimento no contingente total de notificações, em relação a 2007, foi de aproximadamente 1.567%, correspondendo a um salto de 68 para 1.134 registros (Tabela 1).

Tabela 1.
Distribuição do número de registros de notificação dos agravos relacionados ao trabalho, SINAN. Betim, 2007 - 2011.

Os agravos com maior número de registros foram: acidente de trabalho grave, LER/DORT e acidente com material biológico. As menores ocorrências de notificações foram referentes aos agravos pneumoconioses e câncer relacionados ao trabalho (Tabela 1).

Na classificação dos 53 campos comuns presentes nos instrumentos de coleta de dados, pode-se observar que a maioria (53%; n = 28) pertenciam à categoria 'essencial', 26% (n = 14) eram campos 'obrigatórios', 8% (n = 4) foram considerados campos 'chave' e cerca de 13% (n = 7) não apresentaram categorização pelo manual do sistema e foram identificados como campo 'não discriminado' (ND).

A completitude dos campos 'chave' foi classificada como excelente (100% de preenchimento), variou entre 0 e 25% (ruim) para a maior parte dos campos ND e apresentou grande variabilidade para os campos 'essenciais' (0 - 98%) (Tabela 2).

Embora haja a premissa de preenchimento total para os campos 'obrigatórios', observou-se que em alguns deles, 'ocupação' (95%), 'data de nascimento' (96%), 'CID específico' (93%), 'gestante' (87%) e 'emissão de CAT' (87%), ocorreram preenchimentos abaixo de 100% (Tabela 2). Nessa categoria as variáveis nome do paciente, idade, sexo, data do acidente, município de residência, UF de residência, país, unidade notificadora, e UF da unidade notificadora apresentaram 100% de preenchimento dos campos em todos os anos. Cabe ressaltar que os campos analisados não sofreram mudanças em suas classificações durante os anos estudados.

Tabela 2.
Classificação, preenchimento e qualidade de alguns campos comuns às fichas de notificação e investigação de agravos à saúde do trabalhador registrados no SINAN. Betim, Minas Gerais, 2007 - 2011.

Os campos essenciais distrito de residência e distrito da empresa não apresentaram preenchimento algum, assim como os campos não discriminados cartão SUS, geocampo1 e geocampo2 durante a série histórica de dados. Ressalta-se que, dentre os campos não discriminados (n = 7), apenas um (tipo de notificação) foi 100% preenchido em todos os anos analisados.

Em relação à qualidade dos campos essenciais, foi verificado um predomínio de completitude ruim (57%; n = 16), 18% (n = 5) foram regulares e 25% (n = 7) classificados como excelente. Dentre os campos essenciais, variáveis importantes para o delineamento da situação de saúde do trabalhador como escolaridade, raça e CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) apresentaram completitudes ruins, sendo 37, 32 e 0,5%, respectivamente (Tabela 2).

Quanto à tendência de crescimento, 64% (n = 18) dos campos essenciais apresentaram correlação negativa de completitude ao longo dos anos, enquanto 21% (n = 6) aumentaram seus índices de preenchimento e 14% (n = 4) ficaram estacionadas ou não foram preenchidas, no mesmo período. O estudo gráfico sobre a correlação entre a completitude e o tempo das variáveis essenciais, em algumas situações, foi insuficiente para afirmá-la em função de pequenas variações visuais (Figura 1). Essa tendência de crescimento positiva ou negativa foi confirmada pelo coeficiente de Spearman (Tabela 3). Foi possível verificar, pela análise gráfica, que a maior parte dos campos essenciais (n = 18; 64%) apresentou queda nos percentuais de preenchimentos ao longo do tempo, enquanto 34% (n = 6) demonstraram crescimento no mesmo período.

Figura 1.
Gráficos de tendência dos graus de completitude (%) em função do tempo (anos) de todas as variáveis com campo essencial de preenchimento.

Tabela 3.
Correlação entre a completitude e o tempo dos campos essenciais comuns às fichas de notificação e investigação expressa pelo coeficiente de correlação de Spearman e seu valor p.

A análise dos índices de correlação (rs) permitiu verificar que as variáveis escolaridade, CNPJ da empresa e tipo de tempo na ocupação apresentaram forte correlação negativa de completitude ao longo dos anos e estatisticamente significativas (rs = -0,9; p = 0,0347). Dentre as variáveis que apresentaram tendência de crescimento da completitude, nome da mãe, situação no mercado de trabalho, tempo de trabalho na ocupação e bairro da empresa, a única que apresentou crescimento estatístico significativo foi tempo de trabalho na ocupação (rs= 0,9; p = 0,0374) (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Em análise geral, este estudo apontou qualidade regular a excelente para a maioria das variáveis analisadas, baseada no atributo completitude do campo. Estudos sobre a qualidade dos dados de diversos SIS, realizados no Brasil utilizando a metodologia do CDC para a avaliação, verificaram uma distribuição heterogênea do grau de completitude das variáveis contidas nas fichas do SINAN, com melhores índices de preenchimentos no bloco de identificação do paciente e regular para o de acompanhamento do caso1010. Malhão TA, Oliveira GP, Codennoti SB, Moherdaui F. Avaliação da completitude do Sistema de Informação de Agravos de Notificação da Tuberculose, Brasil, 2001-2006. Epidemiol Serv Saúde 2010; 19(3): 245-56.

11. Oliveira PB, Oliveira GP, Codenotti SB, Saraceni V, Nóbrega AA, Sobel J. Avaliação do sistema de vigilância da tuberculose no município do Rio de Janeiro, 2001 a 2006. Cad Saúde Coletiva 2010; 18(3): 337-46.

12. Muguande OF, Ferraz ML, França E, Gontijo ED. Avaliação da qualidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica de doença de chagas aguda em Minas Gerais, 2005-2008. Epidemiol Serv Saúde 2011; 20(3): 317-25.

13. Duarte HHP, França EB. Qualidade dos dados da vigilância epidemiológica da dengue em Belo Horizonte, MG. Rev Saúde Pública 2006; 40(1): 134-42.
-1414. Santos ED, Garret DO. Avaliação do Sistema de Vigilância de Hantavírus no Brasil. Epidemiol Serv Saúde 2005; 14(1): 15-31., o que também foi observado no presente estudo.

Em semelhança com esta pesquisa, uma avaliação do sistema de vigilância da doença de chagas constatou baixa completitude das variáveis cartão do SUS, CEP, distrito e referência da residência do paciente e, de forma geral, identificou que a reduzida completitude da ficha de investigação do SINAN inviabilizou uma análise epidemiológica do agravo analisado1212. Muguande OF, Ferraz ML, França E, Gontijo ED. Avaliação da qualidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica de doença de chagas aguda em Minas Gerais, 2005-2008. Epidemiol Serv Saúde 2011; 20(3): 317-25..

A composição do instrumento de coleta de dados do SINAN para os agravos relacionados ao trabalho fornece informações importantes para as ações de vigilância dos ambientes de trabalho, como o ramo de atividade econômica da empresa (CNAE), a ocupação, a situação no mercado de trabalho, o tempo de trabalho na ocupação, endereço da empresa, dentre outras. Os resultados deste estudo demonstraram um preenchimento excelente para a maior parte de tais variáveis, com exceção para CNAE (0,5%) e endereço da empresa (49%). Merece destaque, nesse contexto, o precário preenchimento da variável CNAE, cujo potencial deflagrador de ações de vigilância em saúde do trabalhador, por ramo de atividade, torna-se prejudicado. Essa constatação permite suscitar reflexões sobre a compreensão dos profissionais dos serviços responsáveis pela investigação e notificação de agravos acerca da importância dessa informação e, até mesmo, sobre o manejo das tabelas de classificações disponibilizadas pelo SINAN. O mesmo é possível para a análise do preenchimento da variável ocupação. Observa-se que sua padronização como campo de preenchimento obrigatório favoreceu seu alto índice de completitude, embora ainda haja dificuldades na codificação das classes e famílias ocupacionais de acordo com a lista de classificações da classificação brasileira de ocupações (CBO) e aquela disponibilizada pelo SINAN. Nesse sentido, Vasconcellos et al.2121. Vasconcellos MM, Gribel EB, Moraes IHS. Registros em saúde: avaliação da qualidade do prontuário do paciente na atenção básica, Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saúde Publica 2008; 24(Suppl 1): 5173-82. consideram que a melhoria da qualidade do registro em saúde pode ser incentivada mediante a estruturação de campos obrigatórios.

Essas observações referentes à CNAE e ocupação também foram estudadas por Neto et al.2222. Neto DLR, Glatt R, Souza CAV, Gorla AC, Machado JMH. As fontes de informação do sistema único de saúde para a saúde do trabalhador. In: Chagas AMR, Salim CA, Servo LMS (orgs). Saúde e segurança no trabalho no Brasil: aspectos institucionais, sistemas de informação e indicadores. Brasília: Ipea; 2011., com base em dados do SINAN NET em nível nacional, em 2010. Os autores constataram, por exemplo, categorias de ocupações não classificáveis como tal e consideraram que tais aspectos apontam para certas dificuldades no entendimento de conceitos e no uso das tabelas do sistema.

Para a vigilância da situação de saúde do trabalhador, as variáveis de identificação da residência logradouro, número, bairro e nome da mãe auxiliam na identificação dos casos e fornecem importantes informações para o desencadeamento de ações territoriais pelos serviços de atenção primária de saúde do SUS. Em muitas situações, a localização da residência também configura o local de realização da atividade produtiva do indivíduo. Essas variáveis tiveram completitudes excelentes, variando entre 95 e 98%.

Neste estudo foi observado um aumento expressivo no número de notificações dos agravos relacionados ao trabalho registrados no SINAN nos últimos anos, o que também foi relatado por Galdino et al.2323. Galdino A, Santana VS, Ferrite S. Os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador e a notificação de acidentes de trabalho no Brasil. Cad Saúde Pública 2012; 28(1): 145-59. sobre os acidentes graves e com exposição a material biológico, em nível nacional. De acordo com Neto et al.2222. Neto DLR, Glatt R, Souza CAV, Gorla AC, Machado JMH. As fontes de informação do sistema único de saúde para a saúde do trabalhador. In: Chagas AMR, Salim CA, Servo LMS (orgs). Saúde e segurança no trabalho no Brasil: aspectos institucionais, sistemas de informação e indicadores. Brasília: Ipea; 2011., no período de 2007 a 2009 foram observados números crescentes de notificações em todas as unidades federativas. Esse crescimento pode estar relacionado à iniciativa do MS em incluir indicadores de saúde do trabalhador no pacto pela vida, estabelecendo-se metas progressivas de aumento do número de notificações desses agravos em todo o território brasileiro2424. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.669, de 3 de novembro de 2009. Estabelece as prioridades, objetivos, metas e indicadores de monitoramento e avaliação do Pacto pela Saúde, nos componentes pela Vida e de Gestão, e as orientações, prazos e diretrizes do seu processo de pactuação para o biênio 2010-2011. Diário Oficial da União. 6 de novembro de 2009, Seção 1:58-60. Disponível em: http://portalweb04.saude.gov.br/sispacto/portaria2669_versao_impressao.pdf (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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. Todavia, a qualidade do preenchimento dos campos não acompanhou o crescimento progressivo do número de notificações no mesmo período. Isso propicia algumas reflexões sobre a realidade de trabalho e/ou o preparo dos profissionais responsáveis pela notificação dos agravos. Há um verdadeiro entendimento e sensibilização quanto à importância dos registros sanitários e suas implicações para as políticas de saúde? O ciclo do sistema de informação alcança a fase de consolidação e retorno dos dados para quem os coletou? Os serviços de saúde têm priorizado a apreensão de um maior número de casos/notificações, em detrimento de um registro mais acurado e completo? Essas são indagações que merecem debates e aprofundamentos.

As fichas de notificação e investigação do SINAN apresentam um quantitativo expressivo de campos. No entanto, apesar da prerrogativa de que todos os campos devam ser preenchidos, os mecanismos do sistema que reforçam essa obrigatoriedade atingem apenas os campos chave e obrigatórios1414. Santos ED, Garret DO. Avaliação do Sistema de Vigilância de Hantavírus no Brasil. Epidemiol Serv Saúde 2005; 14(1): 15-31.. A maioria das variáveis são campos essenciais, ou seja, o seu preenchimento, apesar de importante para cálculos de indicadores epidemiológicos, não é obrigatório para a entrada no sistema1818. Brasil. Ministério da Saúde. SINAN-net: manual do sistema versão 4.0. SVS. Brasília; 2010. Disponível em: http://dtr2004.saude.gov.br/sinanweb/ (Acessado em 15 de outubro de 2012).
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,1919. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Sistema de Informação de Agravos de Notificação - Sinan: normas e rotinas. 2 ed. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2007.. Essa característica, somada ao volume de campos e à falta de critérios pré-definidos para a inclusão de variáveis nas fichas, concorrem para a falta de preenchimento ou pela opção de informação ignorada por parte dos notificadores66. Laguardia J, Domingues CMA, Carvalho C, Lauerman CR, Macário E, Glatt R. Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan): desafios no desenvolvimento de um sistema de informação em saúde. Epidemiol Serv Saúde 2004; 13(3): 135-47..

A ocorrência de variações de completitude de campos classificados como obrigatórios, como, por exemplo, ocupação, data de nascimento, CID específico, gestante e emissão de CAT, foi influenciada por fatores de padronização do próprio instrumento de coleta, tais como falhas na classificação dos campos em fichas diferentes e a possibilidade de opção pela informação ignorada como campo de preenchimento.

A capacidade de cálculo de indicadores epidemiológicos específicos fica ameaçada diante da incompletude de determinados campos e mascaram dados que aferem a qualidade da assistência prestada, deixando de informar reconhecidas variáveis preditoras de risco2525. Scherer V, Miranda FMD, Sarquis LMM, Lacerda MR. Sinan net: um sistema de informação à vigilância na saúde do trabalhador. Cogitare Enferm 2007;12(3): 330-7.,2626. Scussiato LA, Cespedes LDM, Sarquis LMM, von Stein Jr AJ, Miranda FMD. Análise dos agravos relacionados ao trabalho notificados pela unidade saúde do trabalhador. Rev Min Enferm 2010; 14(1): 88-9.. São os casos das variáveis raça e escolaridade, que comumente apresentam preenchimentos menores do que 20%, em muitos SIS nacionais1010. Malhão TA, Oliveira GP, Codennoti SB, Moherdaui F. Avaliação da completitude do Sistema de Informação de Agravos de Notificação da Tuberculose, Brasil, 2001-2006. Epidemiol Serv Saúde 2010; 19(3): 245-56.,2020. Romero DE, Cunha CB. Avaliação da qualidade das variáveis epidemiológicas e demográficas do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos, 2002. Cad Saúde Pública 2007; 23(3): 701-14.,2525. Scherer V, Miranda FMD, Sarquis LMM, Lacerda MR. Sinan net: um sistema de informação à vigilância na saúde do trabalhador. Cogitare Enferm 2007;12(3): 330-7.. Essas informações são importantes, pois configuram fatores de risco para abandono de tratamento e óbito2525. Scherer V, Miranda FMD, Sarquis LMM, Lacerda MR. Sinan net: um sistema de informação à vigilância na saúde do trabalhador. Cogitare Enferm 2007;12(3): 330-7.. No presente estudo, essas variáveis tiveram as completitudes um pouco mais elevadas, sendo 32 e 37%, respectivamente. Ainda assim, prevalece a realidade de uma completitude qualificada como ruim a muito ruim em diversas regiões do país para essa informação2727. Félix JD, Zandonade E, Amorim MHC, Castro DS. Avaliação da completude das variáveis epidemiológicas do Sistema de Informação sobre Mortalidade em mulheres com óbitos por câncer de mama da Região Sudeste: Brasil (1998 a 2007). Cienc Saúde Coletiva 2012; 17(4): 945-53.

28. Macente LB, Zandonade E. Avaliação da completude do sistema de informação sobre mortalidade por suicídio na região Sudeste, Brasil, no período de 1996 a 2007. J Bras Psiquiatr 2010; 59(3): 173-81.

29. Moreira CMM, Maciel ELN. Completude dos dados do Programa de Controle da Tuberculose no Sistema de Informação de Agravos de Notificação no Estado do Espírito Santo, Brasil: uma análise do período de 2001 a 2005. J Bras Pneumol 2008; 34(4); 225-9.
-3030. Romero DE, Cunha CB. Avaliação da qualidade das variáveis sócio-econômicas e demográficas dos óbitos de crianças menores de um ano registrados no Sistema de Informações sobre Mortalidade do Brasil (1996/2001). Cad Saúde Pública 2006; 22(3): 673-81..

Alguns campos relevantes para a análise da situação de saúde do trabalhador apresentaram preenchimento insatisfatório, o que enseja repensar mecanismos mais efetivos para a melhoria da completitude. Mudanças na padronização do sistema operacional, como uma reclassificação de campos "essenciais" em "obrigatórios", também poderiam melhorar os índices de preenchimento dos campos.

A correta utilização do SINAN no campo de saúde do trabalhador poderá definir a situação de saúde desse grupo populacional em nível mais abrangente, além de nortear políticas públicas, investigações, inspeções, avaliações e vigilância dos ambientes e processos de trabalho, a própria assistência ao trabalhador, assim como subsidiar estudos e pesquisas específicos3131. Costa JMBS, Frias PG. Avaliação da completitude das variáveis da declaração de óbitos de menores de um ano residentes em Pernambuco, 1997-2005. Ciênc Saúde Coletiva 2011; 16(Suppl 1): 1267-74.,3232. Almeida MF, Alencar GP, Schoeps D, Minuci EG, Silva ZP, Ortiz LP, et al. Qualidade das informações registradas nas declarações de óbito fetal em São Paulo, SP. Rev Saúde Pública 2011; 45(5): 845-53.. No entanto, um estudo recente sobre esse sistema identificou limitações no seu uso, funcionando apenas como um sistema de registro, fluxo de informações e tabulações de dados1212. Muguande OF, Ferraz ML, França E, Gontijo ED. Avaliação da qualidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica de doença de chagas aguda em Minas Gerais, 2005-2008. Epidemiol Serv Saúde 2011; 20(3): 317-25..

O SINAN agrega informações sobre diversos fatores e características dos agravos relacionados ao trabalho, importantes para orientar a atuação da assistência e vigilância em saúde do trabalhador. Entretanto, avaliações rotineiras de seus atributos de qualidade são indispensáveis para a garantia de um monitoramento mais eficiente dos problemas de saúde dessa população. O aumento no quantitativo informacional em saúde não pode prescindir de atenção à sua qualidade, permitindo, assim, a geração de informações qualificadas e capazes de subsidiar decisões em saúde.

Embora seja possível a replicação dos métodos utilizados nesse estudo para avaliação dos dados de SIS em qualquer município brasileiro, características regionais e peculiares aos serviços de saúde do município estudado podem ter influenciado os resultados. A propósito dessa observação, Muguande et al.1212. Muguande OF, Ferraz ML, França E, Gontijo ED. Avaliação da qualidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica de doença de chagas aguda em Minas Gerais, 2005-2008. Epidemiol Serv Saúde 2011; 20(3): 317-25. consideram que o grau de completitude dos dados de notificação em SIS sofrem influência dos recursos e prioridades dos gestores de saúde e, especialmente, daqueles responsáveis pela vigilância em saúde pública.

Informações sobre saúde contidas em bancos de dados secundários são fontes valiosas de pesquisas. No entanto, possuem vieses decorrentes da complexidade da prestação de cuidados e utilização dos serviços de saúde3333. Terris DD, Litaker DG, Koroukian SM. Health state information derived from secondary databases is affected by multiple sources of bias. J Clin Epidemiol 2007; 60(7): 734-41.. Uma avaliação mais completa da qualidade dos dados dos SIS de uso já estabelecido requer avaliações sumativas com estudos qualitativos e mais aprofundados de verificação dos aspectos subjetivos3434. Lau F, Kuziemsky C, Price M, Gardner J. A review on systematic reviews of health information system studies. J Am Med Inform Assoc 2010; 17(6): 637-45. . É preciso reconhecer que o uso dos SIS no Brasil vem melhorando significativamente, porém, seu aprimoramento constitui-se num processo contínuo de avaliações e ajustes55. Jorge MHPM, Laurenti R, Gotlieb SLD. Avaliação dos sistemas de informação em saúde no Brasil. Cad Saúde Colet 2010; 18(1): 7-18..

CONCLUSÃO

Considerando-se a completitude de campos, constatou-se que a qualidade dos dados armazenados no SINAN de Betim, Minas Gerais, foi, em sua maioria, classificada entre regular e excelente ao longo de 2007 a 2011. Desse modo, verificou-se grande possibilidade de uso do SINAN para o delineamento das condições de saúde do trabalhador e deflagração de ações de vigilância da situação de saúde e dos ambientes de trabalho. Todavia, recomenda-se o uso rotineiro de avaliações da qualidade dos dados dos sistemas de informação que compõem a área de saúde do trabalhador no SUS, assim como o incentivo às ações de sensibilização e qualificação dos profissionais envolvidos com o processo de informação, notificação e investigação dos agravos à saúde como um todo.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos setores de Vigilância em Saúde e Cerest de Betim, pelo fornecimento dos dados para a realização do presente trabalho.

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  • Fonte de financiamento: nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    28 Nov 2012
  • Revisado
    15 Fev 2014
  • Aceito
    18 Fev 2014
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