Exames laboratoriais da Pesquisa Nacional de Saúde: metodologia de amostragem, coleta e análise dos dados

Célia Landmann Szwarcwald Deborah Carvalho Malta Paulo Roberto Borges de Souza Júnior Wanessa da Silva de Almeida Giseli Nogueira Damacena Cimar Azeredo Pereira Luiz Gastão Rosenfeld Sobre os autores

RESUMO:

Introdução:

O artigo teve o objetivo de descrever a metodologia de coleta dos dados dos exames laboratoriais da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).

Metodologia:

Foi selecionada uma subamostra de 25% dos setores censitários, obedecendo à estratificação da amostra da PNS, com probabilidade inversamente proporcional à dificuldade de coleta. A coleta de sangue e urina dos moradores selecionados para entrevista individual foi realizada nos domicílios por um agente de laboratório. Por conta das dificuldades encontradas no trabalho de campo,a amostra não atingiu número suficiente em alguns estratos da pesquisa, então para a análise dos dados foi proposto procedimento de pós-estratificação.

Resultados:

A coleta de material biológico foi realizada em 8.952 indivíduos. Os exames realizados foram: hemoglobina glicada; colesterol total; colesterol LDL; colesterol HDL; sorologia para dengue; hemograma série vermelha (eritograma) e série branca (leucograma); cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) para diagnóstico de hemoglobinopatias; e creatinina. Na urina, estimativa de excreção de potássio, sal, sódio e creatinina. A base de dados dos exames laboratoriais foi ponderada e disponibilizada para os usuários no site da PNS da Fundação Oswaldo Cruz, sem necessidade de autorização prévia para uso.

Conclusão:

A subamostra total coletada é de grande valia, pois permitiu estabelecer parâmetros de referência nacionais adequados às características sociodemográficas e geográficas da população brasileira, fornecendo informações relevantes e complementares para a análise da situação de saúde do Brasil.

Palavras-chave:
Exames e diagnósticos laboratoriais; Inquéritos de saúde; Coleta de urina; Coleta de amostras de sangue; Amostragem

INTRODUÇÃO

Como parte do projeto do Ministério da Saúde com foco nas condições de saúde da população brasileira e na avaliação do desempenho do sistema nacional de saúde, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) teve o objetivo principal de produzir dados em âmbito nacional sobre a situação de saúde e os estilos de vida da população brasileira, bem como sobre a atenção à saúde, no que diz respeito ao acesso e uso dos serviços, às ações preventivas, à continuidade dos cuidados e ao financiamento da assistência 11. Szwarcwald CL, Malta DC, Pereira CA, Vieira MLFP, Conde WL, Souza Júnior PRB, et al. Pesquisa Nacional de Saúde no Brasil: concepção e metodologia de aplicação. Ciên Saúde Colet 2014; 19(2): 333-42. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014192.14072012
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O desenvolvimento da pesquisa envolveu a coleta das informações segundo três eixos: as condições de saúde; a atenção à saúde (acesso, utilização, continuidade do cuidado e financiamento); a vigilância das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e fatores de risco associados22. Damacena GN, Szwarcwald CL, Malta DC, Souza Júnior PRB, Vieira MLFP, Pereira CA, et al. O processo de desenvolvimento da Pesquisa Nacional de Saúde no Brasil, 2013. Epidemiol Serv Saúde 2015, 24(2): 197-206. http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742015000200002
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; além das questões relacionadas aos determinantes sociais como os fatores socioeconômicos, demográficos, culturais, comportamentais e ambientais que influenciam a saúde33. Victora CG, Barreto ML, Leal MC, Monteiro CA, Schmidt MI, Paim J, et al. Health conditions and health-policy innovations in Brazil: the way forward. Lancet 2011; 377(9782): 2042-53. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60055-X
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A PNS é um inquérito de base domiciliar, de abrangência nacional, conduzida pelo Ministério da Saúde em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos anos de 2013 e 2014. Por fazer parte do Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares (SIPD), beneficiou-se da Amostra Mestra da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD contínua), com maior espalhamento geográfico e ganho de precisão das estimativas. Com desenho próprio elaborado especificamente para coletar informações de saúde, a PNS foi planejada para a estimação de vários indicadores em diferentes níveis de desagregação geográfica44. Souza Júnior PRB, Freitas MPS, Antonaci GA, Szwarcwald CL. Desenho da amostra da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(2): 207-16. http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742015000200003
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Um avanço importante da PNS foi a aferição, de forma sistemática, de peso, altura e circunferência de cintura, marcadores fundamentais para o monitoramento de um dos mais graves problemas que se colocam, hoje, no Brasil, a epidemia de sobrepeso e obesidade55. Malta DC, Bernal RTI, Vieira Neto E, Curci KA, Pasinato MTM, Lisbôa RM, et al. Tendências de fatores de risco e proteção de doenças crônicas não transmissíveis na população com planos de saúde no Brasil de 2008 a 2015. Rev Bras Epidemiol 2018; 21 (Supl. 1): e180020. http://dx.doi.org/10.1590/1980-549720180020.supl.1
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. Além da medida de pressão arterial, é digno de nota que, pela primeira vez um inquérito com representatividade nacional coletou nos domicílios amostras biológicas para realização de exames complementares.

O presente artigo descreve a metodologia de coleta de material biológico (sangue e urina) nas suas várias etapas: amostragem, coleta e análise de dados em subamostra da PNS; e introduz os vários artigos deste suplemento, que contêm análises de vários marcadores biológicos, realizadas por ocasião da divulgação da base dos exames laboratoriais da PNS pelo IBGE.

METODOLOGIA

AMOSTRAGEM

A PNS é parte do SIPD do IBGE e utilizou a mesma infraestrutura amostral das demais pesquisas domiciliares do IBGE. O plano amostral empregado foi amostragem por conglomerado em três estágios de seleção, com estratificação das unidades primárias de amostragem (UPA). Como parte do SIPD, no primeiro estágio, a seleção das unidades primárias de amostragem (setores censitários ou composição de setores) foi realizada por amostragem aleatória simples (AAS), mantendo, portanto, a mesma estratificação da amostra mestra. Nosegundo estágio, foi selecionado por AAS um número fixo de domicílios particulares permanentes (10 a 14) em cada UPA selecionada no primeiro estágio. No terceiro estágio, dentro de cada domicílio na amostra, um morador com 18 anos ou mais foi selecionado, também por AAS, a partir de uma lista de moradores elegíveis construída no momento da entrevista44. Souza Júnior PRB, Freitas MPS, Antonaci GA, Szwarcwald CL. Desenho da amostra da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(2): 207-16. http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742015000200003
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Para o morador adulto selecionado, foram feitas aferições de peso, altura, circunferência de cintura e pressão arterial, bem como, em subamostra, coleta de sangue para realização de exames laboratoriais. A coleta de urina foi realizada visando obter dados de função renal e consumo de sal. Ao final da análise de todos os exames laboratoriais, as amostras de sangue foram armazenadas, sem identificação dos sujeitos, em soroteca hospedada na Fundação Oswaldo Cruz.

Os indivíduos selecionados para a pesquisa forneceram o consentimento informado para todos os procedimentos, incluindo: questionário; aferições de peso, altura e circunferência de cintura; medida da pressão arterial; coleta de sangue e urina; e armazenamento da amostra sem identificação.

Para a coleta de material biológico dos moradores selecionados no terceiro estágio da PNS, foi planejada uma subamostra de 25% dos setores censitários pesquisados. Para facilitar a logística da coleta de material biológico, os setores censitários foram selecionados com probabilidade inversamente proporcional à dificuldade de coleta. Para o estabelecimento da dificuldade de coleta por meio de parâmetro numérico, foram identificados todos os municípios com 80mil habitantes ou mais em todas as Unidades da Federação (UF). Emcada UF, foram calculadas as distâncias entre todos os municípios com menos de 80mil habitantes selecionados na amostra e os municípios de grande porte populacional (80mil habitantes ou mais) daquela UF, por meio das coordenadas geográficas dos centroides dos municípios. A distância mínima foi adotada como o parâmetro numérico para mensurar a dificuldade de coleta.

COLETA DE MATERIAL BIOLÓGICO

A etapa de coleta de material biológico da PNS foi realizada com recursos do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS). Umconsórcio de laboratórios privados, liderado pela rede DASA, constituído mediante parceria entre o Ministério da Saúde e o Hospital Sírio Libanês, no âmbito da Proadi-SUS, foi responsável tanto pela coleta do material biológico da PNS como pela análise dos exames laboratoriais. A escolha dos laboratórios foi feita entre aqueles que atendiam aos critérios de controle de qualidade do Ministério da Saúde e para os quais fossem asseguradas as normas vigentes para coleta, transporte e processamento do material biológico.

Para realização da coleta, os laboratórios consorciados receberam os seguintes materiais: agulha de coleta múltipla a vácuo, algodão para compressão no local da punção venosa, adaptador de agulha de coleta múltipla, garrote, curativo oclusivo, swab de álcool para antissepsia do sítio de coleta, luvas de procedimento, gelox, suporte de isopor, caixa de isopor e térmica. O kit de coleta foi composto pelos seguintes materiais: três tubos contendo ácido etilenodiamino tetra-acético (EDTA), dois tubos sorogel, kit para coleta de urina em amostra isolada, um cartão com senha inviolável para o sujeito de pesquisa retirar seus resultados via internet e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para a análise dos exames laboratoriais, foram usados técnicas e reagentes padronizados pelos laboratórios do SUS.

Na primeira etapa da PNS, durante a realização das entrevistas individuais nos domicílios dos setores selecionados para a coleta de material biológico, todos os participantes foram informados pelo agente do IBGE sobre a realização da coleta. Após a conclusão de todas as entrevistas do setor, o IBGE liberava o setor para início da pesquisa de dados laboratoriais. Mediante autorização dos moradores entrevistados, informações sobre o endereço, identificação e características do indivíduo como sexo e idade eram transmitidas à coordenação da rede DASA. Foram criados códigos de identificação dos indivíduos para garantir o sigilo das informações.

Considerada como uma segunda etapa da PNS, a pesquisa de exames laboratoriais foi realizada nos domicílios dos participantes por agentes de laboratório, e ocorreu nos anos de 2014 e 2015. Na visita domiciliar, o técnico do laboratório explicava ao participante o procedimento a ser realizado. Após a assinatura do TCLE, era apresentado o kit de coleta e eram dadas orientações sobre a forma de recebimento do laudo, contendo os resultados dos exames laboratoriais. Tanto a amostra de sangue como a de urina foram coletadas, casualmente, no momento da visita domiciliar, em diferentes horários do dia.

Após a análise dos exames laboratoriais, os resultados foram transmitidos ao IBGE em meio eletrônico contendo apenas os códigos de identificação dos indivíduos.

Os participantes receberam os resultados dos exames, diretamente, pelo laboratório contratado. Indivíduos com exames alterados recebiam indicações para procura de assistência médica. Os casos com resultados considerados críticos foram identificados, imediatamente, pelo laboratório conveniado, e foi providenciada assistência na rede SUS.

ANÁLISE DOS DADOS

Na primeira etapa da PNS, foram selecionados 81.254 domicílios, dos quais 69.994 eram domicílios ocupados. A pesquisa foi realizada em 64.348 domicílios e foram entrevistados 60.202 indivíduos adultos, selecionados em cada domicílio com equiprobabilidade. Tendoem vista que foram selecionados 25% dos setores censitários para realização dos exames laboratoriais, e supondo-se taxa de não resposta de 20%, o número esperado de indivíduos com dados laboratoriais era de 12mil indivíduos, aproximadamente.

Contudo, vários fatores ocasionaram uma perda maior do que 20% na subamostra de indivíduos indicados para a realização dos exames laboratoriais. Entre esses, destacam-se: a dificuldade de localização do endereço pelo laboratório contratado; a recusa do morador selecionado em realizar a coleta de material biológico; o longo tempo decorrido entre a aplicação do questionário e a visita do agente do laboratório; e as dificuldades operacionais de transporte do material biológico. No Brasil como um todo, os exames laboratoriais foram realizados em 8.952 indivíduos, representando cerca de 60% dos moradores entrevistados, individualmente, na etapa inicial da PNS, nos setores selecionados para a pesquisa laboratorial.

Além da taxa de não resposta maior do que a esperada, a distribuição das perdas não foi uniforme e alguns estratos não tiveram representação amostral, restringindo a ponderação dos dados pelos fatores naturais de expansão. Para o uso da base de dados relativos aos exames laboratoriais, foram realizadas ponderações calculadas por procedimentos de pós-estratificação por sexo, faixa de idade, raça/cor e grau de escolaridade segundo grande região, a partir da amostra total da PNS.

Para o cálculo das ponderações, foram considerados os dados dos 60.202moradores selecionados para as entrevistas individuais na etapa inicial da PNS. A idade dos moradores selecionados foi agregada em 4 faixas etárias (18 a 29; 30 a 44; 45 a 59; 60 anos ou mais) e o grau de instrução em 3 níveis (fundamental incompleto; fundamental completo e ensino médio incompleto; ensino médio completo ou mais). Em relação à raça/cor, foram considerados os indivíduos de cor/raça negra, pardos, brancos e outros, compondo 96 categorias em cada uma das macrorregiões geográficas.

Matematicamente, foi calculado o número N h de observações dos moradores selecionados da PNS em cada categoria h e n h , o número de observações correspondentes na subamostra de exames laboratoriais. Então, os fatores de ponderação (Wh) foram calculados pela Equação 1.

Wh=Nhnh(1)

Os pesos de pós-estratificação foram calculados pela Equação 2.

Wh=Nhnh × nhNh(2)

DIVULGAÇÃO DOS RESULTADOS

A coleta de material biológico foi realizada em 8.952 indivíduos. Os exames laboratoriais realizados com as amostras de sangue foram: hemoglobina glicada; colesterol total; colesterol lipoproteína de baixa densidade (LDL); colesterol lipoproteína de alta densidade (HDL); sorologia para dengue - imunoglobulina G (IgG); hemograma série vermelha (eritograma) e série branca (leucograma); cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) para diagnóstico de hemoglobinopatias; e creatinina. E na urina, estimativa de excreção de potássio, sal, sódio e creatinina.

Os dados divulgados contêm os resultados dos exames laboratoriais e informações da PNS coletadas na fase da entrevista com o morador selecionado: sexo, idade, raça/cor, grau de escolaridade, posse de plano privado, procura de profissional de saúde nas duas últimas semanas anteriores à pesquisa, internação hospitalar nos últimos 12meses, autorrelato de dengue, se a informante estava grávida no momento da pesquisa, hábitos de alimentação, fumo, uso de álcool, morbidade referida (hipertensão, diabetes, colesterolemia, doença do coração, artrite, insuficiência renal crônica, câncer), uso de medicamentos para hipertensão e diabetes, autoavaliação de saúde e medidas físicas de peso, altura e pressão arterial.

Para as análises de dados apresentados nos artigos do presente suplemento, foram usados os pesos de pós-estratificação calculados pela Equação 2. O banco de dados dos exames laboratoriais com as ponderações assim calculadas está disponível no site da PNS da Fundação Oswaldo Cruz (www.pns.fiocruz.br) e pode ser utilizado sem necessidade de autorização prévia.

DISCUSSÃO

A subamostra total coletada, de quase 9mil indivíduos, é de vulto e de grande valia, pois permitiu estabelecer parâmetros de referência nacionais adequados às características sociodemográficas e geográficas da população brasileira, fornecendo informações relevantes e complementares para a análise da situação de saúde no país e por grande região.

A análise dos exames laboratoriais, realizada nos demais artigos deste suplemento, estabeleceu diagnósticos populacionais de colesterolemia, diabetes, doença renal crônica, anemias, prevalência de hemoglobinopatias, tais como anemia falciforme, sorologia da dengue e dosagens do sódio urinário, subsidiando a formulação, o monitoramento e a avaliação das políticas públicas de saúde, além de apoiar o enfrentamento de epidemia da dengue. Éimportante ressaltar que os exames laboratoriais são medidas complementares às de morbidade referida, uma vez que essas dependem do acesso ao diagnóstico66. Fang J, Yang Q, Ayala C, Loustalot F. Disparities in access to care among US adults with self-reported hypertension. Am J Hypertens 2014; 27(11): 1377-86. https://doi.org/10.1093/ajh/hpu061
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, e podem ser utilizadas como marcadores do manejo efetivo dessas doenças77. Wang L, Mo N, Pang R, Deng Q, Liu Y, Hu Y, et al. Should quality goals be defined for multicenter laboratory testing? Lessons learned from a pilot survey on a national surveillance program for diabetes. Int J Qual Health Care 2016; 28(2): 259-63. https://doi.org/10.1093/intqhc/mzv121
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Adicionalmente, os resultados compõem uma linha de base para o monitoramento de indicadores globais da Organização Mundial da Saúde e da Organização das Nações Unidas, e o alcance das metas do Plano de Enfrentamento das Doenças Crônicas e dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, agenda 203088. GBD 2016 SDG Collaborators. Measuring progress and projecting attainment on the basis of past trends of the health-related Sustainable Development Goals in 188 countries: an analysis from the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet 2017; 390(10100): 1423-59. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32336-X
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, tais como deter o crescimento do diabetes e reduzir o consumo do sódio em todas as classes sociais 99. Malta DC, Silva MMA, Moura L, Morais Neto OL. A implantação do Sistema de Vigilância de Doenças Crônicas Não Transmissíveis no Brasil, 2003 a 2015: alcances e desafios. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(4): 661-75. http://dx.doi.org/10.1590/1980-5497201700040009
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,1010. Pullar J, Allen L, Townsend N, Williams J, Foster C, Roberts N, et al. The impact of poverty reduction and development interventions on non-communicable diseases and their behavioural risk factors in low and lower-middle income countries: A systematic review. PLoS One 2018; 13(2): e0193378. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0193378
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.

Igualmente de grande relevância para a saúde pública brasileira, a criação da soroteca das amostras de sangue permitirá pesquisas futuras com esses dados, a serem definidas pelo Ministério da Saúde, a exemplo da introdução do vírus Zika e da Chikungunya, que trouxeram uma considerável carga à saúde da população brasileira e enormes desafios ao sistema de saúde1111. Zanotto PMA, Leite LCC. The Challenges Imposed by Dengue, Zika, and Chikungunya to Brazil. Front Immunol 2018; 9: 1964. https://doi.org/10.3389/fimmu.2018.01964
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. A hipótese mais provável da entrada do vírus Zika no Brasil é relacionada à transmissão do vírus por turistas estrangeiros assintomáticos durante a Copa do Mundo de 20141212. Salvador FS, Fujita DM. Entry routes for Zika virus in Brazil after 2014 world cup: New possibilities. Travel Med Infect Dis 2016; 14(1): 49-51. https://doi.org/10.1016/j.tmaid.2015.10.004
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. Especulações, entretanto, sobre o período de entrada do vírus Zika, baseadas em modelos matemáticos de disseminação da epidemia, sugerem que a entrada do vírus se deu em período anterior ao evento esportivo1313. Massad E, Burattini MN, Khan K, Struchiner CJ, Coutinho FAB, Wilder-Smith A. On the origin and timing of Zika virus introduction in Brazil. Epidemiol Infect 2017; 145(11): 2303-12. https://doi.org/10.1017/S0950268817001200
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. Tendo em vista a época de coleta de material biológico da PNS, hipóteses sobre a circulação de vírus oriundos de outros países poderão ser melhor investigadas com esses dados.

Por dificuldades encontradas na coleta de material biológico, a amostra representou 60% dos moradores entrevistados, individualmente, na primeira etapa da PNS nos domicílios dos setores selecionados para a pesquisa laboratorial, e não atingiu número suficiente em alguns estratos da pesquisa. As limitações ocorreram, principalmente, pelo fato de a condução da pesquisa de exames laboratoriais não ter sido concomitante às entrevistas domiciliares da PNS, acarretando uma série de dificuldades operacionais. Entre elas, citam-se, particularmente, as encontradas na região norte. Apesar da seleção com probabilidade inversamente proporcional à dificuldade de coleta, como a seleção da subamostra seguiu a mesma estratificação da PNS, houve a inclusão de setores de municípios de pequeno porte populacional e de difícil acesso. Especificamente nessa região, problemas operacionais consistiram em percorrer longas distâncias, retardando o tempo de coleta no Norte e atrasando o início da coleta nas demais regiões. Adicionalmente, apesar de os domicílios estarem identificados com as coordenadas do GPS, os agentes de laboratório, por vezes, não conseguiam encontrar os domicílios pesquisados na etapa anterior da PNS. Cabe ressaltar, entretanto, que além das dificuldades operacionais apresentadas, o ponto mais nevrálgico dessa operação foi a natureza desse levantamento, que requer mais do que informações referidas pelo informante e que reconhecidamente apresenta uma grande taxa de recusas1414. Gindi RM, Zipf G, Galinsky AM, Miller IM,Nwankwo T,Terry AL. Comparison of in-home collection of physical measurements and biospecimens with collection in a standardized setting: The Health Measures at Home Study. Vital Health Stat 2014; (164): 1-16..

Tendo em vista que as taxas de não resposta foram distintas segundo os estratos da PNS, foi necessário utilizar procedimento de pós-estratificação com base na amostra total da PNS. Essa técnica corrige a não representação da amostra em todos os estratos e tem sido utilizada frequentemente em pesquisas domiciliares, como na PNAD contínua, para compensar a perda em função da não resposta e ajustar pelos totais populacionais gerados pelas projeções populacionais nos domínios de divulgação dos dados1515. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Diretoria de Pesquisas. Coordenação de Trabalho e Rendimento. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - Notas técnicas Versão 1.0. Rio de Janeiro: IBGE; 2017..

A calibração dos dados ou pós-estratificação tem sido usada, igualmente, em várias pesquisas de saúde, como a Pesquisa Mundial de Saúde, que teve taxas diferentes de não resposta por sexo e faixa de idade1616. Vasconcellos MTL, Silva PLN, Szwarcwald CL. Sampling design for the World Health Survey in Brazil. Cad Saúde Pública 2005; 21 (Supl. 1): S89-S99. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2005000700010
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. No Inquérito Telefônico de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas (Vigitel), aplicam-se pesos de pós-estratificação para compensar a baixa cobertura de telefonia fixa em algumas capitais do país1717. Bernal RTI, Iser BPM, Malta DC, Claro RM. Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel): mudança na metodologia de ponderação. Epidemiol Serv Saúde 2017; 26(4): 701-12. http://dx.doi.org/10.5123/s1679-49742017000400003
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As variáveis utilizadas na construção dos pesos de pós-estratificação foram escolhidas para compensar as perdas em alguns estratos e para ajustar pelos totais amostrais estimados com os dados da primeira etapa da PNS, analisados após procedimentos de imputação, e ponderados por fatores calculados pelo inverso da probabilidade de seleção de acordo com o desenho complexo de amostragem da pesquisa. Embora os pesos de pós-estratificação tenham sido aplicados visando minimizar o viés das perdas diferenciadas por estrato, uma limitação desse procedimento está na escolha das variáveis e na construção das categorias de análise. Alterações no conjunto de variáveis ou nas categorias utilizadas podem modificar as estimativas dos indicadores de interesse1818. Silva PLN. Calibration estimation. When and why, how much and how. Rio de Janeiro: IBGE ; 2004. (Textos para Discussão, Diretoria de Pesquisas, nº 15).. No presente trabalho foram usadas categorias de idade, raça/cor, sexo e macrorregião de residência, mas diferentes categorizações de idade, por exemplo, poderiam trazer implicações nos resultados.

CONCLUSÃO

A base de dados dos exames laboratoriais representa importante avanço para o conhecimento de características e condições de saúde da população brasileira, permitindo traçar o perfil bioquímico de condições clínicas ou pré-clínicas da população brasileira e aprimorar a vigilância e o manejo efetivo das doenças crônicas não transmissíveis no país, além de apoiar o enfrentamento de epidemia da dengue.

REFERÊNCIAS

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  • Fonte de financiamento: Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), Ministério da Saúde.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Out 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    02 Jan 2019
  • Revisado
    19 Fev 2019
  • Aceito
    20 Fev 2019
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