Desigualdades socioeconômicas relacionadas às doenças crônicas não transmissíveis e suas limitações: Pesquisa Nacional de Saúde, 2019

Deborah Carvalho Malta Regina Tomie Ivata Bernal Margareth Guimaraes Lima Alanna Gomes da Silva Célia Landmann Szwarcwald Marilisa Berti de Azevedo Barros Sobre os autores

RESUMO:

Objetivo:

Analisar as desigualdades socioeconômicas na prevalência autorreferida de doenças crônicas não transmissíveis e suas limitações na população adulta brasileira.

Métodos:

Estudo transversal com dados da Pesquisa Nacional de Saúde realizada em 2019. Calcularam-se as prevalências autorreferidas de indivíduos com alguma doença crônica não transmissível, segundo características sociodemográficas, e as prevalências e a razão de prevalência dessas doenças e seus graus de limitações, segundo escolaridade e posse de plano de saúde privado.

Resultados:

47,6% da população relatou ter pelo menos uma doença crônica não transmissível. As doenças crônicas não transmissíveis aumentaram progressivamente com a idade e foram mais prevalentes nas mulheres (RP 1,13; IC95% 1,10–1,15), nos indivíduos pretos (RP 1,04; IC95% 1,01–1,06) ou pardos (RP 1,05; IC95% 1,01–1,09), analfabetos ou com ensino fundamental incompleto (RP 1,12; IC95% 1,08–1,16), nos moradores das regiões Sudeste (RP 1,10; IC95% 1,05–1,14) e Sul (RP 1,07; IC95% 1,03–1,12) e entre os indivíduos que não possuem plano de saúde privado (RP 1,02; IC95% 1,00–1,05). Para a maioria das doenças crônicas não transmissíveis investigadas, a maior prevalência do relato de limitação esteve entre aqueles com baixa escolaridade e sem plano de saúde.

Conclusão:

Adultos com menor escolaridade e sem planos de saúde privados apresentam maior prevalência de doenças crônicas não transmissíveis e maior grau de limitação. É importante avaliar os indicadores de saúde ante as diferentes populações e desigualdades, a fim de diagnosticar e monitorar as iniquidades em saúde.

Palavras-chave:
Doença crônica; Pessoas com deficiência; Desigualdades em saúde; Iniquidade social

INTRODUÇÃO

A epidemia de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) resulta em consequências devastadoras para os indivíduos, suas famílias e comunidades, além de sobrecarregar os sistemas de saúde11. World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2010. Geneva: World Health Organization; 2011..

As DCNT constituem um dos maiores problemas de saúde global, responsáveis por 41 milhões de mortes no mundo (71% de todas as mortes)22. World Health Organization. Noncommunicable diseases country profiles 2018 Geneva: World Health Organization; 2018.. Destes óbitos, 15 milhões são prematuros (<70 anos de idade). A carga dessas doenças é maior em países de baixa e média baixa rendas, e, no Brasil, as DCNT constituem as causas mais frequentes e corresponderam a aproximadamente 76% das causas de morte em 20173.

Evidências indicam aumento proporcional das DCNT em função do crescimento dos quatro principais fatores de risco (tabaco, inatividade física, uso abusivo do álcool e dietas não saudáveis) e também do envelhecimento populacional. Assim, intervenções nos fatores de risco resultariam em redução do número de mortes, além de melhorar a qualidade de vida e saúde44. Schmidt MI, Duncan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM, et al. Chronic noncommunicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet 2011; 377 (9781): 1949-61. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60135-9
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,55. World Health Organization. ‘Best buys’ and other recommended interventions for the prevention and control of noncommunicable diseases. Geneva: World Health Organization; 2017..

As DCNT afetam, de forma mais frequente, as populações de baixa renda, por serem mais vulneráveis, expostas aos riscos e terem menor acesso aos serviços de saúde e às práticas de promoção à saúde e prevenção das doenças. As pessoas com DCNT têm sua situação de pobreza agravada, pelos gastos familiares com a doença66. Abegunde DO, Mathers CD, Adam T, Ortegon M, Strong K. The burden and costs of chronic diseases in low-income and middle-income countries. Lancet 2007; (370): 1929-38. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(07)61696-1
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. Estudos apontam que os determinantes sociais, como educação, ocupação, renda, gênero e etnia, contribuem para o aumento das DCNT e da morbimortalidade44. Schmidt MI, Duncan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM, et al. Chronic noncommunicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet 2011; 377 (9781): 1949-61. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60135-9
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,77. Malta DC, Bernal RT, Souza MF, Szwarcwald CL, Lima MG, Barros MB. Social inequalities in the prevalence of self-reported chronic non-communicable diseases in Brazil: national health survey 2013. Int J Equity Health 2016; 15 (1): 153. https://doi.org/10.1186/s12939-016-0427-4
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. As diferenças socioconômicas resultam em prejuízo para as pessoas em condições de maior vulnerabilidade social, ampliando suas limitações e a iniquidade em saúde88. Diez Roux AV. Investigating neighborhood and area effects on health. Am J Public Health 2001; 91 (11): 1783-9. https://doi.org/10.2105/ajph.91.11.1783
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,99. Pampel FC, Krueger PM, Denney JT. Socioeconomic disparities in health behaviors. Annu Rev Sociol 2010; 36: 349-70. https://doi.org/10.1146/annurev.soc.012809.102529
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.

Nesse contexto, o conhecimento da situação de saúde da população é o primeiro passo para planejar ações e programas que reduzam a ocorrência e a gravidade das DCNT. O acompanhamento dos indicadores de saúde é essencial para avaliar as tendências da situação de saúde, visando identificar a evolução das desigualdades em saúde1010. Malta DC, Silva MMA, Moura L, Morais Neto OL. A implantação do Sistema de Vigilância de Doenças Crônicas Não Transmissíveis no Brasil, 2003 a 2015: alcances e desafios. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(4): 661-75. https://doi.org/10.1590/1980-5497201700040009
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. Analisar essas informações também é uma forma de apoiar o monitoramento dos compromissos internacionais, como a Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)1111. United Nations. Transforming our world: the 2030 agenda for sustainable development. General Assembly [Internet]. 2015 [cited on March 7, 2021]. Available at:https://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/70/1&Lang=E
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Ante o exposto, o objetivo deste estudo consistiu em analisar as desigualdades socioeconômicas na prevalência autorreferida de DCNT e das limitações, decorrentes dessas morbidades, na população adulta brasileira.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019, que é um inquérito de base populacional, representativo da população brasileira, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde1212. Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística. Pesquisa nacional de saúde: 2019: percepção do estado de saúde, estilos de vida, doenças crônicas e saúde bucal: Brasil e grandes regiões/IBGE, coordenação de trabalho e rendimento. Rio de Janeiro: IBGE; 2020..

A pesquisa utilizou amostra probabilística por conglomerados em três estágios, sendo os setores censitários a unidade primária, os domicílios a secundária e um morador com 15 anos ou mais, selecionado aleatoriamente em cada domicílio, a terciária. Os domicílios e os moradores foram selecionados por amostragem aleatória simples. A população-alvo da PNS de 2019 foi de indivíduos com 15 anos ou mais de idade, residentes em domicílios particulares permanentes. Contudo, para as análises do presente estudo, excluíram-se os indivíduos com menos de 18 anos de idade, assim, a amostra final foi composta de 88.531 indivíduos. Detalhes metodológicos podem ser obtidos em publicações da PNS1212. Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística. Pesquisa nacional de saúde: 2019: percepção do estado de saúde, estilos de vida, doenças crônicas e saúde bucal: Brasil e grandes regiões/IBGE, coordenação de trabalho e rendimento. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.,1313. Stopa SR, Malta DC, Monteiro CN, Szwarcwald CL, Goldbaum M, Cesar LGC. Acesso e uso de serviços de saúde pela população brasileira, Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Rev Saude Publica 2017; 51 (Suppl 1): 3s. http://doi.org/10.1590/s1518-8787.2017051000074
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Consideraram-se como DCNT as seguintes doenças: hipertensão arterial; diabetes; doença do coração; acidente vascular cerebral (AVC); asma; artrite ou reumatismo; problema crônico de coluna; distúrbio osteomuscular relacionado ao trabalho (DORT); doença crônica no pulmão (enfisema pulmonar, bronquite crônica ou DPOC), câncer; insuficiência renal crônica. A presença de diagnóstico autorreferido de hipertensão foi avaliada pela seguinte questão: “Algum médico já lhe deu o diagnóstico de hipertensão arterial?”, e assim os diagnósticos autorreferidos foram avaliados, sucessivamente, para as demais doenças supracitadas, com exceção para o problema crônico de coluna, o qual foi avaliado pela pergunta: “O(a) Sr.(a) tem algum problema crônico de coluna, como dor crônica nas costas ou no pescoço, lombalgia, dor ciática, problemas nas vértebras ou disco?”.

Em relação ao grau de limitação nas atividades habituais, é feita a seguinte pergunta: “Em geral, em que grau a hipertensão ou alguma complicação da hipertensão limita as suas atividades habituais (como trabalhar, estudar, realizar afazeres domésticos etc.)?”. As opções de resposta são:
  1. Não limita;

  2. Um pouco;

  3. Moderadamente;

  4. Intensamente;

  5. Muito intensamente.

Assim, seguiu-se sucessivamente para todas as doenças supracitadas. Para análise do presente estudo, consideraram-se apenas as respostas “Intensamente” e “Muito intensamente”.

Calcularam-se as seguintes estimativas: prevalência de indivíduos que relataram o diagnóstico de pelo menos uma DCNT, segundo as variáveis sociodemográficas sexo, idade, escolaridade, raça/cor, região e posse de plano de saúde privado; prevalência e razão de prevalência (RP) para cada DCNT, de acordo com escolaridade e posse de plano de saúde privado; e prevalência de limitações intensas ou muito intensas causadas pelas DCNT, também segundo escolaridade e posse de plano de saúde privado.

As análises incluíram estimativas das taxas de prevalência e respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%) e a RP bruta e ajustada (RPaj) por sexo, idade e região, obtidas por meio da regressão de Poisson com variância robusta. Todas as análises foram realizadas no Data Analysis and Statistical Software (Stata) versão 14, empregando-se o módulo survey que considera os pesos de pós-estratificação.

A PNS foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) do Ministério da Saúde, sob parecer número 3.529.376. A participação do adulto na pesquisa foi voluntária, e a confidencialidade das informações, garantida. Os dados da PNS 2019 estão disponíveis para acesso e uso público.

RESULTADOS

Os resultados revelaram que 47,6% da população adulta brasileira relatou pelo menos uma DCNT. As prevalências foram mais elevadas nas mulheres (RP 1,13; IC95% 1,10–1,15) e aumentaram progressivamente com a idade. Os indivíduos com cor de pele preta (RP 1,04; IC95% 1,01–1,06) ou parda (RP 1,05; IC95% 1,01–1,09) e analfabetos ou com ensino fundamental incompleto (RP 1,12; IC95% 1,08–1,16) também apresentaram maiores prevalências. As DCNT foram mais prevalentes nas regiões Sudeste (RP 1,10; IC95% 1,05–1,14) e Sul (RP 1,07; IC95% 1,03–1,12) e entre os indivíduos que não possuem plano de saúde privado (RP 1,02; IC95% 1,00–1,05) (Tabela 1). Em contrapartida, foram menos prevalentes entre aqueles com renda mais elevada, acima de três salários mínimos (RP 0,94; IC95% 0,91–0,98) (dados não mostrados).

Tabela 1.
Prevalência autorreferida e razão de prevalência bruta e ajustada de ter pelo menos uma doença crônica não transmissível, segundo características sociodemográficas. Pesquisa Nacional de Saúde, 2019.

A Tabela 2 apresenta as prevalências e RP ajustada de cada DCNT, segundo a escolaridade. Para a maioria das doenças, as maiores prevalências ocorreram nos indivíduos com baixa ou sem escolaridade, comparado com a população com nível superior completo: hipertensão (RP 1,38; IC95% 1,29–1,46), diabetes (RP 1,77; IC95% 1,56–2,02), doença do coração (RP 1,27; IC95% 1,10–1,47), AVC (RP 2,71; IC95% 2,06–3,57), reumatismo (RP 1,35; IC95% 1,18–1,55), problema de coluna (RP 1,37; IC95% 1,28–1,48), doença crônica no pulmão (RP 1,61; IC95% 1,16–2,23). Contudo outras doenças, como asma (RP 0,75; IC95% 0,64–0,88), DORT (RP 0,94; IC95% 0,73–1,21) e câncer (RP 0,64; IC95% 0,54–0,77), foram menos prevalentes nesses indivíduos.

Ao analisar o grau de limitação intenso ou muito intenso nas atividades habituais que as DCNT causaram, segundo o nível de escolaridade, também se verificou que as prevalências das limitações são maiores entre os menos escolarizados e chegam a ser de duas a quatro vezes maiores ao comparar com aqueles com maior escolaridade (Tabela 3).

Tabela 2.
Prevalências e razão de prevalência de ter doença crônica não transmissível, segundo escolaridade. Pesquisa Nacional de Saúde, 2019.
Tabela 3.
Prevalências e razão de prevalência de limitação muito intensa ou intensa, segundo escolaridade. Pesquisa Nacional de Saúde, 2019.

Na Tabela 4, encontram-se prevalências e RP ajustada de ter DCNT e limitação intensa ou muito intensa nas atividades habituais, segundo posse de plano de saúde privado. Os brasileiros que não possuem plano de saúde privado apresentam maior prevalência para todas as DCNT pesquisadas: hipertensão (RP 1,85; IC95% 1,34–2,57), diabetes (RP 1,88; IC95% 1,22–2,89), doença do coração (RP 2,15; IC95% 1,55–2,97), AVC (RP 1,43; IC95% 0,97–2,1), asma (RP 1,90; IC95% 1,24–2,89), reumatismo (RP 1,46; IC95% 1,18–1,80), problemas de coluna (RP 1,63; IC95% 1,40–1,89), DORT (RP 1,82; IC95% 1,27–2,63), doença crônica no pulmão (RP 1,48; IC95% 0,90–2,45), câncer (RP 2,09; IC95% 1,30–3,34) e doença renal (RP 1,6; IC95% 0,85–3,01). Novamente os indivíduos sem plano de saúde apresentaram para todas as DCNT maiores prevalências de limitações.

Tabela 4.
Prevalência e razão de prevalência de ter doença crônica não transmissível e limitação intensa ou muito intensa, segundo posse de plano de saúde privado. Pesquisa Nacional de Saúde, 2019.

DISCUSSÃO

Avaliaram-se 88.531 indivíduos com idade acima de 18 anos. Destes, 47,6% referiram ter pelo menos uma DCNT, entre as 11 doenças incluídas. Essas doenças apresentaram maior magnitude entre mulheres, indivíduos com raça/cor preta ou parda, analfabetos ou com ensino fundamental incompleto, nas regiões Sudeste e Sul, entre os indivíduos que não possuem plano de saúde privado e com menor renda. Em geral, houve maior relato de limitações decorrentes das DCNT entre aqueles com menor escolaridade e que não possuiam plano de saúde privado.

Este estudo apontou alta prevalência de DCNT no Brasil, onde quase metade da população referiu ter pelo menos uma doença, o que reflete um desafio para o sistema de saúde e para a economia, tendo em vista que essas doenças são responsáveis pela maior parte das despesas governamentais de saúde tanto para o tratamento quanto para a prevenção1414. Kwon SH, Myong JP, Kim HA, Kim KY. Association between morbidity of non-communicable disease and employment status: a comparison between Korea and the United States. BMC Public Health 2020 24; 20 (1): 763. http://doi.org/10.1186/s12889-020-08883-3
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. A prevalência e a carga de DCNT constituem as mais elevadas em diversos países1515. World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2014. Geneva: World Health Organization; 2014.1717. Mao W, Zhang Y, Xu L, Miao Z, Dong D, Tang S. Does health insurance impact health service utilization among older adults in urban China? A nationwide cross-sectional study. BMC Health Serv Res 2020; 20 (1): 630. http://doi.org/10.1186/s12913-020-05489-8
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. Estima-se que a carga global das DCNT as aumentará 17% na próxima década1818. Wang Y, Wang J. Modelagem e previsão de doenças não transmissíveis globais. BMC Public Health 2020; 20: 822. https://doi.org/10.1186/s12889-020-08890-4
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.

A prevalência das DCNT foi mais elevada para o sexo feminino ao ser compararada com o masculino. As possíveis explicações podem estar relacionadas com maior acesso das mulheres aos serviços de saúde no Brasil ao comparar com os homens, o que pode favorecer o diagnóstico e tratamento precoce1919. Malta DC, Bernal RTI, Lima MG, Araújo SSC, Silva MMAD, Freitas MIF, et al. Noncommunicable diseases and the use of health services: analysis of the National Health Survey in Brazil. Rev Saude Publica 2017; 51 (Suppl 1): 4s. http://doi.org/10.1590/S1518-8787.2017051000090
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,2020. Szwarcwald CL, Stopa SR, Damacena GN, Almeida WS, Souza Júnior PRB, Vieira MLFP, et al. Mudanças no padrão de utilização de serviços de saúde no Brasil entre 2013 e 2019. Cien Saude Colet [Internet]. 2020 [cited on May 22, 2021]. Available at:https://www.cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/mudancas-no-padrao-de-utilizacao-de-servicos-de-saude-no-brasil-entre-2013-e-2019/17864?id=17864
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. As mulheres também têm maior percepção dos sintomas e sinais físicos das doenças, o que resulta em maior procura e utilização dos serviços de saúde1919. Malta DC, Bernal RTI, Lima MG, Araújo SSC, Silva MMAD, Freitas MIF, et al. Noncommunicable diseases and the use of health services: analysis of the National Health Survey in Brazil. Rev Saude Publica 2017; 51 (Suppl 1): 4s. http://doi.org/10.1590/S1518-8787.2017051000090
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,2121. Travassos C, Martins M. Uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde. Cad Saude Publica 2004; 20 (Supl 2): 190-8. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2004000800014
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. Ademais, há influência de progressos científicos e assistenciais2222. Saeed A, Kampangkaew J, Nambi V. Prevention of cardiovascular disease in women. Methodist Debakey Cardiovasc J 2017; 13 (4): 185-92. https://doi.org/10.14797/mdcj-13-4-185
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, com o reconhecimento de diferenças entre sexo quanto às apresentações clínicas dessas doenças, dados os aspectos hormonais, funcionais e emocionais2222. Saeed A, Kampangkaew J, Nambi V. Prevention of cardiovascular disease in women. Methodist Debakey Cardiovasc J 2017; 13 (4): 185-92. https://doi.org/10.14797/mdcj-13-4-185
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,2323. Zhang Y, Liu B, Zhao R, Zhang S, Yu XY, Li Y. The influence of sex on cardiac physiology and cardiovascular diseases. J Cardiovasc Transl Res 2020; 13 (1): 3-13. https://doi.org/10.1007/s12265-019-09898-x
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.

Existe uma relação direta entre os processos de transição epidemiológica e demográfica, pois, à medida que cresce o número de idosos e aumenta a expectativa de vida, as DCNT também se tornam mais frequentes2424. Schramm JMA, Oliveira AF, Leite IC, Valente JG, Gadelha AMJ, Portela MC, et al. Transição epidemiológica e o estudo de carga de doença no Brasil. Cienc Saude Coletiva 2004; 9 (4): 897-908. https://doi.org/10.1590/S1413-81232004000400011
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, conforme encontrado no presente estudo, o qual mostrou que as doenças foram mais prevalentes nos idosos com 65 anos e mais. A associação entre avanço da idade e aumento progressivo das DCNT é fundamentada na literatura especialmente pelas alterações inerentes da própria senescência2525. Massa KHC, Duarte YAO, Chiavegatto Filho ADP. Análise da prevalência de doenças cardiovasculares e fatores associados em idosos, 2000-2010. Cienc Saude Coletiva 2019; 24 (1): 105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232018241.02072017
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. Soma-se ainda que a longevidade também pode proporcionar maior tempo de exposição a fatores de risco, como poluição, tabagismo, alimentação não saudável e sedentarismo2626. Costantino S, Paneni F, Cosentino F. Ageing, metabolism and cardiovascular disease. J Physiol 2016; 594 (8): 2061-73. https://doi.org/10.1113/JP270538
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, contribuindo para o desenvolvimento dessas doenças. Ademais, os idosos utilizam mais os serviços de saúde, o que pode contribuir para o diagnóstico1313. Stopa SR, Malta DC, Monteiro CN, Szwarcwald CL, Goldbaum M, Cesar LGC. Acesso e uso de serviços de saúde pela população brasileira, Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Rev Saude Publica 2017; 51 (Suppl 1): 3s. http://doi.org/10.1590/s1518-8787.2017051000074
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,2020. Szwarcwald CL, Stopa SR, Damacena GN, Almeida WS, Souza Júnior PRB, Vieira MLFP, et al. Mudanças no padrão de utilização de serviços de saúde no Brasil entre 2013 e 2019. Cien Saude Colet [Internet]. 2020 [cited on May 22, 2021]. Available at:https://www.cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/mudancas-no-padrao-de-utilizacao-de-servicos-de-saude-no-brasil-entre-2013-e-2019/17864?id=17864
https://www.cienciaesaudecoletiva.com.br...
,2727. Louvison MCP, Lebrão ML, Duarte YAO, Santos JLF, Malik AM, Almeida ES. Desigualdades no uso e acesso aos serviços de saúde entre idosos do município de São Paulo. Rev Saude Publica 2008; 42 (4): 733-40. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000400021
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As DCNT foram mais prevalentes nas regiões Sudeste e Sul. Embora se tenha ajustado por região e por idade, nessas regiões, as estruturas etárias são distintas e têm maior concentração de idosos, riquezas e empregos2828. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por amostra de domicílios. Um panorama da saúde no Brasil. Acesso e utilização de serviços, condições de saúde e fatores de risco e proteção à saúde 2008. Rio de Janeiro: IBGE; 2010.,2929. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE; 2012.. Além disso, o Sul e o Sudeste apresentam maior disponibilidade de serviços de saúde e maior proporção de indivíduos com posse de plano de saúde, o que pode favorecer o diagnóstico e a identificação dessas doenças3030. Malta DC, Stopa SR, Pereira CA, Szwarcwald CL, Oliveira M, Reis ACD. Cobertura de planos de saúde na população brasileira, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cienc Saude Colet 2017; 22 (1): 179-90. https://doi.org/10.1590/1413-81232017221.16782015
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Este estudo mostrou maior magnitude das DCNT nos indivíduos com raça/cor preta ou parda, analfabetos ou com ensino fundamental incompleto e que não possuem plano de saúde privado e com menor renda. Houve, ainda, maior relato de limitações nas atividades habituais entre aqueles com menor escolaridade e que não possuíam plano de saúde privado. Esses resultados evidenciam o impacto das desigualdades sociodemográficas na ocorrência das DCNT. Os determinantes sociais, como renda, educação e ambiente, contribuem para o aumento e a gravidade das DCNT e da morbimortalidade3131. Marmot M, Bell R. Social determinants and non-communicable diseases: time for integrated action. BMJ 2019; 364: l251. https://doi.org/10.1136/bmj.l251
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, pois os indivíduos de baixa renda ou socialmente desfavorecidos são mais expostos aos fatores de risco, têm menos acesso aos serviços de saúde, reduzindo as oportunidades de prevenção e promoção da saúde, bem como de tratamento para essas doenças3232. Keetile M, Navaneetham K, Letamo G, Rakgoasi SD. Socioeconomic inequalities in non-communicable disease risk factors in Botswana: a cross-sectional study. BMC Public Health 2019; 19 (1): 1060. https://doi.org/10.1186/s12889-019-7405-x
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,3333. Malta DC, Moura EC, Morais Neto OL. Desigualdades de sexo e escolaridade em fatores de risco e proteção para doenças crônicas em adultos Brasileiros, por meio de inquéritos telefônicos. Rev Bras Epidemiol 2011; 14 (Suppl 1): 125-35. http://doi.org/10.1590/S1415-790X2011000500013
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. Outros estudos mostraram que as prevalências de tabagismo e hipertensão arterial foram maiores entre os adultos menos escolarizados3333. Malta DC, Moura EC, Morais Neto OL. Desigualdades de sexo e escolaridade em fatores de risco e proteção para doenças crônicas em adultos Brasileiros, por meio de inquéritos telefônicos. Rev Bras Epidemiol 2011; 14 (Suppl 1): 125-35. http://doi.org/10.1590/S1415-790X2011000500013
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,3434. Francisco PMSB, Segri NJ, Barros MBA, Malta DC. Desigualdades sociodemográficas nos fatores de risco e proteção para doenças crônicas não transmissíveis: inquérito telefônico em Campinas, São Paulo. Epidemiol Serv Saude 2015; 24 (1): 7-18. http://doi.org/10.5123/S1679-49742015000100002
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, bem como a prevalência de obesidade3535. Silva AG, Teixeira RA, Prates EJS, Malta DC. Monitoramento e projeções das metas de fatores de risco e proteção para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis nas capitais brasileiras. Cienc Saude Coletiva 2021; 26 (4): 1193-206. https://doi.org/10.1590/1413-81232021264.42322020
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. Em contrapartida, o consumo de alimentos saudáveis e a prática de atividade física foram mais elevados entre indivíduos com melhor nível de instrução3333. Malta DC, Moura EC, Morais Neto OL. Desigualdades de sexo e escolaridade em fatores de risco e proteção para doenças crônicas em adultos Brasileiros, por meio de inquéritos telefônicos. Rev Bras Epidemiol 2011; 14 (Suppl 1): 125-35. http://doi.org/10.1590/S1415-790X2011000500013
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3535. Silva AG, Teixeira RA, Prates EJS, Malta DC. Monitoramento e projeções das metas de fatores de risco e proteção para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis nas capitais brasileiras. Cienc Saude Coletiva 2021; 26 (4): 1193-206. https://doi.org/10.1590/1413-81232021264.42322020
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. Contudo, para alguns alimentos não saudáveis, como doces, sanduíches, salgados e pizzas, observou-se maior prevalência nos segmentos sociais mais favorecidos e nos brancos3636. Medina LPB, Barros MBA, Sousa NFS, Bastos TF, Lima MG, Szwarcwald CL. Desigualdades sociais no perfil de consumo de alimentos da população brasileira: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Rev Bras Epidemiol 2019; 22 (Suppl 2): E190011.SUPL.2. https://doi.org/10.1590/1980-549720190011.supl.2
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. Um estudo analisou o grau das disparidades socioeconômicas na prevalência de comportamentos de saúde da população brasileira, de acordo com a PNS de 2013. Os resultados revelaram desigualdades sociais significativas entre os adultos brasileiros, pois os menos escolarizados, não brancos, e sem plano privado de saúde apresentaram maior prevalência de tabagismo, inatividade física e baixa ingestão de alimentos saudáveis, como verduras, vegetais e frutas. Além disso, os indivíduos não brancos consumiram mais bebidas alcóolicas3737. Barros MBA, Lima MG, Medina LP, Szwarcwald CL, Malta DC. Social inequalities in health behaviors among Brazilian adults: National Health Survey, 2013. Int J Equity Health 2016; 15 (1): 148. https://doi.org/10.1186/s12939-016-0439-0
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. Outras pesquisas também mostraram que a população com planos de saúde privados apresentou menor prevalência de DCNT e limitações, sendo justificado por ter mais acesso a serviços de saúde, exames e tratamentos3737. Barros MBA, Lima MG, Medina LP, Szwarcwald CL, Malta DC. Social inequalities in health behaviors among Brazilian adults: National Health Survey, 2013. Int J Equity Health 2016; 15 (1): 148. https://doi.org/10.1186/s12939-016-0439-0
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3939. Ribeiro MCSA, Barata RB, Almeida MF, Silva ZP. Perfil sociodemográfico e padrão de utilização de serviços de saúde para usuários e não-usuários do SUS – PNAD 2003. Cienc Saude Coletiva 2006; 11 (4): 1011-22. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000400022
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. Em geral, a população mais pobre tem mais morbidade e DCNT77. Malta DC, Bernal RT, Souza MF, Szwarcwald CL, Lima MG, Barros MB. Social inequalities in the prevalence of self-reported chronic non-communicable diseases in Brazil: national health survey 2013. Int J Equity Health 2016; 15 (1): 153. https://doi.org/10.1186/s12939-016-0427-4
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, o que reflete as disparidades socioeconômicas do país e reforça a importância do investimento no Sistema Único de Saúde (SUS) para promover oportunidade de acesso a serviços de saúde, diagnósticos e tratamento de DCNT para a população mais vulnerável.

A hipertensão foi a doença mais prevalente encontrada neste estudo e está associada a desfechos mais graves, como doenças cardiovasculares (DCV), cerebrovasculares e insuficiência renal3939. Ribeiro MCSA, Barata RB, Almeida MF, Silva ZP. Perfil sociodemográfico e padrão de utilização de serviços de saúde para usuários e não-usuários do SUS – PNAD 2003. Cienc Saude Coletiva 2006; 11 (4): 1011-22. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000400022
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,4040. Oliveira GMM, Brant LCC, Polanczyk CA, Biolo A, Nascimento BR, Malta DC, et al. Estatística cardiovascular – Brasil 2020. Arq Bras Cardiol 2020; 115(3): 308-439. http://doi.org/10.36660/abc.20200812
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. O diabetes configura um problema de saúde pública global e sua prevalência é crescente no Brasil e no mundo4141. Shaw JE, Sicree RA, Zimmet PZ. Global estimates of the prevalence of diabetes for 2010 and 2030. Diabetes Res Clin Pract 2010; 87 (1): 4-14. http://doi.org/10.1016/j.diabres.2009.10.007
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. O problema crônico de coluna e a DORT podem acometer grande parcela da população e representam umas das principais causas de anos de vida perdidos por limitação, acarretando impacto econômico e na qualidade de vida dos indivíduos4242. Oliveira MM, Andrade SSCA, Souza CAV, Ponte JN, Szwarcwald CL, Malta DC. Problema crônico de coluna e diagnóstico de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT) autorreferidos no Brasil: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24 (2): 287-96. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000200011
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,4343. Romero DE. Muzy J, Maia L, Marques AP, Souza Júnior PRBD, Castanheira D. Desigualdades e fatores associados ao tratamento do problema crônico de coluna no Brasil. Cienc Saude Coletiva 2019; 24 (11): 4211-26. https://doi.org/10.1590/1413-812320182411.06352018
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. O câncer e a asma foram menos prevalentes nos indivíduos menos escolarizados, mostrando um gradiente invertido, o que pode ser em decorrência das condições socioeconômicas, do menor acesso a serviços de saúde e diagnóstico entre indivíduos com piores condições socioeconômicas1616. Dalstra JA, Kunst AE, Borrell C, Breeze E, Cambois E, Costa G, et al. Socioeconomic differences in the prevalence of common chronic diseases: an overview of eight European countries. Int J Epidemiol 2005; 34 (2): 316-26. http://doi.org/10.1093/ije/dyh386
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.

As desigualdades socioeconômicas em indicadores de saúde ou fatores de risco para as DCNT, bem como na ocorrência de doenças e limitações, ressaltam a importância do monitoramento dessas desigualdades como parte das políticas nacionais de saúde e a necessidade de priorizar ações de promoção da saúde e prevenção de agravos, além de ampliar e melhorar a capacidade de acesso e oferta aos serviços de saúde para o diagnóstico e tratamento das DCNT, principalmente entre os segmentos sociais mais vulneráveis3737. Barros MBA, Lima MG, Medina LP, Szwarcwald CL, Malta DC. Social inequalities in health behaviors among Brazilian adults: National Health Survey, 2013. Int J Equity Health 2016; 15 (1): 148. https://doi.org/10.1186/s12939-016-0439-0
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.

Devem ser consideradas algumas limitações do estudo, como a impossibilidade de estabelecer relação de causalidade, por se tratar de um estudo transversal. Pelo fato da PNS de 2019 coletar informações autorreferidas, os dados podem estar sujeitos ao viés de informação. É possível que a prevalência de algumas doenças esteja subestimada por questões de memória, de desconhecimento do informante ou pela falta de diagnóstico médico da doença. A acurácia da medida sobre as DCNT pode diferir segundo o tipo de morbidade, com maior validade das informações sobre doenças que demandam maior controle. As características sociais do informante também podem impactar a informação4444. Okura Y, Urban LH, Mahoney DW, Jacobsen SJ, Rodeheffer RJ. Agreement between self-report questionnaires and medical record data was substantial for diabetes, hypertension, myocardial infarction and stroke but not for heart failure. J Clin Epidemiol 2004; 57 (10):1096-103.. Assim, os resultados devem ser interpretados cautelosamente. Contudo, destaca-se que o estudo foi feito em amostra representativa de adultos brasileiros, sendo a generalização dos resultados segura para estimativas nacionais. O estudo também preza por alto rigor metodológico nas várias etapas de condução e foi realizado com uma base de dados que permite ajustes para potenciais confundimentos.

Os resultados mostraram que cerca de metade da população adulta brasileira refere o diagnóstico de alguma DCNT e evidenciou que há desigualdades socioeconômicas relacionadas à prevalência dessas doenças e, sobretudo, às suas limitações. Maior magnitude de prevalência das DCNT ocorreu entre indivíduos com raça/cor preta ou parda, analfabetos, com ensino fundamental incompleto, que não possuem plano de saúde privado e com menor renda.

Ainda que o acesso ao diagnóstico possa aumentar a prevalência de DCNT nos mais favorecidos, este estudo detectou significantes associações desfavorecendo a população mais vulnerável. Ampliar o acesso torna-se importante para reduzir as desigualdades no tratamento e controle das DCNT nessa população. Além disso, melhorar a qualidade dos serviços de promoção da saúde é fundamental nessa redução. Assim, a expansão do SUS precisa enfocar cada vez mais a prevenção e o controle das DCNT, com atenção especial ao impacto das morbidades nas atividades diárias dos indivíduos. As estratégias para prevenir os fatores de risco devem ser reforçadas e continuadas, principalmente na atenção primária. As limitações foram mais frequentes na população mais vulnerável e reforçam a importância das ações intersetoriais para o enfretamento das DCNT. Os dados da PNS contribuem para a identificação das iniquidades e apoiam as políticas públicas para sua superação. Destaca-se ainda a importância do SUS no acesso aos serviços de saúde e oportunidade de diagnóstico e tratamento das populações mais vulneráveis.

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  • Fonte de financiamento: Fundo Nacional de Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde – TED 66/2018.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2021
  • Revisado
    21 Jul 2021
  • Aceito
    26 Jul 2021
  • Preprint
    10 Set 2021
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