Adolescência, comportamento sexual e fatores de risco à saúde

Adolescencia, comportamiento sexual y factores de riesgo para la salud

Simone Gonçalves de Assis Romeu Gomes Thiago de Oliveira Pires Sobre os autores

Resumos

OBJETIVO

: Analisar a relação entre comportamento sexual e fatores de risco à saúde física ou mental entre adolescentes.

MÉTODOS

: Estudo realizado com 3.195 escolares de 15 a 19 anos de idade, do segundo ano do ensino médio de escolas públicas e particulares das capitais de 10 estados do Brasil, em 2007-2008. Foi utilizada amostragem por conglomerados com multiestágio de seleção (escolas e alunos) em cada cidade e rede de ensino pública e particular. Foi aplicado questionário a todos os alunos selecionados, com os seguintes itens: dados socioeconômicos e demográficos; comportamento sexual; “transar” com pessoas do mesmo sexo, do sexo oposto ou de ambos os sexos; uso de bebida alcoólica e maconha; usar camisinha ao “transar”; presença de experiências sexuais traumáticas na infância ou adolescência; e ideação suicida. A análise incluiu descrição de frequências, teste de Qui-quadrado, análise de correspondência múltipla e de cluster. Foram analisadas qualitativamente, por análise dos conteúdos manifestos, as respostas a uma questão livre em que o adolescente expressou comentários gerais sobre si e sua vida.

RESULTADOS

: Cerca de 3,0% dos adolescentes referiu comportamento homossexual ou bissexual, sem diferenciação de sexo, idade, cor da pele, estrato social, estrutura familiar e rede de ensino. Adolescentes com comportamento homo/bissexual comparados aos heterossexuais relataram (p < 0,05): ficar de “porre” (18,7% e 10,5%, respectivamente), uso frequente de maconha (6,1% e 2,1%, respectivamente), ideação suicida (42,5% e 18,7%, respectivamente) e ter sido vítima de violência sexual (11,7% e 1,5%; respectivamente). Adolescentes com comportamento homo/bissexual relataram utilizar menos preservativo de forma frequente (74,2%) do que aqueles com comportamento heterossexual (48,6%, p < 0,001). Três grupos foram encontrados na análise de correspondência: composto por adolescentes com comportamento homo/bissexual e que vivenciava os fatores de risco: sofrer violência sexual, nunca utilizar camisinha ao “transar”, ideação suicida, uso frequente de maconha; composto por usuários ocasionais de maconha e camisinha e com frequentes “porres”; adolescentes com comportamento heterossexual e ausência dos fatores de risco investigados. Entre adolescentes com comportamento homo e bissexual, houve mais fatores de risco quando comparados àqueles com comportamento heterossexual. Os adolescentes com comportamento homo e bissexual expuseram mais suas vivências pessoais positivas e relacionamentos negativos do que seus pares heterossexuais, mas se expressaram menos sobre religiosidade.

CONCLUSÕES

: O tema não somente deve ser mais estudado como também devem ser ampliadas as ações preventivas voltadas aos adolescentes com relações afetivo-sexuais homo/bissexuais.

Comportamento Sexual; Comportamento Perigoso; Fatores de Risco; Adolescente; Comportamento do Adolescente


OBJETIVO

: Analizar la relación entre comportamiento sexual y factores de riesgo para la salud física o mental entre adolescentes.

MÉTODOS

: Estudio realizado con 3.195 escolares de 15 a 19 años de edad, de segundo año de educación básica de escuelas públicas y particulares de las capitales de 10 estados de Brasil, en 2007-2008. Se utilizó muestreo por conglomerados con multifase de selección (escuelas y alumnos) en cada ciudad y red de educación pública y particular. Se aplicó cuestionario a todos los alumnos seleccionados, con los siguientes itens: sexo, edad, color de piel, estructura familiar, estrato social, red de educación y ciudad de residencia; comportamiento sexual; tener relación sexual con personas del mismo sexo, del sexo opuesto o de ambos sexos; uso de bebida alcohólica y marihuana; usar preservativo al tener sexo; presencia de experiencias sexuales traumáticas cuando era niño o adolescente; e ideas suicidas. El análisis incluyó descripción de frecuencias, prueba de Chi-cuadrado, análisis de correspondencia múltiple y de cluster. Se analizaron cualitativamente las respuestas a una pregunta libre en que el adolescente expresó comentarios generales sobre sí y su vida por medio de análisis de los contenidos manifestados.

RESULTADOS

: Cerca de 3,0% de los adolescentes manifesto tener pareja o tener sexo con personas del mismo sexo (homosexual) o de ambos sexos (bisexual) sin diferenciación de sexo, edad, color de piel, estrato social, estructura familiar y red de educación. Adolescentes con comportamiento homo/bisexual al compararse con los heterosexuales relataron (p<0,05): embriagarse (18,7% y 10,5%, respectivamente), uso frecuente de marihuana (6,1% y 2,1%, respectivamente), ideas suicidas (42,5% y 18,7%, respectivamente) y haber sido víctima de violencia sexual (11,7% y 1,5%, respectivamente). Adolescentes con comportamiento homo/bisexual relataron utilizar menos preservativo de forma frecuente (74,2%) en comparación con aquellos con comportamiento heterosexual (48,6%, p<0,001) Tres grupos fueron encontrados en el análisis de correspondencia: compuesto por adolescentes con comportamiento homo/bisexual y que experimentaron factores de riesgo: sufrir violencia sexual, nunca utilizar preservativo al tener sexo, ideas suicidas, uso frecuente de marihuana; compuesto por usuarios ocasionales de marihuana y preservativo y con frecuentes estados de embriaguez; adolescentes con comportamiento heterosexual y ausencia de los factores de riesgo investigados. Entre adolescentes con comportamiento sexual homo y bisexual, hubo más factores de riesgo estudiados al compararlos con aquellos que tuvieron esas prácticas de carácter heterosexual. Los adolescentes con comportamiento sexual homo y bisexual expusieron mas sus experiencias personales positivas y relaciones negativas en comparación con sus pares heterosexuales, sin embargo, expresaron menos sobre su vida religiosa.

CONCLUSIONES

: El tema no solamente debe ser más estudiado sino que también deben ampliarse las acciones preventivas dirigidas hacia los adolescentes con relaciones afectivo - sexuales homo/bisexuales.

Conducta Sexual; Conducta Peligrosa; Factores de Riesgo; Adolescente; Conducta del Adolescente


INTRODUÇÃO

Jovens pertencentes a minorias sexuais – homossexuais ou bissexuais – vivenciam mais fatores de risco do que os jovens que não pertencem a essas minorias, os heterossexuais. 1212 Hughes TL, Johnson T, Wilsnack SC. Sexual assault and alcohol abuse: a comparison of lesbians and heterosexual women . J Subst Abuse. 2001;13(4):515-32. DOI:10.1016/S0899-3289(01)00095-5
https://doi.org/10.1016/S0899-3289(01)00...
, 1919 Robin L, Brener ND, Donahue SF, Hack T, Hale K, Goodenow C. Associations between health risk behaviors and opposite, same, and both-sex sexual partners in representative samples of Vermont and Massachusetts high school students. Arch Pediatr Adolesc Med. 2002;156(4):349-55. DOI:10.1001/archpedi.156.4.349
https://doi.org/10.1001/archpedi.156.4.3...

Ryan et al 2020 Ryan C, Huebner D, Diaz RM, Sanchez J. Family rejection as a predictor of negative health outcomes in white and latino lesbian, gay, and bisexual young adults. Pediatrics. 2009;123(1):346-52. DOI:10.1542/peds.2007-3524
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relatam que, desde as primeiras publicações sobre juventude homossexual nos anos de 1970 e 1980, sérias disparidades em saúde são documentadas ao compararem-se gays e bissexuais aos seus pares heterossexuais. Os problemas de saúde encontrados nos estudos com jovens homo e bissexuais são: altos níveis de tentativas de suicídios, uso elevado de substâncias, sintomas de depressão e outros problemas de saúde mental, frequentes comportamentos sexuais de risco, incluindo HIV, doenças sexualmente transmissíveis (DST), gravidez na adolescência, abuso físico ou sexual, distúrbios alimentares e rejeição familiar. 6Feldman MB, Meyer IH. Childhood abuse and eating disorders in gay and bisexual men. Int J Eat Disord. 2007;40(5):418-23. DOI:10.1002/eat.20378
https://doi.org/10.1002/eat.20378...
, 1717 Ortiz-Hernández L, Tello BL, Valdés J. The association of sexual orientation with self-rated health, and cigarette and alcohol use in Mexican adolescents and youths. Soc Sci Med. 2009;69(1):85-93. DOI:10.1016/j.socscimed.2009.03.028
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, 1818 Remafedi G, French S, Story M, Resnick MD, Blum R. The relationship between suicide risk and sexual orientation: results of a population-based study. Am J Public Health. 1998;88(1):57-60. DOI:10.2105/AJPH.88.1.57
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, 2020 Ryan C, Huebner D, Diaz RM, Sanchez J. Family rejection as a predictor of negative health outcomes in white and latino lesbian, gay, and bisexual young adults. Pediatrics. 2009;123(1):346-52. DOI:10.1542/peds.2007-3524
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, 2222 Taquette SR, Vilhena MM, Santos UPP, Barros MMV. Relatos de experiência homossexual em adolescentes masculinos. Cienc Saude Coletiva. 2005;10(2):399-407. DOI:10.1590/S1413-81232005000200018
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, 2323 Welles SL, Baker C, Miner MH, Brennan DJ, Jacoby S, Rosser S. History of childhood sexual abuse and unsafe anal intercourse in a 6-city study of HIV-positive men who have sex with men. Am J Publ Health. 2009;99(6):1079-86. DOI:10.2105/AJPH.2007.133280
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Metanálise 8Friedman MS, Marshal MP, Guadamuz TE, Wei C, Wong CF, Saewyc EM, et. al. A meta-analysis of disparities in childhood sexual abuse,parental physical abuse, and peer victimization among sexual minority and sexual nonminority individuals. Am J Public Health. 2011;101(8):1481-94. DOI:10.2105/AJPH.2009.190009
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realizada a partir de 37 estudos norte-americanos e canadenses publicados entre 1980 e 2009 reitera elevada presença de fatores de risco entre jovens de minorias sexuais, como problemas de saúde mental, uso de substâncias, comportamentos sexuais de risco e HIV. Esses aspectos comumente associam-se à presença de abuso na infância. Todavia, os resultados desses estudos refletem diferentes conceituações atinentes ao tema (comportamento ou identidade sexual) e metodologias, o que demanda atenção nas interpretações existentes.

Interfere na qualidade de vida e saúde dos jovens pertencentes a minorias sexuais a desvalorização da homossexualidade, comentada em vários estudos. Um deles, 1Almeida AC. A cabeça do brasileiro. Rio de Janeiro: Record; 2007. realizado em 102 municípios brasileiros com amostra probabilística de 2.363 participantes, mostrou que 89,0% dos entrevistados foram contra a homossexualidade masculina e 88,0% contra a feminina. O preconceito nem sempre aparece de forma explícita. Pesquisa 7Fleury ARD, Torres ARR. Análise psicossocial do preconceito contra homossexuais. Estud Psicol. 2007;24(4):475-86. DOI:/10.1590/S0103-166X2007000400007 realizada em Goiás com 135 estudantes, predominantemente do sexo feminino (87,0%), concluiu que, embora a maioria dos entrevistados tenha criticado a percepção negativa de que a sociedade brasileira tem dos homossexuais, os sujeitos atribuíram mais características positivas a heterossexuais do que a homossexuais, sugerindo sutil preconceito contra homossexuais. Carrara 4Carrara S. Discrimination, policies, and sexual rights in Brazil. Cad Saude Publica. 2012;28(1):184-9. DOI:10.1590/S0102-311X2012000100020
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refere que homens e mulheres costumam ser expostos a situações de violência e discriminações quando rompem com as convenções sociais de gênero e sexualidade.

Este estudo tem por objetivo analisar a relação entre comportamento sexual e fatores de risco à saúde física ou mental entre adolescentes.

MÉTODOS

Foi realizada pesquisa em 2007 e 2008 para conhecer as vivências de afeto e violência presentes nas relações afetivo-sexuais de 3.205 estudantes (15 a 19 anos) do 2o ano do ensino médio de escolas públicas estaduais e particulares das capitais de dez estados brasileiros: Rio de Janeiro, RJ, Belo Horizonte, MG, Recife, PE, Teresina, PI, Brasília, DF, Cuiabá, MT, Manaus, AM, Porto Velho, RO, Florianópolis, SC, Porto Alegre, RS de 2007 a 2008. 1515 Minayo MCS, Assis SG, Njaine K, organizadores. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do “ficar” entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011.

A seleção das dez cidades teve como critério analisar localidades com elevados índices de morbimortalidade por causas externas de estudantes dos 15 aos 19 anos de idade, nas cinco regiões brasileiras. Utilizou-se amostragem conglomerada com multiestágio de seleção em cada cidade (escolha das escolas, com probabilidade de seleção proporcional à quantidade de alunos nos estratos público e privado) e seleção aleatória de uma turma por escola, com a aplicação do questionário para todos os alunos. A amostra foi dimensionada para obter estimativas de proporção, com erro absoluto de 0,10, nível de confiança de 95% e proporção da ocorrência de vitimização entre namorados igual a 70,0%. 1515 Minayo MCS, Assis SG, Njaine K, organizadores. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do “ficar” entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011. A amostra 1515 Minayo MCS, Assis SG, Njaine K, organizadores. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do “ficar” entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011. é representativa de estudantes do segundo ano do ensino médio das dez capitais brasileiras investigadas.

As informações obtidas referiram-se a 3.195 jovens, todos com vivência de algum tipo de relacionamento afetivo-sexual (namorar ou ficar). As seguintes variáveis foram analisadas: perfil dos adolescentes: sexo, idade (15 a 19 anos), cor da pele (branca, preta, parda e amarela), estrutura familiar (pai e mãe, apenas com um dos pais, com um dos pais e padrasto ou madrasta, sem ambos os pais), estrato social (estratos A-B: renda familiar mensal > R$ 1.669,00, aaAssociação Brasileira de Estudos Populacionais (BR). Critério de classificação econômica Brasil. São Paulo; 2008 [citado 2012 nov 01]. Disponível em: http://www.abep.org/novo/FileGenerate.ashx?id=252 , bbValor equivalente em dolar = US$ 834,5 estratos C-D-E: renda inferior a esse limite); rede de ensino (pública e privada) e cidade de moradia; comportamento sexual: ter ficado ou namorado com pessoas do mesmo sexo, do sexo oposto ou de ambos os sexos; ter “transado” com pessoas do mesmo sexo, do sexo oposto ou de ambos os sexos; fatores de risco à saúde: ter tomado bebida alcoólica até se embriagar ou sentir-se bêbado (ficar de “porre”) no último ano; ter usado maconha no último ano; não uso (pessoal ou pelo parceiro) de camisinha ao “transar”; ter tido experiências sexuais traumáticas quando era criança ou adolescente; ter ficado triste, sem esperança no futuro devido a um relacionamento amoroso, chegando a pensar seriamente em se matar (ideação suicida).

O comportamento sexual foi classificado em: heterossexual – Hete (inclui namoro ou relação sexual com pessoa do sexo oposto); Homo: inclui homossexual (namoro ou relação sexual com pessoa do mesmo) e bissexual (namoro ou relação sexual com pessoas de ambos os sexos). A agregação dos grupos homo/bissexuais (com baixa frequência) foi realizada para dar maior consistência à análise.

O comportamento sexual não é, necessariamente, uma característica fixa da sexualidade nessa fase da vida, podendo ser transitório ou cambiável ao atingir a vida adulta. Utiliza-se a categoria “comportamento sexual” por se partilhar da ideia de Cardoso 2Cardoso FLO. Conceito de orientação sexual na encruzilhada entre sexo, gênero e motricidade. Interam J Psychol. 2008;42(1):69-79. de que o conceito de orientação sexual é atravessado por diferentes referenciais teóricos e discordantes critérios para a sua classificação. Esse autor propõe que a preocupação maior no campo das pesquisas não deva ser com os conceitos, e sim com as práticas sexuais. Nesse sentido, talvez, haja maior possibilidade de se produzir dados sobre as sexualidades quando se comparam as práticas sexuais de três diferentes tipos: parceiros do mesmo sexo, parceiros do sexo oposto ou ambos. 2Cardoso FLO. Conceito de orientação sexual na encruzilhada entre sexo, gênero e motricidade. Interam J Psychol. 2008;42(1):69-79.

Foi realizada a descrição de frequências (incorporando o peso e o desenho amostral) e realizado teste de Qui-quadrado de segunda ordem de Rao-Scott (indicado pela incorporação do desenho amostral na análise ccPessoa DGC, Nascimento Silva PLD. Análise de Dados Amostrais Complexos. São Paulo: Associação Brasileira de Estatística; 1998. ) entre as variáveis que aferiam fator de risco e a que mensurou o comportamento sexual (p < 0,05 indicaram associações estatisticamente significativas). Foi utilizado o pacote estatístico SPSS versão 15.

Foi empregada a Análise de Correspondência Múltipla (ACM), 1111 Greenacre M. Correspondence Analysis in Practice. Boca Raton: Chapman & Hall; 2007. DOI:10.1201/9781420011234
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capaz de apresentar graficamente o modo como um conjunto de variáveis categóricas se inter-relaciona, por meio da disposição de suas categorias em mapa segundo dimensões. Cada eixo do gráfico explica uma parcela da variância contida nos dados. A orientação de cada ponto no mapa, que representa a categoria de determinada variável, é definida pela distância Qui-quadrado. A Análise de Cluster foi utilizada pelo método hierárquico no conjunto de coordenadas das categorias geradas pela ACM para auxiliar na evidenciação de padrão de agrupamento na distribuição dos pontos CM. Essa técnica consiste em subdividir cada um dos pontos (categorias da ACM) em subgrupos mutuamente excludentes por meio de um algoritmo que calcula distâncias entre os pontos analisados a fim de expressar o grau de semelhança entre as categorias e agrupá-las. 1616 Oliveira RVC, Silva AM, Assis SG, Santos NC. Análise de correspondência múltipla e análise de agrupamentos na redução de dimensionalidade de indicadores de eventos de vida. Rev Bras Estat. 2006;67(226):95-116. Foi utilizado o pacote estatístico R versão 2.14.2.

Além das questões fechadas descritas, utilizou-se um item aberto do questionário. onde o adolescente poderia escrever o que considerasse importante sobre si e sua vida: 20,2% dos 3.195 adolescentes utilizaram esse espaço. O tratamento analítico 1010 Gomes R, Souza ER, Minayo MCS, Silva CFR. Organização, processamento, análise e interpretação de dados: o desafio da triangulação. In: Minayo MCS, Assis SG, Souza ER, organizadores. Avaliação por triangulação de métodos: abordagem de programas sociais. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p.185-221. desse item buscou identificar as ideias centrais de cada comentário. Elaborou-se a seguinte classificação com base nos conteúdos manifestos: vivências pessoais positivas; vivências pessoais negativas; relacionamentos positivos; relacionamentos negativos; fatores de risco; religiosidade. Foi excluída da apresentação dos resultados a categoria “outros comentários” (mencionados por 24 adolescentes), não relacionados diretamente à pesquisa. As categorias foram analisadas pela descrição de frequências e da busca de associações entre sexo, comportamento sexual e presença de fatores de risco.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa/ENSP/Fiocruz (Parecer 07/08). Todos os participantes da pesquisa assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. Foi obtida autorização de todos os responsáveis pelas escolas visitadas.

RESULTADOS

Entre os adolescentes, 62,6% eram do sexo feminino; 88,0% tinham entre 15 e 17 anos; 45,6% informaram cor da pele branca, 5,5% amarela e os demais a consideraram preta ou parda; 74,8% pertenciam ao ensino público; 56,4% estavam inseridos nos estratos sociais A e B, mais abastados; 61,1% viviam com pai e mãe, 22,9% apenas com um dos pais, 11,9% com um dos pais e padrasto ou madrasta e 4,1% viviam sem os pais.

Cerca de 3,0% referiram namorar ou ficar com pessoas do mesmo sexo (homossexual) ou de ambos os sexos (bissexual): 36 referiram-se como homossexuais (16 mulheres e 20 homens) e 86 informaram relacionamentos bissexuais (66 mulheres e 20 homens). Não se constatou diferença estatisticamente significativa em relação ao comportamento sexual se analisado segundo sexo, idade, cor da pele, estrato social e estrutura familiar. Houve similaridade segundo as redes de ensino. Alguma diferenciação foi constatada em algumas cidades, com maior percentual de estudantes com comportamento homo ou bissexual em Brasília e Cuiabá (ambas na região Centro-Oeste, com 7,1% e 4,5%, respectivamente), e Florianópolis com 5,2%.

Quando indagados quanto às pessoas com quem “transavam”: 43,7% informaram já ter tido relações sexuais; 2,3% das jovens e 3,8% dos jovens referiram “transar” com pessoas do mesmo sexo ou com ambos os sexos. Entre os 122 jovens que namoravam ou ficavam com pessoas do mesmo sexo, 61,5% tinham relação sexual com seus parceiros.

Cerca de 12,6% dos adolescentes com comportamentos homo/bissexuais vivenciavam o risco de terem doenças sexualmente transmissíveis ou de ocorrer gravidez dentre os que poucas vezes utilizaram camisinha quando “transavam”; 38,7% dos que nunca utilizaram preservativos (17,8% e 8,0% daqueles com comportamento heterossexual, respectivamente) estiveram em situação de maior vulnerabilidade ( Tabela ).

Tabela
Frequência dos fatores de risco informados pelos adolescentes escolares, segundo o comportamento sexual em capitais brasileiras, 2007-2008. (N = 3.195)

Dos adolescentes com comportamento homo/bissexual, 18,7% relataram ficar de “porre” muitas vezes e 54,6%, poucas vezes. No grupo com comportamento heterossexual, 10,5% ficavam de “porre” muitas vezes e 29,4%, poucas vezes.

Outras situações de risco mais relatadas pelos entrevistados com comportamento homo/bissexual foram: maior uso de maconha, ideação suicida em decorrência de dificuldades no namoro ou no “ficar” (42,5%, comparado a 18,7% no grupo com comportamento heterossexual) e ter sido vítima de violência sexual (11,7%, em comparação a 1,5% entre os com comportamento heterossexual) ( Tabela ).

A Figura 1 apresenta os resultados da análise de correspondência múltipla. Observa-se que o grupo no quadrante superior direito (Grupo 2 tem como características o uso pouco frequente de camisinha (Cam1) e de maconha (Mac1) e “porres” muitos frequentes (Por2). Não houve especificidade com nenhum tipo de comportamento sexual nesse grupo, que reuniu comportamentos de risco relacionados à sexualidade e ao uso de substâncias.

Figura 1
Relações entre as categorias das variáveis de risco e comportamento sexual, apresentadas na análise de correspondência múltipla em capitais brasileiras, 2007-2008.

Na mesma figura pode-se visualizar o Grupo 1, situado próximo ao encontro dos eixos, indicando que adolescentes que tendem ao comportamento heterossexual no namoro ou ficar e evitar riscos sempre/muitas vezes usavam camisinha (Cam2), nunca/poucas vezes ficavam de “porre” (Por0 e Por1) e nunca usaram maconha (Mac0). Não houve ideação suicida e de violência sexual prévia (Ide0).

O Grupo 3 esteve situado no quadrante inferior direito da Figura 1 , agregando adolescentes com comportamento homossexual ou bissexual (Homo), que usavam maconha muitas vezes (Mac2) e que nunca usavam camisinha quando “transavam” (Cam0); apresentavam ideação suicida decorrente da relação afetivo sexual (Ide1) e história de violência sexual (Vio1).

A Figura 2 apresenta a análise de cluster, que ratifica os observados na Figura 1 : agregou o Grupo 3 de adolescentes com comportamento homo/bissexual e muitos fatores de risco (sofrer violência sexual, nunca utilizar camisinha ao transar, ideação suicida, uso frequente de maconha); o Grupo 2 reuniu usuários ocasionais de maconha e camisinha e frequentes “porres”; o Grupo 1 agregou adolescentes com comportamento heterossexual e ausência dos fatores de risco investigados.

Figura 2
Grupos por análise de cluster empregando as categorias das variáveis analisadas na Análise de Correspondência Múltipla11 em capitais brasileiras, 2007-2008.

Mais adolescentes com prática homossexual e bissexual aproveitaram as respostas livres para expor suas ideias sobre algo que considerasse importante sobre si e sua vida (35,3%) do que os com comportamento heterossexual (20,9%; p = 0,034).

As vivências pessoais positivas foram mencionadas por 9,7% dos entrevistados. Cerca de 26,5% dos adolescentes com comportamento homo e bissexual exprimiram suas vivências ( versus 9,9% dos com comportamento heterossexual; p = 0,007). As jovens expressaram melhor essas vivências (12,4%) do que os jovens (7,1%; p = 0,001). Os comentários referiram-se principalmente a depoimentos que apontavam para atitude positiva em relação à vida e a si próprio:

“O que eu mais acho importante em mim é o meu modo de agir e pensar sobre a vida. Minha vida é maravilhosa” (menina/Hete);

“Sou uma pessoa ‘amiga’, tento ajudar meus amigos da maneira que posso” (menina/Homo) e

“Eu acho importante em mim a minha inteligência e meu carisma para ver o lado bom e o ruim das coisas” (rapaz/Homo).

As vivências pessoais negativas foram menos mencionadas (0,8%). Foram especialmente comentadas por aqueles que relataram vivenciar fatores de risco (1,4% contra 0,2% dos que não vivenciavam essas situações (p = 0,004). Os comentários mais recorrentes referiram-se a indefinições sobre a sexualidade e sobre a vida em geral:

“Minha vida é um labirinto sem saída” (rapaz/Hete);

“Minha clareza psicológica com relação à minha sexualidade é muito confusa” (rapaz/Homo) e

“Estou no momento muito confuso, sobre como agir com a pessoa que gosto e confusa em quase tudo” (menina/Homo).

Os relacionamentos positivos foram mencionados por 7,9% dos jovens. Entre os que não relataram vivenciar fatores de risco o percentual foi de 10,6% versus 7,1% dos que conviviam com esses fatores (p = 0,025). A aceitação e o respeito por parte da família e dos amigos foi o ponto mais destacado como positivo em um relacionamento:

“Acho minha vida tranquila, tanto com meus pais, meu irmão e meu namorado, não temos problemas, pois sempre há diálogo” (menina/Hete);

“Nunca ocorreram agressões comigo nem com parceiras e parceiros. acho que tudo pode se resolver com conversa” (menina/Homo) e

“Sou homossexual e as pessoas a minha volta me respeitam” (rapaz/Homo).

Os relacionamentos negativos foram mencionados por 2,2% dos adolescentes, porém 14,5% daqueles com comportamento homo ou bissexuais o mencionaram em contraste com os heterossexuais (2,0%; p = 0,002). A falta de diálogo. a não aceitação (adolescentes independente de comportamento sexual) e o preconceito (mais presente nos relacionamentos interpessoais dos adolescentes com comportamento homo/bissexuais) foram os aspectos mais destacados:

“Acho que falta um pouco mais de conversa com meu pai, ele é muito fechado e não há muito diálogo com ele sobre mim. Eu sou ‘rebelde’, às vezes. Ele não gosta do meu jeito de ser ou agir” (menina/Hete) e

“Uma coisa queria deixar explícito, o que mais sofro é preconceito. É muito difícil a relação de pessoas do mesmo sexo, complica muito, nos deixando ao ponto de querer cometer loucuras, e o preconceito sexual na escola é muito frequente” (rapaz/Homo).

A religiosidade foi mencionada por 2,0% dos adolescentes, dentre os quais 5,4% não vivenciavam fatores de risco (em comparação aos 1,2% que conviviam com esses fatores; p = 0,010), e 3,3% apresentavam comportamento heterossexual (em comparação aos 0,3% com comportamento homo ou bissexual; p = 0,002):

“Acho importante servir a Deus. Em meio a tantos problemas que hoje encontramos no mundo. Deus é a única solução” (rapaz/Hete) e

“Minha vida é feliz porque eu tenho Jesus com meu senhor e salvador. Tenho uma vida nova e diferente” (rapaz/Homo).

Os fatores de risco foram descritos por 0,8% dos entrevistados, sem distinção de sexo, comportamento sexual ou exposição aos fatores de risco estudados. Foram mais mencionados: abuso sexual, uso de bebida alcoólica, cigarro e drogas, tráfico de drogas, sofrimento com o término de relacionamentos afetivo-sexuais, convivência com pessoas que usam arma de fogo, depressão, bulimia, sofrimento físico e envolvimento em situações de violência:

“Bebo e fumo para desparecer” (rapaz/Hete) e

“Minha adolescência foi complicada, passei pela depressão, clínica (internação), abuso sexual e a integração a cigarro e drogas” (menina/Homo).

DISCUSSÃO

O percentual de adolescentes com comportamento homossexuais/bissexuais (3,0%) aproxima-se ao de estudo populacional brasileiro ddBerquó E, Loyola MA, Pinho MDG, Ferreira MP, Correa M, Souza MR, et al. Comportamento sexual da população brasileira e percepções do HIV/AIDS. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2000 [citado 2011 jan 01]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/168comporamento.pdf que concluiu que 2,5% entre homens e mulheres de 15 a 49 anos tiveram relações sexuais nos últimos cinco anos com parceiro do mesmo sexo ou com ambos os sexos.

Os adolescentes que namoraram ou tiveram relações sexuais homossexuais e bissexuais expõem-se mais a fatores de risco à saúde do que aqueles que comportamento heterossexual, apontando para possíveis comprometimentos à sua saúde, aspecto referendado em outros estudos. 1717 Ortiz-Hernández L, Tello BL, Valdés J. The association of sexual orientation with self-rated health, and cigarette and alcohol use in Mexican adolescents and youths. Soc Sci Med. 2009;69(1):85-93. DOI:10.1016/j.socscimed.2009.03.028
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, 1919 Robin L, Brener ND, Donahue SF, Hack T, Hale K, Goodenow C. Associations between health risk behaviors and opposite, same, and both-sex sexual partners in representative samples of Vermont and Massachusetts high school students. Arch Pediatr Adolesc Med. 2002;156(4):349-55. DOI:10.1001/archpedi.156.4.349
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Em geral, as pesquisas sobre o tema não tratam o assunto na lógica da causalidade e sim focalizam se há ou não associação entre fatores e tipos de comportamento sexual.

Pesquisa apresentada pelo Ministério da Saúde eeMinistério da Saúde. Uso de preservativos é menos entre homossexuais. Brasília (DF); 2004 [citado 2011 jan 18]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/noticia/uso-de-preservativos-e-menor-entre-homossexuais com 40 mil jovens de 18 anos alistados no serviço militar mostrou que os homossexuais apresentaram os menores índices de uso de preservativo e de práticas de sexo seguro. O índice de comportamento sexual de risco detectado entre esses jovens em todo o País foi 0,9, enquanto a média salta para 1,6 entre os homossexuais. Duas possíveis explicações para tal achado são: perda do sentimento de vulnerabilidade e pouca ênfase nas campanhas dirigidas para os homossexuais, sugerindo existir desinformação sobre o tema.

Comparados às mulheres, os homens – heterossexuais e homossexuais – associam mais o uso de álcool com a prática de sexo sem preservativo. 3Cardoso LRD, Malbergier A, Figueiredo TFB. O consumo de álcool como fator de risco para a transmissão das DSTs/HIV/Aids. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(Suppl 1):70-5. DOI:10.1590/S0101-60832008000700015
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Além disso, homens que fazem sexo com outros homens se associam mais frequentemente a práticas sexuais desprotegidas e com uso de álcool e outras drogas, comparados aos heterossexuais. Mulheres homossexuais apresentam risco elevado para o uso de álcool. 1313 Hughesa TL, Johnsonb TP, Wilsnackc SC, Szalachad LA. Childhood risk factors for alcohol abuse and psychological distress among adult lesbians. Child Abuse Negl. 2007;31(7):769-89. DOI:10.1016/j.chiabu.2006.12.014
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Dados a esse respeito para a fase da adolescência são pouco conhecidos. De modo geral, os dados apresentados indicam a naturalidade do consumo de álcool entre jovens.

Outra associação recorrente é entre homossexuais e risco maior de suicídio. Comparados aos heterossexuais, gays são mais relacionados a comportamento suicida. 5Evans E, Hawton K, Rodham KC, Deeks J. The prevalence of suicidal phenomena in adolescents: a systematic review of population-based studies. Life Threat Behav. 2005;35(3):239-50. DOI:10.1521/suli.2005.35.3.239
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, 1414 Meyer IH. Prejudice, social stress, and mental health in lesbian, gay, and bisexual populations: conceptual issues and research evidence. Psychol Bull. 2003;129(5):674-97. DOI:10.1037/0033-2909.129.5.674
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, 2121 Sandfort TGM, Graaf R, Bijl RV, Schnabel P. Sexual orientation and psychiatric disorders: findings from the Netherlands Mental Health Survey and Incidence Study. Arch Gen Psychiatry. 2001;50(1):85-91. DOI:10.1001/archpsyc.58.1.85
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Estudo de Evans et al 5Evans E, Hawton K, Rodham KC, Deeks J. The prevalence of suicidal phenomena in adolescents: a systematic review of population-based studies. Life Threat Behav. 2005;35(3):239-50. DOI:10.1521/suli.2005.35.3.239
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concluíram que adolescentes gays e bissexuais tinham de duas a sete vezes mais probabilidade de pensar em se matar do que heterossexuais.

A aferição de tipos de comportamento sexual realizada neste artigo, “ter ficado ou namorado com pessoas do sexo oposto ou de ambos os sexos”, aponta atos passados dos adolescentes. A adolescência é um período em que as relações afetivo-sexuais estão se consolidando, por isso a opção de não se utilizar a categoria de orientação sexual que pode sugerir identidades consolidadas. Berquó et al, ccPessoa DGC, Nascimento Silva PLD. Análise de Dados Amostrais Complexos. São Paulo: Associação Brasileira de Estatística; 1998. ao procurarem saber se a orientação sexual de indivíduos de ambos os sexos de 16 a 65 anos foi sempre a mesma nos últimos cinco anos, encontraram que 3,9% dos homens e 3,5% das mulheres mudaram de orientação.

Adolescentes com comportamento homo/bissexual expressaram-se com maior frequência nas respostas livres do que os heterossexuais. Descreveram mais vivências pessoais positivas e relacionamentos negativos do que seus pares heterossexuais, contudo se referiram menos sobre religiosidade. Por não terem muita oportunidade de falar sobre si sem serem discriminados, podem ter aproveitado o espaço aberto para se expressarem. Implícita ou explicitamente aos depoimentos dos adolescentes, há desqualificação do relacionamento sexual que ocorre entre pessoas do mesmo sexo. Isso se observa principalmente nos comentários que os adolescentes com comportamento homo/bissexual fazem sobre as dificuldades nas relações com colegas e família pela não aceitação do seu comportamento sexual.

Os fatores de riscos à saúde dos adolescentes com comportamentos homossexuais e bissexuais podem ser mais bem compreendidos a partir do imaginário social, que desqualifica suas relações afetivo-sexuais por não terem comportamentos exclusivamente heterossexuais. As histórias de violência sexual contribuem para esse entendimento.

Frente a esse cenário, os adolescentes com comportamentos homo/bissexuais podem não só consumir mais álcool como também idealizar o suicídio. A não proteção por meio do uso de preservativo igualmente pode ser potencializada a partir da internalização da desqualificação de sua sexualidade, que induz a pensar que nada têm a perder mais do que já perderam ou vivem continuamente perdendo. Apesar disso, relatam mais vivências positivas do que os adolescentes com comportamento heterossexual. Esse contraponto pode ser compreendido por relatarem mais relacionamentos negativos do que aqueles que mencionam comportamento heterossexual. Tais adolescentes parecem se expor mais a riscos não tanto pela não aceitação de seus comportamentos homossexual ou bissexual, mas pela mais difícil aceitação desses comportamentos por parte de seus familiares e colegas. Algumas limitações nos estudos sobre comportamento sexual na adolescência em âmbito nacional e internacional são destacadas, havendo precariedade de estudos em fases da vida mais precoces. 9Goldfried MR, Bell AC. Extending the boundaries of research on adolescent development. J Clin Child Adolesc Psychol. 2003;32(4):531-5. DOI:10.1207/S15374424JCCP3204_5
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A maior parte dos estudos é realizada com adultos jovens, obtendo dados retrospectivos. Há mais estudos que abordam o sexo masculino. Faz-se necessário compreender melhor as distinções existentes entre dimensões masculinas e femininas relacionadas à homo/bissexualidade.

Neste artigo, ressalta-se a limitação de ser um estudo seccional, que retrata dados de apenas dez capitais brasileiras e que está restrito a adolescentes que estão na escola. Dadas as limitações da análise estatística empregada que não permitem a extrapolação dos resultados para outras realidades, os dados aqui apresentados devem ser interpretados para os 3.195 adolescentes das redes públicas e particulares de ensino das capitais escolhidas.

O comportamento homo/bissexual associa-se mais aos fatores de risco à saúde investigados do que o comportamento heterossexual entre os adolescentes escolares. A discussão acerca do tema em questão deve ser mais desenvolvida em futuros estudos e devem ser ampliadas as ações preventivas voltadas para os adolescentes com relações afetivo-sexuais homo/bissexuais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2014

Histórico

  • Recebido
    13 Nov 2012
  • Aceito
    30 Set 2013
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br