Versão brasileira do Quality of Care Scale: qualidade de cuidado na perspectiva de pessoas com incapacidades

Juliana Bredemeier Marilyn Agranonik Tatiana Spalding Perez Marcelo Pio de Almeida Fleck Sobre os autores

Resumo

OBJETIVO

Analisar as evidências de validade e fidedignidade da versão para o português brasileiro da Quality of Care Scale na perspectiva de pessoas com incapacidades físicas e intelectuais.

MÉTODOS

Participaram do estudo 162 pessoas com incapacidades físicas e 156 com incapacidades intelectuais em Porto Alegre e região metropolitana, 2008. A psicometria clássica foi utilizada para analisar as duas amostras independentemente. As hipóteses para evidências de validade de critério do tipo concorrente foram avaliadas com teste de Mann-Whitney. A análise de componentes principais foi utilizada para exploração dos modelos fatoriais. Evidências de fidedignidade foram calculadas com α de Cronbach para escalas e subescalas. A fidedignidade teste-reteste para pessoas com incapacidades intelectuais foi analisada pelo coeficiente de correlação intraclasse e teste de Willcoxon.

RESULTADOS

Os componentes principais no grupo de pessoas com incapacidades físicas replicou o modelo original apresentado em solução aos dados internacionais do projeto. Foram encontradas evidências de validade discriminante e de fidedignidade teste-reteste.

CONCLUSÕES

O modelo fatorial transcultural encontrado na amostra internacional do projeto parece adequado para as amostras testadas neste estudo, especialmente a de incapacidades físicas. Depressão, dor, satisfação com a vida e incapacidade parecem ter papel mediador na avaliação da qualidade de cuidado. Pesquisas adicionais são necessárias para o acréscimo de evidências às validades dos instrumentos.

Pessoas com Deficiência; Saúde da Pessoa com Deficiência; Qualidade da Assistência à Saúde; Escalas; Estudos de Validação


INTRODUÇÃO

A preocupação com a qualidade do cuidado ofertado em saúde origina-se na relação entre esse construto e a expectativa e a qualidade de vida.1818  World Health Organization. Quality of care: a process for making strategic choices in health systems. Geneva; 2006. A Organização Mundial da Saúde (OMS) entende que a qualidade em um sistema de saúde pressupõe preocupação constante com seis dimensões fundamentais: eficácia (preocupação com demandas reais), eficiência (maximização de recursos e redução de desperdícios), aceitação (ser centrada no paciente, considerando preferências e aspirações culturais de cada comunidade), acessibilidade, igualdade e segurança.1818  World Health Organization. Quality of care: a process for making strategic choices in health systems. Geneva; 2006. Qualidade de cuidado (QC) implica aplicação das dimensões de qualidade em saúde à oferta de atenção e bem-estar e torna possível sua constatação a partir de perspectivas avaliativas.1818  World Health Organization. Quality of care: a process for making strategic choices in health systems. Geneva; 2006.

Estima-se que mais de um bilhão de pessoas no mundo vivam com incapacidades, das quais aproximadamente 200 milhões apresentam dificuldades de funcionalidade consideráveis.1919  World Health Organization. World report on disability. Malta; 2011. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU),aa United Nations, Department of Economic and Social Affairs, Division for Social Policy and Development. The United Nations and disabled persons: the first fifty years. New York; 2003-2004 [citado 2013 jul 4]. Disponível em: http://www.un.org/esa/socdev/enable/dis50y01.htm 2/3 das pessoas com incapacidade vivem em países emergentes. Esse número ascende continuamente com o crescimento populacional, guerras e outras formas de violência, atendimento médico inadequado, acidentes e aumento da expectativa de vida. Segundo a ONU, 3,9% das pessoas possuíam deficiências no Brasil em 2010, o que representava 23,9% da população geral no período.bb Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010: características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE; 2012. Considerando as pessoas afetadas indiretamente pela incapacidade de alguém próximo, mais da metade da população mundial está afetada por questões envolvendo esse problema.aa United Nations, Department of Economic and Social Affairs, Division for Social Policy and Development. The United Nations and disabled persons: the first fifty years. New York; 2003-2004 [citado 2013 jul 4]. Disponível em: http://www.un.org/esa/socdev/enable/dis50y01.htm Assim, estudos sobre a QC recebido por pessoas com incapacidades tornam-se importantes para a saúde pública.

A avaliação da QC no âmbito da saúde é de extrema importância e deve ser realizada de forma séria e cuidadosa para evitar o levantamento de evidências pouco fidedignas. Além disso, a avaliação da QC deve considerar que o conceito é dinâmico e influenciado pelas interações entre usuários e provedores.5 Eser E, Green A, Hao Y, Kullman L, Lucas-Carrasco R, McPherson KM, et al. The Quality of Care and Support (QOCS) for people with disability scale: development and psychometric properties. Res Dev Disabil. 2011;32(3):1212-25. DOI:10.1016/j.ridd.2010.12.030,6 Fadyl JK, Kayes NM, McPherson KM. Perspectives on quality of care for people who experience disability. BMJ Qual Saf. 2011;20(1):87-95. DOI:10.1136/bmjqs.2010.042812,1010  Mattevi BS, Bredemeier J, Fam C, Fleck MP. Quality of care, quality of life, and attitudes toward disabilities: perspectives from a qualitative focus group study in Porto Alegre, Brazil. Rev Panam Salud Publica. 2012;31(3):188-96. DOI:10.1590/S1020-49892012000300002 Pesquisas voltam-se para a utilização e o acesso aos serviços de saúde,8 Lawthers AG, Pransky GS, Peterson LE, Himmelstein JH. Rethinking quality in the context of persons with disability. Int J Qual Health Care. 2003;15(4):287-99. DOI:10.1093/intqhc/mzg048,9 Machado JP, Martins ACM, Martins MS. Avaliação da qualidade do cuidado hospitalar do Brasil: uma revisão sistemática. Cad Saude Publica. 2013;29(6):1063-82. DOI:10.1590/S0102-311X2013000600004,1010  Mattevi BS, Bredemeier J, Fam C, Fleck MP. Quality of care, quality of life, and attitudes toward disabilities: perspectives from a qualitative focus group study in Porto Alegre, Brazil. Rev Panam Salud Publica. 2012;31(3):188-96. DOI:10.1590/S1020-49892012000300002 para a segurança do paciente1414  Reis CT, Martins M, Laguardia J. A segurança do paciente como dimensão da qualidade do cuidado de saúde: um olhar sobre a literatura. Cienc Saude Coletiva. 2013;18(7):2029-36. DOI:10.1590/S1413-81232013000700018 e para a avaliação da QC em doenças específicas.1515  Rolim CLRC, Martins M. Qualidade do cuidado ao acidente vascular cerebral isquêmico no SUS. Cad Saude Publica. 2011;27(11):2106-16. DOI:10.1590/S0102-311X2011001100004 Poucas pesquisas exploram a perspectiva das pessoas com incapacidade sobre os elementos importantes para a QC.6 Fadyl JK, Kayes NM, McPherson KM. Perspectives on quality of care for people who experience disability. BMJ Qual Saf. 2011;20(1):87-95. DOI:10.1136/bmjqs.2010.042812,8 Lawthers AG, Pransky GS, Peterson LE, Himmelstein JH. Rethinking quality in the context of persons with disability. Int J Qual Health Care. 2003;15(4):287-99. DOI:10.1093/intqhc/mzg048

O presente estudo teve por objetivo analisar a validade e fidedignidade da Quality of Care Scale, uma escala de medida da QC na perspectiva de pessoas com incapacidades físicas e intelectuais, desenvolvida no idioma português do Brasil.

MÉTODOS

O presente estudo é uma etapa do Projeto DISQOL,5 Eser E, Green A, Hao Y, Kullman L, Lucas-Carrasco R, McPherson KM, et al. The Quality of Care and Support (QOCS) for people with disability scale: development and psychometric properties. Res Dev Disabil. 2011;32(3):1212-25. DOI:10.1016/j.ridd.2010.12.030 coordenado pelo Grupo de Qualidade de Vida da OMS (Grupo WHOQOL), cujo objetivo foi desenvolver três instrumentos de avaliação para pessoas com incapacidades: (1) qualidade de vida; (2) qualidade de cuidado e (3) atitudes perante incapacidades. À exploração do conceito mediante grupos focais com pessoas com incapacidades, familiares, profissionais e cuidadores1010  Mattevi BS, Bredemeier J, Fam C, Fleck MP. Quality of care, quality of life, and attitudes toward disabilities: perspectives from a qualitative focus group study in Porto Alegre, Brazil. Rev Panam Salud Publica. 2012;31(3):188-96. DOI:10.1590/S1020-49892012000300002 seguiram-se o estudo piloto e o teste de campo, que consolidaram os resultados dos 16 centros participantes do projeto.5 Eser E, Green A, Hao Y, Kullman L, Lucas-Carrasco R, McPherson KM, et al. The Quality of Care and Support (QOCS) for people with disability scale: development and psychometric properties. Res Dev Disabil. 2011;32(3):1212-25. DOI:10.1016/j.ridd.2010.12.030

Foram incluídos neste estudo 320 indivíduos entre 18 e 65 anos que possuíam incapacidade física ou intelectual há pelo menos dois anos, frequentando ou internados em: instituição de atendimento de pessoas com incapacidades, organização não governamental e escola ou serviço de saúde em Porto Alegre e região metropolitana. No caso das pessoas com incapacidades físicas, a incapacidade deveria ser autodeclarada, mediante resposta positiva à pergunta: “Você tem uma deficiência?” ou a, pelo menos, uma de duas perguntas adicionais: “Sua doença crônica lhe causa alguma limitação nas suas atividades diárias?” ou “Sua doença crônica lhe causa alguma restrição na convivência com as outras pessoas (na participação social)?”. Essas perguntas foram incluídas para respeitar a definição de incapacidade da Classificação Internacional de Incapacidade, Funcionalidade e Saúde (CIF) publicada pela OMS.cc Organização Mundial da Saúde. Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF. 2003. Original publicado em 2001. Foi critério de exclusão das pessoas com incapacidade intelectual a reprovação em pelo menos um dos dois testes utilizados em rastreamento pré-entrevista: o Teste de Aquiescência (adaptado de Cumminsdd Cummins RA. Comprehensive Quality of Life Scale – Intellectual/Cognitive Disability. 5.ed. (Com Qol-I5). Melbourne: Deakin University School of Psychology; 1997.), que identifica tendência a concordar, e o Teste de Competência Discriminativa (adaptado de Dalton3 Dalton AJ, McVilly KR. Ethics guidelines for international multicenter research involving people with intellectual disabilities. J Policy Pract Intellect Disabil. 2004;1(2):57-70. DOI:10.1111/j.1741-1130.2004.04010.x), que objetiva avaliar competência para discriminar escolhas numa escala de três pontos.7 Fang J, Fleck MPA, Green A, McVilly K, Hao Y, Tan W, et al. The response scale for the intellectual disability module of the WHOQOL: 5-point or 3-point? J Intellect Disabil Res. 2011;55(6):537-49. DOI:10.1111/j.1365-2788.2011.01401.x A amostra foi obtida por conveniência. O grupo WHOQOL estipula um número de participantes por centro baseado em uma larga experiência em estudos dessa natureza. É difícil basear-se em literatura ou cálculos de tamanho de amostra convencionais pela transculturalidade, simultaneidade e originalidade do estudo. Assim, estipulou-se a meta de 150 pessoas com incapacidades físicas e de 150 pessoas com incapacidades intelectuais para cada centro participante.5 Eser E, Green A, Hao Y, Kullman L, Lucas-Carrasco R, McPherson KM, et al. The Quality of Care and Support (QOCS) for people with disability scale: development and psychometric properties. Res Dev Disabil. 2011;32(3):1212-25. DOI:10.1016/j.ridd.2010.12.030

Os indivíduos responderam aos seguintes instrumentos:

  • Whodas II: medida de incapacidade desenvolvida pela OMS1717  World Health Organization. WHODAS-II Disability Assessment Schedule: training manual: a guide to administration. Geneva; 2000. (2000) de acordo com os conceitos da CIF. α de Cronbach: 0,98.

  • Questionário sociodemográfico: perguntas de caráter socioeconômico e sobre a percepção do participante sobre sua condição de saúde e sua incapacidade.

  • Quality of Care Scale – Physical Disabilities (QOCS-D): instrumento de avaliação da QC para pessoas com incapacidades físicas1919  World Health Organization. World report on disability. Malta; 2011. (Anexo). Compuseram o instrumento 17 itens desenvolvidos a partir do material gerado pelos grupos focais internacionais. Foram adicionados dois itens (18 e 19; Anexo) a essa proposta transcultural, inseridos após análise do material gerado nos grupos focais locais.

  • Quality of Care Scale – Intelectual Disabilities (QOCS-ID): instrumento de avaliação da qualidade de cuidado para pessoas com incapacidade intelectual.1919  World Health Organization. World report on disability. Malta; 2011. Idêntico ao QOCS-D (incluindo as perguntas locais), mas com variação na escala de respostas, que nessa versão é de três pontos e apresenta imagens gráficas (“smile”) introduzidas para facilitar a compreensão dos respondentes.

  • Escala de Satisfação com a Vida:4 Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with life scale. J Pers Assess. 1985;49(1);71-5. DOI:10.1207/s15327752jpa4901_13,ee Hutz CS, Giacomoni CH. Adaptação da Escala de Satisfação de Diener para o Brasil. Porto Alegre: UFRGS, 1998. Manuscrito. escala de cinco itens. Quanto maior o escore, maior a satisfação com a vida. α de Cronbach: 0,82.4 Diener E, Emmons RA, Larsen RJ, Griffin S. The satisfaction with life scale. J Pers Assess. 1985;49(1);71-5. DOI:10.1207/s15327752jpa4901_13

  • Escala Beck para Depressão – versão II (BDI-II):ff Beck AT, Steer RA, Brown GK. Manual for the Beck Depression Inventory-II. San Antonio, TX: Psychological Corporation; 1996. versão de 21 itens, traduzida e validada para o português brasileiro para avaliação da depressão. α de Cronbach: 0,92.gg Gorenstein C, Pang WY, Argimon IL, Werlang BSG. Manual do Inventário de Depressão de Beck – BDI II: adaptação brasileira. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2012.

Foi realizado reteste apenas com a amostra de pessoas com incapacidades intelectuais por questões de cunho logístico.

As análises foram realizadas independentemente para as duas amostras e seguiram os princípios da psicometria clássica. A normalidade das distribuições foi avaliada com testes de Shapiro-Wilk e Kolmogorov-Smirnov. Os resultados mostraram distribuições exclusivamente não normais, o que resultou na escolha de testes não paramétricos. Intervalos de confiança foram estipulados em 95%. Dados ausentes foram preenchidos pela mediana dos pontos adjacentes, que calcula a mediana dos pontos distribuídos acima e abaixo dos resultados do participante na tabulação dos dados.1 Çokluk Ö, Kayri M. The effects of methods of imputation for missing values on the validity and reliability of scales. Educ Sci Theory Pract. 2011;11(1):303-9. Análises fatoriais foram realizadas com avaliação de componentes principais e rotação Varimax com normalização de Kaiser.

As hipóteses para evidências de validade de critério (no caso, discriminante) foram avaliadas com teste de Mann-Whitney para as variáveis: depressão, satisfação com a vida, incapacidade, status de saúde, status de incapacidade, idade, renda e, no caso da amostra de pessoas com incapacidades físicas, escolaridade. A análise da validade de critério tem o intuito de predizer o desempenho de determinado grupo de indivíduos. Na validade de critério do tipo discriminante, procura-se avaliar a medida que o instrumento em desenvolvimento correlaciona-se significativamente com as variáveis com que teoricamente deveria se correlacionar – e vice-versa.1212  Pasquali L. Psicometria: teoria dos testes na psicologia e na educação. Petrópolis: Vozes; 2003. A fidedignidade (análise que se refere a quanto o escore gerado pelo novo instrumento aproxima-se de seu escore verdadeiro nesse construto)1212  Pasquali L. Psicometria: teoria dos testes na psicologia e na educação. Petrópolis: Vozes; 2003. foi calculada pelo α de Cronbach para escalas e subescalas (nas duas amostras) e por meio de medida teste-reteste (apenas nas pessoas com incapacidades intelectuais). Neste caso, o cálculo foi feito pelo coeficiente de correlação intraclasse (ICC, average measures, two-way-random) e teste de Willcoxon para amostras pareadas a partir das médias dos domínios. Utilizou-se o pacote estatístico SPSS para WindowsTM versão 18.0.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) (Processo 06-020). O termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) enfatizou a possibilidade de desistência a qualquer momento do estudo. Solicitou-se a assinatura do TCLE por um dos pais ou responsável legal para a participação de pessoas com incapacidades intelectuais. Ao candidato excluído do estudo, no caso de pessoas com incapacidades intelectuais, não foi comunicado o motivo (fracasso nos testes de rastreamento). Um protocolo de ação foi desenvolvido para os casos de depressão moderada a grave e para os casos com resposta 2 ou 3 para ideação suicida (pergunta 9 do BDI-II). O protocolo envolveu desde a notificação do participante para a necessidade de avaliação para depressão até a notificação da equipe de atendimento nos casos de ideação suicida positiva. A pesquisa foi conduzida dentro dos padrões determinados pela Declaração de Helsinki,hh World Medical Association. Declaration of Helsinki: ethical principles for medical research involving human subjects: updated version – 2008 [citado 2011 jan 23]. Disponível em: http://www.wma.net/ garantidos o anonimato e a confidencialidade.

RESULTADOS

Um total de 162 pessoas com incapacidades físicas (98 mulheres, 60,5%) e de 156 pessoas com incapacidades intelectuais (55 mulheres, 35,2%) da região metropolitana de Porto Alegre participaram da pesquisa em 2008. A média de idade ficou em 45,5 anos para incapacidades físicas (DP = 12,3) e de 30,5 para incapacidades intelectuais (DP = 9,4). O grupo de pessoas com incapacidades físicas era composto por condições de saúde variadas. As mais comuns eram deficiência visual (15,4%), deficiência auditiva (6,8%) e sequela de acidente vascular cerebral (2,5%). As taxas de dados ausentes para os grupos ficaram em 0,1% para pessoas com incapacidades físicas e em 0,7% para as pessoas com incapacidades intelectuais, e dois sujeitos foram responsáveis por 58,0% dos dados ausentes no segundo grupo. Os dados ausentes foram igualmente distribuídos no grupo de pessoas com incapacidades físicas e não houve ocorrência de mais do que um dado ausente para a mesma questão. A taxa de dados ausentes mais alta (1,9%) foi observada no item 9 (“Eu alcanço mais coisas por causa da minha incapacidade”) para pessoas com incapacidades intelectuais.

As análises de consistência interna apresentaram α de Cronbach satisfatórios2 Cortina JM. What is coefficient alpha? An examination of theory and applications. J Appl Psychol. 1993;78(1):98-104. DOI:10.1037/0021-9010.78.1.98 para as escalas globais (0,866 e 0,74 para as versões para incapacidade física e intelectual, respectivamente) e para a maioria das subescalas, neste caso variando de 0,741 (fator Informação) a 0,847 (fator Atendimento das Necessidades), para a versão para incapacidade física, e de 0,604 (fator Acesso ao Cuidado em Saúde) a 0,708 (fator Atendimento das Necessidades), para a versão para incapacidade intelectual. A inclusão dos dois itens locais nas análises de consistência interna praticamente não alterou os resultados de α de Cronbach, resultando em 0,876 para a versão para incapacidade física e 0,75 para a versão para incapacidade intelectual.

A análise de componentes principais na amostra de pessoas com incapacidades físicas resultou num modelo de quatro fatores, como no estudo transcultural, com a manutenção da mesma distribuição de itens nos fatores e da mesma sequência de importância dos fatores (Tabela 1). Os dois itens locais agruparam-se em dupla num quinto fator. A análise de componentes principais resultou num modelo de seis fatores na amostra de pessoas com incapacidades intelectuais, com agrupamento de quatro dos itens do F1 (da distribuição original transcultural) num primeiro fator (Tabela 2). Forçando-se uma análise do modelo em quatro fatores, obteve-se um primeiro fator composto quase exclusivamente por itens do F1 original. Houve o agrupamento dos itens do F4 em um segundo fator. Os itens do F2 e do F3 mesclaram-se nos dois últimos fatores (Tabela 3). Os itens locais 18 e 19, quando incluídos, agruparam-se nos fatores cinco e seis, respectivamente, na análise exploratória, e nos fatores três e quatro em uma segunda análise baseada na quantidade de fatores obtida nas análises transculturais do Grupo WHOQOL.5 Eser E, Green A, Hao Y, Kullman L, Lucas-Carrasco R, McPherson KM, et al. The Quality of Care and Support (QOCS) for people with disability scale: development and psychometric properties. Res Dev Disabil. 2011;32(3):1212-25. DOI:10.1016/j.ridd.2010.12.030

Tabela 1
Análise fatorial exploratória: grupo de pessoas com incapacidade física. Porto Alegre, RS, 2012. (N = 160)
Tabela 2
Análise fatorial: grupo de pessoas com incapacidade intelectual. Porto Alegre, RS, 2012. (N = 156)
Tabela 3
Análise fatorial exploratória forçada em quatro fatores: grupo de pessoas com incapacidade intelectual Porto Alegre, 2012. (N = 156)

As análises para verificação da validade discriminante do QOCS-D no grupo de pessoas com incapacidades físicas mostraram ausência de diferença significativa entre grupos estratificados por necessidade de tratamento médico. Ano de estudo, status de saúde e status de incapacidade apresentaram diferença levemente significativa apenas no F2 (para incapacidades físicas, correspondente ao fator Informação). A idade apresentou diferença também levemente significativa nos grupos, mas apenas no F3 (para incapacidades físicas, correspondente ao fator Qualidade da Equipe) (Tabela 4). As análises para validade discriminante no grupo de pessoas com incapacidades intelectuais mostraram inexistência de diferenças significativas entre os grupos criados pelas variáveis idade, necessidade de tratamento médico e status de saúde. Houve diferença levemente significativa no F4 (Acesso ao Cuidado em Saúde) na estratificação de grupos pela variável status de incapacidade (Tabela 5).

Tabela 4
Validade discriminante do Quality of Care Scale (QOCS) para pessoas com incapacidade física. Porto Alegre, RS, 2012.
Tabela 5
Validade discriminante do Quality of Care Scale (QOCS) para pessoas com incapacidade intelectual. Porto Alegre, RS, 2012.

Dos 96 participantes com incapacidades intelectuais que realizaram o reteste, 27 foram excluídos por ocorrência de fato importante (positivo ou negativo) em suas vidas no intervalo da testagem. Esse dado foi obtido pela pergunta: “Ocorreu algum fato ou mudança importante na sua vida no último mês? (Por exemplo, você se separou de seu (sua) companheiro(a), ficou doente, algum familiar ou pessoa próxima a você faleceu, você perdeu o emprego, se casou...) (sim/não)”. O intervalo médio entre teste e reteste foi de 28 dias (13,58 DP). Foram encontradas diferenças significativas na análise com o coeficiente de correlação intraclasse (ICC) para todos os quatro fatores (p > 0,05). Ao mesmo tempo, não foram encontradas diferenças significativas no teste Wilcoxon para amostras pareadas. Ambas essas informações reforçam a hipótese de haver evidências de fidedignidade teste-reteste.

DISCUSSÃO

O resultado da análise de componentes principais no grupo de pessoas com incapacidades físicas replicou o modelo original apresentado em solução aos dados internacionais do projeto. Esse é um resultado importante, considerando que o objetivo inicial era o de desenvolver instrumento válido para uso em português do Brasil, mas também transcultural. Por outro lado, os agrupamentos apresentaram diferenças em relação ao modelo transcultural na amostra de pessoas com incapacidades intelectuais. A presença do fator “Acesso ao Cuidado em Saúde”, em segundo lugar no modelo forçado em quatro fatores, pode apontar para questões sociais relacionadas à dificuldade de acesso à saúde no Brasil.

A manutenção do F1 (“Atendimento de Necessidades”) na quase totalidade dos itens em todos os modelos testados aponta para uma definição da QC na perspectiva de pessoas com incapacidades. Essa definição é mais ampla do que as vinculadas exclusivamente à qualidade do atendimento em saúde. Isso fica claro quando se atenta para o conteúdo dos itens desse fator: apoio para atividades de lazer, para atividades sociais e para atividades de vida diária e padrões de atendimento – este último mais obviamente vinculado à qualidade. As atitudes dos profissionais da saúde influenciam a percepção da QC e podem ser facilmente trabalhadas com estratégias de intervenção comportamentais.1616  Satchidanand N, Gunukula SK, Lam WY, McGuigan D, New I, Symons AB, et al. Attitudes of healthcare students and professionals toward patients with physical disability: a systematic review. Am J Phys Med Rehabil. 2012;91(6):533-45. DOI:10.1097/PHM.0b013e3182555ea4

O modelo fatorial resultante para pessoas com incapacidades físicas reforça a manutenção do modelo transcultural. São necessárias mais pesquisas, com amostras maiores, para que se possa propor a refutação do modelo transcultural para pessoas com incapacidades intelectuais. As questões locais não contribuíram para a explicação do modelo como um todo, devendo ser tratadas como experimentais e independentes dos outros fatores, em novas investigações.

A análise entre grupos apontou para a existência de evidências de validade discriminante nos dois primeiros fatores do QOCS-D (F1, “Atendimento de Necessidades”, e F2, “Qualidade da Equipe”) para as variáveis renda, dor física, satisfação com a vida, incapacidade, necessidade de tratamento não atendida e depressão. Elementos como competência técnica dos serviços de cuidado e dos profissionais e aproximação humana no fornecimento do serviço foram anteriormente valorizados por pessoas com incapacidades como importantes para a qualidade da equipe de atendimento.6 Fadyl JK, Kayes NM, McPherson KM. Perspectives on quality of care for people who experience disability. BMJ Qual Saf. 2011;20(1):87-95. DOI:10.1136/bmjqs.2010.042812 Observaram-se evidências de validade discriminante nos outros dois fatores (F3, “Informação”, e F4, “Acesso ao Cuidado em Saúde”) sobre as variáveis necessidade de tratamento não atendida e depressão. Isso pode indicar a necessidade de controle para depressão e dor em avaliações de QC que podem atuar como variáveis confundidoras para a avaliação da qualidade. Houve evidências de validade discriminante entre os grupos a partir da variável renda para o F4, apontando para a percepção de maior dificuldade no acesso à saúde na perspectiva de pessoas com incapacidade física com menor renda neste estudo.

Evidências de validade discriminante foram observadas para todos os fatores apenas na variável necessidade de tratamento não atendida na versão QOCS-ID. Isso, somado ao observado no QOCS-D com relação a essa variável, sugere validade de construto do instrumento, especialmente se considerarmos os grupos estratificados pela variável como grupos-critério. O F1 (“Atendimento de Necessidades”) para o grupo de pessoas com incapacidades intelectuais mostrou diferenças significativas com base na depressão, satisfação com a vida e incapacidade. O F2 (“Informação”) gerou diferença altamente significativa e significativa para renda e para satisfação com a vida, respectivamente; o F3 (“Qualidade da Equipe”), para depressão, satisfação com a vida e incapacidade, e as diferenças foram altamente significativas nas duas últimas. O F4 (“Acesso ao Cuidado em Saúde”) gerou diferenças significativas nas variáveis dor física, depressão e incapacidade, e as diferenças foram altamente significativas na última. Isso sugere um papel mediador da percepção de incapacidade na avaliação da QC, o que deve ser mais bem investigado em pesquisas futuras. O fato de variáveis como renda, dor física, satisfação com a vida, incapacidade, necessidade de tratamento não atendida e depressão não apresentarem escores significativamente diferentes entre os grupos num instrumento de avaliação de QC não necessariamente indica falha do instrumento: pode significar a não importância dessas variáveis na determinação do desfecho.

A análise de fidedignidade teste-reteste, avaliada em pessoas com incapacidades intelectuais, mostrou nível altamente significativo de correlação intraclasse (ICC) para o F2 (“Informação”) e significativo para os outros fatores. Ao mesmo tempo, o teste Willcoxon não apontou a ocorrência de diferenças significativas entre as medidas intervalares. Isso confirma a hipótese da fidedignidade teste-reteste do instrumento e reforça a ideia da competência de pessoas com incapacidade intelectual leve a moderada para autorrelatar sua percepção a respeito de construtos abstratos. Essa competência vem sendo discutida na literatura.1313  Power MJ, Green AM; WHOQOL-DIS Group. The attitudes to Disability Scale (ADS): development and psychometric properties. J Intellect Disabil Res. 2010;54(9):860-74. DOI:10.1111/j.1365-2788.2010.01317.x

Os modelos de fatores encontrados nas amostras internacionais do projeto DISQOL apresentaram desempenho semelhante quando aplicados às amostras aqui relatadas, especialmente a física. Pesquisas adicionais são necessárias para que se acrescentem evidências às validades dos instrumentos QOCS-D e do QOCS-ID. Os autores sugerem que essas análises sejam realizadas com controle para depressão, dor, satisfação com a vida e incapacidade, variáveis que parecem ter papel mediador na avaliação da QC.

O presente estudo apresenta limitações decorrentes principalmente da coleta realizada por conveniência e dos tamanhos amostrais. Portanto, generalizações não devem ser feitas a partir dos resultados, e mais estudos de validade e de fidedignidade, com outras amostras e populações, são necessários para o QOCS-D e o QOCS-ID. Ao mesmo tempo, acredita-se que o QOCS-D e o QOCS-ID constituem ferramentas úteis no levantamento de informações sobre o cuidado oferecido às pessoas com incapacidades, podendo fornecer informações com o potencial de colaborar com o desenvolvimento de políticas públicas focadas no incremento da qualidade de cuidado e, consequentemente, do bem-estar.

ANEXO


Itens do Quality of Care Scale para pessoas com incapacidade física e intelectual. Porto Alegre, RS, 2008.

Referências bibliográficas

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  • Artigo baseado na tese de doutorado de Bredemeier J, intitulada: “Qualidade de vida, qualidade de cuidado e atitudes frente a incapacidades em pessoas com incapacidades físicas e intelectuais”, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas: Psiquiatria, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2014

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2013
  • Aceito
    10 Fev 2014
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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