Qual a importância da hesitação vacinal na queda das coberturas vacinais no Brasil?

Ana Paula Sayuri Sato Sobre o autor

RESUMO

O exitoso Programa Nacional de Imunizações do Brasil tem vivenciado grande desafio com relação às coberturas vacinais infantis, que têm apresentado queda. Diversos aspectos estão relacionados, mas certamente a hesitação vacinal vem se fortalecendo como uma das principais preocupações dos gestores e pesquisadores brasileiros. Hesitação vacinal é o atraso em aceitar ou a recusa das vacinas recomendadas quando elas estão disponíveis nos serviços de saúde, sendo um fenômeno que varia ao longo do tempo, do local e dos tipos de vacinas. Indivíduos hesitantes situam-se entre os dois polos de aceitação e recusa total da vacinação. A hesitação vacinal não é novidade em países europeus e norte-americanos e, mesmo no Brasil, ela já vem sendo estudada ainda que sob outra denominação. A queda das coberturas vacinais observadas a partir de 2016 reitera a relevância do tema, que deve ser mais bem compreendido por meio de investigações científicas.

DESCRITORES:
Programas de Imunização; Cobertura Vacinal; Recusa de Vacinação; Movimento contra Vacinação

INTRODUÇÃO

A erradicação da varíola e o controle de doenças imunopreveníveis foram possíveis em todo o mundo11. World Health Organization. Global Vaccine Action Plan 2011-2020. Geneva: WHO; 2013 [cited 2018 Sep 10]. Available from: http://www.who.int/immunization/global_vaccine_action_plan/GVAP_doc_2011_2020/en/
http://www.who.int/immunization/global_v...
33. Turner HC, Thwaites GE, Clapham HE. Vaccine-preventable diseases in lower-middle-income countries. Lancet Infect Dis. 2018;18(9):937-9. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(18)30478-X
https://doi.org/10.1016/S1473-3099(18)30...
em virtude da vacinação, por meio de programas de imunização bem-sucedidos. Iniciativas globais contribuíram substancialmente para o desenvolvimento desses programas em países de média e baixa renda. O Programa Ampliado de Imunização (PAI) da Organização Mundial da Saúde (OMS), estabelecido em 1974, promoveu o acesso à vacinação, indicado pelo aumento da cobertura da vacina difteria-tétano-coqueluche (DTP)44. Okwo-Bele JM, Cherian T. The expanded programme on immunization: a lasting legacy of smallpox eradication. Vaccine. 2011;29 Suppl 4:D74-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2012.01.080
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2012.0...
. O desafio passou a ser, então, a equidade do acesso às novas vacinas. Assim, a Global Alliance for Vaccines and Immunisation foi criada em 2000 com o objetivo de dar esse acesso a todos os estratos sociais em países de baixa renda11. World Health Organization. Global Vaccine Action Plan 2011-2020. Geneva: WHO; 2013 [cited 2018 Sep 10]. Available from: http://www.who.int/immunization/global_vaccine_action_plan/GVAP_doc_2011_2020/en/
http://www.who.int/immunization/global_v...
.

O Programa Nacional de Imunizações (PNI) brasileiro é reconhecido por promover a vacinação gratuita de mais de 15 imunógenos e está cada vez mais complexo, tanto pelo aumento do número de vacinas fornecidas quanto pela diversificação de esquemas vacinais55. Domingues CMAS, Teixeira AMS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22(1):9-27. https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000100002
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201300...
. Paradoxalmente, tal avanço traz consigo desafios inerentes à sua evolução, pois o controle das doenças devido às altas coberturas vacinais influencia a percepção dos riscos e benefícios para se vacinar66. Chen RT, Rastogi SC, Mullen JR, Hayes S, Cochi SL, Donlon JA, et al. The Vaccine Adverse Event Reporting System (VAERS). Vaccine 1994;12(6):542-50. https://doi.org/10.1016/0264-410X(94)90315-8
https://doi.org/10.1016/0264-410X(94)903...
.

Desde a década de 1990, as coberturas vacinais infantis estavam acima de 95%55. Domingues CMAS, Teixeira AMS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22(1):9-27. https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000100002
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201300...
, o que indica boa adesão da população à vacinação. No entanto, a partir de 2016, essas coberturas têm declinado cerca de 10 a 20 pontos percentuaisaaMinistério da Saúde (BR). Programa Nacional de Imunização. Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações - SIPNI. Brasília (DF); 2018 [citado 10 set 2018]. Disponível em: http://sipni.datasus.gov.br/si-pni-web/faces/inicio.jsf . Isso era inesperado e veio acompanhado do aumento da mortalidade infantil e maternabbMinistério da Saúde (BR), Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Informações de saúde (TABNET). Brasília (DF): 2018 [citado 10 set 2018]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php/ . As epidemias de sarampo em Roraima e no Amazonas são consequências imediatas da diminuição das coberturas vacinaisccMinistério da Saúde (BR). Sarampo: situação epidemiológica. Inf Epidemiol. 2018 [citado 10 set 2018];(20). Disponível em: http://portalms.saude.gov.br/saude-de-a-z/sarampo-situacao-epidemiologica .

Muitos fatores estão relacionados a essa queda, seja o enfraquecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) ou aspectos técnicos como a implantação do novo sistema de informação de imunização, sejam aspectos sociais e culturais que afetam a aceitação da vacinação55. Domingues CMAS, Teixeira AMS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22(1):9-27. https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000100002
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201300...
,77. Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica. 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
1010. Succi RCM. Vaccine refusal: what we need to know. J Pediatr (Rio J). 2018. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.008
https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.0...
.

Movimentos anti-vacinas são crescentes e fortalecidos pelo aumento de informações de saúde incorretas compartilhadas especialmente na internet1111. Dubé E, Vivion M, MacDonald NE. Vaccine hesitancy, vaccine refusal and the anti-vaccine movement: influence, impact and implications. Expert Rev Vaccines. 2015;14(1);99-117. https://doi.org/10.1586/14760584.2015.964212
https://doi.org/10.1586/14760584.2015.96...
. A hesitação vacinal não é uma preocupação nova de pesquisadores de países europeus e norte-americanos1212. Dubé E, Gagnon D, Nickels E, Jeram S, Schuster M. Mapping vaccine hesitancy: country-specific characteristics of a global phenomenon. Vaccine 2014;32(49):6649-54. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
1414. Olive JK, Hotez PJ, Damania A, Nolan MS. The state of the antivaccine movement in the United States: a focused examination of nonmedical exemptions in states and counties. PLoS Med. 2018;15(6):e1002578. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002578
https://doi.org/10.1371/journal.pmed.100...
. No Brasil, poucos estudos foram desenvolvidos sobre esse fenômeno1010. Succi RCM. Vaccine refusal: what we need to know. J Pediatr (Rio J). 2018. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.008
https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.0...
, mas a hesitação vacinal tem se tornado cada vez mais evidente.

A queda das coberturas vacinais infantis e suas consequências já visíveis justificam os esforços para melhor compreender a hesitação vacinal no Brasil. Dessa forma, o objetivo deste comentário é apresentar a definição e os fatores relacionados à hesitação vacinal, bem como discutir sua importância no contexto brasileiro.

Hesitação Vacinal: Definição e Fatores Relacionados

A palavra hesitação vem do latim hæsitātĭō e é definida pelo estado de hesitar, ou seja, estar indeciso no momento de tomar decisões1515. Ferreira ABH. Dicionário Aurélio da língua portuguesa. Coordenação Marina Baird Ferreira, Margarida dos Anjos. 5.ed. Curitiba: Positivo; 2010.. Em 2012, a OMS compôs um grupo de especialistas, o Strategic Advisory Group of Experts Working Group on Vaccine Hesitancy (SAGE-WG), para definir a hesitação vacinal, entender sua magnitude e os fatores que a influenciam e reunir sistematicamente evidências de intervenções em saúde pública1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
.

A hesitação vacinal é definida como o atraso em aceitar ou a recusa das vacinas recomendadas, apesar de sua disponibilidade nos serviços de saúde1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
. Esse fenômeno comportamental é bastante complexo em relação a seus determinantes (que envolvem aspectos culturais, sociais e econômicos), e varia ao longo do tempo, do local e dos tipos de vacinas1212. Dubé E, Gagnon D, Nickels E, Jeram S, Schuster M. Mapping vaccine hesitancy: country-specific characteristics of a global phenomenon. Vaccine 2014;32(49):6649-54. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1313. Larson HJ, Jarrett C, Eckersberger E, Smith DM, Paterson P. Understanding vaccine hesitancy around vaccines and vaccination from a global perspective: a systematic review of published literature, 2007-2012. Vaccine. 2014;32(19):2150-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
.

Ela deve ser entendida como um continuum entre aqueles que aceitam e aqueles que recusam indubitavelmente todas as vacinas, ou seja, indivíduos hesitantes situam-se entre esses dois extremos. Eles constituem grupos heterogêneos, nos quais alguns aceitam apenas algumas vacinas e outros atrasam propositalmente, não aceitando o esquema vacinal recomendado. Em proporção menor, há aqueles que recusam apenas algumas vacinas e aqueles que ainda têm dúvidas sobre a decisão de vacinar ou não1313. Larson HJ, Jarrett C, Eckersberger E, Smith DM, Paterson P. Understanding vaccine hesitancy around vaccines and vaccination from a global perspective: a systematic review of published literature, 2007-2012. Vaccine. 2014;32(19):2150-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
,1717. McClure CC, Cataldi JR, O'Leary ST. Vaccine hesitancy: where we are and where we are going. Clin Ther. 2017;39(8):1550-62. https://doi.org/10.1016/j.clinthera.2017.07.003
https://doi.org/10.1016/j.clinthera.2017...
.

Esse comportamento é influenciado por muitos fatores inter-relacionados, como a confiança, complacência e conveniência, conhecido como modelo dos “3 Cs”, proposto pela OMS em 2011. A confiança é sobre a eficácia e segurança das vacinas, o sistema de saúde que as fornece e as motivações dos gestores para recomendá-las. A complacência resulta da baixa percepção de risco de contrair a doença de forma que a vacinação não seria considerada necessária. Por fim, a conveniência considera a disponibilidade física, disposição para pagar, acessibilidade geográfica, capacidade de compreensão e acesso à informação em saúde1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
.

Em 2012, o SAGE-WG definiu uma matriz de determinantes à hesitação vacinal, em que considerou características contextuais e individuais e questões específicas da vacinação. Resumidamente, o domínio de influências contextuais inclui aspectos históricos, geográficos, políticos, socioeconômicos, culturais, religiosos e de gênero, assim como a comunicação e mídia, influência de líderes e a percepção sobre a indústria farmacêutica. As influências individuais são experiências prévias com vacinação, crenças e atitudes sobre saúde, confiança ao sistema de saúde, vínculo com profissionais de saúde, percepção de risco da vacina e visão da imunização como norma social contra a de que a vacinação não é necessária ou é nociva. Por fim, os aspectos específicos da vacina incluem riscos e benefícios, esquema vacinal, modo de administração, introdução de uma nova vacina ou formulação, custos e fornecimento das vacinas1313. Larson HJ, Jarrett C, Eckersberger E, Smith DM, Paterson P. Understanding vaccine hesitancy around vaccines and vaccination from a global perspective: a systematic review of published literature, 2007-2012. Vaccine. 2014;32(19):2150-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
.

Vale ressaltar que a hesitação vacinal e seus determinantes variam ao longo do tempo e são específicos de cada contexto. Revisões sistemáticas reiteram essa heterogeneidade, indicando a necessidade de fortalecer esse conhecimento em diferentes contextos e capacitar programas de imunizações para abordá-lo1212. Dubé E, Gagnon D, Nickels E, Jeram S, Schuster M. Mapping vaccine hesitancy: country-specific characteristics of a global phenomenon. Vaccine 2014;32(49):6649-54. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1313. Larson HJ, Jarrett C, Eckersberger E, Smith DM, Paterson P. Understanding vaccine hesitancy around vaccines and vaccination from a global perspective: a systematic review of published literature, 2007-2012. Vaccine. 2014;32(19):2150-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1818. Larson HJ, Figueiredo A, Xiahong Z, Schulz WS, Verger P, Johnston IG, et al. The state of vaccine confidence 2016: global insights through a 67-country survey. EBioMedicine. 2016;12:295-301. https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08.042
https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08....
. Um estudo com gestores de 13 países mostrou que a maioria deles interpretava a hesitação como recusa vacinal e alguns a consideravam um problema pequeno1212. Dubé E, Gagnon D, Nickels E, Jeram S, Schuster M. Mapping vaccine hesitancy: country-specific characteristics of a global phenomenon. Vaccine 2014;32(49):6649-54. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
. Os fatores também diferiram entre os países1212. Dubé E, Gagnon D, Nickels E, Jeram S, Schuster M. Mapping vaccine hesitancy: country-specific characteristics of a global phenomenon. Vaccine 2014;32(49):6649-54. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
; por exemplo, a alta escolaridade do cuidador e status socioeconômico favorável não influenciam a hesitação vacinal sempre na mesma direção1616. MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine. 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
.

Um estudo com 67 países, incluindo o Brasil, verificou que o sentimento geral em relação à vacinação é positivo, mas há grande variabilidade. A segurança destacou-se como o aspecto que traz sentimentos negativos, particularmente na Europa. Além disso, países com níveis altos de escolaridade e bom acesso aos serviços de saúde apresentaram as menores taxas de sentimentos positivos sobre a vacinação1818. Larson HJ, Figueiredo A, Xiahong Z, Schulz WS, Verger P, Johnston IG, et al. The state of vaccine confidence 2016: global insights through a 67-country survey. EBioMedicine. 2016;12:295-301. https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08.042
https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08....
. Os percentuais de brasileiros que responderam discordar quanto à importância, segurança e efetividade da vacina foram 0,7%, 6,1% e 4,5%, respectivamente, bastante abaixo de outras localidades1818. Larson HJ, Figueiredo A, Xiahong Z, Schulz WS, Verger P, Johnston IG, et al. The state of vaccine confidence 2016: global insights through a 67-country survey. EBioMedicine. 2016;12:295-301. https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08.042
https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08....
.

Apesar de a hesitação vacinal ser um problema reconhecido, sua mensuração ainda é um desafio. O SAGE-WG também desenvolveu, a partir de outros questionários previamente validados1919. Opel DJ, Mangione-Smith R, Taylor JA, Korfiatis C, Wiese C, Catz S, et al. Development of a survey to identify vaccine-hesitant parents: the parent attitudes about childhood vaccines survey. Hum Vaccin. 2011;7(4):419-25. https://doi.org/10.4161/hv.7.4.14120
https://doi.org/10.4161/hv.7.4.14120...
,2020. Opel DJ, Taylor JA, Mangione-Smith R, Solomon C, Zhao C, Catz S, et al. Validity and reliability of a survey to identify vaccine-hesitant parents. Vaccine. 2011;29(38):6598-605. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2011.06.115
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2011.0...
, três instrumentos sobre hesitação vacinal com diferentes tipos de questões: fechadas básicas, escala Likert e abertas2121. Larson HJ, Jarrett C, Schulz WS, Chaudhuri M, Zhou Y, Dube E, et al; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Measuring vaccine hesitancy: the development of a survey tool. Vaccine. 2015;33(34):4165-75. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.037
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
. O Quadro apresenta o instrumento em escala Likert traduzido para o português, mas ainda não validado.

Quadro
Instrumento para estudar a hesitação à vacinação infantil aplicado a pais ou cuidadores, em escala Likert de 5 pontos.

E como lidar com a hesitação vacinal? Revisões sistemáticas concluíram que não há evidências fortes para recomendar intervenções específicas. De forma geral, a maioria das intervenções possuía mais do que um componente e se sobressaíram aquelas dirigidas ao aumento de conhecimento (estratégias de comunicação, mídia, mobilização social, instrumentos informativos para profissionais de saúde). Podemos citar também intervenções baseadas em incentivos não financeiros e de estratégias de agendamento e convocação para vacinação direcionadas à população-alvo2222. Jarrett C, Wilson R, O'Leary M, Eckersberger E, Larson HJ; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Strategies for addressing vaccine hesitancy: a systematic review. Vaccine. 2015;33(34):4180-90. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.040
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.0...
.

O Movimento Anti-Vacinas e suas Consequências

O movimento anti-vacina é tão antigo quanto a própria vacinação. No Reino Unido, já havia caricaturas da vacina de varíola desde os anos de 1800. A obrigatoriedade da vacinação causou resistência de indivíduos que a consideravam uma invasão da liberdade sobre o próprio corpo. Nos Estados Unidos, brigas judiciais contra a vacinação obrigatória não eram raras nos anos 1920. Apesar disso, em países de alta renda, as décadas de 1950-1960 foram consideradas como “era de ouro da aceitação vacinal” com a introdução da vacinação universal contra a poliomielite e sarampo-caxumba-rubéola (SCR), resultando no declínio expressivo dessas doenças. Já os países de média e baixa renda viveram essa fase a partir dos anos de 1970, com o apoio do PAI1111. Dubé E, Vivion M, MacDonald NE. Vaccine hesitancy, vaccine refusal and the anti-vaccine movement: influence, impact and implications. Expert Rev Vaccines. 2015;14(1);99-117. https://doi.org/10.1586/14760584.2015.964212
https://doi.org/10.1586/14760584.2015.96...
.

A partir de 1980, iniciou-se a controvérsia da vacina de coqueluche de células inteiras, o que culminou no desenvolvimento da vacina acelular. Nos Estados Unidos, foi criado um sistema de vigilância passivo de eventos adversos pós-vacina, para além de melhor monitorar esses eventos, fornecer mais transparência à população. Na década de 1990, foram publicados artigos sobre a possível associação entre a vacina SCR e a doença de Crohn e mais tarde, a ligação dessa vacina com autismo. Mesmo após outros trabalhos refutarem essa relação, esse sentimento ainda perdura na população e tais informações ainda são difundidas, atualmente, de forma mais ágil por meio da internet1111. Dubé E, Vivion M, MacDonald NE. Vaccine hesitancy, vaccine refusal and the anti-vaccine movement: influence, impact and implications. Expert Rev Vaccines. 2015;14(1);99-117. https://doi.org/10.1586/14760584.2015.964212
https://doi.org/10.1586/14760584.2015.96...
.

As consequências são as frequentes epidemias de doenças imunopreveníveis, como sarampo e coqueluche que ocorrem atualmente em todo o mundo2323. Phadke VK, Bednarczyk RA, Salmon DA, Omer SB. Association between vaccine refusal and vaccine-preventable diseases in the United States: a review of measles and pertussis. JAMA. 2016;315(11):1149-58. https://doi.org/10.1001/jama.2016.1353
https://doi.org/10.1001/jama.2016.1353...
, e a ameaça da reintrodução da poliomielite em regiões nas quais já foi eliminada2424. Moran-Gilad J, Kaliner E, Gdalevich M, Grotto I. Public health response to the silent reintroduction of wild poliovirus to Israel, 2013-2014. Clin Microbiol Infect. 2016;22 Suppl 5:S140-5. https://doi.org/10.1016/j.cmi.2016.06.018
https://doi.org/10.1016/j.cmi.2016.06.01...
. Na Europa, nos primeiros oito meses de 2018 ocorreram mais de 41.000 casos de sarampoddWorld Health Organization, Regional Office for Europe. Vaccine-preventable Diseases and Immunization Programme. WHO EpiData. 2018 [citado 10 set 2018];(7). Disponível em: http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0008/378602/epi-data-jul2017-jun2018-eng.pdf?ua=1 . Nos Estados Unidos, proporção substancial dos casos de sarampo ocorreu em indivíduos intencionalmente não vacinados. Da mesma forma, a hesitação vacinal também desempenhou um papel importante no ressurgimento da coqueluche, apesar de ser atribuído à perda de imunidade2323. Phadke VK, Bednarczyk RA, Salmon DA, Omer SB. Association between vaccine refusal and vaccine-preventable diseases in the United States: a review of measles and pertussis. JAMA. 2016;315(11):1149-58. https://doi.org/10.1001/jama.2016.1353
https://doi.org/10.1001/jama.2016.1353...
.

Importância da Hesitação Vacinal no Contexto Brasileiro: Desafios e Perspectivas

Movimentos anti-vacinas no Brasil também são antigos e a manifestação mais conhecida foi a Revolta da Vacina em 1904, com a lei da vacinação obrigatória da varíola. Entretanto, o quadro crítico da doença que assolava o país fez com que a população rapidamente buscasse a vacina2525. Buss PM, Temporão JG, Carvalheiro JR, organizadores. Vacinas, soros & imunizações no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2005..

Desde a década de 1990, as coberturas vacinais brasileiras são elevadas, o que reflete a boa aceitação por parte da população. Contribuíram para esse sucesso o aprimoramento do PNI e o avanço da pesquisa, desenvolvimento e produção de imunobiológicos no país. Certamente, as campanhas e os dias nacionais de vacinação favoreceram essa adesão, uma vez que expressavam a mobilização pública. Houve também a melhora da comunicação e mídia das ações de vacinação, com linguajar mais simples, explorando a diversidade étnica e convocando heróis nacionais2525. Buss PM, Temporão JG, Carvalheiro JR, organizadores. Vacinas, soros & imunizações no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2005.. Como consequência direta do sucesso do PNI, houve o controle das doenças imunopreveníveis22. Waldman EA, Sato APS. Path of infectious diseases in Brazil in the last 50 years: an ongoing challenge. Rev Saude Publica. 2016;50:68. https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050000232
https://doi.org/10.1590/S1518-8787.20160...
.

No entanto, esse cenário vem mudando rapidamente. Em 2013–2015, foram registrados 1.310 casos de sarampo nos estados de Ceará e Pernambuco. Em 2018, essas epidemias voltaram nos estados de Roraima e Amazonas com mais 1.500 casos confirmados apenas nos oito primeiros meses deste anoeeMinistério da Saúde (BR). Sarampo: situação epidemiológica. Inf Epidemiol. 2018 [citado 10 set 2018];(20). Disponível em: http://portalms.saude.gov.br/saude-de-a-z/sarampo-situacao-epidemiologica . Essa estatística é um alerta sobre o impacto da queda das coberturas vacinais de forma geral (Figura 1).

Figura 1
Séries históricas das coberturas vacinais (CV) da Difteria-Tétano-Coqueluche (CV DTP), sarampo (CV sarampo) e poliomielite (CV Polio) e dos casos confirmados de sarampo, entre 1994 a 2018, Brasil.

Apesar de altas coberturas nacionais, a homogeneidade ainda é um desafio55. Domingues CMAS, Teixeira AMS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22(1):9-27. https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000100002
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201300...
. A Figura 2 mostra a proporção de municípios com coberturas das vacinas DTP, sarampo e poliomielite ≥ 95%. Pode-se notar alta homogeneidade na primeira década dos anos 2000 e queda a partir de 2014.

Figura 2
Municipios brasileiros que alcancaram coberturas vacinais (CV) ≥ 95% para as vacinas infantis Difteria-Tetano-Coqueluche (DTP) (3a dose), sarampo (1a dose) e poliomielite (3a dose), 1994.2017.

A Figura 3 apresenta mapas da cobertura vacinal de sarampo. Além da evidente heterogeneidade entre os municípios, verifica-se discreta melhora das coberturas entre os anos de 2005 e 2009 e importante queda entre 2013 e 2017. Vale lembrar algumas ressalvas sobre esses dados, como as flutuações decorrentes do tamanho territorial do município e de sua população. Entretanto, a figura ilustra a importância do monitoramento contínuo das coberturas vacinais e também da qualidade dos registros de vacinação.

Figura 3
Cobertura da vacina de sarampo (1a dose) em 2005, 2009, 2013 e 2017, segundo município, Brasil.

Poucas pesquisas brasileiras estudaram a recusa ou atraso voluntário das vacinas disponíveis no SUS. A maioria dos estudos não denominava o que chamamos atualmente de hesitação vacinal. Estudos de abordagem qualitativa distinguiram grupos de cuidadores que vacinam seus filhos (vacinadores), vacinadores seletivos e não vacinadores. Esses estudos mostram que a decisão de vacinar é influenciada por aspectos socioculturais, tanto singulares do contexto brasileiro, como da sociedade contemporânea77. Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica. 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
,88. Barbieri CLA, Couto MT, Aith FMA. A (não) vacinação infantil entre a cultura e a lei: os significados atribuídos por casais de camadas médias de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(2):e00173315. https://doi.org/1590/0102-311X00173315
https://doi.org/1590/0102-311X00173315...
,2626. Couto MT, Barbieri CLA. Cuidar e (não) vacinar no contexto de famílias de alta renda e escolaridade em São Paulo, SP, Brasil. Cienc Saude Coletiva. 2015;20(1):105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
https://doi.org/10.1590/1413-81232014201...
.

Pais vacinadores revelam a vacinação como um ato de dever e responsabilidade e a fazem sem questionamentos, sendo influenciados pela tradição familiar e pela norma social77. Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica. 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
,88. Barbieri CLA, Couto MT, Aith FMA. A (não) vacinação infantil entre a cultura e a lei: os significados atribuídos por casais de camadas médias de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(2):e00173315. https://doi.org/1590/0102-311X00173315
https://doi.org/1590/0102-311X00173315...
,2626. Couto MT, Barbieri CLA. Cuidar e (não) vacinar no contexto de famílias de alta renda e escolaridade em São Paulo, SP, Brasil. Cienc Saude Coletiva. 2015;20(1):105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
https://doi.org/10.1590/1413-81232014201...
. Pais seletivos vivenciaram diferentes situações que os colocaram em dúvida sobre a decisão de vacinar ou postergar, caracterizando a singularização da vacinação dos filhos, ou seja, tornando-a particular, diante do extenso calendário vacinal do PNI77. Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica. 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
,88. Barbieri CLA, Couto MT, Aith FMA. A (não) vacinação infantil entre a cultura e a lei: os significados atribuídos por casais de camadas médias de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(2):e00173315. https://doi.org/1590/0102-311X00173315
https://doi.org/1590/0102-311X00173315...
,2626. Couto MT, Barbieri CLA. Cuidar e (não) vacinar no contexto de famílias de alta renda e escolaridade em São Paulo, SP, Brasil. Cienc Saude Coletiva. 2015;20(1):105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
https://doi.org/10.1590/1413-81232014201...
. Já entre os não vacinadores predominou uma visão mais natural, ou seja, de menor intervenção médico-hospitalar em processos de saúde, bem como a autonomia das decisões parentais frente às normatizações no cuidado infantil. Dentre as justificativas para não vacinar, destacaram-se: baixa percepção do risco da doença, visto que elas já estão controladas ou são leves; medo de eventos adversos pós-vacina; questionamentos sobre sua eficácia e formulação e sobre o interesse financeiro da indústria farmacêutica; opção de outras formas de proteção da saúde77. Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica. 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
,88. Barbieri CLA, Couto MT, Aith FMA. A (não) vacinação infantil entre a cultura e a lei: os significados atribuídos por casais de camadas médias de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(2):e00173315. https://doi.org/1590/0102-311X00173315
https://doi.org/1590/0102-311X00173315...
,2626. Couto MT, Barbieri CLA. Cuidar e (não) vacinar no contexto de famílias de alta renda e escolaridade em São Paulo, SP, Brasil. Cienc Saude Coletiva. 2015;20(1):105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
https://doi.org/10.1590/1413-81232014201...
.

O sentimento de pena da criança pelo recebimento das injeções foi associado ao atraso da vacina de sarampo por pelo menos 20 dias, em estudo no município de São Paulo. Os autores recomendaram ter dois ou mais canais de comunicação e evidenciaram que o cartão de vacina é um instrumento que auxilia a vacinação na idade preconizada2727. Logullo P, Carvalho HB, Saconi R, Massad E. Factors affecting compliance with the measles vaccination schedule in a Brazilian city. Sao Paulo Med J. 2008;126(3):166-71. https://doi.org/10.1590/S1516-31802008000300006
https://doi.org/10.1590/S1516-3180200800...
. Estudo de revisão sobre os eventos adversos das vacinas fornecidas pelo SUS mostrou que os riscos associados à vacinação não justificam a sua interrupção e que o risco associado à não vacinação é crescente. Os autores também alertam para a falta de informações e ressaltam o papel dos profissionais de saúde99. Aps LRMM, Piantola MAF, Pereira S, Castro JT, Santos FAO, Ferreira LCS. Adverse events of vaccines and the consequences of non-vaccination: a critical review. Rev Saude Publica. 2018;52:40. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000384
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018...
. A baixa proporção de indivíduos que conhece o papilomavírus humano e a vacina reforça essa demanda por intervenções educativas2828. Osis MJD, Duarte GA, Sousa MH. Conhecimento e atitude de usuários do SUS sobre o HPV e as vacinas disponíveis no Brasil. Rev Saude Publica. 2014;48(1):123-33. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005026
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20140...
. Há evidências da hesitação vacinal também entre profissionais de saúde brasileiros, com baixa cobertura do esquema completo da vacina de hepatite B2929. Souza FO, Freitas PSP, Araújo TM, Gomes MR. Vacinação contra hepatite B e Anti-HBS entre trabalhadores da saúde. Cad Saude Coletiva. 2015;23(2):172-9. https://doi.org/10.1590/1414-462X201500020030
https://doi.org/10.1590/1414-462X2015000...
, o que indica que a importância da vacinação também deve ser reforçada na própria formação e educação continuada desses profissionais.

A mídia também tem papel fundamental na busca pelas vacinas. O surto de febre amarela de 2007–2008 foi retratado pela cobertura jornalística como uma epidemia fora de controle, sem explicitar a forma silvestre da doença e enfatizando a vacina como salvação única. O resultado foi a busca indiscriminada da população pela vacina, mesmo por pessoas para as quais a vacinação era contraindicada3030. Malinverni C, Cuenca AMB, Brigagão JIM. Epidemia midiática: produção de sentidos e configuração social da febre amarela na cobertura jornalística, 2007-2008. Physis. 2012;22(3):853-72. https://doi.org//10.1590/S0103-73312012000300002.
https://doi.org//10.1590/S0103-733120120...
. Em 2017–2018, problemas semelhantes foram vivenciados, com uma demanda pela vacina exagerada; porém, a introdução da vacina fracionada e a dispersão de notícias incorretas fizeram as filas desaparecerem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A queda das coberturas vacinais instigou gestores e pesquisadores brasileiros a buscarem possíveis explicações. A hesitação vacinal deve ser mais bem compreendida no contexto brasileiro. Esse fenômeno não é novidade em países europeus ou norte-americanos, e mesmo no Brasil ele já vem sendo estudado ainda que sob outra denominação77. Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica. 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
,88. Barbieri CLA, Couto MT, Aith FMA. A (não) vacinação infantil entre a cultura e a lei: os significados atribuídos por casais de camadas médias de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(2):e00173315. https://doi.org/1590/0102-311X00173315
https://doi.org/1590/0102-311X00173315...
,1010. Succi RCM. Vaccine refusal: what we need to know. J Pediatr (Rio J). 2018. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.008
https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.0...
,1313. Larson HJ, Jarrett C, Eckersberger E, Smith DM, Paterson P. Understanding vaccine hesitancy around vaccines and vaccination from a global perspective: a systematic review of published literature, 2007-2012. Vaccine. 2014;32(19):2150-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.0...
,1414. Olive JK, Hotez PJ, Damania A, Nolan MS. The state of the antivaccine movement in the United States: a focused examination of nonmedical exemptions in states and counties. PLoS Med. 2018;15(6):e1002578. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002578
https://doi.org/10.1371/journal.pmed.100...
,2626. Couto MT, Barbieri CLA. Cuidar e (não) vacinar no contexto de famílias de alta renda e escolaridade em São Paulo, SP, Brasil. Cienc Saude Coletiva. 2015;20(1):105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
https://doi.org/10.1590/1413-81232014201...
.

Os extremos de aceitação ou recusa total compreendem grupos relativamente menores do que os hesitantes, que também se distribuem em grupos heterogêneos. Geralmente, a interpretação do risco da vacina não é baseada na avaliação racional das evidências, mas sim na sensação de incertezas e ambiguidades que permanecem mesmo frente a evidências empíricas1111. Dubé E, Vivion M, MacDonald NE. Vaccine hesitancy, vaccine refusal and the anti-vaccine movement: influence, impact and implications. Expert Rev Vaccines. 2015;14(1);99-117. https://doi.org/10.1586/14760584.2015.964212
https://doi.org/10.1586/14760584.2015.96...
. Dessa forma, muitos estudos ressaltam a importância da comunicação e do vínculo da população com as ações de vacinação.

Movimentos anti-vacinas, apesar de antigos, estão se fortalecendo no mundo, com início mais visível em países de alta renda. Entretanto, certamente, o impacto desse sentimento negativo em relação à vacina será mais importante nos países de média e baixa renda, à medida que esses movimentos se fortaleçam1414. Olive JK, Hotez PJ, Damania A, Nolan MS. The state of the antivaccine movement in the United States: a focused examination of nonmedical exemptions in states and counties. PLoS Med. 2018;15(6):e1002578. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002578
https://doi.org/10.1371/journal.pmed.100...
. Assim sendo, é imprescindível que gestores, pesquisadores e a população brasileira se mobilizem para proteger nosso exitoso programa de imunizações.

Referências bibliográficas

  • 1
    World Health Organization. Global Vaccine Action Plan 2011-2020. Geneva: WHO; 2013 [cited 2018 Sep 10]. Available from: http://www.who.int/immunization/global_vaccine_action_plan/GVAP_doc_2011_2020/en/
    » http://www.who.int/immunization/global_vaccine_action_plan/GVAP_doc_2011_2020/en/
  • 2
    Waldman EA, Sato APS. Path of infectious diseases in Brazil in the last 50 years: an ongoing challenge. Rev Saude Publica 2016;50:68. https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050000232
    » https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050000232
  • 3
    Turner HC, Thwaites GE, Clapham HE. Vaccine-preventable diseases in lower-middle-income countries. Lancet Infect Dis. 2018;18(9):937-9. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(18)30478-X
    » https://doi.org/10.1016/S1473-3099(18)30478-X
  • 4
    Okwo-Bele JM, Cherian T. The expanded programme on immunization: a lasting legacy of smallpox eradication. Vaccine. 2011;29 Suppl 4:D74-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2012.01.080
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2012.01.080
  • 5
    Domingues CMAS, Teixeira AMS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude 2013;22(1):9-27. https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000100002
    » https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000100002
  • 6
    Chen RT, Rastogi SC, Mullen JR, Hayes S, Cochi SL, Donlon JA, et al. The Vaccine Adverse Event Reporting System (VAERS). Vaccine 1994;12(6):542-50. https://doi.org/10.1016/0264-410X(94)90315-8
    » https://doi.org/10.1016/0264-410X(94)90315-8
  • 7
    Barbieri CLA, Couto MT. Decision-making on childhood vaccination by highly educated parents. Rev Saude Publica 2015;49:18. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
    » https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005149
  • 8
    Barbieri CLA, Couto MT, Aith FMA. A (não) vacinação infantil entre a cultura e a lei: os significados atribuídos por casais de camadas médias de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2017;33(2):e00173315. https://doi.org/1590/0102-311X00173315
    » https://doi.org/1590/0102-311X00173315
  • 9
    Aps LRMM, Piantola MAF, Pereira S, Castro JT, Santos FAO, Ferreira LCS. Adverse events of vaccines and the consequences of non-vaccination: a critical review. Rev Saude Publica 2018;52:40. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000384
    » https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000384
  • 10
    Succi RCM. Vaccine refusal: what we need to know. J Pediatr (Rio J) 2018. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.008
    » https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.01.008
  • 11
    Dubé E, Vivion M, MacDonald NE. Vaccine hesitancy, vaccine refusal and the anti-vaccine movement: influence, impact and implications. Expert Rev Vaccines 2015;14(1);99-117. https://doi.org/10.1586/14760584.2015.964212
    » https://doi.org/10.1586/14760584.2015.964212
  • 12
    Dubé E, Gagnon D, Nickels E, Jeram S, Schuster M. Mapping vaccine hesitancy: country-specific characteristics of a global phenomenon. Vaccine 2014;32(49):6649-54. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.09.039
  • 13
    Larson HJ, Jarrett C, Eckersberger E, Smith DM, Paterson P. Understanding vaccine hesitancy around vaccines and vaccination from a global perspective: a systematic review of published literature, 2007-2012. Vaccine 2014;32(19):2150-9. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2014.01.081
  • 14
    Olive JK, Hotez PJ, Damania A, Nolan MS. The state of the antivaccine movement in the United States: a focused examination of nonmedical exemptions in states and counties. PLoS Med 2018;15(6):e1002578. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002578
    » https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002578
  • 15
    Ferreira ABH. Dicionário Aurélio da língua portuguesa. Coordenação Marina Baird Ferreira, Margarida dos Anjos. 5.ed. Curitiba: Positivo; 2010.
  • 16
    MacDonald NE; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Vaccine hesitancy: definition, scope and determinants. Vaccine 2015;33(34):4161-4. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.036
  • 17
    McClure CC, Cataldi JR, O'Leary ST. Vaccine hesitancy: where we are and where we are going. Clin Ther. 2017;39(8):1550-62. https://doi.org/10.1016/j.clinthera.2017.07.003
    » https://doi.org/10.1016/j.clinthera.2017.07.003
  • 18
    Larson HJ, Figueiredo A, Xiahong Z, Schulz WS, Verger P, Johnston IG, et al. The state of vaccine confidence 2016: global insights through a 67-country survey. EBioMedicine 2016;12:295-301. https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08.042
    » https://doi.org/10.1016/j.ebiom.2016.08.042
  • 19
    Opel DJ, Mangione-Smith R, Taylor JA, Korfiatis C, Wiese C, Catz S, et al. Development of a survey to identify vaccine-hesitant parents: the parent attitudes about childhood vaccines survey. Hum Vaccin 2011;7(4):419-25. https://doi.org/10.4161/hv.7.4.14120
    » https://doi.org/10.4161/hv.7.4.14120
  • 20
    Opel DJ, Taylor JA, Mangione-Smith R, Solomon C, Zhao C, Catz S, et al. Validity and reliability of a survey to identify vaccine-hesitant parents. Vaccine 2011;29(38):6598-605. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2011.06.115
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2011.06.115
  • 21
    Larson HJ, Jarrett C, Schulz WS, Chaudhuri M, Zhou Y, Dube E, et al; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Measuring vaccine hesitancy: the development of a survey tool. Vaccine 2015;33(34):4165-75. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.037
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.037
  • 22
    Jarrett C, Wilson R, O'Leary M, Eckersberger E, Larson HJ; SAGE Working Group on Vaccine Hesitancy. Strategies for addressing vaccine hesitancy: a systematic review. Vaccine 2015;33(34):4180-90. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.040
    » https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2015.04.040
  • 23
    Phadke VK, Bednarczyk RA, Salmon DA, Omer SB. Association between vaccine refusal and vaccine-preventable diseases in the United States: a review of measles and pertussis. JAMA. 2016;315(11):1149-58. https://doi.org/10.1001/jama.2016.1353
    » https://doi.org/10.1001/jama.2016.1353
  • 24
    Moran-Gilad J, Kaliner E, Gdalevich M, Grotto I. Public health response to the silent reintroduction of wild poliovirus to Israel, 2013-2014. Clin Microbiol Infect. 2016;22 Suppl 5:S140-5. https://doi.org/10.1016/j.cmi.2016.06.018
    » https://doi.org/10.1016/j.cmi.2016.06.018
  • 25
    Buss PM, Temporão JG, Carvalheiro JR, organizadores. Vacinas, soros & imunizações no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2005.
  • 26
    Couto MT, Barbieri CLA. Cuidar e (não) vacinar no contexto de famílias de alta renda e escolaridade em São Paulo, SP, Brasil. Cienc Saude Coletiva 2015;20(1):105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232014201.21952013
  • 27
    Logullo P, Carvalho HB, Saconi R, Massad E. Factors affecting compliance with the measles vaccination schedule in a Brazilian city. Sao Paulo Med J. 2008;126(3):166-71. https://doi.org/10.1590/S1516-31802008000300006
    » https://doi.org/10.1590/S1516-31802008000300006
  • 28
    Osis MJD, Duarte GA, Sousa MH. Conhecimento e atitude de usuários do SUS sobre o HPV e as vacinas disponíveis no Brasil. Rev Saude Publica 2014;48(1):123-33. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005026
    » https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005026
  • 29
    Souza FO, Freitas PSP, Araújo TM, Gomes MR. Vacinação contra hepatite B e Anti-HBS entre trabalhadores da saúde. Cad Saude Coletiva. 2015;23(2):172-9. https://doi.org/10.1590/1414-462X201500020030
    » https://doi.org/10.1590/1414-462X201500020030
  • 30
    Malinverni C, Cuenca AMB, Brigagão JIM. Epidemia midiática: produção de sentidos e configuração social da febre amarela na cobertura jornalística, 2007-2008. Physis 2012;22(3):853-72. https://doi.org//10.1590/S0103-73312012000300002.
    » https://doi.org//10.1590/S0103-73312012000300002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Nov 2018

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2018
  • Aceito
    08 Out 2018
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br