Eficiência da atenção primária nas capitais brasileiras e modelos de gestão: 2008–2019

André Luis Paes Ramos Marismary Horsth De Seta Marcelo Battesini Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Analisar a eficiência na atenção primária à saúde das capitais brasileiras no período 2008–2019, considerando o modelo de gestão: administração pública direta ou administração cedida a terceiros.

MÉTODOS

Estudo de propósito avaliativo, objetivo analítico, com dados secundários de acesso público, analisados em recorte transversal (2019) e longitudinal (2008, 2012, 2016 e 2019). Para caracterizar as cidades e sua atenção primária à saúde, utilizaram-se dados demográficos, socioeconômicos e sete indicadores relacionados à atenção primária à saúde (cobertura em atenção básica, internações por condições sensíveis à atenção básica, cura de tuberculose, mortalidade infantil, materna e prematura por condições crônicas, incidência de sífilis congênita). A esses indicadores foram acrescidos os de gastos em saúde e em atenção primária à saúde e realizou-se a análise envoltória de dados voltada a outputs (sem admitir redução de gastos) para cálculo da eficiência em 2008, 2012, 2016 e 2019. Com o índice de Malmquist, buscou-se identificar possíveis ganhos de produtividade entre 2008 e 2019.

RESULTADOS

Quatro capitais identificadas como de administração cedida a terceiros (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Fortaleza) não obtiveram maior eficiência perante a administração pública direta, tampouco evoluíram quando comparados os seus próprios resultados no tempo. Em 2019, e na abordagem longitudinal, apenas capitais de gestão por administração pública direta obtiveram índice máximo de eficiência relativa na comparação entre as capitais. Doze capitais em administração pública direta mantiveram-se eficientes em todos os anos, ao passo que as em administração cedida a terceiros apresentaram, consistentemente, ineficiência fraca em atenção primária à saúde, ou seja, no período estudado, a relação entre investimentos na atenção primária à saúde e resultados obtidos é inferior ao alcançado pelas capitais eficientes.

CONCLUSÕES

Não encontramos evidências de ganhos de eficiência com a adoção de administração cedida a terceiros. Ressalte-se que a eficiência produtiva não representa, necessariamente, o atendimento de necessidades de saúde.

Atenção Primária à Saúde; Serviços Terceirizados; Avaliação em Saúde; Eficiência

INTRODUÇÃO

Países com sistemas de saúde universais investem fortemente na Atenção Primária à Saúde (APS) para acesso ao sistema e resolução de necessidades mais comuns11. Starfield B. Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: Unesco; Ministério da Saúde; 2002.,22. Giovanella L. A atenção primária à saúde nos países da União Europeia: configurações e reformas organizacionais na década de 1990. Cad Saude Publica. 2006 Maio;22(5):951-63..

No Brasil, cabem principalmente aos municípios a gestão e a execução das políticas de APS. As capitais dos estados destacam-se pelas condições estruturais, econômicas, políticas e sociais, e por serem polos regionais de referência, não apenas para os municípios circundantes.

Há diversos projetos em disputa sobre a melhor forma para gerir e prestar serviços em saúde, estando pautado o debate sobre a maior ou menor presença do Estado na provisão de políticas sociais. Um argumento seria a suposta maior eficiência do setor privado sobre o setor estatal33. Rao S. Is the private sector more efficient? A cautionary tale. 2016. https://doi.org/10.13140/RG.2.1.1180.1682
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. Gestores públicos brasileiros apontam as leis de licitações e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) como constrangimentos para a gestão pública exclusiva, tornando necessário o uso de modelos alternativos de gestão, mais flexíveis para compras e contratação de pessoal44. Barbosa ACQ, Silva Junior AG, Turci MA, Mendes PS. Eficiência e gestão pública em saúde na APS. APS. 2021; 3(2):144-53. https://doi.org/10.14295/aps.v3i2.209
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.

Alternativas à administração pública exclusiva proliferam: fundações estatais de direito público ou privado, empresas públicas, organizações não governamentais, organizações sociais (OS), Organizações da Sociedade Civil de Direito Público, Organizações da Sociedade Civil, Serviço Social Autônomo. São frequentes os arranjos mistos, em que parte das unidades de saúde é gerida pela administração pública direta ou indireta, e outra parte é terceirizada para instituições privadas; na mesma unidade de saúde podem coexistir distintos modelos.

Criadas em 1998, as OS representam a principal estratégia de terceirização da administração de unidades públicas de saúde, mas sua expansão não foi acompanhada de estudos sobre se a propalada eficiência fora ou não alcançada, principalmente na APS. Estudos sobre o desempenho da atenção hospitalar gerida por OS ou administração pública comparam hospitais por indicadores de cada estabelecimento, sem focalizar resultados e impactos sobre a saúde da população assistida no sistema em que estão inseridos.

Trabalhos recentes55. Ramos ALP, De Seta MH, Andrade CLT. Terceirização e desempenho da atenção primária à saúde nas capitais brasileiras. In: Sá MC, Tavares MFL, De Seta, MH. Organização do cuidado e práticas em saúde: abordagens, pesquisas e experiências de ensino. Rio de Janeiro, Fiocruz, 2018. p. 295- 357.,66. Ramos ALP, De Seta MH. Atenção primária à saúde e organizações sociais nas capitais da região sudeste do Brasil: 2009 e 2014. Cad Saude Publica. 2019; 35(4):e00089118. https://doi.org/10.1590/0102- 311X00089118
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analisaram o desempenho da APS – compreendido como a medida em que o sistema de saúde das capitais brasileiras atinge os objetivos propostos77. Hurst J, Jee-Hughes M. Performance measurement and performance management in OECD health systems. Paris: OECD; 2001. (OECD Labour Market and Social Policy Occasional Papers, v. 47).. Contudo, a eficiência não fora analisada e os gastos realizados para o alcance dos resultados não foram considerados.

A eficiência, um princípio constitucional para a administração pública88. Brasil. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988., consta nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCs) como a razão entre esforço e recursos empreendidos. A relação eficiente entre resultados obtidos e a quantidade de insumos utilizados (função produção) não é facilmente determinada em saúde pública, e demanda a análise das melhores práticas de referências virtuosas (benchmarks), que delimitam uma fronteira limítrofe para unidades que compartilham condições similares99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022.. No entanto, o uso de medidas de eficiência não deve servir para diminuição na alocação de recursos públicos, dada a sua contribuição minoritária para a composição do gasto em saúde no Brasil, predominantemente privado99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022..

Este estudo objetiva analisar a eficiência da APS nas capitais brasileiras no período 2008–2019, a partir de duas questões. A primeira, se as capitais são eficientes ao ofertar a APS; e a segunda, se o modelo de gestão da APS adotado impactou a eficiência.

MÉTODOS

Estudo de propósito avaliativo, objetivo analítico, com dados secundários, de acesso público, analisados em recorte transversal (2019) e longitudinal (2008, 2012, 2016 e 2019).

Pesquisa realizada em duas fases. Na primeira, a APS nas 27 capitais foi caracterizada mediante indicadores usuais55. Ramos ALP, De Seta MH, Andrade CLT. Terceirização e desempenho da atenção primária à saúde nas capitais brasileiras. In: Sá MC, Tavares MFL, De Seta, MH. Organização do cuidado e práticas em saúde: abordagens, pesquisas e experiências de ensino. Rio de Janeiro, Fiocruz, 2018. p. 295- 357.,1010. Miclos PV, Calvo MCM, Colussi CF. Evaluation of the performance of actions and outcomes in primary health care. Rev Saude Publica. 2017;51:86. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051006831
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,1111. Varela OS, Martins GA, Favero LPL. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Rev Ad. 2012;47(4):624-37. (Tabela 1) referentes a dados populacionais, modelo de gestão, gasto e arrecadação públicos e percentual de população coberta por planos de saúde suplementar (população em SS), priorizando a informação mais recente (entre 2020 e 2021). Estimaram-se os valores per capita para reduzir a influência de disparidades socioeconômicas e de porte populacional. Dois destes indicadores foram utilizados também na segunda fase (gasto em saúde e gasto em APS).

Tabela 1
Caracterização das capitais segundo indicadores selecionados (2018, 2020 e 2021).

Considerando que a qualidade da administração dos serviços de saúde pode impactar positivamente seu desempenho99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022., os modelos predominantes de gestão da APS de cada capital foram identificados a partir de informações obtidas com gestores locais55. Ramos ALP, De Seta MH, Andrade CLT. Terceirização e desempenho da atenção primária à saúde nas capitais brasileiras. In: Sá MC, Tavares MFL, De Seta, MH. Organização do cuidado e práticas em saúde: abordagens, pesquisas e experiências de ensino. Rio de Janeiro, Fiocruz, 2018. p. 295- 357., com busca bibliográfica para atualização. Esse procedimento gerou as categorias: administração pública direta exclusiva (AD) e administração concedida a terceiros (AT). Os indicadores foram analisados mediante estatística descritiva e correlação de Pearson.

Na segunda fase, estudaram-se as eficiências na gestão da APS das capitais, por meio de análise envoltória de dados (AED ou DEA, data envelopment analysis), método multidimensional não paramétrico utilizado para estimar a eficiência de unidades tomadoras de decisão (DMU, decision making units), com base em programação linear matemática1212. Cooper WW, Seiford LM, Tone K. Data envelopment analysis: a comprehensive text with models, applications, references and DEA-solver software. New York: Springer; 2007.. Além de gasto por habitante na função saúde e em APS, foram utilizados como variáveis indicadores de saúde presentes no Pacto de Diretrizes e Metas (PDM) 2013–20151313. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Caderno de diretrizes, objetivos, metas e indicadores 2013-2015. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2013. (Quadro), calculados a partir de dados de bases nacionais. As análises e a solução dos modelos AED foram realizadas no ambiente R-Studio (R Core Team, 2022), com o auxílio do pacote benchmarking e suas funções.

Quadro
Inputs (Xi) e Outputs (Yi) utilizados na aplicação de análise envoltória de dados (AED).

A AED é baseada na produtividade das DMU analisadas, estimada pela razão entre resultados obtidos e os recursos utilizados. A eficiência de uma DMU é obtida pela solução do problema de programação linear que otimiza razão θ= output virtual/input virtual =[v1y1+v2y2++vnyn]/[u1x1+u2x2++umxm], com θ ≥ 1, sendo vi e ui os pesos ótimos (vi e ui) obtidos, com n variáveis de output e m de input1414. Ramanathan R. An introduction to data envelopment analysis: a tool for performance measurement. New Deli: Sage; 2003., como resultado da comparação entre a produtividade de uma DMU em relação à produtividade máxima definida por uma fronteira latente.

Em geral, a AED minimiza inputs e maximiza outputs buscando mais eficiência ou melhor performance1515. Zhu J. Quantitative models for performance evaluation and benchmarking: data envelopment analysis with spreadsheets. 3rd ed. New York: Springer; 2014. (International Series in Operations Research & Management Series)., e as DMU eficientes formam uma fronteira que serve de referência às ineficientes. A eficiência resulta da comparação entre as distintas habilidades em converter inputs em outputs (produtividade) e a fronteira de eficiência endógena é identificada por um modelo de programação matemática linear1616. Hosseinzadeh LF, Ebrahimnejad A, Vaez-Ghasemi M, Moghaddas Z. Fuzzy data envelopment analysis models with R codes. Switzerland: Springer; 2020.. Os passos utilizados são: definir DMU; selecionar variáveis; definir modelo; obter e apresentar resultados1212. Cooper WW, Seiford LM, Tone K. Data envelopment analysis: a comprehensive text with models, applications, references and DEA-solver software. New York: Springer; 2007.. Adicionalmente, estimamos a mudança de produtividade ao longo do tempo.

As 27 capitais foram tomadas como DMU, por apresentarem condições similares de oferta e serem referências locais em APS. As variáveis de input (Xi, recursos), gastos públicos por habitante na função saúde (X1) e na Atenção Básica (X2), entendida neste estudo como sinônimo de APS, expressam investimento em saúde e o grau de prioridade atribuído pela gestão ao primeiro nível de atenção. As variáveis utilizadas como output (Yi) incluíram indicadores de produção (produtos intermediários) e de efetividade e desfechos (outcomes)99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022., constam no Quadro.

As variáveis de output Y2, Y3, Y5, Y6 e Y7 (menor-é-melhor) foram tomadas em seu inverso nas análises AED para assumirem a mesma direção das demais (maior-é-melhor) na otimização.

Foi utilizado o modelo AED de retorno variável orientado ao output (VRS−O), relacionado à forma como a fronteira de eficiência é definida e a orientação se refere à direção escolhida para estimar a eficiência das DMU ineficientes1616. Hosseinzadeh LF, Ebrahimnejad A, Vaez-Ghasemi M, Moghaddas Z. Fuzzy data envelopment analysis models with R codes. Switzerland: Springer; 2020.. Dois modelos matemáticos são utilizados na AED VRS−O, representados nas Equações 1 e 21212. Cooper WW, Seiford LM, Tone K. Data envelopment analysis: a comprehensive text with models, applications, references and DEA-solver software. New York: Springer; 2007.. Na primeira, é apresentado o primal na forma do envelope (definição da fronteira) e na segunda o dual na forma dos multiplicadores expressos algebricamente (definição dos pesos).

maxθ0 sujeito à: Xλx0;θy0Yλ0;eλ=1;λ0Equação 1

nas quais, q0 é a eficiência da DMU sob análise; X= {xi} é um conjunto de variáveis de input; Y= {yj} é um conjunto de variáveis de output; x0 e y0 são as variáveis de input e de output da DMU sob análise; l é o vetor de pesos da DMU sob análise; e é um vetor com elementos iguais a 1; e l = 1 impõe a condição de convexidade.

min[(vx0v0)/uy0] sujeito à: [(vxiv0)/uyj]1Equação 2

nas quais, xi e yj são variáveis de input e output; e vi e ui os pesos ótimos.

O modelo VRS−O permite estimar as eficiências técnicas (Etécnica) das DMU, a partir de uma envoltória convexa definida por trechos, buscando maximizar os níveis de outputs considerando o atual consumo de inputs1212. Cooper WW, Seiford LM, Tone K. Data envelopment analysis: a comprehensive text with models, applications, references and DEA-solver software. New York: Springer; 2007.. A orientação a outputs é compatível com pesquisas na área de saúde pública, cujo orçamento é limitado99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022.,1717. Funcia FR. Subfinanciamento e orçamento federal do SUS: referências preliminares para a alocação adicional de recursos. Cienc Saude Coletiva. 2019 Dez;24(12):4405-15. https://doi.org/10.1590/1413-812320182412.25892019
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e não se almeja a sua redução, apesar de ser esperada progressiva melhoria dos indicadores de APS.

Os escores de Etécnica estimados pelo modelo AED VRS expressam um componente da eficiência global (Eglobal), que também inclui a eficiência de escala Eescala = Etécnica / Eglobal1212. Cooper WW, Seiford LM, Tone K. Data envelopment analysis: a comprehensive text with models, applications, references and DEA-solver software. New York: Springer; 2007.. Assim, para identificar se uma DMU opera em sua escala mais produtiva (economia de escala), é necessário estimar o modelo AED CRS1414. Ramanathan R. An introduction to data envelopment analysis: a tool for performance measurement. New Deli: Sage; 2003..

O modelo AED de retorno variável orientado ao output (AED VRS−O) foi estimado para os anos de 2019, 2016, 2012 e 2008 (análises transversais). Complementarmente, foi estimada a Eglobal pelo modelo AED de retorno constante (AED CRS−O) para identificar a Eescala das DMU no ano de 2019.

As análises transversais geram resultados pontuais sobre a eficiência relativa entre as DMU, sem considerar que o fenômeno investigado possa evoluir ou involuir no tempo. Para observar essas modificações, foi estimado o índice de Malmquist (IM), entre 2008 e 2019 (análise longitudinal). O IM é uma medida global de mudança das DMU no tempo (progresso ou retrocesso) e expressa os ganhos de produtividade entre os tempos t e t+11515. Zhu J. Quantitative models for performance evaluation and benchmarking: data envelopment analysis with spreadsheets. 3rd ed. New York: Springer; 2014. (International Series in Operations Research & Management Series).. IM é definido como o produto de seus componentes (IM = EIM *TIM), que expressam a mudança na Eficiência (EIM, catch-up effect) e a mudança na Tecnologia (TIM, frontier-shift effect), sendo calculado pela Equação 31616. Hosseinzadeh LF, Ebrahimnejad A, Vaez-Ghasemi M, Moghaddas Z. Fuzzy data envelopment analysis models with R codes. Switzerland: Springer; 2020..

perIMt+1(xt+1,yt+1,xt,yt)=[Dt+1(xt+1,yt+1)Dt(xt,yt)][Dt(xt+1,yt+1)Dt+1(xt+1,yt+1)Dt(xt,yt)Dt+1(xt,yt)]1/2Equação 3

na qual: Dt a função distância que mensura a eficiência na conversão de inputs (xt) em outputs (yt) no período t.

Os valores do IM, EIM e TIM referem-se a medidas de mudança, indicando variação: positiva se > 1 (evolução); negativa se < 1 (involução); constante se = 1 (estabilidade)1414. Ramanathan R. An introduction to data envelopment analysis: a tool for performance measurement. New Deli: Sage; 2003..

RESULTADOS

As 27 capitais executam os gastos mínimos (15%) em saúde1818. Brasil. Emenda Constitucional nº 29, de 13 de setembro de 2000. Altera os arts. 34, 35, 156, 160, 167 e 198 da Constituição Federal e acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde. Diario Oficial Uniao, 2000 Sep 14. e são cidades de grande porte, sendo 14 metrópoles (> 900 mil habitantes)1919. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Perfil dos municípios brasileiros: 2018. Rio de Janeiro: IBGE; 2019 [cited 2023 June 20]. Available from: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101668.pdf
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. Apenas Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo e Fortaleza apresentam unidades da APS sob AT (Tabela 1) e totalizam 46% da população de todas as capitais. As demais adotam AD.

Há grande heterogeneidade, com valores extremos apresentados na Tabela 1. O maior produto interno bruto (PIB) per capita ocorre em Brasília (R$ 85.661,39), seguida de Vitória (R$ 73.632,55), que possui a maior cobertura populacional pela SS (64,20%). Teresina apresenta o maior gasto em saúde por habitante (R$ 1.677,84) e aloca mais recursos próprios à APS (42,20%), apesar da 22ª posição no PIB. Também se destacam positivamente os gastos em saúde por habitante em Campo Grande (R$ 1.535,96), Cuiabá (R$ 1.597,80) e Belo Horizonte (R$ 1.463,70), que contrastam com as nove capitais com valores abaixo de R$ 710,00. Dentre as metrópoles, os menores valores ocorrem em Salvador (R$ 635,05) e no Rio de Janeiro (R$ 630,30). Este apresentou o maior gasto com pessoal no poder executivo municipal (56,20%), ultrapassando o limite máximo (54,00%) estipulado pela LRF. Os maiores gastos por habitante em APS ocorreram em Florianópolis (R$ 517,22), São Paulo (R$ 403,64) e Recife (R$ 390,40), discordante dos valores inferiores a R$ 100,00 em oito capitais. Boa Vista (32,83%) e Macapá (33,66%) apresentaram maior dependência de receitas (%) do fundo de participação dos municípios (FPM).

Analisamos também as principais associações entre os indicadores da Tabela 1, em correlações de Pearson: negativa forte (-0,78) entre o % FPM e % População em SS e moderada entre % FPM e PIB (-0,61); e positiva moderada entre % População em SS e PIB (0,60). Capitais onde a população tem maior renda apresentam menor dependência de repasses financeiros federais e maior utilização de planos de saúde.

A Tabela 2 apresenta as 27 capitais ordenadas por suas Etécnica em 2019, existindo pelo menos duas capitais eficientes em cada uma das cinco regiões do país. Quinze capitais foram eficientes (Etécnica = 1), ou seja, utilizaram tecnologia mais capaz de converter gasto por habitante (inputs, Xi) em resultados da APS (outputs, Yi). Doze capitais apresentaram ineficiência fraca e menor desempenho nessa conversão. O estudo da estabilidade temporal dessas eficiências ao compará-las com anos anteriores (2016, 2012, 2008) revelou consistência na manutenção das Etécnica pelas 15 capitais eficientes, assim como, das 12 capitais fracamente ineficientes, com oscilações anuais dessa condição.

Tabela 2
Escores de eficiência das capitais por região do Brasil e Unidade Federada (2019, 2016, 2012 e 2008).

Os retornos de escala dos processos de APS em cada capital no ano de 2019 (Tabela 2) foram calculados a partir da estimação da EGlobal. Dentre as capitais eficientes, oito operam na escala de transformação ideal (constante) ao transformar inputs em outputs. As outras sete não operam na escala mais produtiva (decrescente) e poderiam obter ainda mais outputs (Yi). Conforme esperado, todas as capitais ineficientes operam em uma escala não ideal (decrescente) ao produzir outputs, ou seja, caso haja um incremento de 10% no gasto per capita (Xi) é esperada menor melhora percentual nos outputs.

Os escores de Etécnica da Tabela 2 foram estudados, separadamente, para as capitais com unidades da APS sob AT, que apresentaram, em 2019, média de Etécnica = 0,87, inferior àquela das capitais que adotam AD de Etécnica = 0,99. Essa diferença tem aumentado nos 12 anos.

Na Tabela 2 também são apresentadas as análises transversais de ETécnica para os anos 2008, 2012, 2016. Doze capitais em AD se mantiveram eficientes em todos os anos, ao passo que os municípios em AT apresentaram, consistentemente, ineficiência fraca em APS, ou seja, no período estudado a relação entre investimentos na APS e resultados obtidos é inferior àquela das capitais eficientes.

A AED fornece ainda os valores dos indicadores na estimativa de metas para os outputs (Yi) das capitais não eficientes (Tabela 3). Exemplificando, São Paulo precisaria, para ser eficiente, simultaneamente: aumentar 6,1% a cobertura em AB e 7,2% a proporção de cura da tuberculose; e reduzir o ICSAB (1,2), a taxa de mortalidade infantil (1,0), a taxa de mortalidade prematura (164,9), a taxa de mortalidade materna (13,5) e a taxa de incidência de sífilis congênita (3,8). Essas metas poderiam auxiliar a busca por maior eficiência.

Tabela 3
Valores dos indicadores e metas, por capital não eficiente, em 2019.

Os resultados das mudanças de produtividade pela comparação do IM e seus componentes (EIM, TIM), em perspectiva dinâmica da mudança entre fronteiras de eficiência sucessivas (2008 e 2019) foram agrupados segundo os modelos de gestão (AD e AT) (Tabela 4).

Tabela 4
Mudanças do Índice Malmquist e de seus componentes entre 2008 e 2019, por agrupamentos de capitais segundo modelo de gestão.

Houve redução da produtividade setorial (Geral), com IM=0,70(0,691,02) que decorreu da involução (< 1) tecnológica (TIM = 0,69) e da mudança positiva (> 1), muito pequena, na eficiência (EIM = 1,02). Como efeito, em média, a APS involuiu (IM) na conversão de inputs (Xi) em outputs (Yi). A evolução de EIM expressa o uso da escala ideal (adequação ao porte mais produtivo) e o ganho de eficiência técnica ao converter insumos em produtos (Xi utilizado em 2008 gerou menos Yi em 2019).

Houve também involução média do IM em ambas as formas de gestão da APS. A APS sob AD evoluiu a Eficiência (EIM) e involuiu em tecnologia (TIM) enquanto sob AT involuiu a Eficiência (EIM) e evoluiu em tecnologia (TIM). A mudança negativa nos escores TIM não resulta da observação empírica da tecnologia nas capitais, mas da comparação entre os seus afastamentos à fronteira de eficiência AED VRS−O, medidos nos tempos t (2008) e t+1 (2019). A menor variação (CV, max, min) nos escores sob AT, indicam cidades mais homogêneas na oferta de APS.

DISCUSSÃO

A análise da eficiência da APS nas capitais brasileiras no período 2008–2019 resultou em 15 capitais com AD eficientes, ao passo que outras 12 apresentaram ineficiência de fraca intensidade. Entre as ineficientes figuram as capitais com administração cedida a terceiros (AT).

Há predomínio da AT no Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo e Fortaleza, o que inclui as duas capitais mais populosas. Esse resultado se alinha com levantamento anterior1919. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Perfil dos municípios brasileiros: 2018. Rio de Janeiro: IBGE; 2019 [cited 2023 June 20]. Available from: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101668.pdf
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, que indicou predominar estabelecimentos municipais de saúde administrados por terceiros na Região Sudeste (72,4%), seguido da Sul (15,2%) e Nordeste (8,0%). Destacam-se as Fundações no Sul e as OS no Sudeste, que representam 83,3% das instituições terceirizadas.

A gestão em saúde por OS tem presença expressiva nas cidades ou estados de maior poder econômico, com relevância para a sua origem e maior número no estado de São Paulo2020. Sodré F, Bussinguer ECA. Organizações sociais e privatização da saúde: a discricionariDEAde dos contratos de gestão com o terceiro setor. In: Sodré F, Bussinguer ECA, Bahia L, organizadores. Organizações sociais: agenda política e os custos para o setor público da saúde São Paulo: Hucitec, 2018. p. 37-65., ratificando seu caráter empresarial e localização nos principais polos econômicos do país. Outro estudo2121. Morais HMM, Albuquerque MSV, Oliveira RS, Cazuzu AKI, Silva NAF. Organizações sociais da saúde: uma expressão fenomênica da privatização da saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2018;34(1):e00194916. https://doi.org/10.1590/0102-311x00194916.
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corrobora esse achado ao demonstrar a expansão geográfica das dez maiores OS do país, presentes em 17 estados, com concentração no eixo sul-sudeste, de maior dinamismo econômico. Da mesma forma, as capitais com maior percentual de cobertura por planos de saúde estão nas sete capitais dessas regiões.

Todas as capitais investem, ou superam, o percentual mínimo de aplicação de recursos em saúde, o que é consistente com outros autores. Desde 2004, todos os municípios brasileiros superam o percentual mínimo (15%), com média de 22,5% em 20172222. Vieira FS, Piola SF, Benevides RPS. Vinculação orçamentária do gasto em saúde no Brasil: resultados e argumentos a seu favor. Brasília, DF: Ipea; 2019. (Texto para Discussão, n. 2516)..

O limite legal de gastos com pessoal no poder executivo municipal (54%) determinados pela LRF, é um dos principais argumentos para a implantação de AT2323. Costa NR, Silva IM, Lima PT, Silva TS, Costa ICM, Figueiredo IVO.A implantação em larga Escale da Estratégia de Saúde da Família na cidade do Rio de Janeiro, Brasil: evidências e desafios. Cienc Saude Coletiva. 2021;26(6):2075-82. https://doi.org/10.1590/1413-81232021266.01012021
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, mormente na APS. No Rio de Janeiro, a terceirização não reduziu o percentual de 56,2%. Também é apontada2323. Costa NR, Silva IM, Lima PT, Silva TS, Costa ICM, Figueiredo IVO.A implantação em larga Escale da Estratégia de Saúde da Família na cidade do Rio de Janeiro, Brasil: evidências e desafios. Cienc Saude Coletiva. 2021;26(6):2075-82. https://doi.org/10.1590/1413-81232021266.01012021
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redução do esforço fiscal no Rio, que aplicou 25,5% de receita própria em 2016, com posterior redução iniciada, em 2017, quando investiu apenas R$ 3,31 per capita/dia em saúde, valor abaixo da média nacional (R$ 3,38 per capita/dia)2424. Melo EA, Mendonça MHM, Teixeira M. A crise econômica e a atenção primária à saúde no SUS da cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Cienc Saude Coletiva. 2019 dez;24(12):4593-8. https://doi.org/10.1590/1413-812320182412.25432019.
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Os maiores gastos per capita em APS, em 2020, foram realizados em Florianópolis (R$ 517,22) e São Paulo (R$ 403,64), o que pode sugerir baixa influência do modelo de gestão na priorização da APS nos gastos em saúde. Todavia, a cobertura populacional na APS em Florianópolis é historicamente superior à de São Paulo capital55. Ramos ALP, De Seta MH, Andrade CLT. Terceirização e desempenho da atenção primária à saúde nas capitais brasileiras. In: Sá MC, Tavares MFL, De Seta, MH. Organização do cuidado e práticas em saúde: abordagens, pesquisas e experiências de ensino. Rio de Janeiro, Fiocruz, 2018. p. 295- 357..

Ao longo do tempo, houve estabilidade nos escores de eficiência para 12 das 15 capitais sob AD. Essa regularidade está em sintonia com um estudo que indicou Florianópolis, Belo Horizonte e Curitiba como referências nacionais de forte rede de APS com ênfase na ESF2525. Organização Pan-Americana da Saúde. Inovando o papel da Atenção Primária nas redes de Atenção à Saúde: resultados do laboratório de inovação em quatro capitais brasileiras. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da Saúde; 2011.. Similarmente, São Paulo não ser eficiente em todos os anos estudados reafirma análise realizada em 20152626. Contreiras H, Matta GC. Privatization of health care management through Social Organizations in the city of São Paulo, Brazil: description and analysis of regulation. Cad Saude Publica. 2015 Feb;31(20): 285-97. https://doi.org/10.1590/0102-311X00015914
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, de que a experiência de administração gerencial pelo setor privado na capital paulista não alcança maior eficiência mediante o combate ao patrimonialismo.

Os escores de ETécnica das capitais (Tabela 2) foram obtidos em diferentes condições de investimento em saúde. Considerados valores corrigidos para 2019, a APS sob AD reduziu o gasto médio de R$ 232,86/hab para R$ 153,08/hab entre 2008 e 2019 (-52,1%), enquanto as capitais com AT aumentaram de R$ 127,00/hab para R$ 211,94/hab (+66,9%). Há desproporção de investimentos relacionada às escalas de produção decrescentes e ineficiências das capitais sob AT, que têm maior gasto per capita (Xi) sem a correspondente melhora da condição de saúde (Yi). Reitera-se que a busca de eficiência pela APS pública é limitada pela continuada asfixia no financiamento99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022.,1717. Funcia FR. Subfinanciamento e orçamento federal do SUS: referências preliminares para a alocação adicional de recursos. Cienc Saude Coletiva. 2019 Dez;24(12):4405-15. https://doi.org/10.1590/1413-812320182412.25892019
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A análise da mudança de produtividade (IM e seus componentes EIM, TIM), entre 2008 e 2019, também evidenciou diferenças entre modelos de gestão da APS. Ambos apresentaram involução na produtividade média (IM). Nas capitais sob AD esse efeito foi maior pelo recuo tecnológico (TIM) e simultâneo incremento de eficiência ao gerar resultados (EIM = 1,04), pela melhora na eficiência técnica pura e de escala. Inversamente, nas capitais sob AT (Fortaleza, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre) houve evolução tecnológica (TIM = 1,04), relacionada à capacidade de adequação das capitais à tecnologia disponível, porém com redução de eficiência. Esses resultados são consistentes com a redução dos investimentos e também podem decorrer da maior heterogeneidade entre as capitais sob AD.

Vale considerar que a eficiência produtiva pode não ser efetiva em atender demandas de saúde99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022.. Essa questão é importante no contexto das avaliações dos processos de pactuação entre entes federados, em que a contagem do número de indicadores com metas atendidas pelos municípios pode permitir a sua comparação, mas não a suposição de sua eficiência.

Nossos resultados estão alinhados com estudos realizados em outros contextos. Melhor prestação em hospitais filantrópicos sobre os privados com fins lucrativos33. Rao S. Is the private sector more efficient? A cautionary tale. 2016. https://doi.org/10.13140/RG.2.1.1180.1682
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; ausência de comprovação de superioridade de modelos alternativos à AD, sendo ainda escassas as evidências sobre impactos positivos da gestão em arranjos público-privados2727. Ravioli AF, Soárez PC, Scheffer MC. Modalidades de gestão de serviços no Sistema Único de Saúde: revisão narrativa da produção científica da Saúde Coletiva no Brasil (2005-2016). Cad Saude Publica. 2018;34(4):e00114217. https://doi.org/10.1590/0102-311X00114217
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,2828. Soares GB, Borges FT, Santos RR, Garbin CAS, Moimaz SAS, Siqueira CEG. Organizações Sociais de Saúde (OSS): privatização da gestão de serviços de saúde ou solução gerencial para o SUS? Rev Eletronica Gestao Saude;7(2):828-50.. Ademais, a privatização do Sistema Único de Saúde (SUS) como solução para maior eficiência, tem sido tratada como mito99. Ocké-Reis CO, organizador. SUS: avaliação da eficiência do gasto público em saúde. Brasília, DF: Ipea, Conass, Opas; 2022..

A revisão de literatura internacional também não encontrou evidências de maior eficiência em prestação pública ou privada no setor saúde. O aumento da privatização do NHS mediante subcontratação de serviços a empresas com fins lucrativos correspondeu à queda de qualidade na assistência em saúde, com aumento de mortalidade evitável2929. Goodair B, Reeves A. Outsourcing health-care services to the private sector and treatable mortality rates in England, 2013-20: an observational study of NHS privatisation. Lancet Public Health. 2022 Jul;7(7):e638-46. https://doi.org/10.1016/S2468-2667 (22)00133-5
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, assim como houve piora dos cuidados e resultados em saúde em outros países de renda elevada3030. Goodair B, Reeves A. The effect of health-care privatisation on the quality of care. Lancet Public Health. 2024 Mar;9(3):e199-206. https://doi.org/10.1016/S2468-2667 (24)00003-3
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As limitações deste estudo podem decorrer do método e dos dados utilizados. A opção pelo modelo adotado (AED VRS−O e índice Malmquist) produziu resultados consistentes, entretanto destacamos que suas fronteiras de eficiência (vertical e horizontal) podem gerar eficiências que não atendem perfeitamente ao conceito de Pareto-Koopmans. Teria sido possível utilizar modelos mais flexíveis e dinâmicos de AED, mas eles não são isentos de limitações intrínsecas, em especial as suposições de aditividade, divisibilidade, proporcionalidade e certeza. Quanto às variáveis, ressaltamos que a quantidade de DMU não permitiu o uso de formas estocásticas de AED. Quanto aos dados, os indicadores utilizados podem influenciar a eficiência estimada pela incompletude ao representar a APS e, ainda, apesar de haver uma relação lógica consistente entre insumos e produtos utilizados, a eficiência pode ser influenciada por fatores socioeconômicos concorrentes e exógenos à APS, que não foram estudados.

CONCLUSÕES

O alcance da eficiência não representa, necessariamente, satisfação de necessidades de saúde. Os resultados indicam que unidades da APS sob AD são mais eficientes do que as sob AT e não apontam evidências de ganho de eficiência na APS das capitais brasileiras pela adoção de modelos alternativos de gestão. Isso confronta os benefícios disseminados pelo pensamento neoliberal e incorporados pela nova gestão pública e, ainda, contrasta com a suposição de existir maior eficiência da prestação de serviços públicos com a adoção de fundamentos do mercado e inclusão de instituições privadas para qualificar políticas sociais.

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  • Financiamento:

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes - PROEX nº: 1673/2024 / 88881.974063/2024-01- Programa de Saúde Pública).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Maio 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2024
  • Aceito
    18 Jul 2024
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br