Representações do cuidado em saúde bucal de crianças em vulnerabilidade em uma cidade do nordeste do Brasil11Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio ao estudo no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Universidade Federal do Ceará.

Representations of child oral health care in northeastern Brazil

Patrícia Soares Cavalcante Ricardo Hugo Gonzalez Sobre os autores

Resumo

O cuidado em saúde bucal com enfoque na integralidade em saúde de crianças em vulnerabilidade social auxilia a desenvolver indivíduos com uma maior consciência de si. Uma das suas dependências está no potencial modelador das ações, atitudes e intenções dos sujeitos em relação à saúde ou doenças bucais e seus modos de cuidar circulantes na sociedade. O objetivo central foi analisar as representações sociais do cuidado em saúde bucal de crianças em vulnerabilidade. Realizou-se uma pesquisa qualitativa e exploratória, cuja amostra foram 26 crianças entre cinco e 12 anos, numa unidade de atenção primária em saúde de Fortaleza, CE, entre maio e julho de 2021. Foi aplicada a técnica do desenho-estória com tema e realizada análise interpretativa das informações, utilizando elementos da teoria salutogênica e revisão narrativa, evocados através de representações sociais, por meio de análise temática do conteúdo. As crianças retratam a prática da escovação dentária enquanto hábito rotinizado ou coercitivo, como cuidado oral. Práticas de autocuidado oral, expressando ludicidade, associando a assistência odontológica e elencando variedade de elementos para a atividade foram pontuais. Nas representações da boca, o significado é atrelado aos dentes e aos lábios, desejos e idealizações para com eles, experiência de cárie e da perda do dente decíduo.

Palavras-chave:
Saúde Bucal; Cuidado da Criança; Senso de Coerência

Abstract

Oral health care focused on comprehensive health for vulnerable children helps to develop better self- aware individuals, relying on the shaping potential of the subjects’ actions, attitudes and intentions regarding oral health or diseases and their ways of caring in place. This study sought to analyze the social representations of oral health care for vulnerable children. A qualitative and exploratory research was conducted with 26 children between five and 12 years of age, in a primary health care unit in Fortaleza, between May and July 2021. Data were collected by means of thematic drawing-story and investigated by interpretive and content analysis, using elements from salutogenic theory and narrative review evoked by social representations. Children portray toothbrushing as a routine or coercive habit, such as oral care. Oral self-care practices associated with playfulness, dental care and a variety of elements for the activity were punctual. In representations concerning the mouth, meaning is tied to the teeth and lips, related desires and ideals, the experience of caries and loss of primary tooth.

Keywords:
Oral Health; Child Care; Sense of Coherence

Introdução

A boca humana é um território corporal dotado de processos de produção e reprodução social dos homens, das suas condições materiais e da sua inserção nesta produção. Ela acumula, hoje, aspectos identitários envoltos por séculos de uma práxis social na qual suas estruturas dentárias apresentam-se diferentemente entre categorias e classes sociais (Iyda, 1998IYDA, M. Saúde bucal: uma prática social. In: BOTAZZO, C.; FREITAS, S. F. T. Ciências sociais e saúde bucal: questões e perspectivas. São Paulo: Unesp, 1998. p. 127-140.). Essa práxis, aplicada às funções primordiais da boca, auxilia na promoção ou não de um constructo do cuidado de si.

Em análises históricas, por seguimento populacional e das práticas assistenciais em saúde bucal, a cárie ainda desponta como a doença mais prevalente no mundo, polarizada em populações vulneráveis e com uma prática clínica relevante enquanto intervenção no componente biológico; entretanto, ela pouco contempla as dimensões do processo saúde-doença-cuidado em seus significados e como tópico modelador das ações humanas, já que estas resultam de processos para além das condições biológicas e assistenciais que alimentam o ciclo clínico-restaurador-cirúrgico (Barreto; Colares, 2020BARRETO, K. A.; Colares, V. The social status associated with dental experience among Brazilian children. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 25, n. 10, p. 3913-3919, 2020. DOI: 10.1590/1413-812320202510.32312018
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; Neves; Giordani; Hugo., 2017NEVES, M.; GIORDANI, J. M. A., HUGO, F. N. Atenção primária à saúde bucal no Brasil: processo de trabalho das equipes de saúde bucal. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 24, n. 5, 2019. DOI: 10.1590/1413-81232018245.08892017
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; Rousseau et al., 2013ROUSSEAU, N. et al. Your whole life is lived through your teeth: biographical disruption and experiences of tooth loss and replacement. Sociology of Health & Illness, Bethesda, v. 36, n. 3, p. 462-476, 2013. DOI: 10.1111/1467-9566.12080
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).

A permuta entre o biológico e o assistencial no processo saúde-doença-cuidado se ocuparia então de incapacidades bucais, dimensão para a qual apresenta potencial resolutivo e de satisfação das pessoas. Entretanto, saúde bucal e “capacidade bucal” ou “incapacidade bucal” são condições diferentes e de aspecto complexo e individual (Narvai; Frazão, 2013NARVAI, P. C.; FRAZÃO, P. O SUS e a Política Nacional de Saúde Bucal. In: PEREIRA, A. C. Tratado de Saúde Coletiva em Odontologia. São Paulo: Napoleão, 2013. p. 18-32.), pois retoma as dicotomias inscritas nos valores culturais do que é saúde/ doença, correto/incorreto, saudável ou doentio.

A dor de dente que se segue à cárie não tratada também é um problema persistente, muitas vezes grave e revelado em histórias de vida de muitas crianças em todo o mundo. A prevalência de dor dentária na faixa etária pode variar de 5% a 33% e aumenta com a idade da criança, severidade da cárie e declínio do status socioeconômico (Peres et al., 2019PERES, M. A. et al. Oral diseases: a global public health challenge. The Lancet, Bethesda, v. 394, n. 10194, p. 249-260, 2019. DOI: 10.1016/S0140-6736(19)31146-8
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). No sul do Brasil, esse fenômeno, acrescido da perda dentária entre adolescentes, tem sido observado até mesmo em áreas com Atenção Primária em Saúde (APS) e com acesso a equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF), sendo esta determinada pelo contexto social e de vulnerabilidade (Ely et al., 2016ELY, H. C. et al. Impacto das equipes de saúde bucal da Estratégia da Saúde da Família na saúde bucal de adolescentes do sul do Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 21, n. 5, p. 1607-1616, 2016. DOI: 10.1590/1413-81232015215.07822015
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).

Crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social são aquelas que vivem negativamente as consequências das desigualdades, com mais exposição à violência armada e a piores condições de saúde e educação (Pereira, 2016PEREIRA, S. E. F. N. Crianças e adolescentes em contexto de vulnerabilidade social: articulação de redes em situação de abandono ou afastamento do convívio familiar. São Paulo: Acolhimento em rede. Disponível em: <Disponível em: http://acolhimentoemrede.org.br/ >. Acesso em: 23 nov. 2020.
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). Na Pesquisa Nacional de Saúde Bucal 2010 (SB Brasil 2010), um dos principais problemas observados refere-se à cárie não tratada entre 12 e 15 anos, além das diferenças regionais: o Norte e Nordeste apresentam o índice de Dentes Cariados, Perdidos e Obturados (CPOD) entre médio e alto (Brasil, 2012BRASIL. Ministério da Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal - resultados principais. Brasília, DF, 2012., p. 39).

No Ceará, de um total de 1976 pessoas na amostra da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a proporção de pessoas com 18 anos ou mais que perderam 13 ou mais dentes foi em média de 28,9%. Na capital, Fortaleza, a proporção média total foi de 21,8% (IBGE, 2019IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde: percepção do estado de saúde, estilos de vida, doenças crônicas e saúde bucal. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: <Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/saude/9160-pesquisa-nacional-de-saude.html?edicao=29270&t=o-que-e >. Acesso em: 25 nov. 2020.
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), sugerindo o acúmulo da doença no decorrer do tempo.

Pesquisas também reiteram a estrutura dicotômica e semiótica dos valores culturais sobre o que é saúde-doença-cuidado oral na sociedade, principalmente quando se ocupam do caráter transcendental da dor dentária, da naturalização histórica da cárie como um fenômeno comum humano, do isolamento da boca e dos dentes em atos de cuidado como atividade exógena e normativa e do meio social onde são produzidas práticas e discursos sobre o cuidado em saúde bucal (Abreu; Pordeus; Modena, 2005ABREU, M. H. N. G.; PORDEUS, I. A.; MODENA, C. M. Representações sociais de saúde bucal entre mães no meio rural de Itaúna (MG), 2002. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 245-259, 2005. DOI: 10.1590/S1413-81232005000100031
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; Arora et al., 2021ARORA, A. et al. How do mothers living in socially deprived communities perceive oral health of young children? A qualitative study. International Journal of Environmental Research and Public Health, Bethesda, v. 18, n. 3521, p. 1-18, 2021. DOI: 10.3390/ijerph18073521.
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; Nations; Nuto, 2002NATIONS, M. K.; NUTO, S. A. S. “Tooth worms”, poverty tattoos and dental care conflicts in Northeast Brazil. Social Science & Medicine, Bethesda, v. 54, p. 229-244, 2002. DOI: 10.1016/s0277-9536(01)00019-3
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). Assim, a compreensão dos efeitos que diferentes contextos e complexidades exercem sobre a forma com que os sujeitos concebem significados distintos a um mesmo objeto permite prever os “modos de pensar” sobre esse objeto, identificar qual importância lhe é atribuída na forma de reprodução no cotidiano das pessoas e quais práticas culturais do seu uso são socialmente aceitas e compartilhadas por um determinado grupo (Nascimento-Schulze; Garcia; Arruda, 1995NASCIMENTO-SCHULZE, C. M.; GARCIA, Y. F.; ARRUDA, D. C. Health paradigms, social representations of health and Illness and their central nucleus. Papers social representations, [S. l], v. 4, n. 2, p. 1021-5573, 1995.).

Neste sentido, identificar como atores sociais atribuem relevância a determinados temas, resumidos no fenômeno das relações, das representações e da intencionalidade, como objeto percebido no cotidiano e que são adensados no constructo do pensamento desses sujeitos, auxilia no planejamento de ações e estratégias para um cuidado em saúde bucal. Assim, o objetivo foi analisar as representações sociais do cuidado oral de crianças em vulnerabilidade numa cidade do nordeste do Brasil, através de elementos impressos na linguagem.

Percurso Metodológico

Este estudo faz parte de uma pesquisa maior que visa analisar as representações sociais do cuidado em saúde bucal de crianças e seus cuidadores em situação de vulnerabilidade. Com abordagem qualitativa, do tipo exploratório, o estudo envolveu crianças entre cinco e 12 anos em situação de vulnerabilidade social, com termos de aceitação pactuados e assinados entre elas e seu respectivo responsável.

Foi utilizada a técnica do desenho-estória com tema para produção do material de pesquisa (Trinca, 1997TRINCA, W. (Org.). Forma de investigação clínica em Psicologia. São Paulo: Vetor, 1997., p. 12). O tema é determinado por um condutor (nesse caso, o próprio pesquisador). A execução do desenho foi precedida de um diálogo, no qual a criança foi estimulada a comentar sobre três questões: como é a sua boca, como cuida dela e se ela já foi ao dentista. Em seguida, a criança recebeu uma folha de papel-ofício em branco e lápis de cor e foi convidada a fazer um desenho sobre o que “está vindo à sua cabeça”.

Durante a etapa de construção do desenho, a criança não foi interrompida e foi respeitado o tempo que ela necessitasse para elaboração do pensamento e da projeção. Concluída a etapa de construção do desenho, a criança expressava verbalmente as ideias contidas nele. Foi estimulado o relato do sentido de cada elemento representado e por quais motivos foram abordados. O registro da exposição verbal foi anotado em uma folha de papel- ofício individual identificada com o nome da criança.

Sob a lógica abdutiva, a análise interpretativa das informações produzidas considerou os elementos constituintes de base da teoria salutogênica e revisão narrativa, evocados através de representações sociais do objeto de estudo. O processo evocativo aconteceu por análise temática do conteúdo, com delineamento categórico.

Segundo Minayo (2009MINAYO, M. C. S. Pesquisa Social: teoria, método, criatividade. 26. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.), a análise temática busca descobrir os núcleos de sentidos que expressam o processo linguístico da tematização no pensamento, algo cuja presença, frequência ou tensão cognitiva tenham significado para o objeto analisado, seja por escrita, fala, iconográficos, gestos ou expressões, o que coaduna com a perspectiva das Representações Sociais (RS) de Moscovici (2007MOSCOVICI, S. Representações sociais: investigações em psicologia social. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.). Para o autor, RS favorecem a identificação da reprodução de percepções retidas na lembrança ou do conteúdo do pensamento dos sujeitos analisados. A perspectiva define representações sociais como categorias de pensamento que expressam a realidade, uma vez que o ser humano como ser social cria conteúdos cognitivo-afetivos a partir do contexto que os originam e sobre objetos socialmente valorizados, sendo eles transcritos no prolongamento do seu comportamento, desenvolvendo sua identidade e procurando seu lugar no mundo.

Assim, dimensões e tensões do cuidado em saúde oral podem ser evocadas e explicadas pela teoria salutogênica, que consiste em um modelo dos sistemas complexos, da saúde e humano, que pode explicar o paradigma da promoção da saúde. O modelo salutogênico fornece pontos fortes e fracos de suas dimensões, práticas e ideias preventivas, curativas e de reabilitação para a garantia da qualidade de vida na perspectiva de fortalecer o capital psicológico de indivíduos e, consequentemente, coletividades. Por concentrar a sua atenção nos elementos do capital psicológico, como autonomia, autoeficácia, afeto, vontade de viver etc. auxilia a pessoa na superação das dificuldades que surgem na sua vida (Antonovsky, 1996ANTONOVSKY, A. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International, Oxford, v. 11, n. 1, p. 11-18, 1996. DOI: 10.1093/heapro/11.1.11
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).

A inclusão da faixa de idade considerada no estudo foi por ser um período entre a fase final da primeira infância e adolescência, que corresponde ao período de cristalização do pensamento. Nessa fase há o início da construção lógica do raciocínio, o período operatório concreto. A criança tem a capacidade de estabelecer relações que permitam a coordenação de pontos de vista diferentes, com a energia libidinal voltada para brincadeiras, esportes, artes e atividades intelectuais (Xavier; Nunes, 2015XAVIER, A. S.; NUNES, A. I. B. L. Psicologia do Desenvolvimento. 4. ed. Fortaleza: EdUECE, 2015. p. 162.).

A produção do material de pesquisa ocorreu em território de abrangência de uma Unidade de Atenção Primária em Saúde (UAPS), da Coordenadoria Regional de Saúde (CORES) III, no município de Fortaleza, CE, entre maio e julho de 2021. O município possuía uma população estimada, no período de dezembro de 2020, de 2.669.342 pessoas (IBGE, 2021), com cobertura populacional pelas Equipes de Saúde da Família (EqSF) de 58,29% e pelas Equipes de Saúde Bucal (EqSB) de 47% (Fortaleza, 2021FORTALEZA. Secretaria Municipal de Saúde. Coordenadoria de Redes de Atenção Primária e Psicossocial - CORAPP. Área técnica de Saúde Bucal. Fortaleza, 2021.), distribuídas em sete coordenadorias regionais de saúde. As coordenadorias abrangem bairros que se caracterizam pela proximidade e perfil sociodemográfico.

O critério de escolha pela Cores III foi por apresentar cobertura de EqSB equivalente ao total do município de 48% (Fortaleza, 2021FORTALEZA. Secretaria Municipal de Saúde. Coordenadoria de Redes de Atenção Primária e Psicossocial - CORAPP. Área técnica de Saúde Bucal. Fortaleza, 2021.), conter uma UAPS com área de abrangência envolvendo o nono bairro mais populoso do município, com 42.494 habitantes; sua população apresentar renda média de R$ 658,00 e risco médio de violência urbana (Fortaleza, 2017FORTALEZA. Secretaria Municipal de Saúde. Plano municipal de saúde de Fortaleza: 2018 - 2021, Fortaleza, 2017.).

A amostragem da pesquisa foi não probabilística, composta por casos múltiplos, contatados via indicação do serviço de saúde, especificamente, através do Agente Comunitário de Saúde (ACS). A indicação dos casos obedeceu a uma dinâmica capilar de relações sociais e micropolíticas, estabelecida entre serviço de saúde, trabalhadores da saúde, pesquisador e população estudada. Durante os encontros foi seguido o protocolo sanitário corrente para pandemia do coronavírus. A utilização de casos múltiplos foi por envolver um volume grande de sujeitos cujo objeto de pesquisa não é mensurável e em que se procura elementos que caracterizam a homogeneidade da amostra, assim como elementos que identificam a diversidade entre eles (Nobre et al., 2016NOBRE, F. C. et al. A amostragem na pesquisa de natureza científica em um campo multiparadigmático: peculiaridades do método qualitativo. Investigação Qualitativa em Ciências Sociais, Lisboa, v. 3, p. 157-166, 2016.).

O primeiro contato foi com os cirurgiões-dentistas, seguido da coordenação do serviço e, sequencialmente, os ACS da unidade. Em todos os momentos, o objetivo da pesquisa, os métodos empregados e a forma de divulgação deles foram apresentados e reforçados. Essas etapas foram fundamentais para a identificação dos casos em estudo, permitindo o contato a partir do fluir da rede de relações (Abreu; Pordeus; Modena, 2005ABREU, M. H. N. G.; PORDEUS, I. A.; MODENA, C. M. Representações sociais de saúde bucal entre mães no meio rural de Itaúna (MG), 2002. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 245-259, 2005. DOI: 10.1590/S1413-81232005000100031
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).

A amostragem final foi definida por contraste-saturação. Foram excluídos os sujeitos com: impossibilidade ou negação de construir desenho ou elaborar um pensamento relacionado a um desenho, condição de dor dentária recente pela criança, condição de estresse identificável, adoecimento físico ou negação do responsável.

Resultados

A amostragem final do estudo contemplou 26 crianças com seus respectivos desenhos, de ambos os sexos. Elaborando o pensamento quanto aos questionamentos sobre o cuidado da boca, como imagina que ela é e se já foi ao dentista, as crianças esboçaram características próprias da idade nas falas e nos desenhos, como sociabilidade, estabelecimento de relações em grupo, brincadeiras, verbalização de visões diferentes e representações do mundo da fantasia com interpretações mais lógicas.

As crianças projetam temas relacionados ao hábito de higiene como cuidado e percebem a boca segundo estado dental, desejos e idealizações, com a representação do cirurgião-dentista pouca expressiva. Foram explorados também os sentidos de cada elemento presente nos desenhos e nas falas das crianças, a fim de identificar os sentimentos quanto aos objetos em reflexão. Sob estes aspectos foram delineadas as categorias de sentidos e estratégias para um cuidado oral e representações da boca: como ela é.

Sentidos e estratégias para um cuidado oral

A escovação dentária foi refletida como uma prática rotinizada ou coercitiva do cuidado oral. Em alguns casos foram elaboradas associações à escovação dentária como prática de cuidado em saúde bucal, por exemplo: a projeção de outros elementos que compõe a higiene dental e assistência odontológica; e a ludicidade e/ou criticidade na estruturação de um hábito.

O cuidado oral foi representado pelas crianças com imagens da escova dental, sendo a prática descrita nas expressões verbais. A atividade foi verbalizada no formato em que acontece e apontando elementos e personagens pertencentes a ela. A rotina foi compreendida como associação da escovação com outros hábitos da criança, tais como horário do uso de medicação contínua e horários específicos do dia, por exemplo, período da manhã e do banho, quando descrevem o ambiente e os utensílios que utilizam, como o espelho. No Desenho 1, observa-se a elaboração do cuidado oral como hábito rotinizado.

Desenho 1
Escovação dentária como rotina

O cuidado oral é representado como um hábito instituído pela mãe da criança, sendo realizado de forma rotinizada, no Desenho 1. A memória da criança traz o conteúdo primeiro acessado no pensamento, sugestionando que a realização da prática acontece somente uma vez ao dia e sem o uso de dispositivos complementares de remoção do biofilme dental, como o fio dental.

Essa boca é minha. Quem me ensinou foi minha mãe a escovar o dente. Eu escovo 8 horas, de manhã. (Criança 5, 9 anos)

A escovação dentária também foi revelada como um cuidado oral realizado sob coerção. Na fala da criança 2, Desenho 2, a indicação da escovação dentária é realizada somente uma vez ao dia e sob a ordem dos cuidadores.

Eu só fiz os dente pôde, esses aqui (aponta no desenho) porque eu desenhei a boca pequena, sinto dor nos dente pôde. Essa é minha escova (aponta para o desenho da escova), eu só escovo uma veis por dia, quem manda é meu vô e minha mãe. (Criança 2, 8 anos)

Desenho 2
Escovação dentária coercitiva

A imagem transmitida na elaboração no Desenho 2 remonta a lembrança da dor dentária já sentida e do não reconhecimento da boca sadia, com o cuidado oral visualizado no ato da escovação dentária rotineira, mas sob a determinação da mãe e do avô, e não como uma atividade auto reconhecida como habitual.

A projeção de elementos associados à escovação dentária foi representada com menor frequência. Foram projetadas estratégias sem distinção hierárquica entre elas, sendo possível presumir que a criança as assimila como um todo enquanto componentes do cuidado em saúde bucal. Foram citados: uso de espelho durante a escovação dentária, fio dental, colutórios e assistência odontológica. Os desenhos 3 e 4 ilustram os casos citados.

Desenho 3
Escovação associando fio dental

Desenho 4
Componentes do cuidado oral

No Desenho 3, a criança remonta sua boca e os momentos da higiene dental como atividade atrelada ao uso da medicação e ida à escola. A lembrança da escola, uma vez que, no período, elas encontravam- se fechadas pela pandemia do coronavírus, levantam a questão de que, estaria a criança mantendo a rotina? As expressões, as cores e as formas no desenho esboçam positividade quanto às ações e aos objetos de desejo, como alinhamento dos dentes.

A [linha vermelha] é o fio dental, a [amarela] é tipo aparelho, eu acho que meus dente é torto, ai preciso ajeitar. A [linha azul] é dos dente e o espaço branco é o céu da boca. Aqui é a pasta, minha pasta é verde. Passo fio dental, escovo meu dente de novo, tomo meu remédio e vou dormir. Sempre que vou para o colégio eu escovo meu dente.”E a carinha feliz?“Depois que faz tudo isso. (Criança 20, 10 anos)

No Desenho 4, a associação para um cuidado dos dentes entre a escovação dentária e a assistência odontológica faz referência à dor dentária experienciada, trazendo o aspecto preventivo e curativo mutilador da doença cárie que é circulante no contexto social da criança e que foi assimilado como componente do cuidado oral.

A boca, o dentista que eu ia e a pasta. Eu coloquei porque eu tinha um dente que doía e precisava arrancar. (Criança 14, 12 anos)

A escovação dentária como um hábito de cuidado dotado de ludicidade e associação crítica à saúde da boca foi representada por casos pontuais. Os desenhos 5 e 6 fazem referência a esta perspectiva.

Desenho 5
O cuidado oral como saúde da boca

Desenho 6
O cuidado oral lúdico

A condição para brincar é revelada como o ato da escovação dental, demonstrando a fase lógico- racional e da energia libidinal próprias da idade, no Desenho 5. Sendo que o cuidado oral enquanto hábito instituído pode ser compreendido quando da distinção e associações do que é saudável, doentio e dos elementos elencados na construção, num processo de cristalização no pensamento do sentido da prática rotineira e condicionada.

Esse é o dente limpo e esse é o dente sujo. A pasta e a escova. Essa gengiva de baixo fica preta. A escova e a pasta a gente tem que escovar até ficar bem limpo e a gente ir brincar e ele não ficar preto. (Criança 10, 6 anos)

A ludicidade, no Desenho 6, é apresentada pelo momento da escovação dentária, esboçando um hábito rotinizado e internalizado pela criança, quando ele relembra e remonta o efeito do creme dental na boca como um balão. A idade da criança, o método utilizado na realização da prática pelo cuidador e as experiências da criança com sua boca e dentes podem ter auxiliado a construir a associação da prática da escovação de forma leve e contínua.

Minha escova e minha garganta com um balão cheio de pasta. (Criança 1, 5 anos)

Representações da boca: como ela é

Nas representações da boca, o significado é atrelado aos dentes e lábios, desejos e idealizações para com eles, experiência de cárie e da perda do dente decíduo. Nos desenhos 7, 8 e 9, se vê as representações de como as crianças imaginam e valorizam sua própria boca e dentes.

Desenho 7
Dentes, desejos e idealizações da boca

Desenho 8
Dentes, desejos e idealizações da boca

Desenho 9
Experiência perda do dente decíduo

No Desenho 7, a idealização do aparelho ortodôntico pode estar atrelada à necessidade de posse do dispositivo ou de alinhamento dental pela criança, elaborando a ideia de uma boca com aspectos semelhantes a de outras crianças e que está condicionada a má oclusão, denotando um caso de estigma.

É uma boca com aparelho e aqui é minha escova. Minha boca tem um aparelho porque eu queria ter um aparelho (Fonte: Criança 4, 9 anos)

No Desenho 8, a associação do cuidado oral é entre a consulta odontológica na Estratégia Saúde da Família e ao creme dental utilizado na escovação para a boca de desejo. O desejo para a boca é refletido na utilização e dúvida entre as cores rosa e vermelho no uso do batom, já despertado, e a frustação de ainda permanecer com a doença cárie em boca.

Eu desenhei uma boca e uma pasta. Ela é minha, pra escovar meu dente. Aqui é o hospital pra gente tomar vacina e arrancar o dente. No dia que eu fui, o homem mandou tirar um dente pôde aqui, mas minha mãe não levou. Eu cobri a boca de vermelho, parece um batom forte, eu prefiro um rosinha.”Pega a folha, se vira e volta a olhar a boca novamente. (Criança 15, 9 anos)

Já no Desenho 9, o detalhamento dos momentos em que houve a perda dos dentes por esfoliação fisiológica e as sensações da erupção dos dentes permanentes, representa a experiência sentida com o território bucal, própria da fase transitória de dentição mista, e de como ela ficou adensada no pensamento da criança.

Tem uma bolha aqui na minha boca, na hora que eu aperto dá uma dor de dente. Eu fiz um dente sem e depois outro dente sem, esse aqui eu tirei ali, na bodega, esse outro caiu sozinho. Quando cuspi saiu sangue, na minha língua apareceu um monte de bolinha de sangue. (Criança 18, 6 anos)

Discussão

O cuidado em saúde bucal de crianças em vulnerabilidade social foi representado no estudo como uma atividade externa à ação do corpo, ligada a sensações, práticas e percepções desconexas de técnicas para um cuidado de si. Técnicas de cuidado são trabalhadas por Foucault (2006FOUCAULT, M. A hermenêutica do sujeito. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.) nas categorias “cuidado de si mesmo” e “conhece-te a ti mesmo”, enquanto imperativos éticos do ser. O princípio do “conhece-te a ti mesmo” inclui nada em demasia e prevenção de riscos. O “cuidado de si mesmo” seria uma ação extensiva do ser; ele estaria encrustado no cerne do sujeito, constituindo um princípio de agitação, movimento e permanente inquietude no curso da existência.

Sob essa perspectiva, os achados do estudo validam a importância de conhecer e distinguir a fase de desenvolvimento da criança para introdução e consolidação de hábitos orais saudáveis. Na fase do operatório concreto, o movimento para saúde seria facilitado pela disponibilidade de energia da criança e pela flexibilização de esquemas do pensamento, na construção e cristalização dos significados durante a realização das práticas de cuidado (Xavier; Nunes, 2015XAVIER, A. S.; NUNES, A. I. B. L. Psicologia do Desenvolvimento. 4. ed. Fortaleza: EdUECE, 2015. p. 162.).

Neste sentido, utilizando-se de métodos por aprendizagem significativa, como por experiências, a educação em saúde bucal auxiliaria na condução do princípio de agitação. Assim, o cuidado seria um primeiro despertar luminoso para a razão - uma consciência crítica e estaria no limite “do que se é”, do ser/sujeito, segundo Foucault (2006FOUCAULT, M. A hermenêutica do sujeito. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.).

A consciência crítica está associada ao desenvolvimento do senso de coerência (SOC) dos indivíduos, no constructo de recursos generalizados de resistência, como a autonomia. O constructo do SOC se faz a partir do empoderamento dos indivíduos, comunidades ou coletivos em determinadas situações de enfrentamento, para explicar e seguir em direção a uma produção da saúde (Antonovsky, 1996ANTONOVSKY, A. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International, Oxford, v. 11, n. 1, p. 11-18, 1996. DOI: 10.1093/heapro/11.1.11
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). Essa visão combinada de forma particular à positividade dos acontecimentos auxiliaria em transformações das experiências vividas motivacional, comportamental e cognitivamente, para o empoderamento e busca do cuidado e da saúde, seja individual ou de forma coletiva (Leirbakk et al., 2018LEIRBAKK, M. J. et al. Formative research in the development of a salutogenic early intervention home visiting program integrated in public child health service in a multiethnic population in Norway. Bmc Health Services Research, Bethesda, v. 18, n. 1, p. 1-11, 2018. DOI: 10.1186/s12913-018-3544-5.
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).

O significado das experiências de vida, os recursos e os estilos disponíveis para vivê-las e quais deles escolher para usar são dependentes da cultura, grau de compreensão de um dado problema ou situação aos quais os indivíduos ou coletivos foram expostos, podendo variar muito em momentos diferentes de vida (Rousseau et al, 2013ROUSSEAU, N. et al. Your whole life is lived through your teeth: biographical disruption and experiences of tooth loss and replacement. Sociology of Health & Illness, Bethesda, v. 36, n. 3, p. 462-476, 2013. DOI: 10.1111/1467-9566.12080
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).

No campo da saúde bucal, em relação à cárie e aos comportamentos individuais como modeladores de um processo saúde-doença-cuidado, a força do SOC pode influenciar nos seus efeitos enquanto modelo biopsicossocial prático para a promoção da saúde. Para crianças e adolescentes, a saúde bucal é significativamente afetada pelo SOC dos pais, sendo o das mães com maior poder de influenciar práticas de saúde bucal, especificamente, o padrão de prevenção e consulta odontológica (Elyasi et al., 2020ELYASI, M. et al. Modeling the Theory of Planned Behaviour to predict adherence to preventive dental visits in preschool children. Plos One, Bethesda, v. 15, n. 1, p. 1-14, 2020. DOI: 10.1371/journal.pone.0227233
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).

Neste estudo, também é possível depreender que o padrão de métodos preventivos do cuidado oral, principalmente em relação à consulta odontológica, foi pouco representado pelas crianças e, quando presente, esboçando caráter adjunto ao cuidado oral, mas de intervenção na doença cárie. Tomazoni et al., (2019TOMAZONI, F. et al. The association between sense of coherence and dental caries in low-social status schoolchildren. Caries Research, Bethesda, v. 53, n. 3, p. 314-321, 2019. DOI: 10.1159/000493537
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), investigando o SOC de crianças direcionado à cárie, observaram que quanto maiores escores de SOC em crianças e adolescentes, melhores frequências de cuidados orais, como frequência de escovação dentária e idas ao dentista para consultas de prevenção.

Assim, seria necessário analisar junto aos responsáveis pelas crianças a significância do cuidado em saúde bucal, na tentativa de buscar a correspondência das práticas e dos métodos de transmissão do conhecimento. Uma vez que o conhecimento é compartilhado e construído na interação entre os sujeitos, em formato de encadeamento e pode produzir visões variadas sobre determinado objeto.

A significância faz parte do SOC, principal constituinte da teoria salutogênica de Antonovsky (1996ANTONOVSKY, A. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International, Oxford, v. 11, n. 1, p. 11-18, 1996. DOI: 10.1093/heapro/11.1.11
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). Segundo o autor, se cada indivíduo em seus sistemas sociais, em virtude de serem sistemas complexos, está no continuum do movimento em direção à saúde, com experimentações de vida variadas, é possível surgir classificações dicotômicas, tais como: saudável/ doentil, correto/incorreto, feio/bonito, já que é uma autoavaliação subjetiva e dependente da experiência vivida e imaginada por cada sujeito.

Neste estudo, enquanto recursos de empoderamento para o cuidado oral na população observada, os tipos de assistência odontológica e índices da doença cárie também necessitam de avaliação, uma vez que a lógica do cuidado na ESF, segundo a Política Nacional de Saúde Bucal, consiste “na reorientação das concepções e práticas no campo da saúde bucal capazes de propiciar um novo processo de trabalho tendo como meta a produção do cuidado” (Brasil, 2004BRASIL. Ministério da Saúde. Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. Brasília, DF, 2004.). Fatores estes que implicam no processo de trabalho na ESF com populações vulneráveis, como a deste estudo, já que as crianças representam o efeito da polarização da cárie. No efeito, há a existência de dois polos: em um deles, há ausência da doença; no outro, há grande quantidade de casos em um grupo de poucos indivíduos (Pereira, 2013PEREIRA, A. C. Saúde Coletiva: métodos preventivos para doenças bucais. São Paulo: Artes Médicas, 2013.).

Corroborando com Pereira (2013PEREIRA, A. C. Saúde Coletiva: métodos preventivos para doenças bucais. São Paulo: Artes Médicas, 2013.), quando ele observa que o fenômeno pode estar refletindo medidas de controle da cárie embasadas em estratégias populacionais, que acabam por privilegiar alguns grupos em detrimento de outros e revelar seguimentos populacionais negligenciados e marginalizados.

Em estudos por seguimento populacional, a polarização da cárie foi encontrada nesses grupos marginalizados, mesmo em países de alta renda, entre jovens, crianças e famílias em vulnerabilidade social. Além de pessoas em situação de rua, encarceradas, convivendo com doenças crônicas transmissíveis, como HIV/aids, pessoas que vivem com deficiência, comunidades indígenas e quilombolas, ciganos, pertencentes a programas de transferências de renda e imigrantes, que apresentaram dificuldade ou ausência total de acesso em serviços odontológicos e altos índices de cárie (Peres et al., 2019PERES, M. A. et al. Oral diseases: a global public health challenge. The Lancet, Bethesda, v. 394, n. 10194, p. 249-260, 2019. DOI: 10.1016/S0140-6736(19)31146-8
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).

Considerações Finais

O estudo suscita a abordagem preventiva no cuidado em saúde bucal, sob regras normativas e prescritivas que garantem a instituição de hábitos saudáveis, revelado no contexto das crianças analisadas. As crianças em vulnerabilidade social representam um cuidado oral como atividades de ação no corpo, como a higienização, de forma rotinizada ou coercitiva.

Aspectos das sensações, experiências, desejos e idealizações em relação à boca foram revelados como próprias da fase de desenvolvimento, como a dentição mista, brincadeiras e esquemas lógicos racionais. Expressões de normas sociais também foram dispostas, presentes no cotidiano da criança e que necessitam perceber os sentidos da representação, a fim de elencar estratégias de intervenção do cuidado naquelas não usuais para a fase de desenvolvimento.

Também se faz necessário investigar técnicas de cuidado dispostas por cuidadores distais à criança (como profissionais do serviço de saúde), não contemplados na pesquisa, em busca de explorar práticas e percepções do cuidado em saúde bucal que promovem a construção de representações sociais condizentes com o modelo biomédico odontológico, e que podem interferir na superação para modelos mais efetivos na produção da saúde, como os pertencentes ao paradigma da promoção da saúde.

Agradecimentos

Os autores agradecem aos profissionais de saúde da Estratégia Saúde da Família do município de Fortaleza (CE) pela viabilidade do estudo. Agradecem também aos pais e crianças por participarem da pesquisa.

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  • 1
    Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio ao estudo no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Universidade Federal do Ceará.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    25 Maio 2022
  • Aceito
    03 Jul 2022
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
E-mail: saudesoc@usp.br