Saúde e Sociedade, Volume: 27, Número: 1, Publicado: 2018
  • Apresentação - Desigualdades, vulnerabilidades e reconhecimento: em busca de algumas invisibilidades produzidas nas políticas de saúde Dossiê

    Castellanos, Marcelo Eduardo Pfeiffer; Baptista, Tatiana Wargas de Faria
  • Por uma atenção diferenciada e menos desigual: o caso do Distrito Sanitário Especial Indígena da Bahia Dossiê

    Mota, Sara Emanuela de Carvalho; Nunes, Mônica

    Resumo em Português:

    Resumo Nesse estudo buscou-se conhecer os significados do princípio da “atenção diferenciada” por meio da análise dos enunciados e da observação das práticas de gestores do Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas na Bahia, a fim de revelar as bases sociais, políticas e culturais que os sustentam e analisar como contribuem, ou não, para a sua operacionalização. Parte-se do pressuposto de que a prestação de ações de atenção à saúde efetivamente diferenciadas, que considerem as especificidades socioculturais dos povos indígenas e sua medicina tradicional, pode contribuir para maior resolutividade do cuidado à saúde desses povos e mitigação de algumas implicações de determinantes sociais sobre os modos de viver, adoecer e morrer na população indígena. Optou-se pela realização de um estudo qualitativo, de abordagem etnográfica, com aplicação das técnicas de observação participante e de entrevistas semiestruturadas entre gestores do Subsistema na Bahia. A coleta de informações ocorreu entre setembro de 2014 e março de 2017. As narrativas revelaram frequentemente um tom retórico da ideia de “atenção diferenciada” como uma iniciativa de respeito às especificidades culturais indígenas, as quais foram mais insistentemente utilizadas como justificativa para a não realização de práticas diferenciadas de cuidado (por exemplo, protocolos específicos). A presença de indígenas na gestão contribuiu para a produção de práticas mais contextualizadas e orientadas para os problemas vivenciados pelas comunidades, mas o esforço de legitimação nesse espaço social ratifica a hegemonia “branca” na pauta principal de discussões.

    Resumo em Inglês:

    Abstract In this study, we sought to know the meanings of the principle of “differentiated health care” through the analysis of narratives and practices from managers of the Subsystem of Indigenous People’s Health Care in Bahia, Brazil, to reveal how their social, political, and cultural bases can contribute or not to its operationalization. It is assumed that the provision of effectively differentiated health care actions, which consider the socio-cultural specificities of indigenous peoples and their traditional medicine, can contribute to a greater resolution of health services targeted for these peoples and mitigation of some social determinants of their ways of living and dying. Thus, a qualitative study with an ethnographic approach was developed, using participant observation techniques and semi-structured interviews with managers of the Subsystem in Bahia. Data collection took place between September 2014 and March 2017. The narratives often revealed a rhetorical tone of the idea of “differentiated health care” as an initiative to respect indigenous cultural specificities, which were insistently used as a justification for not conducting differentiated practices (as specific protocols, for example). The presence of indigenous people in the management contributed for producing more contextualized practices, oriented to the problems experienced by the communities, but the effort to legitimize themselves in this social space ratifies a “white” hegemony in the main topic of discussions.
  • Imigração, refúgio e saúde: perspectivas de análise sociocultural Dossiê

    Martin, Denise; Goldberg, Alejandro; Silveira, Cássio

    Resumo em Português:

    Resumo Os recentes processos migratórios internacionais ocorridos no Brasil se apresentam como um campo de estudo para as ciências sociais e humanas em saúde. Este artigo tem como objetivo refletir sobre os processos de inclusão de imigrantes e refugiados pelas instituições de saúde, considerando o campo de debates das ciências sociais e humanas em Saúde e o comprometimento dessa área com os direitos humanos. Inicialmente, são apresentadas características contemporâneas das migrações internacionais, incluindo a situação brasileira. Em seguida, são descritas algumas pesquisas e práticas sobre concepções de saúde, doenças e cuidados com imigrantes e, por fim, propomos um debate acerca de alguns conceitos antropológicos que podem contribuir para uma abordagem menos estereotipada dos processos de inclusão nas instituições de saúde nacionais. Pretendemos apresentar uma perspectiva das ciências sociais e humanas em saúde em um horizonte teórico articulado com práticas em saúde que, de certa forma, podem contribuir para a formulação de conceitos, explicações e orientações no plano das políticas públicas com essas populações.

    Resumo em Inglês:

    Abstract The international migratory processes that are recently occurring in Brazil are a field of study for Health Social and Human Sciences. This article aims to reflect on immigrants and refugees processes of inclusion by health institutions, considering the discussion possibilities of Health Social and Human Sciences and the commitment of this area to Human Rights. Initially, contemporary characteristics of international migrations are presented, including the Brazilian situation. Some researches and practices about conceptions of health, illness and care with immigrants are described below, and, finally, we propose a debate on some anthropological concepts that can contribute to create a less stereotyped approach in the processes of inclusion in national health institutions. We intend to present a perspective of Health Social and Human Sciences within a theoretical horizon that is articulated with health practices that can somehow contribute to the formulation of concepts, explanations and guidelines in public policies to these populations.
  • Práticas de saúde em contextos de vulnerabilização e negligência de doenças, sujeitos e territórios: potencialidades e contradições na atenção à saúde de pessoas em situação de rua Dossiê

    Oliveira, Roberta Gondim

    Resumo em Português:

    Resumo Este artigo ancora-se na premissa de que a relação entre políticas públicas, vulnerabilidade, sofrimento humano e negligência de pessoas e territórios merece ser questionada e melhor entendida. Um de seus principais pressupostos é a aposta em pontes de diálogos na produção de conhecimentos em saúde, em diferentes quadros de referência - paradigma biomédico; determinação social da saúde; vulnerabilidade social; aportes descoloniais. É fruto de estudo dedicado a acompanhar as práticas de saúde em territórios negligenciados e vulnerabilizados na cidade do Rio de Janeiro, em especial às pessoas que vivem em moradias precárias e em situação de rua. Diferentes encontros e modos de levar a vida, na feitura de cotidianos possíveis, foram vivenciados. Esses encontros forneceram elementos ao entendimento da saúde como valor social em situações concretas, pondo em questão, sob variadas leituras, a vulnerabilização de vidas humanas. Fala-se, portanto, sobre leituras críticas acerca de formas de estar no mundo, dialogicamente relacionadas às condições históricas, políticas e sociais, em que reside a aposta na resistência e nas ações cotidianas de diversos atores sociais e em dispositivos de saúde inovadores, que tenham potencial na efetivação de práticas contra-hegemônicas.

    Resumo em Inglês:

    Abstract This article is anchored on the premise that the relationship between public policies, vulnerability, human suffering and neglect of people and territories deserves to be questioned and better understood. One of its main assumptions is the bet on dialogues bridges in the production of health knowledge, through different frames of reference - biomedical paradigm; social determination of health; social vulnerability; decolonial contributions. It is the result of a study dedicated to monitor health practices in neglected and vulnerable areas in the city of Rio de Janeiro, Brazil, especially to people living in precarious houses and homeless people. Different encounters and ways of taking life, in the making of possible daily life, were experienced. These encounters provided elements for the understanding of health as a social value in concrete situations, bringing into question, under various readings, the vulnerability of human lives. There is talk, therefore, of critical readings about ways of being in the world, dialogically related to historical, political and social conditions, in which lies the bet on resistance and daily actions of various social actors and innovative health devices that have potential in the making of anti-hegemonic practices.
  • Entrevista com José Ricardo Ayres Dossiê

    Ayres, José Ricardo; Castellanos, Marcelo Eduardo Pfeiffer; Baptista, Tatiana Wargas de Faria

    Resumo em Português:

    Resumo Nesta entrevista à revista Saúde e Sociedade, José Ricardo Ayres conta como se aproximou do conceito de vulnerabilidade, das vantagens e perigos presentes em seu emprego, situando-o na saúde coletiva e na conjuntura científica, sanitária e política brasileira. Pensando nos estudos sobre a epidemia de aids, ele destaca diferenças nas ênfases dadas ao conceito no Brasil e nos Estados Unidos da América (EUA). Enquanto nos EUA a ênfase recaiu sobre o eixo da ética e do direito, fomentando ações jurídicas reivindicatórias perante o Estado, no Brasil enfatizou-se uma perspectiva crítica sobre o caráter tecnocrático das políticas públicas e sobre o autoritarismo dos saberes operados pela saúde pública, buscando relações mais dialógicas com os movimentos sociais em um contexto de lutas pela (re)construção de um Estado de direito democrático, em pleno processo de reabertura política no Brasil. A articulação entre vulnerabilidade e aportes específicos da teoria do reconhecimento, segundo Ayres, reforça a análise das relações entre intersubjetividades e contextos sociais, diálogos e conflitos, ações e estruturas sociais. Para ele, devemos considerar a dialética das representações, das interações e do trabalho como forma de construção do mundo de relações em que nos inscrevemos, rompendo assim com a ideia de que o indivíduo é uma “mônada” que atua sobre o mundo como algo meramente externo ou que age segundo imperativos sociais sem possibilidade de transformação da realidade. Desse modo, evitamos a naturalização da vulnerabilidade, quando tomada como característica intrínseca dos sujeitos, o que neutralizaria o interesse analítico e político desse conceito.

    Resumo em Inglês:

    Abstract In this interview to the magazine Health and Society, José Ricardo Ayres explains how he approached the concept of vulnerability and of the advantages and dangers present in its application, situating it amidst the public health and in the academic, sanitary and political contexts. Taking the studies on the AIDS epidemic into consideration, he highlights differences in the emphasis given to the concept in Brazil and in the United States of America (USA). While in the U.S. the emphasis fell on the axis of ethics and law, fostering legal actions before the State, Brazil emphasized on a critical perspective of the technocratic aspect of public policies and on the authoritarianism of knowledge possessed in public health, seeking more dialogical relations with social movements in a context of struggles for the (re)construction of a democratic constitutional State, while occurred a process of reopening politics in Brazil. The relationship between vulnerability and specific contributions of recognition theory, according to Ayres, strengthens analysis of relations between intersubjectivities and social contexts, dialogue and conflict, actions and social structures. For him, we must consider the dialectic of representations, of interactions and of work as a way of construction of the world of relationships where we found ourselves, thus rupturing from the idea that the individual is a “Monad” that acts upon the world as something merely external or that acts according to social imperatives without possibility of transformation of reality. In this way, we avoid the naturalization of vulnerability when considering it as an intrinsic characteristic of the subjects, which would neutralize the analytical and political interest of this concept.
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
E-mail: saudesoc@usp.br