Processo de trabalho e sofrimento psíquico de médicos da atenção primária na pandemia do covid-19

Maurício Roberto Campelo de Macedo Isa Maria Hetzel de Macedo Ruy Ribeiro Moraes Cruz Gabrielle Karla de Oliveira Dantas Isabela Coronelli Augusto Izadora Freitas Lopes Sobre os autores

Resumo

A organização e o processo de trabalho são espaços privilegiados para reconhecer as forças que levam ao sofrimento psíquico. Este artigo pretende analisar as percepções de médicos(as) da atenção primária à saúde, que atuam no Programa Mais Médicos, sobre as relações entre sofrimento psíquico e processo de trabalho, no contexto da pandemia do coronavirus. Esta pesquisa foi realizada por meio de um estudo de caso, utilizando métodos e técnicas qualitativas para a coleta, descrição e análise dos dados. Foi selecionada uma amostra intencional em conformidade com a técnica de saturação teórica. A coleta de informações foi realizada com ajuda de entrevistas semiestruturadas, seguindo um roteiro construído para atender aos objetivos desta pesquisa. A análise do discurso dos entrevistados articulou categorias de análise extraidas de cinco eixos temáticos que têm pontos de articulação entre si, com consensos e contradições que dão sentido às visões e posições dos atores no campo da saúde. Os resultados evidenciaram a pandemia como catástrofe sanitária e traumática, redimensionando o processo de trabalho e contribuindo para a sobrecarga, conflitos, medo, sentimento de desamparo e sofrimento psíquico. Inúmeras carências, problemas de infraestrutura, burocracia, interferências políticas, descompasso entre a formação e a prática também contribuiram para esse sofrimento.

Palavras-chave:
Trabalho; Sofrimento Psíquico; Pandemia; Atenção Primária à Saúde; Médicos

Introdução

As experiências de fluidez, instabilidade e incertezas presentes nas sociedades contemporâneas levaram Bauman (2001BAUMAN, Z. B. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.) a situá-las em um contexto que de chamou modernidade líquida. Assim, substantivas mudanças econômicas, políticas e culturais reconstituíram as relações sociais, os valores de referência simbólica e, também, os modos de subjetivação (Birman, 2022BIRMAN, J. O Sujeito na Contemporaneidade: espaço, dor e desalento na atualidade. São Paulo: Civilização Brasileira , 2022.). Os avanços tecnológicos, as mudanças nas relações de trabalho e o desencanto com os projetos coletivos contribuíram para a emergência de tecnicismo centralizado na individualidade, na meritocracia, na efemeridade dos vínculos sociais, e no consumismo, que esvaziam as vidas humanas de sentido, bem como as relações entre as pessoas e os seus respectivos trabalhos.

A crise do petróleo dos anos 1970 atingiu os Estados de bem-estar social e exigiu do capitalismo uma reestruturação produtiva, um processo de mudanças radicais no marco do neoliberalismo. Dessa forma, foram desenvolvidas novas tecnologias de gestão do trabalho associadas à sua flexibilização, intensificação e precarização (Antunes, 2009ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho. Ensaio sobre a afirmação e negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2009.; Antunes; Praun, 2015ANTUNES, R.; PRAUN, L. A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, v. 123, p. 407-427, 2015. DOI: 10.1590/0101-6628.030
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; Moraes; Ferraz; Areosa, 2018MORAES, A. F. G.; FERRAZ, D. L. S.; AREOSA, J. Relações de trabalho na dinâmica do capitalismo contemporâneo: uma antecâmara para o suicídio? Techniques Methodologies and Quality, Lisboa, n. spe. p. 12-28, 2018.). Mas, o neoliberalismo não se estabeleceu apenas como modelo socioeconômico, mas também como mecanismo disciplinar da gestão do sofrimento psíquico (SP), utilizando como fundamentos implícitos da ação econômica categorias morais e psicológicas indutoras de produtividade máxima. Vale ressaltar que, nesse modelo, tanto a fragmentação e alienação das atividades e a precarização dos vínculos trabalhistas são reforçadas por uma noção de “liberdade como propriedade de si”, que produz indivíduos com o horizonte de se tornarem empreendedores de si mesmos. Assim, o neoliberalismo também se constitui como um operador político-social e de produção de subjetividade e SP dos trabalhadores (Antunes; Praun, 2015ANTUNES, R.; PRAUN, L. A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, v. 123, p. 407-427, 2015. DOI: 10.1590/0101-6628.030
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; Safatle; Silva; Dunker, 2021SAFATLE, V.; SILVA, J. N.; DUNKER, C. (Org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021.).

O trabalho dos profissionais da saúde é permeado por tensões, conflitos, incertezas e dificuldades para a tomada de decisões clínicas e éticas diante do sofrimento dos outros. Além disso, existe uma tendência crescente de precarização das condições de trabalho que afeta o campo da saúde. A vida, o sofrimento e a morte são onipresentes no cotidiano desses profissionais, integram o objeto do seu trabalho, e condicionam a emergência do SP imanente da sua alteridade, sobretudo quando existe empatia com os usuários dos serviços de saúde. Como potenciais condicionantes deste sofrimento, destacam-se: quantidade de usuários atendidos diariamente; dificuldades de comunicação; situações de morte para comunicar; dilemas éticos; medo do erro; trabalho excessivo e sob pressão; precarização dos vínculos de trabalho. Essas características do processo de trabalho médico, além dos condicionantes socioculturais e institucionais da prática médica, contribuem para uma prevalência de SP maior do que na população geral (Farina, 2004FARINA, H. D. Sofrimento psíquico: um estudo entre médicos e enfermeiros em um hospital de Manaus. 2004. Tese (Dissertação de Mestrado em Saúde Pública) - Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2004.; Turíbio et al., 2020TURÍBIO, D. D. C. Q. et al. Qualidade de Vida dos Estudantes de Medicina da UFRN. Psychiatry Online Brasil, São Paulo, v. 25, n. 4, 2020.).

Na atenção primária à saúde (APS), pressupõe-se que os médicos estabeleçam um compromisso territorial e vínculos com os usuários, prestem cuidados que vão além da assistência clínica e se situem diante de uma dupla perspectiva: um espaço estratégico para a observação direta dos problemas de saúde nos espaços de vida dos doentes; e uma maior vulnerabilidade ao SP, diante do sentimento de impotência resolutiva à complexidade dos problemas (Esperidião; Saidel; Rodrigues, 2010; Fontana et al., 2016FONTANA, K. C; LACERDA, J. T; MACHADO, P. M. O. O processo de trabalho na Atenção Básica à saúde: avaliação da gestão. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 40, n. 110, p. 64-80, 2016. DOI: 10.1590/0103-1104201611005
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). Algumas contradições estruturais das políticas de saúde também contribuem para esse SP, como: anunciar a prioridade, mas mantendo a escassez de recursos na APS; enfatizar o modelo integral das redes de atenção, porém reforçar as práticas médicas baseadas no modelo biomédico/curativista; e destacar o trabalho em equipe, todavia desenvolver um processo de trabalho fragmentado (Maissiat et al., 2015MAISSIAT, G. S. et al. Contexto de trabalho, prazer e sofrimento na atenção básica em saúde. Revista Gaúcha de Enfermagem, Porto Alegre, v. 36, n. 2, p. 42-49, 2015. DOI: 10.1590/1983-1447.2015.02.51128
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).

Diante da histórica insuficiência dos profissionais das equipes de APS no território nacional e sua distribuição inadequada, foi criado no Brasil, em 2013, o Programa Mais Médicos (PMM), que procurou dar respostas a esses problemas, contudo, sem se resumir a uma política de provimento de médicos (Kemper; Mendonça; Sousa, 2016KEMPER, E. S.; MENDONÇA, A. V. M.; SOUSA, M. F. Programa Mais Médicos: panorama da produção científica. Ciência e Saúde Coletiva , Rio de Janeiro, v. 21, n. 9, p. 2785-2796, 2016. DOI: 10.1590/1413-81232015219.17842016
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; Pinto; Oliveira; Soares, 2022PINTO, H; OLIVEIRA, F. P.; SOARES, R. Panorama da implementação do Programa Mais Médicos até 2021 e comparação com o Programa Médicos pelo Brasil. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, v. 46, n. 1, p. 32-53, 2022. DOI: 10.22278/2318-2660.2022.v46.n1.a3616
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). O programa atenderia às unidades de APS localizadas nos vazios territoriais, com provimento de médicos para atender às necessidades básicas de saúde da população, articuladas aos componentes de infraestrutura e de formação, por meio de parcerias com as universidades públicas para promover a sua qualificação.

Nesse sentido, pesquisas apontam que o perfil dos médicos se modificou em relação ao início do programa, apontando para um relativo equilíbrio entre os sexos, assim como o crescimento progressivo de jovens médicos(as) brasileiros (as), recém-formados(as) ou com poucos anos de experiência profissional (Damico et al., 2019DAMICO, J. G. S.; SILVA, L. F. (Coord.). Relatório final do Projeto Rede Observatório do Programa Mais Médicos. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2019.; Kemper; Mendonça; Sousa, 2016KEMPER, E. S.; MENDONÇA, A. V. M.; SOUSA, M. F. Programa Mais Médicos: panorama da produção científica. Ciência e Saúde Coletiva , Rio de Janeiro, v. 21, n. 9, p. 2785-2796, 2016. DOI: 10.1590/1413-81232015219.17842016
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; Macedo; Macedo; Castro, 2021MACEDO, M. R. C.; MACEDO, I. M. H.; CASTRO, J. L. Sofrimento Psíquico dos Médicos da Atenção Primária à Saúde e Processo de Trabalho Durante a Pandemia do COVID-19. Relatório de Pesquisa. Natal: Observatório de Saúde Mental da UFRN , 2021.; Pinto; Oliveira; Soares, 2022PINTO, H; OLIVEIRA, F. P.; SOARES, R. Panorama da implementação do Programa Mais Médicos até 2021 e comparação com o Programa Médicos pelo Brasil. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, v. 46, n. 1, p. 32-53, 2022. DOI: 10.22278/2318-2660.2022.v46.n1.a3616
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). A partir de 2015, com a integração entre o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (PROVAB) e o PMM, a avaliação positiva desse programa pela população, gestores e médicos participantes, assim como a definição de uma pontuação adicional de 10% nas provas de seleção para residência médica, fez crescer exponencialmente a adesão dos jovens médicos(as) brasileiros(as) (Damico et al., 2019DAMICO, J. G. S.; SILVA, L. F. (Coord.). Relatório final do Projeto Rede Observatório do Programa Mais Médicos. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2019.; Pinto; Oliveira; Soares, 2022PINTO, H; OLIVEIRA, F. P.; SOARES, R. Panorama da implementação do Programa Mais Médicos até 2021 e comparação com o Programa Médicos pelo Brasil. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, v. 46, n. 1, p. 32-53, 2022. DOI: 10.22278/2318-2660.2022.v46.n1.a3616
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). Durante as entrevistas para a pesquisa que deu origem a esse artigo, poucos entrevistados(as) declararam ter pós-graduação lato sensu em medicina de família e comunidade ou medicina geral antes de integrar o programa.

Um estudo comparativo da situação do PMM em 2013 e 2015 identificou a ampliação e qualificação do acesso (Damico et al., 2019DAMICO, J. G. S.; SILVA, L. F. (Coord.). Relatório final do Projeto Rede Observatório do Programa Mais Médicos. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2019.); outros estudos evidenciaram a melhoria dos indicadores de saúde depois da implantação do PMM, o que levou à alta legitimação desse programa pela população e pelos gestores dos municípios beneficiados (Pinto; Oliveira; Soares, 2022PINTO, H; OLIVEIRA, F. P.; SOARES, R. Panorama da implementação do Programa Mais Médicos até 2021 e comparação com o Programa Médicos pelo Brasil. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, v. 46, n. 1, p. 32-53, 2022. DOI: 10.22278/2318-2660.2022.v46.n1.a3616
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). Isso contribuiu para a adesão dos(as) médicos(as) brasileiros(as) ao PMM, sobretudo a partir de 2015, conforme mencionado anteriormente. No entanto, a mudança conjuntural de 2019, com cortes sucessivos de médicos e supervisores e, mesmo, a criação pelo Ministério da Saúde de um programa concorrente denominado de “Médicos pelo Brasil”, gerou incertezas sobre a continuidade do PMM (Macedo; Macedo; Castro, 2021MACEDO, M. R. C.; MACEDO, I. M. H.; CASTRO, J. L. Sofrimento Psíquico dos Médicos da Atenção Primária à Saúde e Processo de Trabalho Durante a Pandemia do COVID-19. Relatório de Pesquisa. Natal: Observatório de Saúde Mental da UFRN , 2021.).

A pandemia do coronavírus surgida em 2019 potencializou problemas das sociedades contemporâneas, introduzindo novos padrões de comportamento para os indivíduos e grupos sociais. Os cuidados e medidas protetivas necessários ao enfrentamento dessas questões em escala mundial produziram reações diversas e mudaram sensivelmente a sociabilidade, ressignificando o cotidiano dos indivíduos (Harari, 2020HARARI, Y. N. O mundo depois do coronavírus. Revista IHU On-Line. São Leopoldo, 26 mar. 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.ihu.unisinos.br/categorias/597469-o-mundo-depois-do-coronavirus-artigo-de-yuval-noah-harari . Acesso em: 10 maio 2023.
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). Essas mudanças contribuíram para o surgimento de novos modos de subjetivação e o conceito de trauma nos remete à sua genealogia em um mundo que foi revirado pelo avesso; uma experiência traumática modulada pela dor e pelo sofrimento que afetam os indivíduos de maneira singular (Birman, 2020BIRMAN, J. O Trauma na Pandemia do Coronavírus: suas dimensões políticas, sociais, econômicas, ecológicas, culturais, éticas e científicas. São Paulo: Civilização Brasileira, 2020.) e que foi intensificada por um problema sanitário, até então, inteiramente desconhecido, constituindo-se fonte de incertezas, tensões, medos, traumas, aumento de SP e, também, problemas nas relações e processos de trabalho (Costa; Carvalho; Coelho, 2020COSTA, W. A.; CARVALHO, N. C.; COELHO, P. A. B. Colapso da Atenção Básica em Contexto de COVID-19 sob o Olhar de uma UBS. Comunicação em Ciências da Saúde, Brasília, DF, v. 31, n. suppl 1, p. 209-216, 2020.; Galon; Navarro; Gonçalves, 2022GALON, T.; NAVARRO, V. L.; GONÇALVES, A. M. S. Percepções de profissionais de enfermagem sobre suas condições de trabalho e saúde no contexto da pandemia de COVID-19. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 47, n. ecov2, p. 1-9, 2022. DOI: 10.1590/2317-6369/15821PT2022v47ecov2
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).

No Brasil, durante a pandemia, a assistência foi centralizada nos hospitais, mas a APS teve uma atuação relevante na vacinação em massa, identificação e tratamento dos casos sem gravidade, encaminhando aos demais níveis de atenção quando necessário. Assim, foram elaborados novos protocolos de serviço, tecnologias, mudanças nas rotinas de trabalho e reorganização das responsabilidades nas equipes (Fontana et al., 2016FONTANA, K. C; LACERDA, J. T; MACHADO, P. M. O. O processo de trabalho na Atenção Básica à saúde: avaliação da gestão. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 40, n. 110, p. 64-80, 2016. DOI: 10.1590/0103-1104201611005
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; Medina et al., 2020MEDINA, M. G. et al. Atenção primária à saúde em tempos de COVID-19: o que fazer? Cadernos de Saúde Pública , Rio de Janeiro, v. 36, n. 8, p. 1-5, 2020. DOI: 10.1590/0102-311X00149720
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; Seda-Gombau et al., 2021SEDA-GOMBAU, G et al. Impact of the COVID-19 Pandemic on Burnout in Primary Care Physicians in Catalonia. International Journal Environmental Research Public Health, Bethesda, v. 18, n. 17, p. 9031, 2021. DOI: 10.3390/ijerph18179031
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). Nesse contexto, os médicos apresentaram uma mortalidade maior do que na população geral e as modificações ocorridas nos processos de trabalho contribuíram para tensões e o SP entre os profissionais da APS (Miranda et al., 2021MIRANDA, F. B. G. et al. Sofrimento psíquico entre os profissionais de enfermagem durante a pandemia da COVID-19: scoping review. Escola Anna Nery, Rio de Janeiro, v. 25, n. spe., p. 1-10, 2021. DOI: 10.1590/2177-9465-EAN-2020-0363
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; Zille; Teles, 2021ZILLE, L. P.; TELES, J. S. Saúde Mental de Médicos e a Pandemia COVID-19. Economia e Gestão, Belo Horizonte, v. 21, n. 60, p. 178-194, 2021. DOI: 10.5752/P.1984-6606.2021v21n60p178-194
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).

A organização e o processo de trabalho são espaços privilegiados para reconhecer as forças que levam ao SP, o qual exprime a insatisfação do sujeito com a realização de suas expectativas e motivações nesses cenários. O indivíduo busca dar sentido às atividades que realiza, adotando estratégias defensivas diante do “sofrimento patogênico” ou do “sofrimento criativo” condicionados pelas situações que se apresentam no trabalho (Dejours, 2017DEJOURS, C. Psicodinâmica do Trabalho. São Paulo: Dublinense, 2017., 2018DEJOURS, C. A. Loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez, 2018.). O objetivo deste artigo foi analisar as percepções de médicos(as) da APS, que atuam no PMM no Rio Grande do Norte (PMM-RN), sobre as relações entre sofrimento psíquico e o processo de trabalho neste cenário de práticas de saúde, durante o contexto da pandemia de covid-19. Por meio dos resultados desta pesquisa, esperamos contribuir com a gestão da saúde para identificar estratégias adequadas que garantam respostas efetivas a essa problemática.

Metodologia

A pesquisa que deu origem a este artigo foi desenvolvida como um estudo de caso, utilizando-se de métodos e técnicas qualitativas para a coleta, descrição e análise dos dados. Esse tipo de estudo é escolhido quando se busca lidar com problemas complexos, a partir de análises em profundidade, desenvolvendo estratégias para organizar, descrever e analisar os atributos e o desenvolvimento de fenômenos complexos em indivíduos, grupos sociais e instituições (Minayo, 2014MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: Hucitec, 2014.). Nesses casos, a atenção é voltada para a natureza dos fenômenos e o sentido que os atores envolvidos com a problemática lhe atribuem (Gaudet; Robert, 2018GAUDET, S.; ROBERT, D. L’aventure de la recherche qualitative: Du questionnement à la rédaction scientifique. Ottawa: Les Presses de l’Université d’Ottawa, 2018.; Minayo; Deslandes; Gomes, 2013MINAYO, M. C. S.; DESLANDES, S. F.; GOMES, R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2013.).

A população do estudo foi composta pelos(as) médicos(as) que atuavam na APS vinculados ao Programa Mais Médicos no estado do Rio Grande do Norte (PMM-RN), entre 2021 e 2022, totalizando 271 profissionais. A escolha dessa população para o estudo consistiu no fato de que as características desses médicos(as), no momento atual, são semelhantes às dos outros(as) que atuam na APS do RN e na maioria dos estados em que foi implantado o programa (Costa; Carvalho; Coelho, 2020COSTA, W. A.; CARVALHO, N. C.; COELHO, P. A. B. Colapso da Atenção Básica em Contexto de COVID-19 sob o Olhar de uma UBS. Comunicação em Ciências da Saúde, Brasília, DF, v. 31, n. suppl 1, p. 209-216, 2020.; Damico; Silva, 2019DAMICO, J. G. S.; SILVA, L. F. (Coord.). Relatório final do Projeto Rede Observatório do Programa Mais Médicos. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2019.; Pinto; Oliveira; Soares, 2022PINTO, H; OLIVEIRA, F. P.; SOARES, R. Panorama da implementação do Programa Mais Médicos até 2021 e comparação com o Programa Médicos pelo Brasil. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, v. 46, n. 1, p. 32-53, 2022. DOI: 10.22278/2318-2660.2022.v46.n1.a3616
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), cujos processos de trabalho e o contexto da pandemia neste estado são igualmente semelhantes e que, operacionalmente, a parceria do programa com as universidades facilitava o acesso dos pesquisadores.

A amostra intencional escolhida, a partir dessa população, chegou a 15 médicos (sujeitos da pesquisa), sendo que o processo amostral foi interrompido, observando-se a saturação teórica das informações colhidas (Fontanella; Ricas; Turato, 2008FONTANELLA, B. J. B.; RICAS, J.; TURATO, E. R. Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 17-27, 2008. DOI: 10.1590/S0102-311X2008000100003
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; Nascimento et al., 2018NASCIMENTO, L. C. N. et al. Saturação teórica em pesquisa qualitativa: relato de experiência na entrevista com escolares. Revista Brasileira de Enfermagem , Brasília, DF, v. 71, n. 1, p. 243-248, 2018. DOI: 10.1590/0034-7167-2016-0616
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;). Nas pesquisas qualitativas é frequente o seu uso como critério para definir o ponto de corte em que se interrompe o processo amostral. Considera-se que essa saturação teórica está dada quando as informações/dados não acrescentam mais nenhuma contribuição relevante para a análise teórica do material coletado; os discursos passam a ser redundantes, não contribuem significativamente à compreensão da problemática em estudo; nem aos seus objetivos. Os sujeitos da pesquisa foram identificados por região de saúde do RN, com a ajuda de uma identificação de suas características, previamente discutidas com alguns supervisores do PMM. Os critérios adotados para inclusão na pesquisa foram: envolvimento com a APS por no mínimo dois anos e capacidade de vocalização para representar as diversas tendências de pensamento existentes e as atitudes do conjunto dessa população. Na pesquisa, caracterizamos o perfil dos entrevistados mediante a consulta ao banco de dados do PMM-RN.

A coleta de dados e informações foi realizada no período de outubro de 2021 a abril de 2022, com ajuda de entrevistas semiestruturadas, contando com um roteiro construído para atender aos objetivos desta pesquisa. As entrevistas foram realizadas em ambiente virtual, na plataforma Google Meet, respeitando a necessidade de isolamento social e todas as precauções sanitárias recomendadas. Além disso, foram gravadas em áudio e transcritas para o software Word. Após a transcrição de cada entrevista, era realizada uma pré-análise (leitura superficial dos textos) e seguida da ordenação do corpus da entrevista (organização sistemática do texto transcrito para a análise, com identificação preliminar de categorias empíricas). Observada a possível saturação teórica, decidia-se sobre a continuidade das entrevistas.

A análise e a interpretação foram baseadas numa perspectiva hermenêutica de busca de compreensão e de apreensão do sentido presente no discurso dos sujeitos da pesquisa (Minayo, 2014MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: Hucitec, 2014.; Minayo; Deslandes, 2013MINAYO, M. C. S.; DESLANDES, S. F.; GOMES, R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2013.). Neste sentido, procurou-se estabelecer relações dialógicas entre as diferentes percepções dos médicos(as) sobre a problemática da pesquisa e produzir uma narrativa coerente com os resultados empíricos do discurso dos atores, identificando semelhanças, diferenças e contradições no interior do contexto de sua elaboração, em busca de significação e legitimidade (Mendonça; Sousa, 2021MENDONÇA, A. V. M.; SOUSA, M. F. Métodos e Técnicas da Pesquisa Qualitativa em Saúde. Brasília, DF: ECoS, 2021. v. I.). Dessa forma, texto e contexto ganham vida estabelecendo relações entre o conteúdo dos discursos e seus aspectos contextuais. Operacionalmente trabalhou-se com técnicas de “análise de conteúdo” e técnicas de “análise temática”, tratando as queixas “mentais” por meio de uma categoria ampla, o “sofrimento psíquico”, que não se confunde com o conceito de “transtornos mentais” da ordem do patológico (Macedo; Macedo, 2012MACEDO, M. R. C; MACEDO, I. M. H. Saúde Mental e Qualidade de Vida em Natal. Natal: Observatório de Saúde Mental da UFRN, 2012.; 2018MACEDO, M. R. C.; MACEDO, I. M. H. Relação entre Qualidade de Vida e Sofrimento Psíquico em Estudantes de Medicina. Natal: Observatório de Saúde Mental da UFRN ; 2018.). A técnica de análise de conteúdo é estruturada em torno de três fases: (1) pré-análise; (2) exploração do material, categorização ou codificação; (3) tratamento dos resultados, inferências e interpretação (Bardin, 2011BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2011.; Minayo; Deslandes, 2013MINAYO, M. C. S.; DESLANDES, S. F.; GOMES, R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2013.). Nesta pesquisa, a análise temática foi compreendida como um dos componentes da terceira fase da análise de conteúdo, quando se busca identificar eixos temáticos ou temas que estão presentes no discurso dos atores e que estruturam a trama dos sentidos e significados de suas percepções e ações (Minayo, 2014MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: Hucitec, 2014.). Embora, alguns autores percebam a análise temática como um método analítico (Braun; Clarke, 2006BRAUN, V.; CLARKE, V. Using thematic analysis in psychology. Qualitative Research in Psychology, Abingdon, v. 3, n. 2. p. 77-101. 2006. DOI: 10.1191/1478088706qp063oa
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).

O estudo foi realizado atendendo aos princípios éticos e normas para a realização de pesquisas com seres humanos definidos na Resolução Nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde. O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL). Para preservação desses princípios éticos foi elaborado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e um Termo de Autorização para Gravação de Voz (TAGV) que foram assinados por aqueles que decidiram participar da pesquisa.

Resultados e discussão

O trabalho analítico revelou cinco eixos temáticos que articulam categorias de análise no discurso dos entrevistados, que têm pontos de articulação entre si e apresentam consensos e contradições que dão sentido às visões e posições dos atores nesse campo.

Percepção de Sofrimento psíquico

O conceito de SP encontra-se na encruzilhada das diferentes correntes do pensamento científico que tematizam o problema, como também nos discursos oriundos de saberes das diferentes culturas. Nas sociedades complexas da contemporaneidade, que constituem um mosaico de vozes heterogêneas, existem percepções e experiências cognitivas distintas que podem definir o SP como algo próximo aos conceitos de “ansiedade” e de “estresse comum”; outras, em conformidade com a cultura médica, usam categorias da psicopatologia, como “distúrbio mental”, “tristeza profunda” ou “depressão”. Assim, como médicos, alguns dos entrevistados perceberam o SP como um problema patológico, que interfere dramaticamente na vida das pessoas, tirando-lhes a possibilidade de realizar as atividades básicas do dia a dia ou produzindo uma perda do controle da vida emocional.

SP pode englobar depressão, estresse, situações pós traumas, e do ponto de vista pessoal é um sentimento de tristeza profunda. (Tupã)

[…] um empecilho psíquico de natureza depressiva ou até psicótica que diminua seu desempenho em atividades do dia a dia como se alimentar e dormir. (Oxum)

No entanto, vários dos entrevistados definiram o SP de forma mais ampla, como uma condição humana relacionada a algum desequilíbrio emocional (pontual, intermitente ou constante) que pode, eventualmente, tornar-se patológico. Nesse sentido, de forma coerente com a literatura (Cardoso; Campos, 2020CARDOSO, F. M; CAMPOS, G. Aprendendo a clínica do sofrimento social: narrativas do internato na Atenção Primária à Saúde. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 25, n. 4, p. 1251-1260, 2020. DOI: 10.1590/1413-81232020254.10852019
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; Farina, 2004FARINA, H. D. Sofrimento psíquico: um estudo entre médicos e enfermeiros em um hospital de Manaus. 2004. Tese (Dissertação de Mestrado em Saúde Pública) - Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2004.; Macedo; Macedo, 2012MACEDO, M. R. C; MACEDO, I. M. H. Saúde Mental e Qualidade de Vida em Natal. Natal: Observatório de Saúde Mental da UFRN, 2012.; Macedo; Macedo; Castro, 2021MACEDO, M. R. C.; MACEDO, I. M. H.; CASTRO, J. L. Sofrimento Psíquico dos Médicos da Atenção Primária à Saúde e Processo de Trabalho Durante a Pandemia do COVID-19. Relatório de Pesquisa. Natal: Observatório de Saúde Mental da UFRN , 2021.; Turibio et al, 2020TURÍBIO, D. D. C. Q. et al. Qualidade de Vida dos Estudantes de Medicina da UFRN. Psychiatry Online Brasil, São Paulo, v. 25, n. 4, 2020.), o SP é visto tal qual um fenômeno normal, universal, frequentemente referido como uma dor intangível, difícil de descrever, associada ao estresse cotidiano, problemas pessoais, familiares ou do trabalho, simples preocupações, dificuldades de concentração, problemas com o sono ou com a alimentação, “somatização” de conflitos psíquicos. Esse SP pode, inclusive, manifestar-se como uma doença orgânica e, mesmo sem impedir, pode dificultar as atividades do dia a dia e interferir na vida das pessoas, promovendo limitações e desprazer.

[…] é uma dor que não é palpável, não é visível; às vezes não pode ser descrita ou expressada, mas é real, machuca, tira as condições da pessoa realizar o que gosta, o que planeja, e limita bastante a vida. (Janaina)

SP é uma questão psicológica, a gente começa a somatizar e ter algo externo, mas a princípio é psicológico. É aquilo que você fica martelando, de não saber o que fazer, e estar sofrendo por dentro. (Osíris)

Ou seja, um mal-estar imanente da experiência da modernidade que se atualizou nas sociedades contemporâneas. Segundo Birman (2020BIRMAN, J. O Trauma na Pandemia do Coronavírus: suas dimensões políticas, sociais, econômicas, ecológicas, culturais, éticas e científicas. São Paulo: Civilização Brasileira, 2020.), essas mudanças se traduzem em novos modos de subjetivação modulados por experiências traumáticas, pela dor e pelo sofrimento de cada indivíduo em sua singularidade.

Percepção do próprio SP e de como a população atendida é afetada

A maioria dos médicos entrevistados afirmou experimentar algum tipo de SP associado aos momentos de crise, períodos de estresse intenso, muitas cobranças e competição, referindo ansiedade, queixas somáticas e, em alguns casos, depressão. Vários relataram experiências que começaram no curso médico e que continuaram na vida profissional, fato que reforça os achados da literatura (Farina, 2004FARINA, H. D. Sofrimento psíquico: um estudo entre médicos e enfermeiros em um hospital de Manaus. 2004. Tese (Dissertação de Mestrado em Saúde Pública) - Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2004.; Turibio et al, 2020TURÍBIO, D. D. C. Q. et al. Qualidade de Vida dos Estudantes de Medicina da UFRN. Psychiatry Online Brasil, São Paulo, v. 25, n. 4, 2020.). Poucos negaram ter apresentado algum tipo de SP. Nesse caso, estes entrevistados foram os mesmos que relacionaram o SP à condição de depressão ou transtornos mentais; assim, o transtorno é visto como um fenômeno estabelecido, estruturado, sem possibilidades de resolução.

Sim! Eu sou ansioso […] mas nunca cheguei a usar medicamentos, sempre fiz psicoterapia. A gente sabe que a ansiedade não tem cura definitiva, o que temos é mais um controle dela, mas eu me considero sob controle com a psicoterapia. (Ísis)

A concepção do transtorno mental como algo irreversível, mesmo que não seja grave, remete a uma associação com doenças crônicas como diabetes e hipertensão, que não podem ser curadas, mas controladas. Uma racionalidade médica que tem como objetivo central a cura, mas que em última instância aceita o controle como alternativa terapêutica possível.

Por sua vez, o cenário da APS é privilegiado para observar o SP cotidiano. Todos relataram que o SP é um problema presente e que desafia as possibilidades de ação dos profissionais. A infraestrutura das unidades, o desabastecimento de medicamentos, a falta de alguns profissionais formados para abordar o SP e a carência de qualificação geram frustração nos próprios médicos.

É uma experiência cotidiana para nós da APS. […] falta medicação ou oportunidade de ofertar um tratamento melhor para os pacientes. Isso gera frustração e o paciente acaba agravando […] na maioria dos casos uma terapia poderia resolver, mas como não temos psicólogo na equipe acabamos repetindo ciclos de medicação. (Ceuci)

Dessa forma, em meio a um contexto restritivo e frustrante, ressalta-se entre os médicos entrevistados o compromisso e o sentimento de empatia com os usuários e seus problemas, identificando o SP na população e relatando preocupação e impotência ao lidar com essas situações. Nesses casos, o SP é associado a uma situação estrutural de carência econômica ou vulnerabilidade social, que se aproxima mais do que alguns autores chamam de “sofrimento social” (Cardoso; Campos, 2020CARDOSO, F. M; CAMPOS, G. Aprendendo a clínica do sofrimento social: narrativas do internato na Atenção Primária à Saúde. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 25, n. 4, p. 1251-1260, 2020. DOI: 10.1590/1413-81232020254.10852019
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).

Quando atendo uma criança sem as mesmas condições de minha filha, na mesma idade, ou quando recebo um idoso vulnerável, vivendo um abandono e um sofrimento muito grande, isso me afeta profundamente. […] à noite quando vou dormir revivo estes fatos do dia, o que me leva a momentos de muita tristeza e solidão. (Zeus)

Meu sofrimento é quando […] eles pedem ajuda e eu fico sem saber o que dizer pois a minha possibilidade de ajudar escapa a minha esfera de ação. Escuto, dou palavras de conforto, é tudo que posso fazer. (Krishna)

As mudanças no mal-estar contemporâneo exprimem a fragmentação e “fluidificação” das experiências atuais da vida em sociedade, a aceleração e as restrições do tempo vivido, as dificuldades para acionar os mecanismos de proteção simbólica do psiquismo, estabelecidos pela cultura (Birman, 2020BIRMAN, J. O Trauma na Pandemia do Coronavírus: suas dimensões políticas, sociais, econômicas, ecológicas, culturais, éticas e científicas. São Paulo: Civilização Brasileira, 2020.). O corpo passa a ser um espaço privilegiado para as manifestações da “dor psíquica” que se somatizam. Além disso, essas mudanças incluem uma maior prevalência de transtornos de ansiedade (incluído o transtorno de pânico), depressão, fadiga crônica (burnout) e compulsões; entre essas, destaca-se o uso abusivo de drogas. Nos territórios assistidos pelos médicos entrevistados, o abuso de bebidas alcoólicas predomina entre as substâncias psicoativas, mas a dependência aos psicotrópicos é sempre mencionada como relevante na APS. O uso dessas substâncias é associado a tentativas de alívio para uma vida sofrida e existem variações entre as zonas urbano-rurais. Também se ressalta o problema das “recaídas”, sempre frustrantes para os que estão envolvidos no projeto terapêutico.

No município em que trabalho vejo uso abusivo de álcool, mas no outro bairro em que trabalhei antes, do mesmo município, via de forma corriqueira uso abusivo de álcool e também de cocaína. (Amon)

[...] tenho vários pacientes que usam benzodiazepínicos e são dependentes. (Ísis)

Sofrimento psíquico e processo de trabalho

A perspectiva de saúde integral e da integralidade do sistema são dominantes entre os entrevistados, que reforçam a importância das equipes multiprofissionais e da implementação de redes de saúde no SUS, tendo na APS a principal porta de entrada do sistema. No entanto, na maioria das unidades de APS persiste uma tensão entre essa visão mais ampla e a ênfase dada à assistência médica individual. Os médicos atribuem aos interesses da gestão e de uma parcela dos usuários essa pressão por atenção médica individual, o que o limita a função de agente de diagnóstico e prescritor de medicamentos. Isso revela a medicalização dos gestores e da população que reforça o modelo biomédico de atenção, por sua vez indutor dessa cultura medicalizada. Esse paradigma confere centralidade à assistência curativa e ao médico. Dessa forma, prioriza as consultas médicas nas unidades, comprometendo o estabelecimento de vínculos com o território e os usuários, o trabalho em equipe, o desenvolvimento de outras atividades (promoção da saúde, prevenção de doenças, reabilitação) e o planejamento local. Por fim, provoca a sobrecarga de trabalho, conflitos, insatisfação e sofrimento, os quais foram amplificados com a chegada da pandemia de covid-19.

O trabalho do médico dentro da equipe e da unidade de saúde é muito limitado ao atendimento individual no consultório e a uma demanda enorme. (Shiva)

Não temos disponibilidade para descansar, existe uma pressão muito grande não só da gestão, mas dos próprios pacientes. Seria muito interessante se tivéssemos disponibilidade para realizar outras atividades e desenvolver saúde integral, como a APS propõe, dedicando uma atenção melhor às pessoas com sofrimento psíquico. (Ceuci)

A medicina constitui-se como uma prática social determinada pelo contexto histórico e seus componentes econômicos, sociais, políticos, culturais e institucionais que, mediados pelos conhecimentos e técnicas médicas, permitem o desenvolvimento de ações e cuidados nos diferentes espaços do seu exercício, com maior ou menor autonomia. Na contemporaneidade, estamos diante de mudanças no trabalho que agenciam a sua desregulamentação e flexibilização por meio de mecanismos de produção e gestão neoliberais que fragmentam, precarizam e intensificam as atividades nos cenários de prática. No nível local, portanto, exprimem-se as contradições entre um desejo de liberdade/autonomia, o qual pode dar significado ao processo de alienação do trabalho e a dimensão objetiva das contradições estruturais do contexto e das políticas de saúde em suas diversas manifestações no cenário do trabalho.

Assim, a maioria dos médicos afirmou estar satisfeita com o trabalho, mesmo com críticas e queixas diversas, sobretudo, acerca da demanda excessiva, as exigências de produtividade, os problemas na infraestrutura das unidades, a falta de medicamentos/equipamentos de proteção individual (EPI) e insuficiência de profissionais nas equipes. É flagrante a contradição entre um discurso de satisfação, que tem mais relação com os vínculos afetivos estabelecidos, a idealização do fazer profissional e o projeto de vida individual, e as queixas sobre as condições e o processo de trabalho, com relatos de sofrimento, chegando ao esgotamento.

Tenho muita satisfação com o que faço, gosto do lugar em que trabalho, já estou há bastante tempo, então criei vínculos com a comunidade. (Amon)

A estrutura da unidade de saúde também me incomoda, muito sucateada, a escassez de material e de medicamentos; trabalhamos no limite do que é fundamental para o atendimento. (Zeus)

No meu posto de saúde muitas vezes faltou máscara, gorro, capote, muitas vezes não eram servidos aventais e, às vezes, ficava oferecendo apenas aos médicos, sendo que toda a equipe estava exposta. (Oxóssi)

Existem problemas no emprego de mecanismos de gestão para garantir a integralidade da assistência, definir as atribuições dos distintos níveis, o uso de protocolos clínicos, a programação local, entre outros. O trabalho extenuante, limitado e burocratizado é considerado pelos médicos como um problema de gestão, referindo-se de forma recorrente à pressão dos gestores sobre a equipe, principalmente sobre eles mesmos. O uso de “estratégias defensivas” (Dejours, 2018DEJOURS, C. A. Loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez, 2018.) é evidente, sendo associado às limitações objetivas dos profissionais diante do tipo de atividade que exercem e os contextos de ação. O sofrimento criativo está presente quando existem condições concretas de possibilidade para o profissional se defender do sofrimento, mesmo que inconscientemente, dadas as condições objetivas de trabalho em cada município.

Esse ano, consegui mudar para outro ambiente e colocar em prática o que aprendi na minha residência de Medicina de Família, fazendo práticas com grupos… e estou me sentindo mais satisfeito. (Oxóssi)

Umas coisas me deixam travado no processo de trabalho, me incomodam muito. Às vezes, se ocorre um óbito, os familiares dos pacientes vêm em cima da gente. Tem até ameaça de morte sobretudo nas áreas periféricas. Mas, a maioria dos pacientes gosta do trabalho que eu faço. Procuro fazer vínculos e gosto do meu trabalho. (Tupã)

Por outro lado, diante da impossibilidade de uma estratégia criativa, o médico se defende recorrendo a mecanismos patológicos de expressão do seu sofrimento psíquico (Dejours, 2018DEJOURS, C. A. Loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez, 2018.). É quando o sujeito perde as condições de se defender do desgaste posto pelas condições de trabalho buscando soluções alternativas nos limites do equilíbrio; quando o sofrimento se exprime, então, de forma mais dramática.

Tive problemas! Sobrecarga de trabalho, excesso de demanda, desentendimentos. Desenvolvi um quadro de transtorno de ansiedade e consegui sair do quadro com psicoterapia e ajuda pessoal, sem precisar de tomar medicação. (Janaina)

Tive episódios depressivos, crises de insônia, além do abuso de café, álcool e comida para compensar essa carreira tão consumidora. (Brahma)

[…] lá tinha uma cobrança gigante. Houve até perseguição pessoal e tive que fazer acompanhamento psiquiátrico. (Afrodite)

O contexto socioeconômico, a burocracia e a ingerência política sobre os serviços, contribuem para os problemas de gestão local e da gestão da clínica, pois podem reduzir a capacidade de resolução dos problemas de saúde na APS e, assim, a sua credibilidade. No caso do PMM-RN, existe um diferencial em relação aos outros serviços de APS: a supervisão e seu papel pedagógico e fiscalizador que contribui para a qualificação do trabalho dos médicos. Os supervisores desse programa também atuam como articuladores institucionais, estabelecendo “pontes” entre as equipes da APS e os gestores.

A burocracia impede que possamos pedir um eletrocardiograma ou mesmo um ecocardiograma para um paciente cardíaco na APS, o município não permite. Só o cardiologista pode pedir e ficamos sem resolutividade na Atenção Básica. (Tupã)

Além disso, precisa também melhorar a gestão porque nos municípios tem muita interferência política. (Shiva)

Trauma e sofrimento psíquico na Pandemia

A eclosão da pandemia do covid-19 constituiu um momento traumático de grande dramaticidade. As imagens da peste ressurgiram do imaginário popular para assombrar a população e, em particular, aqueles que estavam diretamente envolvidos nas estratégias de enfrentamento desse problema. A prática médica nos serviços de APS passou por readequações em condições de alto risco sanitário, com a adoção de medidas de controle e prevenção para evitar a transmissão do vírus. Muitos médicos se afastaram do convívio familiar, e experimentaram o medo do contágio, ansiedade e até problemas psíquicos mais graves, tais como “transtorno de pânico” e “depressão”.

Com a covid era uma tensão muito grande em relação ao contágio. Fiquei muito isolado, sozinho, sem meus familiares e nesse momento senti muito sofrimento e busquei formas de me proteger. (Oxum)

[…] ficamos todos inseguros, tive medo de morrer ou de contaminar meus pais e meu marido que tem comorbidades. […] meu sofrimento era muito grande, mas não podia deixar de atender, não podia deixar de estar com eles. (Shiva)

Os relatos cotidianos sobre SP foram potencializados com o surgimento da pandemia; inclusive os usuários que antes não manifestavam queixas dessa ordem, relatando transtornos de ansiedade e depressão. O trabalho sob pressão amplificou-se e os entrevistados o associam ao seu próprio SP. O medo era onipresente e a pressão da gestão local por maior produção de atendimentos foi referida como um elemento importante para o SP dos profissionais.

Aumentou muito o diagnóstico de “transtorno de ansiedade” e alguns casos evoluíram para um quadro depressivo […] até mesmo quem nunca teve problema psíquico passou a apresentar. (Atena)

Tive que lidar com o próprio medo, o da equipe e o dos pacientes. […] Foi uma pressão enorme, uma carga emocional muito grande e desenvolvi transtorno de pânico. (Afrodite)

Pandemia, trauma, catástrofe e desamparo psíquico. Questões que se articulam no universo da assistência e que remetem a um contexto de isolamento e solidão. O trabalho extenuante muitas vezes dava lugar ao “burnout” (Seda-Gombau et al., 2021SEDA-GOMBAU, G et al. Impact of the COVID-19 Pandemic on Burnout in Primary Care Physicians in Catalonia. International Journal Environmental Research Public Health, Bethesda, v. 18, n. 17, p. 9031, 2021. DOI: 10.3390/ijerph18179031
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); a busca de atividades prazerosas e, mesmo, uma perspectiva heroica se impunham como estratégias defensivas, pela resistência ou sacrifício. O limite da normalidade de um sofrimento psíquico leve foi várias vezes ultrapassado e alguns médicos desenvolveram transtornos mentais. Os sofrimentos tanto individual quanto público se interpenetravam, aumentando a busca por terapia. Continuam os problemas de saúde habituais, mas a pandemia se destaca na agenda de todos. Dramas singulares tocam a sensibilidade de alguns médicos e tornam-se um repertório de histórias tristes a ser relembrado no imaginário social e das instituições de saúde.

Aumentou mais o estresse durante a pandemia, todo mundo muito estressado, a carga horária de trabalho bem confusa, todo mundo com medo de morrer… alguns colegas faltando e a gente tendo que suprir a ausência deles. Aumentou estresse, angústia, preocupação. Por si só a pandemia já gerava preocupação. (Brahma)

Eu estava atendendo uma paciente durante a pandemia depois de ter visto nove mortes num só dia e ter de dar notícias à família, comecei a sentir falta de ar. Só depois percebi que era uma crise de pânico. (Afrodite)

A necessidade de qualificação

Apesar do PMM ter um componente de formação, com apoio das universidades, a maioria dos entrevistados afirma o desejo por mais qualificação para atender aos problemas encontrados nas unidades de APS. Em função do amplo e complexo espectro de atividades e de situações que enfrentam nos diversos contextos comunitários em que atuam, os(as) médicos(as) ainda se sentem inseguros(as) em algumas áreas específicas do conhecimento e das situações a enfrentar; em particular na área de Saúde Mental e em habilidades de comunicação, dinâmica de grupo e de gestão de conflitos. Quando falam sobre saúde mental, mesmo com uma dominância da perspectiva de saúde integral, interdisciplinar e multiprofissional, os(as) médicos(as) da APS têm como sua preocupação central a administração de medicamentos psicotrópicos.

Alguns percebem que existem muitos casos de dependência a esses medicamentos e que é preciso lidar com esse problema. Outros persistem com uma visão psiquiátrica tradicional e medicalizante, centrada na prescrição acrítica desses psicotrópicos. Em geral, existe uma consciência sobre a necessidade de contar com tecnologias simples, mesmo que muito complexas na sua efetivação, como psicoterapias e técnicas de dinâmica de grupo. Para isso, sugerem a contratação de psicólogos para a APS e qualificação nessas áreas.

Aprender a lidar com o coletivo seria muito importante. Saber conversar, colocar dúvidas, expressar seus sofrimentos, saber dialogar, aprender a fazer uma reunião de equipe, chegar a consensos, sem agressões, diminuir fontes de sofrimento, seria bom se tivéssemos capacitações para isso. (Zeus)

Tenho necessidade de atualização em medicações psiquiátricas porque têm pacientes que usam por muito tempo antidepressivos e que poderiam fazer o desmame e iniciar uma terapia holística. (Jaci)

Precisamos de algo simples, às vezes uma tecnologia leve, e a gente não tem. Às vezes você precisa de um psicólogo na atenção primária […] intervir naquele momento de forma adequada com psicoterapia…. (Janaina)

Considerações finais

Esta pesquisa foi realizada em meio às dificuldades do contexto da pandemia que nos levou a adotar técnicas de investigação mediadas por plataformas digitais, o que certamente trouxe vantagens, mas também problemas que ainda não foram suficientemente analisados pelos pesquisadores. O contexto de polarização política no país também exigiu dos pesquisadores muita sensibilidade na abordagem dos entrevistados. Além disso, o fato dos(as) médicos(as) não terem vínculos empregatícios, nem serem contratados por concurso público ou outras formas de contratos com maior estabilidade, pode ter impedido críticas mais contundentes sobre a gestão ou às dimensões do processo de trabalho, contribuindo para algumas contradições dos discursos.

O SP é uma condição humana, um fenômeno normal associado às situações estressantes do cotidiano, que pode se agravar e, eventualmente, tornar-se um sofrimento patológico. A maioria dos entrevistados o percebem dessa forma, mas alguns aderem à visão medicalizante da psiquiatria tradicional, que insiste em patologizar e ver na medicação sua única estratégia de lidar com o sofrimento psíquico. Embora reconheçam o desgaste físico e mental do exercício de uma profissão estressante e exaustiva, nem sempre percebem as estratégias defensivas de naturezas diversas produzidas na subjetividade e desenvolvidas em suas práticas nos territórios.

O processo de desmonte da APS, num contexto político restritivo agravado pela pandemia, contribuiu para intensificar a fragmentação e deterioração dos processos de trabalho. O contato com uma população que apresenta inúmeras carências, os problemas estruturais das unidades de saúde, a burocracia, as interferências políticas sobre o trabalho, o descompasso entre a formação e os conhecimentos necessários para responder com segurança aos problemas que surgem no cotidiano dos serviços de saúde, têm contribuído para incertezas, frustrações e sofrimento dos(as) médicos(as).

O surgimento da pandemia com sua característica de catástrofe sanitária e traumática vem redimensionar o processo de trabalho da APS e assombrar os diferentes atores, virando pelo avesso as expectativas. Sobrecarga de trabalho, conflitos, insatisfação e sofrimento são amplificados; o medo e o sentimento de desamparo se estabelecem. O trabalho criativo é sufocado pelas sombras de um contexto sanitário inóspito e de um contexto político nacional de desmonte das políticas públicas e de negativismo científico. Terreno fértil para estratégias defensivas patológicas que se manifestam também sob a forma de transtornos diversos que passam pelo burnout, transtornos de ansiedade e depressão. Nesse contexto, a saúde mental é referida como uma área estratégica para a formação e para exercer com competência as práticas na APS.

No âmbito do PMM-RN, foram referidos problemas relativos à precariedade dos vínculos trabalhistas, mediante uma condição de bolsista que se prolonga indefinidamente, sem a formalização de uma contratação e o estabelecimento dos direitos trabalhistas universais. Numa conjuntura que se iniciou em 2019, marcada por um governo que se manifestou contrário a esse programa e que promoveu cortes sucessivos no seu contingente de médicos, reduzindo a sua cobertura assistencial, esta condição prolongada de bolsista contribuiu para a sensação de incerteza diante da carreira profissional em construção. Por outro lado, mesmo com o apoio diferenciado da supervisão e tutoria das universidades, afirma-se um desejo de conhecimento diante das fragilidades de um universo complexo que transcende a formação universitária e exige uma maior qualificação.

O PMM foi uma oportunidade fantástica para mim. Só acho que uma coisa poderia melhorar é a relação trabalhista. Até hoje recebemos bolsa, estou há cinco anos nessa situação que é uma forma do estado não gerar vínculo e ter mão de obra disponível. (Zeus)

Sob influências diversas, desenvolve-se, nos diversos territórios, um mosaico de situações que pode permitir ou impedir as estratégias criativas ou patológicas para responder ao processo de trabalho. É possível evidenciar que, apesar das especificidades presentes nos estudos de caso, a maioria dos resultados desta pesquisa reforça o que foi encontrado na literatura científica com relação ao tema. Este artigo tentou apresentar e refletir sobre algumas dessas experiências, mas novos estudos devem ser realizados para aprofundar algumas questões levantadas, ampliar o conhecimento e subsidiar políticas e práticas de saúde mental na APS, envolvendo os processos de trabalho para que esses cenários de prática se transformem em espaços de afeto e realização.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2023
  • Revisado
    16 Mar 2023
  • Revisado
    13 Abr 2023
  • Aceito
    19 Abr 2023
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
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